sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Curso Gratuito de Redação e Gramática da USP

O Projeto Redigir – curso gratuito de redação e gramática da Universidade de São Paulo (USP) – está com inscrições abertas até sábado, 10. São 120 vagas abertas à comunidade. O curso é destinado às pessoas de baixa renda, que estão cursando ou já concluíram o 3º ano do Ensino Médio em escola pública.

Durante dois semestres (de março a julho e de agosto a dezembro), os estudantes terão uma aula por semana, com duração de duas horas e meia. As aulas começam na segunda-feira (12).

As inscrições deverão ser feitas pessoalmente pelo candidato, no Centro Acadêmico Lupe Cotrim, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. Até sexta (9), o atendimento vai das 10 às 20 horas. No sábado, das 9h30 às 13h30.
Os interessados devem levar os seguintes documentos: uma cópia do RG, do comprovante de escolaridade e dos comprovantes de renda de todas as pessoas de sua residência que trabalham. A seleção levará em conta critérios socioeconômicos, e não a ordem de chegada.

Cidadania – O Projeto Redigir existe desde 1999. Surgiu com a proposta de oferecer uma atividade de extensão gratuita e de qualidade às pessoas de baixa renda. Os professores são estudantes e profissionais voluntários formados pela própria ECA.

Além das aulas de redação e gramática, os alunos terão acesso à biblioteca circulante e participarão dos seguintes eventos: ciclo de palestras Como não ser enganado pela mídia (aberto à comunidade), atividades culturais, visitas ao centro de São Paulo e aos assentamentos de sem-terra.

SERVIÇO

Projeto Redigir – curso gratuito de redação e gramática da USP. Inscrições no Centro Acadêmico Lupe Cotrim, da ECA, que fica na Av. Professor Lúcio Martins Rodrigues, 443, Cidade Universitária, capital. Mais informações pelo telefone (11) 3091-4013.

http://www.servidorpublico.net/noticias/2007/03/08/inscricao-para-curso-de-redacao-da-usp-termina-sabado

Fonte:
Colaboração de Douglas Lara
SOROCABA dia e noite
http://www.vejosaojose.com.br/sorocabadiaenoite.htm

Escrever Bem não é o que se Pensa

Nem só escritores e jornalistas vivem de escrever. Nas repartições públicas, nos escritórios das empresas e nas escolas, há gente redigindo memorandos, cartas, pareceres, relatórios e redações.

A função desses textos é informar, comunicar ordens, obter respostas, orientar decisões, prestar contas. Supõe-se, então, que duas devem ser suas qualidades: clareza e concisão, nomenclatura velha que traduzimos por objetividade e rapidez na comunicação.

Classificando com rigor, há dois tipos de redator: o que finca o lápis no papel (ou os dedos no teclado) e espera que o começo caia do teto, e o que "redige bem", na base de vocabulário aprendido em antologias ou fazendo pareceres mudando apenas os dados da "chapa".

Há também os que sabem escrever.

Os do bloco "o difícil é começar" pecam pela falta de organização do pensamento, decorrente do desábito de leitura e da ausência de preparação específica. Os do outro grupo atrapalham o leitor, que necessita apenas de informação, por procurarem um estilo que os aproxime dos que eles consideram os bons autores.

Há diferença (bastante grande) entre língua literária e linguagem informativa.

A PALAVRA É O PONTO

A literatura pretende, por meio da palavra, causar um prazer no leitor. Por isso é que na leitura de um texto literário se valoriza a palavra. Mais numas épocas que em outras. Muito no tempo de Vieira, ou no de Bilac, Coelho Neto e Rui Barbosa. Na poesia, onde a intenção do prazer é mais clara, a seqüência vocabular pode não ter nem sentido lógico, vale pelo impacto visual ou pela impressão sonora.

Limitando com exagero, poderíamos descobrir duas tendências na prosa de hoje: a dos escritores que procuram prolongar o prazer estético pela dificuldade da palavra - James Joyce, Guimarães Rosa, e a daqueles que, seguindo uma linha que vem do Modernismo, buscam diminuir a distância entre a linguagem artística e a linguagem cotidiana, para tornar a arte mais verdadeira porque mais próxima do povo, origem e fim da arte, segundo pensam.

O fato é que, na literatura, a palavra tem vida independente, vale por si.

A PALAVRA DA COMUNICAÇÃO

Quando lemos um jornal, não paramos nas palavras para saber se são bonitas, precisas ou sugestivas; o assunto chega ao nosso conhecimento numa relação imediata.

O texto informativo é compacto, nós o percebemos como um todo, junto com a idéia.

Isto porque a linguagem cotidiana é automática. Da mesma maneira que não pensamos na perna que devemos movimentar cada vez que damos um passo, não escolhemos a palavra na hora de falar. O movimento das pernas já é "conhecido" do cérebro, e se realiza sem que precisemos conscientizá-lo. Da mesma forma, o vocabulário da linguagem corrente é constituído de termos conhecidos. Isto é que nos faz compreender imediatamente o que nos dizem, como se fôssemos direto à idéia e não houvesse a palavra entre a pessoa que fala e a que ouve.

O vocabulário corrente está longe de ser a maior parte do léxico. Há uma limitação, embora não haja estratificação. Exceto de certas expressões que se desgastam com o uso excessivo, viram bagaço; ditas a todo momento, nada mais significam. Por isso é que o redator-chefe de um jornal lembre aos focas que "nem toda chuva é torrencial, nem todos os lábios ficam entreabertos, não é todo mundo que se entrega de corpo e alma a determinada tarefa, nem todo olhar é penetrante, etc". É o lugar-comum.

EXPRESSIVIDADE

Certas pessoas e alguns escritores têm um modo especial de falar - ou de escrever - que nos atrai e os faz agradáveis. Não é preciso perspicácia maior para perceber que a linguagem deles difere da comum por algum motivo. Eles nos atingem com muito mais intensidade. A qualidade pela qual a linguagem capta de imediato o interesse do leitor é a expressividade. Pode ser a força do detalhe na ironia de Eça, a antítese humorística de Machado de Assis, ou a parentela e a gíria de um Stanislaw Ponte Preta.

SIMPLICIDADE

Originalidade na linguagem não significa pedantismo; pelo contrário. A palavra falada é de certa forma incompleta. A mímica, os objetos à vista, as situações que falam por si, tornam a fala econômica, ficando a frase muitas vezes pelo meio, sem que isto comprometa o entendimento.

Já a palavra escrita procura modelos. Sua tendência é estar sempre atrasada em relação às necessidades expressivas. Principalmente a cravejada de adjetivos, rechonchuda de advérbios, trôpega de possessivos, demonstrativos e artigos.

Os vocábulos de fraque e chapéu coco que se intrometem na comunicação diária - entrementes, alhures, outrossim, consoante, consubstanciar e quejandos - tiram-lhe a atualidade, atrasam a leitura e a compreensão, enchem-na de um ranço incompatível com a dinâmica de hoje.

Os telegramas custam caro, as rotativas imprimem o resultado do trabalho de centenas de pessoas, o tempo no rádio e na televisão é medido em cifras: um adjetivo enfeitando aqui, uma conjunção rara mostrando sapiência ali, são desperdício e tornam a comunicação pastosa, tiram-nos o prazer que poderíamos sentir ao ler um relatório.

O mundo moderno é muito rápido. A velocidade do presente não admite mais o ornamental na comunicação. A não ser que tenhamos preocupações falsamente artísticas, a redação deve ser simples e objetiva.

JORNAL E COMUNICAÇÃO BUROCRÁTICA

Parece-nos que a técnica de redação de jornal é aconselhável para as comunicações de serviço. Não há diferença da boa redação de uma noticia para a de um relatório.

O primeiro parágrafo de uma reportagem é um resumo conciso das principais informações, e procura responder ao maior número das perguntas: quê? quem? quando? onde? por quê? Os demais são ordenados conforme o interesse.

Nada de palavras difíceis ou adjetivos desnecessários. Melhor: todo o dispensável é abandonado. Algumas palavras são verdadeiros tropeços. Cuidado com elas: possessivos, demonstrativos, artigos, e as terminadas em -ão e -mente. O quê, pelo grande número de funções que desempenha, atravanca freqüentemente a frase.

Não é demais lembrar a vigilância sobre a repetição demasiada de palavras.

A frase ideal da comunicação é curta, incisiva, sem rodeios.

"No cemitério enterrei $189.000 - pagamento ao coveiro e conservação." Parece linguagem de relatório? Pois é. E de homem bastante sério, Graciliano Ramos, na prestação de contas que fez ao governador de Alagoas, quando o escritor era prefeito de Palmeira dos Índios.

Embora não se pretenda ensinar a redigir em dez lições sem mestre, as notinhas abaixo podem ajudar bastante.

ARRUMAÇÃO

- Procure escrever rascunhos claros e limpos. Você ganha tempo,

- Escreva de um só lado da folha com espaçamento razoável (às vezes a gente tem de "enxertar" alguma coisa),

- Numere as folhas se tiver mais de uma,

- No alto de cada página, à direita, escreva uma palavra ou frase que identifique o texto,

- Não comece parágrafo na última linha,

- Ponha ao lado o dicionário, se possível. De preferência um que contenha as instruções que orientam a ortografia oficial.

AGORA ESCREVA

- Antes, reuna o maior número possível de informações sobre o assunto,

- Na verdade, o que temos a dizer sempre caberia numa frase. Para evitar fugir do assunto, pense no tema em cada parágrafo;

- Ocupe o primeiro com as informações mais importantes do texto, respondendo ao maior número das perguntas quê? quem? onde? quando? como? por quê?

- Ordene o restante de acordo com a importância dos pormenores,

- Use parágrafos curtos,

- Conserve a ordem direta. Na medida do possível,

- Reduza ao necessário o emprego de artigos, demonstrativos e possessivos,

- Procure evitar:
a repetição desnecessária de palavras. Principalmente não comece períodos ou parágrafos com a mesma palavra,
palavras chulas, e expressões de gíria não incorporadas à linguagem geral, também termos preciosos
o excesso de advérbios terminados em -mente;
o clichê - fórmulas e expressões generalizadas (a tarde morria silenciosa, não resistindo aos padecimentos, indigitado criminoso, calor senegalesco, etc.).

NOTÍCIA QUASE PERFEITA

Apliquemos as regrinhas a uma notícia quase perfeita.

"A decantada capacidade de reação do Vasco não foi suficiente para deter o novo América na tarde de ontem no Maracanã, que assistiu entusiasmado aos três gols do Diabo: dois de Eduardo e um de Edu. O Vasco ainda fez um, por Paulo Bim, ao apagar das luzes, quando as bandeiras vermelhas do América já tremulavam comemorando a nova vitória do virtual vencedor da Taça Guanabara. Privilegiado pela sua condição de colíder - junto com o Botafogo -, ao América caberá apenas aguardar o resultado do próximo jogo do alvinegro com o Bangu, quarta-feira, para saber se poderá usar as primeiras faixas deste ano. Caso o Botafogo vença, ganhará o direito de disputar uma partida extra com o América, em data ainda a ser marcada. No sábado, o Flamengo tirou o Bangu da taça, ao empatar por 1 x 1, em jogo onde três atletas quebraram a cabeça: Jaime, Itamar e Del Vecchio." (Última Hora)

a) Informações: no mínimo, treze.
1 - o Vasco tem capacidade de reação já tradicional;
2 - o América se apresenta renovado;
3 - o jogo se realizou no estádio do Maracanã;
4 - a data do jogo;
5 - o América venceu por 3 x 1;
6 - os autores dos gois;
7 - o América é o virtual vencedor da Taça Guanabara;
8 - o Botafogo é colíder;
9 - se o Botafogo perder para o Bangu, o América já é campeão;
10 - a data do encontro Botafogo x Bangu;
11 - as possibilidades diante de uma vitória do Botafogo;
12 - por que o Bangu não é mais aspirante à taça;
13 - um acidente curioso.

b) A noticia poderia se resumir a: O América venceu o Vasco de três a um e é o virtual campeão da Taça Guanabara.

c) As perguntinhas estariam assim respondidas: quê? - um jogo; quem? - o América venceu o Vasco; onde? - no estádio Maracanã; como? -de três a um, em clima de entusiasmo; por que? - porque a renovação do América o fez um grande time.

d) Ordem de importância: vitória do América, sua situação diante do colíder, o afastamento do Bangu, o acidente.

e) A não abertura de parágrafos deve-se ao aproveitamento de espaço de primeira página, onde a noticia saiu.

f) Observe a ordem no primeiro parágrafo.

g) Escorregou apenas nos dois clichês: ao apagar das luzes (mas que faz
parte da gíria do futebol) e bandeiras tremulavam.

