segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Carlos Leite Ribeiro (A Deusa e o Mar) Capitulo 7

Entretanto, na sala de operações, do melhor e mais bem apetrechado hospital de Lisboa, o Dr. Roger Richter, terminara a segunda operação, a Sandra Cristina. Na ante-sala, esperavam-no o pai e a mãe da paciente. O médico saiu da sala das operações, com o semblante carregado. Os Mendes encararam-se, preocupados.

Encarando com eles, o Dr. Roger Richter disse, com aquela rudeza quase agressiva, que o caracterizava, quando estava enfronhado nos seus trabalhos profissionais:

Dr. Roger: -  A vossa filha vai ficar curada. Cheguei a recear que apenas pudesse fazê-la coxear um pouco menos. Mas a verdade, é que Deus me ajudou, e agora, posso garantir-lhes que dentro de três a seis meses, a nossa gentil Sandra Cristina, correrá e dançará, como qualquer rapariga que nunca tenha sofrido qualquer acidente!

Emília: -  Oh, Sr. Doutor!

A mãe da rapariga rompeu num pranto silencioso e feliz, enquanto o marido caminhava para o Dr. Roger Richter, e estendeu-lhe a mão, com os olhos marejados de lágrimas. O médico apertou-a e com um sorriso. Já perdera aquele ar carrancudo que tinha, quando prestava a sua atenção profissional, e disse-lhe:

Dr. Roger: Não tem nada que me agradecer, Sr. André Mendes. Fiz o que pude. Mas olhe que a sua mulher precisa de si…

Efetivamente, Emília Mendes tateava o ar, procurando onde se pudesse apoiar. Na sua perturbação, aquela mãe ainda duvidava das palavras claríssimas que acabara de ouvir!

Depois do marido a ter amparado e a levado até a uma cadeira, a pobre senhora levantou os olhos para o médico, e nesse olhar endereçou-lhe o mais eloquente agradecimento que ele poderia ter recebido. Sensibilizado, o Dr. Roger Richter disse-lhe então:

Dr. Roger: -  Dentro de uma hora, podem fazer companhia à vossa menina, mas por poucos minutos, dez o máximo. E não se esqueçam que ficam completamente proibidos de lhes dizer o que eu lhes contei do êxito da intervenção cirúrgica. 

Emília: -  Assim faremos, Sr. Doutor. Até parece um sonho, o melhor sonho de minha vida!

Dr. Roger: - Se lhe dissessem isso lhe provocaria um choque nervoso, que poderia ser-lhe prejudicial na evolução no processo de recuperação, que agora deve ser rápido.

Emília: -  Faremos tudo o que o Sr. Doutor nos mandar ...

Dr. Roger: -  Digam-lhe que não estiveram comigo, depois da operação.

Emília: -  Pode estar descansado, Sr. Doutor.

Dr. Roger: -  E para terminar, também vos quero dizer que os convido para jantarem comigo e com a minha mulher, esta noite.

Eles sorriram envergonhados, mas o médico receou que não o tivessem compreendido que lhes estava a fazer um convite formal, pelo que se apressou a acrescentar:

Dr. Roger: -  Esta será a última parte da mentira, que peçam que não digam a Sandra... Bem, não é rigorosamente uma mentira, pois, minha mulher e eu, esperamos que nos deem o prazer da vossa companhia, hoje, ao jantar - está bem ?!

Emília: -  Temos todo o prazer em aceitar o seu amável convite!

Dr. Roger: -  Então até logo às oito horas no hotel.

No final do jantar, o Dr. Roger Richter esclareceu o casal Mendes:

Dr. Roger: -  Convidei-os com um determinado fim, ou seja, o caso de Sandra Cristina. Em princípio, ela deveria de precisar de outra intervenção cirúrgica, mas que talvez seja desnecessária, se durante estes meses mais próximos, for vigiada com toda a atenção e competência. Nós temos de partir de avião para Nova Iorque, na próxima semana, pois não posso de modo algum protelar a data da minha partida, por compromissos anteriormente assumidos.

André: -  E o que nós podemos para ajudar a nossa querida filha?

Dr. Roger: -  Tenham calma e escutem a minha mulher vos tem para vos dizer.

Jodie: -  Por isso pensei, ou melhor, pensamos eu e meu marido, em pedir emprestada a vossa filha por uns meses. Autorizem que a Sandra venha conosco, pois lhe faria muito bem mudar de ambiente. Em Nova Iorque, temos muitos amigos, e ela recompor-se-á noutro meio ambiente, de modo que, quando regressar será outra rapariga, tendo inclusive já perdido todos os seus complexos, que sempre a têm atormentado. Que me dizem?

Emília: -  Nós gostaríamos que ela fosse, mas compreendem as saudades... E, além disso, financeiramente, não podemos suportar tanta despesa,

Jodie: -  Mas atenção, pois tratasse de um pedido nosso, sem qualquer encargo financeiro para vós.

Dr. Roger: -  Reforçando a ideia de minha mulher, lhes direi que não vos fiz qualquer pedido em proveito próprio, a não ser aquele de cederem parte da vossa mesa, na esplanada, no primeiro dia que nos conhecemos!

Jodie: -  É um convite que fazemos com todo o prazer, e que não representa para vocês, repito qualquer despesa financeira.

Dias depois, Sandra Cristina, acompanhada pelo casal Richter, partia de avião rumo a Nova Iorque.

