segunda-feira, 14 de abril de 2008

Danilo Corci (O Romance Moderno)

Em "Reflexões do Romance Moderno", Anatol Rosenfeld discursa sobre os mecanismos que compõem a temática e o estilo da obra literária no Século XX após a ruptura brutal com as formas determinadas por um passado clássico. E a primeira noção absoluta para criar uma discussão como esta, consiste em enxergar o romance e sua análise como ideais de uma cultura exclusivamente ocidental.

O mecanismo escolhido pelo autor foi uma comparação direta da literatura com a pintura. Ao partir deste esquema, Rosenfeld apresenta os fatores determinantes para a mudança das artes plásticas, que também podem ser encontradas nos textos literários. Uma delas é a "desrealização", ou seja, a obra deixa de ser mimética por excelência e abandona por completo a idéia de cópia, na completa negação do realismo em forma e conteúdo.

Assim sendo, a perspectiva central é completamente limada de consideração primordial na composição do trabalho. Esta perspectiva, resultado direto da observação entre dois pólos, o do homem e o do mundo, foi forjada na Grécia Clássica, o que originou trabalhos tridimensionais e coesos. No romance moderno, a preocupação vai na direção contrária. Vai pela explosão desta perspectiva. Acontece a ruptura com a linearidade e com a cronologia. O espaço e a sucessão temporal são eliminados. Os exemplos cabais desta nova percepção estão nas obras de Proust, Joyce e Faulkner.

Tanto tempo e espaço deixam de ser entidades absolutas. Passam a serem vistos de maneira objetiva e relativa. Não existem mais certezas. A visão de uma realidade mais profunda, mais real do que o senso comum passa a ser a referência e é absorvida pela literatura. A expressão total disto vem com o romance de consciência, uma vez que não vivendo mais "no" tempo, o homem agora passa a ser o tempo, tempo este não cronológico, mas sim uma atualidade que engloba tanto o passado, o presente e o futuro, misturados e quase sem identificação. A consciência flutua entre estas referências de maneira completa. A narrativa fica sem fronteiras em seu contexto.

Portanto, a partir deste entendimento, Rosenfeld compreende que este fluxo de consciência caminha para a radicalização do monólogo interior, característica crucial do romance moderno. Some-se o narrador. A consciência da personagem se manifesta em sua atualidade. Acabam-se, então, as leis de causa e efeito, o começo, o meio e o fim. Porém, o autor observa que esta radicalização foi produzida com base no romance psicológico e realista do Século XIX. Ou seja, se perde a noção de personalidade total. O ser humano, no romance moderno, se fragmenta, se individualiza. Beckett seria um dos principais vetores deste estilo.

Assim, esta individualização facilita a busca dos mesmos padrões arquetípicos dos mitos, como em um eterno retorno já que o tempo mitológico é circular e não cronológico. "Ulisses", de James Joyce faz esta fragmentação. Fragmentação esta que representa a busca da superação da realidade sensível numa procura incansável de algo por de trás da aparência em que vivemos.

Outras possibilidades apontadas pelo autor são o geometrismo, onde um Eu narrador se aproxima do mundo narrado para mostrar um novo mundo sem tempo algum. Proust seria um dos mestres disto. Ao mesmo tempo, este mesmo narrador se ironiza tanto por saber de tudo e busca a sua justificativa nos mecanismos psíquicos de todos os seres humanos, uma vez que o narrador também é um ser humano. É a cultura do relativismo, da transformação.

Uma outra forma encontrada no romance moderno é o Behavorism. Usado por Hemingway e por Camus, este estilo cria um estranhamento total. Não existe plano psicológico. Tudo é sem profundidade, sem mergulhos internos, um verdadeiro mundo estranho e indevassável. Um mundo de seres humanos sem alma, chapados, externos. Kafka, por sua vez, usava a espera como condição primordial. Seu tempo é a eterna espera.

Anatol Rosenfeld ainda identifica outra ruptura com a técnica clássica. Trata-se do tempo simultâneo, onde grandes espaços e o coletivo são as principais fontes da técnica. Ali, os indivíduos são lançados no fluxo de consciências e do mundo, num verdadeiro redemoinho urbano e caótico. Ao identificar os fatores de ruptura, o texto apresenta um panorama da complexidade estética e das questões filosóficas discutidas pelo romance moderno. O que não deixa de ser um ambicioso mergulho no espírito de nossa época.

Fontes:
07/09/2003
http://www.speculum.art.br/module.php?a_id=526#
http://l4mp3j05.blogspot.com/ (figura)

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