O QUE É BOM

A linguagem burocrática deve ser fluída e livre de tentativas "literárias" em lugar impróprio e das excessivas repetições de fórmulas emboloradas.

É claro que uma notícia é uma notícia e uma redação é uma redação. Cada qual tem desenvolvimento diferente. Mas a finalidade é a mesma: informar e orientar com rapidez e correção. O espírito deve ser o mesmo.

O que é bom para a notícia é bom para uma redação.

Fonte:
Santos Jr., Silvio (seleção). E-learning 3 (CD-Rom) São Paulo: Digerati

Processo de Redação

No processo de redação existe um plano estruturado para ligação lógica do que o emissor codificador quer transmitir ao receptor ou decodificador da mensagem, ou melhor, temos uma sequência de idéias que geram um diálogo entre duas pessoas (escritor e leitor/ vestibulando e examinador) por meio de idéias que são tecidas por meio do tema proposto e delimitado.

Formamos um plano de trabalho lógico ao leitor: a Introdução, que é o início de uma idéia geral e importante (objeto principal do trabalho). Construímos o núcleo-frasal que será desenvolvido; o Desenvolvimento que é a manifestação do tema em todos os seus elementos "actions" (afirmação ou negação). Nele se desenvolvem os elementos extrínsecos ou formais e os intrínsecos (conceitos e argumentos) observando a clareza e a concisão do parágrafo. Conclusão é o sintetizador do desenvolvimento e criador do elo final com a idéia geral mencionada na introdução. Ordene esta redação e veja se é uma dissertação.

Você somente aprende escrevendo e sendo examinador do texto mas nunca deixe de consultar seu professor de redação e gramática. Não se esqueça de visitar as Dicas de Português e Literatura. As minhas Dicas nada valem sem o entendimento da Gramática e dos estilos de redação.

FORTALECENDO IDÉIAS

Usando a idéia de processos de expressividade, o professor e conferencista ALPHEU TERSARIOL dedica ao leitor um excelente roteiro de trabalho em sua obra: Manual Prático de Redação e Gramática, da LI-BRA Empresa Editorial Ltda.

Para trazer curiosidade à leitura, busco seu conceito sobre as formas de redação: "... Dissertar tem por objetivo instruir e instruir-se, através de raciocínio e reflexão..."; "...narração é uma sequência de episódios... é colocar os fatos numa devida ordem, sem repetir os acontecimentos e circunstâncias..."; "...Descrição é a reprodução visual da natureza, dos fenômenos dos fatos, objetos e sensações..."Ela abrange diversos aspectos no mundo exterior e às vezes do íntimo..."

Aconselho aos vestibulandos ler este manual, principalmente, nas observações e conselhos sobre recursos de expressividade que enriquecem sua redação dissertativa como o exemplo que o autor expõe sobre desarmamento infantil.

A ordenação no Desenvolvimento do Parágrafo pode acontecer

a) por indicações de espaço : "... não muito longe do litoral...".Utilizam-se advérbios e locuções adverbiais de lugar e certas locuções prepositivas, e adjuntos adverbiais de lugar;
b) por tempo e espaço: advérbios e locuções adverbiais de tempo, certas preposições e locuções prepositivas, conjunções e locuções conjuntivas e adjuntos adverbiais de tempo;
c) por enumeração: citação de características que vem normalmente depois de dois pontos;
d) por contrastes: estabelece comparações, apresenta paralelos e evidencia diferenças; Conjunções adversativas, proporcionais e comparativas podem ser utilizadas nesta ordenação;
e) por causa-consequência: conjunções e locuções conjuntivas conclusivas, explicativas, causais e consecutivas;
f) por explicitação: esclarece o assunto com conceitos esclarecedores, elucidativos e justificativos dentro da idéia que construída.

Fonte:
Guimarães, Débora Miura (seleção). E-learning 6 (CD-Rom) São Paulo: Digerati

Dissertação

DISSERTAÇÃO

Dissertar é discutir assuntos, debater idéias, tecer opiniões, delimitando um tema dentro de uma questão ampla e defendendo um ponto de vista, por meio de argumentos convincentes. É um tipo de texto lógico-expositivo - colocamo-nos criticamente perante alguma dimensão da realidade e, mais do que isso, fundamentamos nossas idéias; explicitamos os motivos pelos quais pensamos o que pensamos.

Já se tornou um aborrecido lugar-comum afirmar que o Brasil possui dimensões continentais. Os ufanistas que tanto repisaram essa fórmula para receitar esperança no futuro do país talvez não tenham previsto que a quantidade e a variedade de problemas desse "gigante" infelizmente também teriam grandezas igualmente continentais.
Folha de São Paulo,14.04.96

Produção de texto dissertativo

Ao produzir um texto é preciso que se pense sobre: Tema, objetivo, argumentos e dados.

a) TEMA: é o assunto da minha redação (Sei alguma coisa sobre ele? Já li ou vi algo a respeito? Já conversei sobre esse assunto?)

b) OBJETIVO: é a meta da minha redação ( onde quero chegar com o meu texto? Quero concordar? Discordar? Denunciar? Questionar? Comparar? Opor? Enumerar? Interessante é observar que a união entre dois ou mais objetivos se encaminha para uma meta maior: denunciar e questionar; concordar e enumerar; discordar e opor...)

c) ARGUMENTOS: é o conjunto de idéias que justificam o objetivo do meu texto ( Com base em que eu me posiciono de um modo ou de outro na redação?)

d) DADOS: é a exemplificação dos meus argumentos ( Os dados ilustram e sustentam mais ainda o objetivo da redação.)

O início da redação

DECLARAÇÃO INICIAL
"O hábito de correr, benéfico para o coração, os pulmões e a manutenção da forma física, também origina sérios problemas, principalmente ortopédicos."

INTERROGAÇÃO
"De que maneira uma nação pode conciliar seu desenvolvimento com uma pesada dívida externa?"

OMISSÃO DE DADOS
"De uns tempos para cá, tem surgido um elemento novo no cenário nacional.Extremamente movediço, ele sempre aparece onde não se espera. Se o espreitamos, ele se esconde em hibernação cautelosa."

COMPARAÇÃO
"O uso de drogas é como um vôo solitário e cego. É como visitar um mundo novo em cada viagem e sempre ter como pouco a depressão, porto escuro e frio."

TIPOS DE CONCLUSÃO

Conclusão proposta: aponta soluções para o problema tratado, ou seja, procura saídas, medias que possam ser tomadas. Em suma, é uma conclusão que aponta para o futuro.

"Como se nota pela dimensão do problema, algumas medidas fazem-se urgentes: é necessário investir em projetos de recuperação dos rios, tal como se fez na Inglaterra com o rio Tamisa; por outro lado, devem-se desenvolver projetos que visem ao reaproveitamento dos esgotos. Ao lado, disso, devem-se fazer maciças campanhas educativas para a população. Finalmente, há necessidade de uma ampla fiscalização por parte das autoridades responsáveis."

Conclusão resumo: a forma mais comum de concluir o texto. Resumem-se os aspectos abordados no desenvolvimento e apresenta-se (ou reforça-se) a tese.

"Dessa maneira, observamos que o problema da poluição nos rios envolve uma série de variáveis que incluem a população, as indústrias e o Estado".

Conclusão surpresa: Possibilita uma maior liberdade de criação por parte quem escreve. Citações, pequenas histórias, um fato curioso, uma piada, um final poético, são conclusões inesperadas que surpreendem o leitor.

"Talvez um dia casos como o do garoto C.A.C.M., não ocorram mais. Cabe a todos nós lutar por isso."

TEMA: Shopping center: o espaço social dos jovens de hoje.

ASSUNTO Shopping center

DELIMITAÇÃO -Objetivo (para quê?) O espaço social dos jovens de hoje

INTRODUÇÃO Citar o assunto e a delimitação

DESENVOLVIMENTO 1 Desenvolver o tema: shopping center
DESENVOLVIMENTO 2 Desenvolver a delimitação: espaço social dos jovens de hoje
CONCLUSÃO Idéia reservada do banco

MODELO

Primeiro passo INTRODUÇÃO

Um dos fenômenos constatados dos anos 90 é o do "shopping center". Esse local de consumo, com segurança e com ambiente climatizado, exerce um outro papel para o qual não foi diretamente criado: centro de encontros de jovens.

Segundo passo BANCO DE IDÉIAS

ASSUNTO
O "shopping center" virou moda nos grandes centros urbanos;
os atrativos desse centro de compras são segurança, conforto e variedade de lojas no mesmo lugar;
o "shopping" incrementou o hábito de consumo da classe média;
associado às compras, esses locais transformaram-se em verdadeiros centros de lazer.

DELIMITAÇÃO
na falta de outros centros de convivência, o "shopping" tornou-se em espaço de jovem;
antigamente os jovens buscavam nos locais públicos (nas praças) um espaço de convivência;
entre outros motivos, a segurança tornou-se a principal razão da busca desse local pelos jovens;
o "shopping" expressa bem o jovem dos anos 90, colorido,luminoso, ágil, agitado, nervoso e repleto de outros jovens.

Terceiro passo REDIGIR O RASCUNHO

DESENVOLVIMENTO 1
Os "shoppings" viraram moda nos grandes centros urbanos. As razões desse fenômeno mostram-se simples: segurança, conforto e grande variedade de lojas centralizadas. Um paraíso de consumo, esses locais acabam criando novos hábitos - comprar, além de necessidade, é prazer. Associado a isso, os "shoppings" criaram parques de diversão para as crianças e um verdadeiro arsenal de comidas nas praças de alimentação.

DESENVOLVIMENTO 2
Na falta de outros espaços de convivência, esses locais foram adotados pelos jovens dos anos 90. Esse desejo de agregação é comum ao adolescente de qualquer geração, e isso pode ser observado em outros tempos, em que eles se encontravam nas praças das cidades. Mas a violência urbana tomou conta dos grandes centros e mudou muitos hábitos do homem atual. O jovem pode divertir-se, encontrar-se com os amigos e conversar nos "shoppings" sem ter preocupações com assaltos, e os pais ficam bem mais tranqüilos diante disso.

CONCLUSÃO
Assim, se o argumento da violência não basta para explicar o sucesso desses centros de compras junto aos jovens, vale lembrar que esses locais possuem a expressão mesma dos adolescentes: agilidade, nervosismo e inquietação. Os mais saudosos talvez lembrem com nostalgia os tempos de jogo de bola no meio da rua - outros tempos sem dúvida.

Dicas de redação
# Não fique "enrolando", enrole seu(sua) namorado(a), tenha clareza e concisão. Objetividade é muito importante.

# Fuja do lugar-comum (clichês) como o diabo foge da cruz; evite: inflação galopante, entregar-se nas mãos das drogas, duas faces de uma mesma moeda, dar a volta por cima, abrir com chave de ouro, agradar a gregos e troianos, alto e bom som, apertar os cintos(...)

# O Ricardão está com sua namorada. Não atropele a língua, você pode brigar sem motivo. Olhe a ambigüidade, a namorada é dele ou sua?

# Se você quiser fazer vestibular para um grupo de pagodeiros use: A decisão da eleição não causou comoção na população. Agora, se seu objetivo é outro corra do ECO.

# Caro deputado, nunca gaste dinheiro com bobagens. Alguns políticos, realmente tem "emporcalhado" a situação brasileira, mas não faça o mesmo com seu texto. Cacófatos é prejudicial à escrita.

# Organize bem seu texto: centralize o título, solte uma linha entre ele e o início da redação, respeite as margens (tanto esquerda quanto direita), faça letra cursiva ou de forma (mas diferencie bem maiúsculas de minúsculas). Em caso de erro passe apenas um trasso traço sob a palavra.

# Os verbos DAR, FAZER, SER e TER, têm alta incidência em texto. Para evitar o uso repetitivo troque-os por outras palavras que expressem a mesma idéia: O governo não tem alternativas (possui).