Quando o carro particular do casal parou, de fronte a um enorme arranha-céus onde moravam, o Dr. ajudou Sandra a descer do automóvel, e a rapariga, também amparada a sua mulher, caminhou devagarzinho até ao ascensor.

Estava radiante de felicidade. Chegados ao último andar, o ascensor parou. Um mordomo veio-os receber e cumprimentou-os respeitosamente. A senhora Jodie Richter, perguntou-lhe então:

Jodie: -  Antony, anteontem recebeu um telegrama meu?

Mordomo: -  Recebi sim, minha senhora!

Jodie: -  Então, está tudo conforme as indicações que lhe dei?

Mordomo: -  Segui todas as suas indicações, minha senhora.

Jodie: -  Muito bem... Sandra Cristina venha agora ver a cidade de Nova Iorque, do alto de um centésimo quinto andar.

Devagarzinho, com mil precauções e carinhosamente, a mulher do Dr. Roger Richter levou a Sandra, até a uma grande janela que se abria sobre o coração da cidade. O espetáculo que daí se avistava, era simplesmente maravilhoso!

O Dr. Roger Richter, veio reunir-se a ela e a sua mulher.

Dr. Roger: -  O que se avista daqui é de facto esmagador! Mas vim aqui convidá-las a passarem à biblioteca. Venha, Sandra Cristina, que nós a ajudaremos.

Jodie: -  Eu vou à frente abrir a porta, e a Sandra vai entrar sozinha, sem estar amparada a nós. Serão os primeiros passos que dará, sem coxear, valeu?

Sandra: -  Vamos lá a ver se conseguirei…

A porta abriu-se e a rapariga viu-se num dos topos de uma grande sala, confortável e forrada com estantes cheias de livros. Não estava ninguém na biblioteca, apenas, na grande parede do fundo, estava uma tela...

Ao ver a tela, Sandra Cristina caminhou sozinha para a frente, com o corpo direito e sem coxear, com o olhar brilhante e fixo naquele quadro, como se estivesse sonhando.

Era ela a retratada, era ela que estava ali, numa técnica de pintura como nunca vira, e em que cada traço lhe falava de um amor, que ela não soubera compreender a tempo...

Sim, ela tinha razão quando argumentou com os pais, que o quadro recebido do Luís Carlos, não poderia ser o original. O seu coração não a enganara!

E foi os seus olhos brilhantes, que fizeram a pergunta, que os seus lábios não se atreveram a formular.

Então, conscientemente e pela primeira vez na sua vida, o Dr. Roger Richter faltou à sua palavra, e explicou a Sandra, como é que aquele precioso quadro, que o autor nunca quisera vender por preço algum, se encontrava ali em sua casa, na sua biblioteca.

A Sandra Cristina teve uma inevitável crise de lágrimas e logo quis saber onde se encontrava Luís Carlos.

Jodie: -  Isso também nós queríamos saber, Sandra. Até porque o meu marido tem de fazer contas com ele, pois todas as despesas extras da operação deviam ser pagas por ele. Ora, para isso mandou-nos um cheque com uma importância muito superior àquela que despendemos, mesmo contando com esta sua viagem a Nova Iorque. E o meu marido, quer-lhe devolver-lhe o excedente.

Sandra: -  Mas então têm o endereço dele de Paris?

Jodie: -   Também não temos esse endereço, e só sabemos que ele partiu da capital francesa, sem deixar rastro.

Sandra Cristina ficou pensativa, mordendo os lábios. Foi o Dr. Roger Richter quem lhe indicou o que ela devia de fazer:

Dr. Roger: -  Para mim, não pode haver quaisquer dúvidas sobre o que vai acontecer. Mais dia, menos dia, Luís Carlos vai quer saber o resultado da operação, e então terá de comunicar comigo para poder saber o que aconteceu, ou, então, vai aparecer em São Pedro de Moel, visto que daqui a dois meses, fará dois anos que vocês ali se conheceram, não é verdade?

Sandra: -  É verdade. Estou a ver que o Sr. Doutor sabe tudo a nosso respeito. Mas que posso eu fazer?

Dr. Roger: -  Por enquanto, minha boa amiga, ainda está sob a alçada do clínico, que está a vigiar a sua convalescença.

Sandra: -  E ainda terei que ficar por cá muito tempo?

Jodie: -  Daqui a dois meses e meio ou três, regressará a Portugal e a São Pedro de Moel, novinha em folha e capaz de amar sem qualquer complexo, o mais generoso e bondoso coração de homem que palpita sobre a terra, ou seja, o Luís Carlos! E vai ver que ele aparecer-lhe-á, disso não tenha a menor dúvida, minha amiga!

Sandra: -  Se me pudesse garantir isso...

Dr. Roger: -  O que minha mulher lhe disse, é rigorosamente verdade, pois nada sabemos de Luís Carlos. Mas quase lhe podemos garantir-lhe o seguinte: cuide-se de si, pois com certeza que ele a procurará... e a encontrará!

Sandra: -  Se eu tivesse a certeza...

Jodie: -  Quase lhe posso dar a minha palavra de honra que ele a procurará!

Sandra: -  A sua palavra de honra?! ... Então, deve saber mais algumas coisas, além do que me disse...

Dr. Roger: -  Pode crer que  nem eu nem minha mulher sabemos mais nada, a não ser que o amor dos homens honrados, é a maior força que os impele neste mundo!

continua…

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