sexta-feira, 25 de julho de 2008

Sonia Belloto (É Bom Ser Escritor)

O escritor como empresário

Imagine que você resolveu ter seu próprio negócio. Você está pensando em abrir um restaurante. Sabe o que vai acontecer se você o fizer? Para começar, vai assumir uma porção de responsabilidades. Terá de fazer um investimento considerável e descobrirá que o retorno financeiro vai demorar alguns anos. Vai ter de respeitar o horário comercial e contratar funcionários. Ficará às voltas com contador, fornecedores e aluguel. Terá de pensar na compra de mercadorias e, muitas vezes, ir de lá para cá até encontrar os produtos de que precisa. Os funcionários podem ficar doentes ou faltar por qualquer motivo, e você vai ter de se preocupar com isso. Sim, porque você vai querer que seu negócio dê certo. E você já ouviu dizer que o boi só engorda diante dos olhos do dono.

Mas, caso você resolva ser escritor, não precisará passar por esses aborrecimentos. Quer saber por quê? Então responda a esta pergunta: Em que lugar você pode escrever?

Em qualquer lugar. Portanto, não precisará se preocupar em comprar ou alugar um ponto comercial. Também não precisará se deslocar até o local de trabalho, já que sempre estará nele. Imagine um daqueles dias de chuva em que o trânsito está insuportavelmente lento. Como escritor, você poderá olhar pela janela, saboreando uma xícara de café bem quentinho, o aparelho de som tocando sua música preferida, a cabeça cheia de idéias, e você dirá:

— Que dia maravilhoso! Perfeito para escrever mais um capítulo.

Parece boa essa sensação?

E o que dizer do horário? Não terá hora certa nem para entrar nem para sair, tampouco para interromper o trabalho quando estiver na melhor parte. Sem chefe e sem grandes investimentos. A matéria-prima dos escritores são as idéias, e os produtos são os textos. Assim, você nunca terá problemas com fornecedores.

Seus funcionários não exigirão salário, férias, nem décimo terceiro. Não perderão um dia de trabalho e nunca ficarão doentes. Na verdade, eles responderão por um outro nome: personagens. Você terá um poder divino sobre eles. Aliás, se desejar, poderá fazê-los adoecer, morrer e até ressuscitá-los.

O escritor Arthur Conan Doyle, por exemplo, criou Sherlock Holmes, um personagem que se tornou famoso. Certa vez, cansado de escrever histórias sobre Sherlock Holmes, o autor resolveu dar um fim ao personagem e escreveu uma cena de luta na qual ele morria ao despencar de um penhasco. Já imaginou o poder de matar Sherlock Holmes e não ser preso por isso?

Mas aconteceu algo inesperado. Os leitores se indignaram com a morte do detetive e escreveram inúmeras cartas de protesto. Pressionado, Doyle não pensou duas vezes e ressuscitou o personagem no livro seguinte.

Os escritores podem tudo. Podem fazer chover, realizar milagres, promover a justiça, dar sentido à vida, ensinar, fazer rir e chorar, despertar as mais diferentes emoções, viajar sem sair do lugar. Sem dúvida, são possuidores de poderes divinos.

Como patrões de seus personagens, os escritores também são dispensados de respeitar as leis trabalhistas. Sabemos que não é permitido o trabalho infantil, no entanto, a escritora J. K. Rowling criou um garoto de apenas onze anos, batizou-o de Harry Potter e o colocou para trabalhar. Ao contrário do que aconteceria em uma empresa convencional, ninguém reclamou. Aliás, o que muita gente quer é ver o menino em ação.

Outra importante vantagem de ser escritor é que você não precisa abandonar seu atual modo de vida. Escrever é uma atividade que pode ser desenvolvida em paralelo a qualquer outra.

Muitos escritores têm outras atividades. Machado de Assis e Carlos Drummond eram funcionários públicos. Michael Crichton, Moacyr Scliar e Drauzio Varella são médicos. John Grisham é advogado. Não importa o que você faz, sempre é possível conseguir algum tempo para escrever.

Os escritores também não enfrentam barreiras de idade. Cora Coralina teve seu primeiro livro publicado aos 76 anos. E quando tinham apenas 18 anos, Françoise Sagan escreveu Bom dia, tristeza, e Mary Shelley, Frankenstein.

Viver muitas vidas

Os escritores vivem várias vezes. Uma vez na vida comum e outras nas histórias que criam. Escrever é um estado alterado de consciência. É sonhar acordado.

Quando escrevemos, podemos criar mundos com realidades distintas. Vivenciamos experiências que jamais teríamos em nossas vidas comuns. Isso faz com que os escritores percebam o mundo de uma forma diferente. E todo o árduo trabalho diante do papel ou do computador é largamente recompensado.

Escrever é uma atividade sedutora. Quando você descobrir isso, não terá mais escolha, desejará escrever. Verá seu primeiro livro desabrochar diante dos olhos e ficará surpreso ao perceber que é capaz de fazer. Ao ver seu livro publicado, você vai explodir de felicidade!

E, por favor, não se esqueça de me convidar para a sessão de autógrafos. Faço questão absoluta de ser a primeira da fila.

Outras vantagens de ser escritor

Escrever é uma atividade absolutamente democrática. Não há restrição quanto ao sexo, raça, idade, posição social, forma física, aparência etc.

Como vimos anteriormente, não há idade para começar a escrever. Nunca é cedo ou tarde demais. Eu mesma, apesar de ter começado a fazer as minhas tentativas aos seis anos de idade, só fui escrever meu primeiro livro quando tinha quarenta e cinco anos.

Ser escritor não exige nenhum diploma ou registro profissional. No entanto, você precisa gostar de ler e de contar histórias. Sim, porque, no caso do romance, o aspecto fundamental é contar histórias.

Também não são necessários equipamentos especiais para o trabalho. Basta que você tenha um bloco de notas e uma caneta ou um computador.

Você não precisa estar em um lugar específico, podendo escrever aonde desejar. Seja num parque, em uma cafeteria, em sua própria casa, ou mesmo se estiver viajando. Portanto, em qualquer lugar poderá escrever.

Escrever é uma atividade que pode ser desenvolvida em paralelo a qualquer outra. Logo, há flexibilidade no horário do trabalho. E você pode morar aonde quiser, porque hoje em dia é possível enviar o seu texto ao editor, por meio da internet.

Fonte:
BELLOTO, Sonia. Você já pensou em escrever um livro? São Paulo: Ediouro, 2008.

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