# Não condene todos os bandidos à morte, nem diga que todos os políticos são ladrões, ou seja, não radicalize.

# Não "estique" sua redação usando adjetivos desnecessários : mansão luxuosa (toda mansão é luxuosa)

# Não caia na "doença do queísmo", evitando repeti-lo. Você pode fazer uso das orações reduzidas.

# Escreva o texto sem se preocupar com os erros; corrija-os apenas ao terminar toda a redação.

# Não esqueça o título. Para não esquecer, escreva na folha de rascunho, bem grande, NÃO ESQUECER O TÍTULO.


APRESENTAÇÃO DA REDAÇÃO

A estética

Sua redação não é a “baranga” da sua vizinha, por isso não precisa de penduricalhos, faça-a o mais simples possível.

Título: Centralize-o. Entre o título e o texto deixe uma ou duas linhas. Use o ponto final caso o título seja uma frase. Evite título com apenas uma palavra (ex. O adolescente, A crise...) Procure utilizar no título a mesma letra do corpo de sua redação.
Pode-se grafar o título das seguintes maneiras:
Festa na Aldeia Global
O mundo Cão da TV Brasileira
ou
Festa na aldeia global
O mundo cão na tv brasileira (não precisa grifar)

Parágrafos: devem adentrar a linha dois centímetros e iniciarem-se sempre à mesma altura. O número de parágrafos varia de acordo com a extensão da redação. Procure fazer o mínimo de três parágrafos; o máximo dependerá do número de linhas pedidas. Não faça parágrafos muito extensos para evitar mistura de idéias. Apenas o primeiro parágrafo pode ser constituído de um período.

Rasuras: redação bem apresentável não deve conter rasuras, para isso você receberá um rascunho. Não rabisque e principalmente não use corretivos. Caso erre no original passe apenas um traço sobre a palavra erada errada. Não assine seu texto, mesmo que ele se pareça com uma obra de arte.

Letra: poderá ser letra cursiva ou de forma, neste último caso, desde que fique bem claro a diferença entre iniciais maiúsculas e minúsculas. A legibilidade do texto é de extrema importância, o corretor não é um Sherlock Homes para tentar decifrar o enigma da caligrafia. Caderno de caligrafia não é só para crianças, treine.

Correção: o texto estará correto se seguir as normas da Gramática. Se você as acha “chatas”, cuidado, pois agora elas poderão jogar sua nota em redação no lixo. Não aprendemos Gramática apenas para satisfazer ao “mala” do professor de português. Aprendemos para aplicá-las em nossas atividades redacionais. Portanto, fique atento:
Concordância: verifique se o sujeito está concordando com o verbo, ou se adjetivos e substantivos concordam entre si. Cuido com os advérbios, pois eles não variam (Maria está meia triste ou meio triste? Use o segundo). Períodos longos quase sempre dificultam a concordância como também a ordem inversa de frases, por isso reduza-os e escreva de forma simples.
Regência: cuidado com os verbos de regência mais complicada, principalmente aqueles que mudam de significado quando TD ou TI [Assisti ao filme (ver – VTI) – Assisti o doente (ajudar – VTD)]. Lembre também que o LHE(s) sempre será OI e O(s), A(s) sempre OD.
Colocação pronominal: Não é tão condenável, mas há casos exagerados do uso brasileiro que precisam ser evitados: iniciar frases com pronome oblíquo –Me disseram que você viria -. Frases em que aparecem antes do verbo palavras negativas, pronomes indefinidos e relativos, advérbios, conjunções, essas atraem o pronome oblíquo para antes do verbo. É condenável o uso de pronome oblíquo depois do verbo particípio – Vocês tinham desgastado-se muito – o correto é tinham se desgastado -.
Grafia: erro ortográfico não é aceitável. Não se faça de Carla Perez: “a palavra se escreve com i de ´iscola´”. Se tiver dúvida em alguma palavra troque por outra de mesmo sentido. fique atento á acentuação gráfica.
Cuidado com a ambigüidade: “Doutor a paciente está aqui com a sua mãe” (mãe de quem? Do médico ou da paciente).
Cuidado com pleonasmos: “check-up geral, mergulhar dentro d´água, entrar para dentro...” Esse uso quase sempre faz sua nota “descer para baixo”.
Cuidado com cacófatos: “nosso hino é lindo; entregue um por cada” (a turma do chiqueiro agradece, mas o corretor!), “Espero que o governo nunca gaste mais que arrecadar” (governo que gasta mais do que arrecada faz o que insinua o cacófato), “Fez por razões que desconheço” (Que grosseria! Para que esse palavrão?)
Evite clichês: “Atualmente, nos dias de hoje” (são quase sempre dispensáveis); “estamos desnorteados, sem rumo”(sua redação! Sem comentários.); “entregar-se nas mãos de Deus” (aproveite e entregue sua redação a Ele);”duas faces de uma mesma moeda”(compro sua redação, mas com uma moeda de um centavo).
Clareza: seu texto deve ser compreensível: lembre-se que você não está ao lado do corretor para explicar o que você queria dizer. Utilize frases curtas. Não seja esnobe empregando palavras “difíceis”, o uso de vocabulário simples, porém culto, evita o risco do seu texto não ser compreendido.
Concisão: é a qualidade de expressar um fato, uma opinião com o menor número possível de frases e palavras. Mas cuidado com o excesso de concisão, pois pode acarretar em obscuridade. No trecho abaixo as palavras destacadas são dispensáveis:

“Há algumas ocasiões em que é melhor ficar calado do que falar besteira. Eu posso contar um caso recente que me aconteceu há pouco. Eu saí de casa rumo ao bar para beber alguma coisa. Percebam vocês que não tinha nada planejado, apenas queria beber um pouco e ficar a observar os habitantes da noite, os boêmios. Foi então que algo totalmente inesperado aconteceu...”

INICIANDO A REDAÇÃO

Dados retrospectivos: As primeiras manifestações de comunicação humana, nas eras mais primitivas, foram traduzidas por sons que expressavam dor, alegria, espanto, Mais tarde...
Citação: A partir das palavras de “...” podemos afirmar que “...”
Cena descritiva: Edifícios altíssimos e cinzentos cobrem a metrópole. Cinzas também são as nuvens que quase diariamente cobrem o céu e despejam uma torrente que logo traz caos à cidade. Uma insuportável sinfonia de buzinas inunda o ar. É mais um dia em São Paulo.
Pergunta: Será o futebol brasileiro realmente o melhor do mundo, se os melhores jogadores do país não disputam os campeonatos locais, pois partem para os clubes europeus assim que possível?
Dado geográfico: Em Criciúma, no Sul de Santa Catarina, oito mil homens vivem uma aventura todos os dias. A aventura do carvão. São os mineiros, homens que quase nunca vêem o sol.
Dados estatísticos: Numa típica cidade brasileira, que tenha, digamos... habitantes, cerca de.... não possuem escolaridade completa até o 2º grau, o que denota o desprestígio do ensino perante a classe dirigente.
Narrativa: Em Abril de 1964 foi deposto o presidente João Goulart e dado início à ditadura
militar, que governou o país durante mais de vinte anos.
Idéias contratantes: Enquanto nos restaurantes caros pessoas elegantes gastam até duzentos reais numa refeição que segue cozinhas renomadas, os marginais da sociedade morrem de fome nas ruas.
Uma frase nominal seguida de explicação: Uma tragédia. Essa é a conclusão da própria Secretaria de Avaliação e Informação Educacional do Ministério da Educação e Cultura sobre o desempenho dos alunos do 3º ano do 2º grau submetidos ao Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), que ainda avaliou estudantes da 4ª série e da 8ª série do 1º grau em todas as regiões do território nacional.

Quanto ao desenvolvimento do tema: podemos usar citação, dados estatísticos, justificativas, exemplos, comparações, causa e conseqüência....

Quanto à conclusão: retoma-se a introdução e os argumentos e fecha o texto. Sem apresentar dados novos. A conclusão pode conter uma idéia humorística, surpreendente, taxativa, sugestiva.

Fonte:
RESENDE, José Antonio Oliveira de. Curso de Produção de Texto. FUNREI.
Guimarães, Débora Miura (seleção). E-learning 6 (CD-Rom) São Paulo: Digerati

Aluísio de Azevedo (1857 - 1913)

ALUÍSIO TANCREDO GONÇALVES DE AZEVEDO nasceu em São Luís do Maranhão a 14 de abril de 1857 e faleceu em 21 de janeiro de 1913 em Buenos Aires.

Era filho do vice-cônsul português David Gonçalves de Azevedo e de D. Emília Amália Pinto de Magalhães e irmão mais moço do comediógrafo Artur Azevedo. Sua mãe havia casado, aos 17 anos, com um comerciante português. O temperamento brutal do marido determinou o fim do casamento. Emília refugiou-se em casa de amigos, até conhecer o vice-cônsul de Portugal, o jovem viúvo David. Os dois passaram a viver juntos, sem contraírem segundas núpcias, o que à época foi considerado um escândalo na sociedade maranhense.

Da infância à adolescência, Aluísio estudou em São Luís e trabalhou como caixeiro e guarda-livros. Desde cedo revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, o que certamente o auxiliou na aquisição da técnica que empregará mais tarde ao caracterizar os personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, onde já se encontrava o irmão mais velho, Artur que já fazia sucesso com suas peças teatrais. Matriculou-se na Imperial Academia de Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se fazia caricaturas para os jornais da época, como O Figaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada. A partir desses “bonecos” que conservava sobre a mesa de trabalho, escrevia cenas de romances. (Consta que, mais tarde , ao abandonar o desenho pela literatura, Aluísio Azevedo manteve o hábito de , antes de escrever seus romances, desenhar e pintar, sobre papelão, as personagens principais mantendo-as em sua mesa de trabalho, enquanto escrevia).

A morte do pai, em 1878, obrigou-o a voltar a São Luís, para tomar conta da família. Ali começou a carreira de escritor, com a publicação, em 1879, do romance Uma lágrima de mulher, típico dramalhão romântico. Ajuda a lançar e colabora com o jornal anticlerical O Pensador, que defendia a abolição da escravatura, enquanto os padres mostravam-se contrários a ela. Em 1881, Aluísio lança O mulato, romance que causou escândalo entre a sociedade maranhense pela crua linguagem naturalista e pelo assunto tratado: o preconceito racial. O romance teve grande sucesso, foi bem recebido na Corte como exemplo de naturalismo, e Aluísio pôde retornar para o Rio de Janeiro, embarcando em 7 de setembro de 1881, decidido a ganhar a vida como escritor.

Quase todos os jornais da época tinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus romances. A princípio, eram obras menores, escritas apenas para garantir a sobrevivência. Depois, surgiu nova preocupação no universo de Aluísio: a observação e análise dos agrupamentos humanos, a degradação das casas de pensão e sua exploração pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação resultariam duas de suas melhores obras: Casa de pensão (1884) e O cortiço (1890). De 1882 a 1895 escreveu sem interrupção romances, contos e crônicas, além de peças de teatro em colaboração com Artur de Azevedo e Emílio Rouède.

Em 1895 ingressou na diplomacia. O primeiro posto foi em Vigo, na Espanha. Depois serviu no Japão, na Argentina, na Inglaterra e na Itália. Passara a viver em companhia de D. Pastora Luquez, de nacionalidade argentina, junto com os dois filhos, Pastor e Zulema, por ele adotados. Em 1910, foi nomeado cônsul de 1ª. classe, sendo removido para Assunção. Buenos Aires foi seu último posto. Ali faleceu, aos 56 anos. Foi enterrado naquela cidade. Seis anos depois, por uma iniciativa de Coelho Neto, a urna funerária de Aluísio Azevedo chegou a São Luís, onde o escritor foi sepultado.

Foi membro fundador da Academia Brasileira de Letras (Cadeira 4). Simpatizante da Escola Realista, pode ser considerado como o iniciador dessa corrente literária, no Brasil. Arguto observador social, soube descrever com elegância e exatidão os costumes do povo. Aos quarenta anos entrou para a carreira diplomática, servindo como cônsul do Brasil na Espanha, Inglaterra, Japão, Argentina e Itália. Seus romances são do tipo naturalista, tendo realizado o romance experimental.

"0 Mulato" explora a questão racial, embora isso não se coadunasse com os postulados do naturalismo. Sua obra mais expressiva é, sem dúvida, "0 Cortiço". Em "0 Cortiço" sobressaem com mais vigor e as qualidades excelentes de Aluísio Azevedo. É uma obra-prima de observação pormenorizada. 0 escritor revela a influência de Eça nos tipos mais caricaturais que apresenta; focaliza as aglomerações residenciais da ralé dos pobres do Rio, semelhantes às nossas favelas atuais.

Aluísio não criou tipos, pois, não se detinha a analisar as almas de seus personagens, nem enveredou pela psicologia Individual, mas limitou-se a lidar com as massas. Nesta obra, são freqüentes os diálogos e observa-se nela o relacionamento dos episódios. Condensou variados aspectos da sociedade da época: o português ambicioso, o fidalgo burguês, o negro, o mestiço, a luta pela vida num ambiente tipicamente brasileiro. Aluísio Azevedo pode ser chamado realista objetivo em busca da realidade externa. Escreveu, também, obras para o teatro e contos, mas é no romance que se destaca o verdadeiro narrador.

Da infância e adolescência no Maranhão, ficaram algumas influências , permanente na obra de Aluisio Azevedo:

A. A aproximação com o falar português , os arcaísmos e lusitanismos, freqüentes em O Mulato, O Cortiço, Casa de Pensão , etc., decorrem do fato de que o Maranhão era , na época , a mais portuguesa das províncias brasileiras, com fortes resíduos da colonização e permanente intercâmbio com Lisboa; além disso , os pais de Aluísio eram portugueses.
B. A crítica à hipocrisia da vida provinciana parece também decorrente do fato de que a sociedade conservadora de São Luís hostilizou duramente os pais de Alísio, que não eram casados e viviam juntos. Em O Mulato, Aluísio parece vingar-se de São Luís.
C. A técnica do pintor e do caricaturista que Aluísio desenvolveu, posto que sua primeira inclinação foi para as artes plásticas, reflete-se na capacidade de , através da escrita, "visualizar" rapidamente as personagens e cenas, captando, de imediato, seus traços mais exteriores. Se , por um lado, essa propensão para a caricatura faz as personagens de Aluísio bastante esquemáticas, reduzidas a "tipos" , sem profundidade psicológica, por outro, possibilitou ao autor movimentar em seus romances centenas de tipos, habilitando-o para o romance de coletividade de multidão.

Escreveu:
"Uma Lágrima de Mulher" (1880); "Memórias de um Condenado" , (1882); "Filomena Borges", (1884); "0 Homem", (1887); "0 Esqueleto", (em colaboração com Olavo Bilac) "A Mortalha de Alzira", (1894); "Livro de uma Sogra", (1895); "A Girândola de Amores" ou "O Mistério de Tijuca" (1900); "Condessa Vesper, (1901), etc.

Para o teatro produziu:
"Os Doidos", "Casa de Orates", "Flor de Lis", "Em Flagrante", "Caboclo", "Um Caso de Adultério", "Venenos que Curam" e "República".

Obras consideradas de maior valor literário: - "0 Mulato" (1881); "0 Cortiço" (1890) -, e principalmente "Casa de Pensão" (1894). Imensa foi a repercussão que este último livro obteve no seio da sociedade fluminense, devido ao desenlace ocorrido numa dessas casas de habitação coletiva.

Além disso, no romance se movem tipos de perfeito desenho ao natural, característica peculiar ao seu poderoso engenho retratista. Como jornalista redigiu o "Pensador".

Suas obras têm ocasionado as opiniões mais desencontradas da crítica especializada. Mas, o grande público continua lendo seus livros sempre com grande curiosidade.

Aluísio de Azevedo foi um observador dos costumes de sua época, procurando retratar a burguesia e estudando os seus tipos, como o mau sacerdote, a mulher histérica, o preconceito de cor na figura do mulato. Seu romance não é psicológico; caricatura as pessoas, as coisas e as cenas.

"0 Cortiço", "0 Mulato" e "Casa de Pensão" são os seus romances mais significativos, bastante o primeiro deles para lhe assegurar o título de principal representante do Naturalismo em nosso país.

Fontes:
http://www.sitedoescritor.com.br/
http://www.academia.org.br/

Aluísio de Azevedo (O Cortiço)

Resumo

João Romão, português, bronco e ambicioso, ajuntando dinheiro a poder de penosos sacrifícios, compra pequeno estabelecimento comercial no subúrbio da cidade (Rio de Janeiro). Ao lado morava uma preta, escrava fugida, trabalhadeira, que possuía uma quitanda e umas economias. Os dois amaziam-se, passando a escrava a trabalhar como burro de carga para João Romão.

Com o dinheiro de Bertoloza (assim se chamava a ex-escrava), o português compra algumas braças de terra e alarga sua propriedade. Para agradar a Bertoleza, forja uma falsa carta de alforria. Com o decorrer do tempo, João Romão compra mais terras e nelas constrói três casinhas que imediatamente aluga. O negócio dá certo o novos cubículos se vão amontoando na propriedade do português. A procura de habitação é enorme, e João Romão, ganancioso, acaba construindo vasto e movimentado cortiço.

Ao lado vem morar outro português, mas de classe elevada, com certos ares de pessoa importante, o Senhor Miranda, cuja mulher leva vida irregular. Miranda não se dá com João Romão, nem vê com bons olhos o cortiço perto de sua casa. No cortiço moram os mais variados tipos: brancos, pretos, mulatos, lavadeiras, malandros, assassinos, vadios, benzedeiras etc. Entre outros: a Machona, lavadeira gritalhona, "cujos filhos não se pareciam uns com os outros"; Alexandre, mulato pernóstico; Pombinha, moça franzina que se desencaminha por influência das más companhias; Rita Baiana, mulata faceira que andava amigada na ocasião com Firmo, malandro valentão; Jerônimo e sua mulher, e outros mais. João Romão tem agora uma pedreira que lhe dá muito dinheiro.

No cortiço há festas com certa freqüência, destacando-se nelas Rita Baiana como dançarina provocante e sensual, o que faz Jerônimo perder a cabeça. Enciumado, Firmo acaba brigando com Jerônimo e, hábil na capoeira, abre a barriga dó rival com a navalha e foge. Naquela mesma rua, outro cortiço se forma. Os moradores do cortiço de João Romão chamam-no de "Cabeça-de-gato"; como revide, recebem o apelido de "Carapicus". Firmo passara a morar no "Cabeça-de-Gato", onde se torna chefe dos malandros. Jerônimo, que havia sido internado em um hospital após a briga com Firmo, arma uma emboscada traiçoeira para o malandro e o mata a pauladas, fugindo em seguida com Rita Baiana, abandonando a mulher.

Querendo vingar a morte de Firmo, os moradores do "Cabeça-de-gato" travam séria briga com os "Carapicus". Um incêndio, porém, em vários barracos do cortiço de João Romão põe fim à briga coletiva. O português, agora endinheirado, reconstrói o cortiço, dando-lhe nova feição e pretende realizar um objetivo que há tempos vinha alimentando: casar-se com uma mulher "de fina educação", legitimamente. Lança os olhos em Zulmira, filha do Miranda. Botelho, um velho parasita que reside com a família do Miranda e de grande influência junto deste, aplaina o caminho para João Romão, mediante o pagamento de vinte contos de réis. E em breve os dois patrícios, por interesse, se tornam amigos e o casamento é coisa certa. Só há uma dificuldade: Bertoleza. João Romão arranja um piano para livrar- se dela: manda um aviso aos antigos proprietários da escrava, denunciando-lhe o paradeiro. Pouco tempo depois, surge a polícia na casa de João Romão para levar Bertoleza aos seus antigos senhores. A escrava compreende o destino que lhe estava reservado, suicida-se, cortando o ventre com a mesma faca com que estava limpando o peixe para a refeição de João Romão.

Observações Importantes e Textos

O ROMANCE SOCIAL
"Desistindo de montar um enredo em função de pessoas, Aluísio atinou com a fórmula que se ajustava ao seu talento: ateve-se à seqüência de descrições muito precisas, onde cenas coletivas e tipos psicologicamente primários fazem, no conjunto, do cortiço a personagem mais convincente do nosso romance naturalista." (Alfredo Bosi).

Todas as existências se entrelaçam e repercutem umas nas outras. O Cortiço é o núcleo gerador de tudo e foi feito à imagem de seu proprietário, cresce, se desenvolve e se transforma com João Romão.

A CRÍTICA DO CAPITALISMO SELVAGEM
O tema é a ambição e a exploração do homem pelo próprio homem. De um lado João Romão que aspira à riqueza e Miranda, já rico, que aspira à nobreza. Do outro, a gentalha", caracterizada como um conjunto de animais, movidos pelo instinto e pela fome.

"E naquela terra encharcada o fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a fervilhar, a crescer um mundo, uma coisa viva, uma geração que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro e multiplicar-se como larvas no esterco. "

"As corridas até a vende reproduziam-se num verminar de formigueiro assanhado."

"Daí a pouco, em volta das bicas era um zunzum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. "

A redução das criaturas ao nível animal (zoomorfização) é característica do Naturalismo e revela a influência das teorias da Biologia do Século XIX (darwinismo, lamarquismo) e do determinismo (raça, meio, momento).

".. depois de correr meia légua, puxando uma carga superior às suas forças, caiu morto na rua, ao lado de carroça, estrompado como uma besta.
'Leandra... a ‘Machona’, portuguesa feroz, berradora, pulsos cabeludos e grossos, anca de animal do campo

"Rita Baiana... uma cadela no cio".

A FORÇA DO SEXO

O sexo é, em O Cortiço, força mais degradante que a ambição e a cobiça. A supervalorização do sexo, típica do determinismo biológico, e do naturalismo, conduz Aluísio a buscar quase todas as formas de patologia sexual, desde o "acanalhamento" das relações matrimoniais, adultério, prostituição, lesbianismo, etc. Observe esta, descrição de Rita Baiana, e do fascínio que exercia sobre o português Jerônimo:

"Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui. ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas de fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas brasileiras, era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e era o açúcar gostoso, era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o seu azeite de fogo; e/a era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, e muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras, embambecidas pela saudade de terra, picando-lhe as artérias, para lhe cuspir dentro da sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbam em tomo da Rita Baiana o espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca."

OS TIPOS HUMANOS

João Romão

"E seu tipo baixote, socado, de cabelos à escovinha, a barba sempre por fazer, ia o vinha de pedreira para a venda, de vende As hortas é ao capinzal, sempre em mangas de camisa, tamancos, sem meras, olhando para todos os lados, com o seu eterno ar de cobiça, apoderando-se, com os olhos, de tudo aquilo de que ele não podia apoderar-se logo com as unhas".

".. possuindo-se de tal delírio de enriquecer, que afrontava resignado as mais duras privações. Dormia sobre o balcão da própria venda, em cima de uma esteira, fazendo travesseiro de um saco de estepe cheio de palha".

Albino

"Fechava a fila das primeiras lavadeiras, o Albino, um sujeito afeminado, fraco, cor de aspargo cozido e com um cabelinho castanho, deslavado e pobre, que lhe caía, numa só linha, até o pescocinho mole e tino. "

Botelho

"Era um pobre-diabo caminhando para os setenta anos, antipático, cabelo branco, curto e duro como escova, barba e bigode do mesmo teor, muito macilento, com uns óculos redondos que lhe aumentavam o tamanho de pupila e davam-lhe à cara uma expressão de abutre, perfeitamente de acordo com o seu nariz adunco e com a sua boca sem lábios: viam-lhe ainda todos os dentes, mas, tão gastos, que pareciam limados até ao meio ... foi lhe escapando tudo por entre as suas garras de ave de rapina ".

Você tem nestes trechos excelentes exemplos de descrição realista e objetiva.

A SITUAÇÃO DA MULHER


As mulheres são reduzidas a três condições: primeira, de objeto, usadas e aviltadas pelo homem: Bertoloza e Piedade; segunda, de objeto e sujeito, simultaneamente: Rita Baiana; terceira, de sujeito, são as que se independem do homem, prostituindo-se: Leonie e Pombinha.

O DESFECHO DO ROMANCE

Delatada por João Romão, os antigos donos de Bertoleza diligenciam para capturar a escrava fugida. Procurada pelos policiais, a negra se suicida.

Observe o exagero da cena, e a ironia do desfecho.

"A negra, imóvel, cercada de escamas e tripas de peixe, com uma das mãos espalmada no chão e com a outra segurando a faca de cozinha, olhou aterrada para eles, sem pestanejar.
Os policiais, vendo que ela se não despachava, desembainharam os sabres. Bertoleza então, erguendo-se com ímpeto de anta bravia, recuou de um salto, e entes que alguém conseguisse alcançá-la, já de um só golpe certeiro e fundo rasgara o ventre de lado a lodo.
E depois emborcou para a frente, rungindo e esfocinhando moribunda numa lameira de sangue.
João Romão fugira até o canto mais escuro do armazém, tapando o rosto com os mãos.
Nesse momento parava à porta da rua uma carruagem. Era uma comissão de abolicionistas que vinha, de casaca, trazer-lhe respeitosamente o diploma de sócio benemérito."


Fonte:
Guimarães, Débora Miura (seleção). E-learning 6 (CD-Rom) São Paulo: Digerati

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Machado de Assis (O Enfermeiro)

O Enfermeiro é um conto redigido em primeira pessoa, muito humano, porém com um toque de ironia típica machadiana e se da inicialmente como trecho de um diálogo com alguém que não se manifesta no livro, mas que deseja que o narrador redija um episódio de sua vida a ser publicado. O narrador deixa bem claro que nada deve ser divulgado antes de sua morte.

Ele se despede e pede para que o leitor o queira bem, embora seus atos passados não tenham sido gloriosos, longe disso. Abrindo um despertar de curiosidade no leitor, que agora anseia por saber o que se passou com a vida do sujeito, que pede para que o perdoem “o que lhe parecer mal” e que “não maltrate muito a arruda, se lhe não cheira a rosas”.

Procópio, o narrador, então começa a contar o episódio de 1860. Aos seus 42 anos formou-se em teologia e a pedido de um vigário, sem titubear, foi servir de enfermeiro ao Coronel Felisberto mediante um bom ordenado. Porém ao chegar na vila descobriu que esse coronel não era uma pessoa nada fácil de lidar, muito pelo contrário, teve péssimas referências a respeito dele, o que deixa o leitor mais curioso ainda pelo o que está por vir.

Porém o velho não lhe recebeu mal, embora seu jeito grosseiro ficasse muito evidente, “acontece que vivemos uma lua de mel de sete dias”. Após essa semana Procópio começou a sofrer como cão nas mãos do velho coronel doente, não dormia, não comia, apenas escutava suas lamúrias e impertinências da moléstia. Procópio decidiu que iria embora e diria ao velho na próxima oportunidade. Assim, três bengaladas na cabeça e ele se demitiu, porém o coronel foi ter com ele e lhe pediu que não o deixasse, “estou na dependura, Procópio”, e acabou ficando.

Foi passando o tempo e apenas as bengaladas melhoraram, pois o resto ia de mal a pior, os insultos, as injúrias. Tentou sair novamente, mas acabou ficando a pedido do vigário. Mesmo assim não havia acabado a vontade de ir embora e também, havia guardado um bom dinheiro e queria gastá-lo.

“Já por esse tempo, havia eu perdido a escassa dose de piedade que me fazia esquecer os excessos do doente; trazia dentro de mim um fermento de ódio e aversão”.
Decidiu então, que em um mês sairia de lá, não importando o estado em que o coronel se encontrasse.

Na noite de vinte e quatro de agosto, o coronel teve um acesso de raiva, ameaçou-o de tiro e atirou-lhe um prato de mingau. Após esse episódio o velho foi se deitar e Procópio ao ler um livro, adormeceu ao lado.

“Acordei aos gritos do coronel (...) e acabou por lançar mão da moringa e arremessá-la contra mim. Não tive tempo de desviar-me e a moringa bateu-me na face esquerda, e tal foi à dor que não vi mais nada; atirei-me ao doente, pus-lhe as mãos ao pescoço, lutamos e esganei-o”.

Procópio ficou atordoado e começou a ouvir vozes. “Senti-me com o crime nas costas e vi a punição certa”. Abotoou a camisa do coronel e foi dar a notícia de que o homem tinha morrido.

Fonte:
http://pt.shvoong.com

Ligia Simoneli (A influência da imigração italiana na Literatura Brasileira)

O objetivo principal desta comunicação é levantar a questão de como a imigração italiana é tratada na Literatura Brasileira e sua respectiva influência, baseando o estudo da temática nas obras: Brás, Bexiga e Barra Funda, de António de Alcântara Machado. O Quatrilho, de José Clemente Pozenato e Anarquistas, Graças a Deus de Zélia Gattai.

Primeiramente, é imprescindível um esclarecimento do contexto histórico durante a imigração no Brasil e suas causas, com maior enfoque à imigração italiana nas regiões de maior influência, onde as obras citadas foram ambientadas. Partindo das causas da imigração e posteriormente para a imigração italiana no estado de São Paulo e Rio Grande do Sul.

Durante o século XIX o Brasil tem um período de grande expansão cafeeira no Sudeste, pelo grande consumo dos E.U.A. e Europa e com a crise dos produtores asiáticos os preços mantêm-se em alta. Em 1850, D. Pedro II proíbe o tráfico africano, e, em 1888 a princesa Isabel cede as pressões inglesas e assina a abolição. A solução encontrada é a atração de imigrantes estrangeiros, com o apoio oficial. (Almanaque Abril: 1998, 34).

Além da preocupação de obter mão-de-obra existia o interesse de povoar o sul do Brasil, evitando o risco de alguma invasão, atrair população branca oprimindo os negros e mestiços que eram obrigados a concorrer com os trabalhadores imigrantes em regime de parceria, recebendo por produção ou como assalariados. (Almanaque Abril: 1998, 92).

No século XX, países como Alemanha e Itália, em pleno desenvolvimento do capitalismo, geravam um excedente populacional sem terra e sem trabalho, provocando uma tensão social. A emergência da indústria e desarticulação do trabalho industrial contribuíram para a expulsão da população, juntamente com o processo de unificação de alguns países, conflitos civis aumentavam o número de camponeses arruinados. Através de propagandas de incentivo à imigração milhares de imigrantes foram atraídos para o Brasil, enfrentando viagens marítimas em porões de navios cargueiros, encontraram uma realidade muito diferente no país de destino. Os imigrantes italianos chegaram ao Brasil com pequenas quotas em 1836, 1847, 1852 e 1853, crescendo expressivamente a partir de 1877, tornando-se o segundo principal contingente estrangeiro, depois dos portugueses (Diégues Júnior: 1972, 107). Alguns rumam para lavouras de café em São Paulo, com o intuito de tornarem-se independentes ou, na maioria das vezes, irem para a cidade para trabalhar em indústrias. No Rio Grande do Sul, os imigrantes italianos chegaram a partir de 1875, em situação de desvantagem perante a imigração alemã, que chegaram 50 anos antes (Pesavento: 1985, 50).

Nas primeiras décadas do século XX, com a consolidação da República de inspiração positivista o Brasil revezava paulistas e mineiros no poder com a política café-com-leite. Neste início de século, ao lado dos imigrantes espanhóis, os italianos tem grande influência nos grupos anarco-sindicalistas nas áreas industriais de São Paulo e Rio Grande do Sul, participando na massa operária, a frente de greves sangrentas reinvidicando seus direitos e mais tarde obtendo a Legislação Trabalhista, esta influência é enfraquecida com a presença de grupos menos reinvidicadores e a repressão política, que culmina com a proibição da entrada dos imigrantes em 1932 (Bastilde: 1973, 201-2) e (Pesavento: 1985, 80-2).

A etnologia brasileira sempre centrada no estudo do índio, no início deste século também dirige suas atenções ao elemento branco, principalmente os grupos entrados com a imigração e a existência ou não de assimilação por determinado grupo em outro (Diégues Júnior: 1972, 14-24), passando para o campo literário, durante o período Romântico o índio é a grande fonte de inspiração como forma de acentuar o nacionalismo, já no Realismo as atenções são voltadas para os problemas político-sociais e grupos marginalizados, como o negro, mas é apenas no pré-modernismo que o tema da imigração é tratado com Graça Aranha em Canaã, retratando as primeiras experiências da imigração alemã no estado do Espírito Santo, através de dois personagens centrais, Milkau o imigrante que acredita na “Canaã” e Lentz voltado para a superioridade de sua raça sem adaptar-se a realidade brasileira. Segundo Alfredo Bosi:

“(...) E o contraste entre o racismo e o universalismo, entre a “lei da força” e a “lei do amor” que polariza ideologicamente, em Canaã, as atitudes do imigrante europeu diante da sua nova morada." (in Nicola: 1998, 265).

Brás, Bexiga e Barra Funda.

Em 1927, o cronista e contista António de Alcântara Machado, com a publicação desta obra composta por onze contos, trata do tema da imigração italiana e a primeira geração de ítalo-brasileiros em ascensão na capital paulista. Aristocrata e de família tradicional paulista, mesmo não participando da Semana de Arte Moderna de 1922, este escritor da primeira geração moderna sob seu estilo impressionista, irônico, utilizando uma linguagem “macarrônica” mistura do português com o italiano, baseado nas crônicas de Juó Bananére retratando a comédia diária e os dramas dos imigrantes italianos dos três bairros – título, transmite a “xenofobia” das famílias tradicionais paulistas perante os imigrantes italianos na década de 20 modificando a paisagem e trazendo seus costumes, buscando a ascensão social, mesmo com a procura de neutralidade expressa no Artigo de fundo:

“(...) Este livro não nasceu livro: nasceu jornal. Estes contos não nasceram contos: nasceram notícias. E este prefácio portanto também não nasceu prefácio: nasceu artigo de fundo” (Alcântara Machado: 1997, 27).

A ascensão social do imigrante é retratada nos contos: A sociedade, Armazém progresso. A busca de assimilação da cultura brasileira pelo imigrante, em: Nacionalidade e Tiro de guerra nº. 35. A família numerosa e miserável, em Lisetta. É a primeira vez em nossa literatura, que a imigração italiana é tratada, mesmo sobre o ponto de vista de um aristocrata brasileiro da época, de uma forma caricatural, como fizera em suas crônicas Juó Bananére (Alexandre Ribeiro Marcondes Machado) da luta, dos costumes destes imigrantes, transmitindo a reação das famílias tradicionais brasileiras perante a imigração italiana.

Anarquistas, Graças a Deus

Em 1979, a escritora ítalo-brasileira publica esta obra em que faz uma rememoração de episódios de sua infância e adolescência, agora o tema da imigração italiana é tratado sob a visão de uma filha de imigrantes italianos na capital paulista iniciando a narrativa em 1910. Baseada em fatos verídicos, a saga da família de seus pais nos transmite a imigração italiana e a realidade vivida pelos imigrantes, desde a saída do país de origem até sua estabilidade na capital, nos episódios: Seu Ernesto conta uma história, A Colônia Cecília, Dr. Giovanni C. Gárdias, Começo da viagem, Serviço de imigração e saúde, Bandeira Vermelha e Preta e Fim da Colônia Cecília retratam a propaganda de atração de imigrantes feita na Itália, as péssimas condições de viagem, a realidade brasileira sob a visão e realidade do imigrante estrangeiro. Já em suas narrações Zélia Gattai retrata a primeira geração de ítalo-brasileiros surgindo à procura de ascensão social e busca de assimilação da cultura brasileira como são evidentes nos episódios que envolvem discussões entre Wanda e Ernesto sobre o quadro anarquista, Angelina e suas filhas que criticam os costumes e a linguagem da mãe. As lutas anarquistas e socialistas e as repressões políticas que os imigrantes sofriam são retratadas nos episódios: Vizinhança Nova e estado novo, imigração italiana, as classes laboriosas, conde Fróla. A confusão de identidade nacional é presente nas falas de Angelina, uma mistura de porturês com dialeto da região italiana de onde sua família provinha.

A escritora faz um paralelo entre a saga de imigrantes italianos, sua chegada no Brasil no século XIX e a primeira geração de ítalo-brasileiros em São Paulo no início da industrialização, sob uma visão realista de uma filha de imigrantes mostrando a imigração e a realidade encontrada pelos imigrantes.

O Quatrilho

Em 1985, o escritor ítalo-brasileiro José Clemente Pozenato publica este romance com a trama principal o desvario amoroso de dois casais jovens de imigrantes italianos, mostrando a vida rude, difícil e o poder da religião sobre os imigrantes no ambiente rural.

A história se passa em Caxias do Sul – RS no período de 1908 à 1930. Na colônia de Santa Corona, Angelo Gardoine casa com Teresa, prima de Pierina, casada com Massimo Boschini. Em serões na casa de parentes Teresa e Massimo se apaixonam. Com o nascimento de Rosa (filha de Angelo e Teresa) Angelo volta a colônia e propõe sociedade à Massimo na compra de uma propriedade em San Giuseppe, mesmo com o preço exorbitante fazem negócio com Batiston. Os dois casais passam a morar na única casa, enquanto Massimo constrói o moinho, Angelo é responsável pela lavoura. Massimo e Teresa tornam-se amantes e três meses depois fogem com Rosa. Pierina permanece com seus dois filhos e Angelo na casa, dispostos a continuar os negócios, com o tempo o casal passa a viverm em concubinato. Pierina grávida é o alvo dos preconceitos moralistas de Padre Gentile, com o desentendimento com Angelo, Gentile manipula os habitantes da colônia para ignorar o casal e seus negócios, levando Angelo a continuar trabalhando em outras cidades. Pierina enfrenta Padre Gentile durante uma missa. Passados vinte anos o mesmo padre aparece na casa do casal, agora com nove filhos e situação abastada, “redimindo-se” de seus preconceitos. Teresa envia uma carta à padre Giobbe e sua mãe com sua fotografia com Massimo e seus três filhos, em São Paulo.

Importante observar nesta obra, a reafirmação das raízes da colonização italiana no Rio Grande do Sul feita pelo escritor, procurando retratar a realidade sofrida pelo imigrante italiano no Brasil e no ambiente rural, sob a visão do imigrante. Nas reflexões de Angelo, relata a fuga do imigrante de seu país de origem e situação de miséria, e chegada em um país ainda “jovem”. Nesta obra, a linguagem também é recheada de expressões em dialeto vêneto e não em italiano oficial como faz António de Alcântara Machado na fala de seus personagens, considerando que entre a maioria dos imigrantes italianos predominavam o dialeto regional usado inclusive pelos analfabetos no país de origem. A dificuldade de aprender a nova língua encontrada pelo imigrante e o medo de assim ser trapaceados por negociantes brasileiros é mostrado no episódio que Angelo encontra dois fazendeiros brasileiros afirmando sua dificuldade de entendê-los em português (cap. 2 – Segunda Contagem) . A caracterização das personagens é muito interessante abrangendo temas sobre a religião, o casamento, a submissão da mulher, a repressão ideológica. Os padres Giobbe e Gentile demonstram a hipocrisia e o moralismo clerical. Giobbe é o imigrante que para fugir da miséria ingressou no seminário e questiona em suas reflexões o moralismo ensinado pela igreja e a realidade dos colonos. Gentile é o religioso hipócrita e manipulador. Angelo é o imigrante em busca de ascensão no meio rural. Pierina mulher rude, submissa alvo de preconceitos por viver em concubinato. Teresa é a mulher que não encontra amor no casamento mas na traição. Scariot o anarquista marginalizado que contesta a exploração e submissão dos colonos, a manipulação da Igreja.

Pozenato e Zélia Gattai representam a geração de ítalo-brasileiros em busca de suas raízes retratando com realismo o lado do imigrante italiano na imigração, sua saga, sofrimento fuga da miséria, sua contribuição dada ao novo país sem reduzir a história de um povo e sua imigração à sátira de seus costumes trazendo uma visão esteriotipada, ou como o enfoque norte-americano que traz obras transportadas ao cinema que pouco se trata da contribuição dos imigrantes italianos reduzindo a Comunidade italiana naquele país a máfia, caracterizando como um povo desprovido de valores éticos e morais, oprimido e marginalizando um povo e sua imigração.

Portanto, a influência da imigração italiana na Literatura Brasileira é caracterizada basicamente em dois momentos. O primeiro, marcado pela reação das famílias tradicionais brasileiras perante o imigrante italiano em seu processo de adaptação, sua dualidade de nacionalidade transformando a paisagem e a etnia brasileira nas primeiras décadas o século XX, retratada pela obra Brás, Bexiga e Barra Funda do contista António de Alcântara Machado sob uma visão caricatural de um aristocrata da época. O segundo é caracterizado pela nova geração de ítalo-brasileiros e seus descendentes em busca de suas raízes, identidade cultural mostrando a imigração sob a visão e vivência dos imigrantes italianos, sua história, sua saga, suas contribuições ao desenvolvimento do país em que se estabeleceu retratada pelos escritores ítalo-brasileiros José Clemente Pozenato em O Quatrilho e Zélia Gattai em Anarquistas, Graças a Deus, sem esquecer das repressões políticas e a marginalização feita pela aristocracia brasileira aos imigrantes, não muito diferente daquela sofrida pelos negros e índios no Brasil.

Fonte:
Extraído de
Ligia Simoneli
A influência da imigração italiana na Literatura Brasileira

Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão – FECILCAM
XIII Seminário do CELLIP (Centro de Estudos Linguísticos e Literários do Paraná) 21-23 out 1999 - Campo Mourão. Maringá: Depto.de Letras da UEM, 2000 (Org. Thomas Bonnici)
(CD-Rom)

P.S. Com o intuito de preservar os direitos autorais da autora, as referências bibliográficas foram propositalmente retiradas, o que não afeta em hipótese alguma a veracidade e importância do documento.

Gercina Isaura da Costa Bezerra (Considerações sobre o Material de Leitura)

A leitura enquanto exercício da cidadania exige um leitor crítico que, além de construir a significação global do texto, seja capaz de transpor os limites do texto incorporando-o reflexivamente aos seus conhecimentos para melhor compreender a realidade que o cerca. Uma sociedade realmente democrática, preocupada com a superação das diferenças sociais, certamente estaria comprometida com a formação desse leitor. Mas essa responsabilidade tem cabido à escola, como se ela sozinha fosse capaz de executar essa tarefa. O mais grave é que dentro do espaço escolar, o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita parece caber apenas ao professor de língua materna. Não é raro a cobrança da proficiência dos alunos nessas habilidades por parte dos professores das demais disciplinas. São também inúmeros os estudos e as análises dos textos veiculados nas aulas de língua portuguesa. Exagerando, temos a impressão de que as atividades de leitura e escrita só acontecem nas aulas de língua materna. Certamente isso não é verdade. Temos conhecimento de análise de textos didáticos das demais disciplinas, mas ao que parece, a grosso modo, essas análises estão voltadas para a adequação das definições e conceitos, bem como para as ideologias e preconceitos presentes nos textos.

Nossa prática tem nos mostrado, que o desconhecimento dos processos de leitura pelos professores de outras disciplinas, os leva a selecionar textos que dificultam a compreensão dos alunos, levando-os a decorar conceitos sem entendê-los.

Assim, esse trabalho objetiva demonstrar que a escolha inadequada do material de leitura pode comprometer sua compreensão. Devido ao reduzido espaço, selecionamos apenas o capítulo 6 do livro “Os seres vivos” para exemplificar algumas dessas inadequações. A razão de tal escolha deveu-se ao fato de ser um texto tradicionalmente adotado na sexta série e a dificuldade que os alunos apresentaram para compreendê-lo.

O título do capítulo é “A biodiversidade da terra”, a expectativa despertada seria para um texto que tratasse da variedade de formas de vida do planeta, bem como de seus habitats, comunidades e ecossistemas formados pelos organismos. Além disso, seria possível incluir considerações sobre seu potencial econômico e sua importância social, cultural, ecológica etc. Mas o capítulo trata mesmo é da classificação dos seres vivos, que na diagramação do texto aparece como um subitem. Assim, se o leitor iniciante (Nesse texto denominamos leitor iniciante aquele indivíduo que ainda está desenvolvendo suas estratégias de leitura. Ao leitor que ainda não é proficiente) tiver um idéia do que seja biodiversidade terá sua expectativa de leitura fustrada, por outro lado, se desconhecer a palavra acabará por associá-la a classificação dos seres, podemos afirmar que o título se constitui numa pista falsa para a compreensão do texto.

Textos mais longos têm além do tópico principal, outros subtópicos de unidades menores como o parágrafo. O tópico e os subtópicos constituem uma estrutura em que uns se subordinam aos outros, todo esse sistema deve ser facilmente percebido pelo leitor, pois a percepção da relação e da hierarquia que se estabelece entre eles é um componente essencial da compreensão textual. No texto analisado falta uma explicitação geral e objetiva dessa hierarquia, a presença excessiva de figuras, títulos e itens entrecortando o texto, prejudica o seu fluxo e dificulta a percepção do mesmo como um texto único, uma vez que sua articulação encontra-se fragmentada. Um exemplo disso é o trecho em que os autores explicam o que é gênero e como vários gêneros constituem uma família temos a intercalação de um subtópico com sete parágrafos, e que se constitui numa informação secundária (“O nome científico dos seres vivos é escrito em latim”) que poderia estar diluída no corpo do texto sem desviar a atenção do leitor do seu assunto principal. Por isso não fica claro para o leitor que a classificação é feita a partir de sucessivos agrupamentos até formar um conjunto maior, segundo o critério de características semelhantes. Esses são apenas alguns exemplos das inadequações que encontramos no texto.

Há professores que, desconhecendo os processos de desenvolvimento da leitura e seus mecanismos, esperam do aluno do segundo ciclo uma eficiência leitora que ainda está em processo. Ler é mais que decifrar, a decodificação é apenas um primeiro estágio da leitura eficiente. Não se pode alcançar a um comportamento praticando um hábito contrário a ele. Decifrar obriga a ter um comportamento diante da escrita que é o oposto daquele indispensável para um bom leitor. A escrita é uma linguagem para os olhos e não para os ouvidos; ler não é traduzir o escrito em oral para chegar a compreensão. A capacidade de compreender supõe a possibilidade de antecipar, no caso da leitura, a decifração impede a antecipação, ou a dificulta, no melhor dos casos.

A leitura consiste numa busca de índices mínimos e não na investigação total dos signos escritos. Um bom leitor compreende um texto em um tempo mínimo, sem se preocupar com cada uma das palavras do texto. Isso porque o sentido de uma frase não é a soma dos sentidos das palavras que a compõe, mas é determinado pelo texto e pelo contexto, nos quais estão inseridas. Da mesma forma que, a percepção isolada dos elementos que compõe uma paisagem impedem a visão global da mesma, a decifração não leva a compreensão do texto porque não se concentra na percepção do todo.

Essa percepção não se restringe ao registro passivo de estímulos exteriores, mas resulta de uma reorganização da estrutura do conhecimento, diante de um novo estímulo. Assim, a percepção é uma aprendizagem que depende das experiências anteriores daquele que aprende, isso é importante a medida em que dirige nossa atenção para o papel das vivências do aprendiz e de suas experiências de vida.

Dessa forma, podemos dizer que a leitura resulta da interação entre as informações visuais que estão no texto, e as informações não visuais que se constituem das experiências anteriores armazenadas na memória do leitor.

Nesse sentido, o papel de todo professor, seja de que nível for, não se resume a transmitir conhecimento, seu papel é o de instrumentalizar o aluno de forma a dar-lhe condições de ampliar o seu entendimento da realidade que o cerca, tornando-o capaz de atuar nessa realidade. Sendo o texto principal fonte de veiculação do conhecimento, e instrumento de trabalho daqueles que ensinam, faz-se necessário que estejamos comprometidos com a formação desse leitor crítico, propiciando ao aluno condições para tal.

Ao selecionar ou ao produzir um texto para trabalhar com os alunos, o professor ou o autor do manual deve considerar que a compreensão de um texto não depende apenas da competência lingüística do aluno, mas também das condições que o texto oferece, a observação de alguns aspectos, na seleção do texto, podem contribuir para que o aluno desenvolva suas estratégias de leitura.

O texto é o elemento simples da comunicação escrita, pois é a sua organização de conjunto que, por si mesma, contém o significado; e a comunicação escrita diz respeito ao relacionamento intertextual. Assim, o leitor iniciante deve confrontar-se com textos completos, que funcionem como tal e que se remetam uns aos outros, pois sendo unidade mínima da escrita, é também a entrada mais fácil para o sentido ancorado no contexto no qual esse texto funciona.

Desde o início, deve-se apresentar textos significativos utilizados em situações concretas de comunicação, centrados nos interesses e necessidades daquele que aprende, enfim autênticos.

Muitas vezes, acreditando estar “facilitando” a aprendizagem, a maioria os manuais costumam utilizar uma linguagem artificial, tentando dar ao texto escrito características da linguagem oral. No texto analisado por exemplo, na página 46 encontramos:

“Aquilo que você fez com os animais representados no quadro, os cientistas fizeram com todos os seres vivos da natureza, mas usando outros critérios.”

Acontece que o aluno não fez absolutamente nada no referido quadro, porque já estava feito. Isso era necessário para se garantir o uso de critérios que atenderiam às intenções dos autores. Não há possibilidade de no texto escrito se estabelecer uma interação imediata, salvo no contexto da internet. O problema está no fato dos autores tentarem dar ao texto escrito características da linguagem oral, o que causa confusões com relação aos referenciais principalmente. Os parágrafos também são substituídos por itens, descaracterizando a estrutura do texto, havendo inclusive supressão de elementos coesivos que garantiriam uma legibilidade maior do texto. O uso da ilustração como bengala, pode até ser que em alguns casos auxilie na compreensão, mas no caso do texto analisado podemos afirmar que as imagens foram mal utilizadas. Essas inadequações, codificam um discurso artificial, perdido entre a linguagem oral e a linguagem escrita, não favorecendo ao aluno a utilização do seu conhecimento prévio, nem o auxilia no conhecimento sobre como ler.

Para facilitar a aprendizagem não é necessário descaracterizar o texto, pode-se alcançar essa “facilitação” por meio de uma seleção gradual e criteriosa, observando além da autenticidade e da relevância, a estrutura formal do texto.

É assim que, FULGÊNCIO et LIBERATO (1992: 37), apontam a identificação do tópico de um texto como indispensável para a compreensão do mesmo. O que as autoras definem como tópico discursivo é o assunto principal do texto, por isso afirmam que, a dificuldade de identificar o tópico de um texto compromete a sua legibilidade. Isso acontece porque é essa identificação que estabelece o quadro de referência, a partir do qual o leitor passa a criar expectativas que guiam a sua interpretação, auxiliando-o inclusive a desfazer possíveis ambigüidades. As autoras acreditam que o aparecimento do tópico na primeira sentença, ou ainda, a referência reiterada a um mesmo elemento, podem facilitar a identificação de tópicos. De acordo com as autoras,

“os lingüistas têm chamado atenção para a estrita correlação - (...) - entre ser tópico e ocupar uma posição inicial. Essa correlação parece natural: é de se esperar que a ordem das palavras enunciadas reflita a ordem em que seus correspondentes psicológicos (seus referentes) se organizam no processo cognitivo.” (FULGÊNCIO et LIBERATO, 1992: 29).

Elas também demonstram por meio de exemplos, que a má sinalização ou a representação inadequada do tópico compromete a legibilidade dos textos. Assim, aquele que escreve ou seleciona material de leitura para o leitor-aprendiz, deve preocupar-se em oferecer textos nos quais a identificação do tópico não se constitua numa dificuldade.

Para as autoras, um outro aspecto importante da organização textual é a paragrafação. Baseando-se nas teorias de REHFELD, consideram que a divisão do texto em parágrafos funciona para o leitor como uma pista sinalizadora da estruturação do texto; pois “o leitor desenvolve uma estratégia de processamento que o leva a prever, nos pontos onde há mudança de parágrafo,(...), uma quebra na uniformidade de um bloco de texto, e o início conseqüentemente de uma nova unidade.”(Id. ibid., p.56).

A compreensão do texto é facilitada à medida em que a divisão dos parágrafos corresponda às expectativas do leitor e vá de encontro às suas estratégias de leitura. Dessa forma, a organização dos parágrafos deve funcionar como um elemento que revela a estruturação semântica, formal e discursiva do texto, evidenciando as unidades em torno das quais se organiza.

A teoria da paragrafação pode parecer, a princípio, que não atinja diretamente o leitor iniciante, mas apresenta implicações importantes com relação a aprendizagem da estratégia da paragrafação. Pois, se uma paragrafação adequada facilita a leitura no caso de leitores eficientes, por outro lado, ela possibilita ao leitor inexperiente a dedução das bases da organização dos parágrafos, levando-o a internalizar essa estratégia. Assim, uma forma de levar o aluno a adquiri-la, é colocá-lo em contato com textos que apresentem uma divisão de parágrafos que reflita a estruturação semântica, formal e discursiva do texto, de modo que evidencie as unidades em torno das quais é constituído.

Além desses aspectos, FULGÊNCIO et LIBERATO, apoiadas nos estudos de CHAFE, chamam atenção para a necessidade de se oferecer ao leitor iniciante, textos que possuam um equilíbrio entre informações dadas e novas. As autoras consideram informação dada, àquela que o emissor presume que esteja presente na mente do receptor no momento da comunicação; e informação nova, àquela que o emissor presume que está introduzindo na mente do receptor no momento da comunicação. O equilíbrio entre esses dois elementos é que possibilita a progressão do texto, garantindo sua compreensibilidade. Um texto só com informações dadas torna-se redundante e circular, por outro lado, um texto só com informações novas também torna-se incompreensivo, pois o processo de compreensão depende de um conhecimento anterior para que as informações novas sejam processadas. É a progressão resultante do equilíbrio desses dois tipos de informação, que garante a coerência do texto, por isso o professor deve considerar esse aspecto ao selecionar ou ao produzir textos para seus alunos.

CONCLUSÃO:

A análise exaustiva do texto não foi nosso objetivo aqui, muito menos pretendemos esgotar todos os aspectos que podem auxiliar o leitor no desenvolvimento da compreensão. Foi nosso desejo despertar a atenção daqueles que ensinam para a importância de avaliar técnica e criticamente o material com o qual se está trabalhando, isso porque muitas vezes é esse fator que está dificultando a aprendizagem de nossos alunos. Para melhor auxiliar nossos alunos a desenvolver suas estratégias de leitura, é necessário que àquele que o orienta tenha conhecimento e reflita sobre as condições necessárias para promover este processo. Uma consideração importante e que pode fazer diferença é a sensibilidade do professor com relação ao conhecimento prévio e interesses dos alunos, a maneira utilizada para envolvê-los no planejamento e seleção do material de leitura, considerando o grau de motivação desses.

Relacionamos aqui, alguns itens que consideramos importantes para facilitar a legibilidade do texto:

- Os professores devem propiciar condições para que o aluno desenvolva estratégias de leitura que viabilizem a compreensão textual;

- Deve-se elaborar materiais de leitura que facilitem a aquisição de estratégias por parte dos alunos, enfatizando as pistas fornecidas pelo texto de forma relevante;

- Os educadores devem levar em consideração o conhecimento prévio dos alunos, a partir do qual se estabelece a formulação de hipóteses.

São inúmeras as sugestões que caberiam aqui no intuito de tornar nosso aluno um leitor mais proficiente. O importante é ter em mente que ler exige que haja interação entre autor/texto/leitor; no caso de haver deficiência em algum destes elementos, a compreensão textual não se efetuará.

Enfim, foi nossa principal intenção neste artigo chamar a atenção para o fato de que quando o material de leitura oferece pistas inadequadas ou ineficientes seu entendimento estará comprometido.

Fonte:
Gercina Isaura da Costa Bezerra (Mestrado UNESP)
Considerações sobre o Material de Leitura

XIII Seminário do CELLIP (Centro de Estudos Linguísticos e Literários do Paranpa) 21-23 out 1999 - Campo Mourão . Maringá: Depto. de Letras da UEM, 2000 - Org. Thomas Bonnici (CD-Rom)

P.S. Com o intuito de preservar os direitos autorais da autora, as referências bibliográficas foram propositalmente retiradas, o que não afeta em hipótese alguma a veracidade e importância do documento.

Margarida da Silveira Corsi (Do Romance ao Palco, do Palco ao Romance: uma reflexão a ser feita)

Este trabalho faz parte de nossa pesquisa de mestrado que trata da reversibilidade ocorrida nas obras de Alexandre Dumas Fils (La dame aux Camélias, do romance para peça) e de José de Alencar (da peça As asas de um anjo para o romance Lucíola), e é uma tentativa de conceituação da reversibilidade, prática bastante comum no século XIX.

Este problema, sempre nos veio à mente como uma difícil missão, pois, quando nos deparamos com a confecção de suas possíveis respostas, descobrimos a importância de alguns pré-requisitos para essa conceituação. Para afirmarmos exatamente o que é reversibilidade, precisamos saber, em primeiro lugar, quando ocorreu, que razões levaram os autores a praticá-la e qual é o seu contexto histórico-literário. Tendo em vista estes questionamentos, começaremos, então, por buscar tais dados na historiografia literária e por visualizar um período em que os autores europeus e brasileiros, buscando ganhar espaço no meio literário, dividiam-se entre mais de um gênero; prática que, acreditamos, ter dado origem à reversibilidade.

Durante o século XIX, essa prática dos autores dividirem suas atividades criadoras entre gêneros literários diferentes, trabalhando em princípio com aquele que lhes assegurasse um sucesso ou reconhecimento imediato, para em seguida dedicar-se àquele ao qual direcionavam seu talento e preferência, tornou-se comum durante o período de ascensão do teatro e da prosa ficcional, na França. Assim, muitos autores que se destacaram na historiografia literária com o cultivo de um gênero literário específico, começaram suas carreiras com outro ou dividindo seu tempo entre dois gêneros literários diferentes.

No Brasil, essa divisão de talento entre dois gêneros é tão comum quanto na França, no entanto, a primeira opção dos autores brasileiros é pela produção dramatúrgica o que se dá em função da rápida ascensão que o teatro podia lhes proporcionar e de um espírito renovador que intuía a recriação da dramaturgia nacional.

Esse interesse dos autores brasileiros pelo teatro intensificou-se ainda mais após de 1855 com a inauguração do Teatro Ginásio Dramático que, inspirado no Théâtre Gymnase Dramatique de Paris, inovara o teatro brasileiro, dando um grande salto para o aprimoramento da nossa dramaturgia, introduzindo na corte o teatro realista francês que passaria a ser o estilo escolhido pelos grandes escritores do teatro nacional. É o que confirma João Roberto Faria ao dizer que “ A 12 de abril de 1855, no pequeno teatro de 256 lugares, rebatizado com o nome de Teatro Ginásio Dramático - inspirado certamente no Gymnase Dramatique de Paris -, a nova empresa inaugurou seus trabalhos, sem saber que dava o primeiro passo de uma importante renovação teatral, que logo se cristalizaria.” E acrescenta que “O Ginásio não só introduziu a nova escola francesa (realista) entre nós como despertou o interesse de uma jovem geração de intelectuais para o gênero dramático” Como podemos perceber através das palavras de João Roberto Faria, a abertura do Teatro Ginásio Dramático é um dos passos mais significativos para impulsionar uma vasta produção teatral no país e, por conseqüência para estimular nossos autores a produzirem para o teatro, sobretudo aqueles que se iniciavam na arte literária.

Nesse momento, muitos de nossos autores buscaram na dramaturgia uma maneira mais fácil e rápida para ascender-se no meio literário, por isso, muitos deles que preferiam a prosa de ficção ou a poesia trabalharam conjuntamente dois gêneros (dramaturgia e prosa ficcional). Dentre os autores brasileiros que buscavam sobressair como escritores, produzindo textos para o teatro, estão Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar e Machado de Assis, que foram atraídos pela possibilidade de destacar-se enquanto autor de uma comédia ou de uma tragédia encenada no teatro dramático do Rio de Janeiro. Essa atração dos escritores pelo texto teatral fez da arte dramática um dos gêneros prediletos do Romantismo brasileiro. Nesse período, era natural que “todo escritor, fosse qual fosse a sua vocação, tentasse adquirir no teatro o seu certificado de proficiência ficcional. Escrever romances era facultativo. Escrever peças praticamente obrigatório”.

Diferentemente dos autores brasileiros, os franceses tiveram desde o início a opção de escrever tanto para a dramaturgia quanto para a prosa de ficção, pois os dois gêneros estavam no auge de popularidade no contexto francês do início do século XIX, enquanto no Brasil o romance dava seus primeiros passos e o teatro buscava reerguer-se. Isso porque “a palavra romantismo, na França, aplica-se a toda uma época, mais exatamente, a todas as obras escritas dentro dela e que se inspiraram no espírito do século novo, traduzindo suas exigências” O Romantismo francês foi uma época de gênios e de obras-primas, nas artes da poesia, do romance e do teatro; portanto, uma época de vastas produções em todos os gêneros literários. Foi também um período de afirmação do valor literário, de mudanças progressivas na cultura, na sociedade e, por conseqüência, na dramaturgia e na prosa de ficção.

Assim, tanto a dramaturgia quanto a prosa ficcional eram sinônimo de trampolim para a conquista de um espaço na sociedade intelectual da França do século XIX. No entanto, houve épocas de predileção por um ou outro gênero. Durante o início do Romantismo, ou melhor num período que podemos chamar de pré-romantismo, era muito interessante para os literatos investirem na tragédia, a qual era muito incentivada pelo imperador. Depois do surgimento do drama romântico, o próprio público incentivou o cultivo de peças centradas na liberdade de expressão e na valorização dos conceitos burgueses. Entre 1840 e 1850, o folhetim perdurou como o gênero almejado por todo escritor. Entretanto, apesar da existência de momentos mais interessantes para um ou outro gênero, a dramaturgia e a prosa ficcional sempre foram gêneros bem estruturados na França e, por isso, eram sinônimo de grande expressão literária perante os autores renomados e aqueles que desejavam alcançar o sucesso por meio da literatura.

Data-se de 1827 (prefácio de Cromwell) e de 1830 (Hernani) a brutal irrupção do teatro romântico”. É, principalmente, nesse momento que a dramaturgia ganha novos rumos, pois o novo público, associado ao desejo de inovação dos gêneros literários, faz surgir uma nova forma de produção teatral, não mais centrada nos moldes clássicos, mas em busca de modernidade. Assim, “Os novos senhores do país freqüentavam o teatro: lacaios enriquecidos, fornecedores do exército, beneficiários da agiotagem ou da especulação sobre os bens nacionais, burgueses promovidos a altos cargos” os quais não apreciavam o teatro clássico, ao modelo de Corneille ou Racine, e davam mais atenção aos melodramas que pareciam mais convenientes para um público iletrado que desejava divertir-se.

Os dramas de Victor Hugo, Vigny e Alexandre Dumas Père, as tragédias de Delavigne e as comédias de Escribe marcaram um momento de evolução do teatro francês e predominaram durante um bom tempo nos teatros parisienses. As fases diferentes porque passou o teatro francês do início do século XIX testemunham a ascensão de muitos autores e de muitos estilos dramáticos. Foram a tragédia, o drama, as peças da école du bon sens, as comédias de costumes, o teatro de variedades, os vaudevilles e por fim o teatro realista, todos surgidos em decorrência de um desejo de inovação e de afirmação do talento de seus autores.

Paralelamente ao desenvolvimento da arte dramática, no início do século XIX, a prosa de ficção também sofreu transformações importantes para o seu aprimoramento enquanto forma literária. Popularizou-se através dos folhetins, a partir de 1840(É importante esclarecer que, segundo Marlyse Meyer, o folhetim surgiu em 1836, mas popularizou-se a partir de 1840), e ganhou novas formas com o romance social, o romance histórico, o romance negro. Depois de sua inserção nos periódicos, passa a ser uma das formas mais populares da representação literária francesa, levando aos periódicos escritores já renomados no teatro e também aqueles que buscavam alcançar a fama através das tiras fatiadas.

Mas, apesar da dupla possibilidade de produção que os autores franceses tiveram, os motivos que os levaram, no início de suas carreiras, à produção dramatúrgica não diferem daqueles dos autores brasileiros, pois ambos desejavam uma ascensão mais rápida e, como o teatro era uma maneira de o autor apresentar-se diretamente ao público, eles procuravam mostrar seus talentos nos palcos dos grandes teatros parisienses para depois partirem para a produção romanesca e, em, muitos casos, como o de Balzac e de Dumas Père, dirigirem-se depois de renomados para a publicação em folhetins que, além da glória, eram vantajosos financeiramente.

Assim, essa busca de afirmação e reconhecimento no meio literário fez grandes autores do contexto francês dividirem seu tempo de criação entre os dois gêneros literários mais reconhecidos e apreciados pelo público da época: dramaturgia e prosa de ficção. Victor Hugo (1802-1885), apesar de durante algum tempo de sua carreira ter se dedicado à poesia e de ter sido um grande poeta, dividiu grande parte de seu tempo de criação entre a dramaturgia e a prosa de ficcional.

E, de acordo com Jean Gaumier “o teatro projetava sua glória recente e o romance contribuía para desenvolvê-la entre o grande público” Alexandre Dumas Père (1802-1870) também iniciou sua carreira escrevendo mais de um tipo de texto, eram versos, comédias e dramas, e, depois de já ser reconhecido pelo pelo público, perferiu a prosa de ficção e passou a publicar em folhetins. É o que afirma Jean-François Josselin: “On connaît les mensurations impressionnantes de l’oeuvre de Dumas - plus gigantesque que celle de ses contemporains Balzac et Hugo: trois cents volumes au moins repartis entre le théâtre, le roman (surtout), les contes, les nouvelles, les traités, e bien sûr les memoires.” Honoré de Balzac (1799-1850), apesar de ser conhecido quase que exclusivamente como romancista, também começou sua carreira dividindo seu poder criador entre a dramaturgia e a prosa de ficção. Escreveu no início o drama Cromwell e o romance Sténie, mas, apesar de ter buscado o sucesso imediato no teatro, mostrou-se, desde o princípio mais propenso à prosa de ficção do que à dramaturgia, por isso sua passagem pelo teatro foi rápida e pouco fecunda em relação à sua produção romanesca. Alexandre Dumas Fils (1824-1895), seguindo os passos do pai, dividiu-se desde o princípio de sua carreira entre a dramaturgia e a prosa de ficção.

Em 1846, publicou Aventures des quatre femmes et d’un Perroquet e levou ao palco a peça Le bijou de la reine. Nos primeiros anos teve intensa produção de romance, sem nunca ter abandonado a dramaturgia. Mas foi somente a partir da encenação de La Dame aux Camélias que passou a dedicar-se mais às produções teatrais em detrimento da prosa de ficção. Sua obra compõe-se de 30 peças e 15 romances. A dedicação simultânea a esses dois gêneros fez com Dumas adaptasse seu texto escrito em princípio em prosa de ficção para o teatro. Composto e publicado em 1848, o romance La Dame aux Camélias obteve, desde o início, um grande sucesso com o público leitor e, depois de adaptado ao teatro, em 1852, foi aclamado pelo público parisiense, por sua inovação e pelo cunho realista que apresentavam suas cenas. Como vemos, essa experiência de Dumas foi positiva para o público e para a crítica que já haviam apreciado o romance e que terminaram por consagrar a peça como chef-d’oeuvre de um novo estilo dramatúrgico: o teatro realista francês.

Dentre os “romancistas-teatrólogos” ou “teatrólogos-romancistas” brasileiros, Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882) é quem mais obteve sucesso com a dramaturgia. Escreveu durante seu tempo de dedicação ao teatro 15 peças de teor e estilos variados, são comédias farsescas, dramas românticos, uma burleta, um drama sacro, uma comédia realista e um drama realista. A dedicação paralela entre o drama e o romance não impediu que o autor de Luxo e Vaidade e de A Moreninha fosse apreciado, durante o Romantismo, tanto por ser um autor iniciador da prosa de ficção no Brasil quanto por seu bom desempenho na dramaturgia. Machado de Assis (1839-1908), depois de dar os primeiros passos de sua carreira, escrevendo resenhas críticas e algumas poesias, também dedicou-se algum tempo ao teatro. Neste período, escreveu 12 peças, dentre as quais está Forcas Caudinas, que fora mais tarde transformada no conto Linha Reta, Linha Curva.

Da leitura de seus textos teatrais Quintino Bocaiúva dissera: “São para serem lidos e não representados”. A prova disso é que, ao efetuar a reversibilidade de sua peça para conto, o autor precisou apenas modificar a estrutura do texto, passando do discurso direto para o indireto e dando voz a um narrador já perspicaz que conhece as personagens interiormente. Alencar (1829-1877), assim como Macedo e Machado, também dividiu seu poder criador entre o teatro e a prosa de ficção, e apesar de ter iniciado sua carreira publicando três folhetins de sucesso, decidiu dedicar-se, por algum tempo, ao teatro em detrimento da prosa ficcional. Esta escolha inicial, feita em função da importância que a dramaturgia tinha na época e do desejo de Alencar de contribuir para o aprimoramento e para a afirmação do teatro realista no Brasil, não foi em vão, pois, durante algum tempo, sobretudo depois da inauguração do teatro Ginásio Dramático do Rio de Janeiro, a dramaturgia realista brasileira, baseada na nova estética teatral francesa, ganhou espaço, pouco a pouco, nos palcos cariocas.

Alencar só retornou à ficção romanesca depois do fracasso de O Crédito, em 1857, e da proibição de sua peça As Asas de um anjo, em 1858. Depois de decepcionar-se com o teatro, retomou a prosa ficcional, quando publicou o romance Lucíola em 1864, o qual apresentava o mesmo tema da peça As Asas de um anjo. Daí em diante, apesar de não abandonar por completo a produção teatral, passa a dedicar-se muito mais à produção de romances. Pode-se dizer que o tempo que Alencar trabalhou com a dramaturgia não foi somente importante por sua contribuição à renovação teatral brasileira, mas também porque a partir de sua experiência teatral, valorizou a estrutura de seus romances, atribuindo-lhes elementos característicos da dramaturgia. Além dessa influência interna nos textos, Alencar, assim como Dumas Fils, fez uso da reversibilidade, quando transformou sua peça As Asas de um anjo no romance Lucíola. O resultado dessa adaptação foi um romance bem trabalhado e que respondia às expectativas do público-ledor e da crítica moralista que havia rejeitado a peça em função de sua temática e das cenas realistas que apresentava.

É interessante acrescentar que, no momento da reversibilidade, a opção dos autores que se dedicaram às duas modalidades narrativas acaba direcionando-se para o gênero de sua preferência, ao qual demonstra possuir mais aptidão e talento, sobretudo, quando isso significa ter mais oportunidade de afirmação pessoal no meio literário. Essa predileção pela modalidade a que os autores acreditavam ter mais predileção pode ter contribuído para a opção de Dumas Fils e de Alencar para a transformação de seus textos iniciais, pois, coincidentemente, os dois autores transformaram seus textos originais em gêneros diferentes que atestavam suas preferências por um determinado gênero. Dumas partiu do romance para o teatro e Alencar do teatro para o romance. Escolhas que podem ter sido impulsionadas pelas vantagens que cada modalidade podia oferecer ao escritor, no dado momento de sua produção ou de sua transformação.

Dumas escreveu e publicou seu romance num momento em que a prosa de ficção estava no auge de sua produção no contexto literário francês, durante o advento do folhetim (É preciso esclarecer que Dumas publicou seu romance em volumes, mas não deixou de ser favorecido pelo advento do folhetim que impulsionou toda a prosa ficcional desse momento), e sua peça foi ao palco num momento de decadência, ou melhor, de proibição da inserção do romance nos jornais, quando o teatro mostrava-se como a melhor forma de ascensão para o literato, e Alencar escreveu sua peça-teatral, em 1857, exatamente quando o teatro brasileiro se reerguia e transformou-a em romance no momento mais culminante da prosa de ficção nacional.

Os dois autores, além do amor pela produção teatral ou romanesca, tiveram senso de oportunismo, escrevendo suas obras nos gêneros que acreditavam ser os mais adequados para o primeiro momento e as transformaram também quando era mais coerente para alcançarem o apoio do público e da crítica, sem é claro deixar de considerar suas preferências.

Diríamos, então, que a reversibilidade, além de transformação, adaptação e conversão de um texto em outro, é decorrência de uma prática que intuía a realização pessoal do autor e que testemunhava sua capacidade de criação, pois, para tanto, era preciso que ele estivesse apto a usar de sua pena criadora tanto para a produção dramática quanto para a ficcional. É, além de tudo isso, prova de que a arte literária pode manifestar-se da maneira que for mais conveniente ao escritor, desde que continue sendo uma forma de representação social que diverte e instrui sem deixar de atender aos desejos da sociedade que representa ou que intenta agradar. Assim, a transformação de um romance em uma peça-teatral ou de uma peça-teatral em romance testemunha o desejo do autor de atender às preferências do público-leitor ou dos espectadores.

Ao executar a reversibilidade, esse autor, além de apresentar o texto no gênero narrativo de preferência do seu receptor atual, retira os elementos que lhes são desagradáveis e insere outros de sua preferência, tornando-o mais agradável ao público e à crítica. Dessa forma, a reversibilidade é positiva tanto para o público-receptor quanto para o literato, uma vez que este ganha com a conquista de novos leitores ou espectadores e aquele com o prazer que sente ao ler um texto ou ao ver uma peça que respeite seus limites morais ou sociais.

Fonte:
Margarida da Silveira Corsi (mestrado-UNESP-Assis)
Do Romance ao Palco, do Palco ao Romance: uma reflexão a ser feita
XIII Seminário do CELLIP (Centro de Estudos Linguísticos e Literários do Paranpa) 21-23 out 1999 - Campo Mourão
Maringá: Depto. de Letras da UEM, 2000 - Org. Thomas Bonnici (CD-Rom)

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