domingo, 24 de agosto de 2008

José Levy de Oliveira (Exercícios de Trovas)

(id:MCCXXXII)
.
UBT – Membro no. 088 - Seção de Juiz de Fora, MG

I. TROVAS BEM-COMPORTADAS

O temas são vários: um cartaz de alguém muito preocupado com meu bem-estar e o da coletividade;a indefinição das vestes e cabelos modernos; algumas fraquezas humanas; um noivo impaciente:

1.
Não que me faltasse aviso
Ou falte espírito crítico;
A mim? De mim! o sorriso
Do sorrateiro político!

2.
Dúvida atroz nos domina
Ante a mocidade nova:
Será menino ou menina
Ou os dois, até contra-prova?

3.
Já está na boca do povo
Que a mulher do Belisário
Vai ser um defunto novo:
Nunca faz aniversário...

4.
A fim de não levar “pito”
O cara, dissimulado,
Pra não revelar o pito
Pitava o pito apagado.

5.
Posso desejar a ti”
É ver-te bem desmaiado,
Pois, antes fora de si
Do que mal acompanhado.

6.
Se detestavas a morta
Por cruel e aborrecida,
Nada disso mais importa,
Pois a encontras ... falecida.

7.
Fui um dos heróis da luta
Nessa batalhe triunfal;
Ninguém me viu na disputa
Mas dei um apoio moral....!

8.
Detida por impudência,
A moça assim se define:
-É clara minha inocência.
Só me esqueci do biquíni...

9.
Doidivanas e ao léu,
Ela trocou o biquíni:
De óculos, chinelo e chapéu
Foi banhar-se ... de triquini.

10.
Para o Carnaval, de fato,
Não é difícil arranjar-se
E fica até bem barato:
Desnudar-se, desnudar-se ...

11.
“- Se te atrasas para o altar,
Eu me agasto, minha nega!
- Não adianta se agastar ...
O problema é que ela chega!

12.
Eu não sei o que seria
Se a Pati nada quisesse,
Mas, supondo que eu fizesse,
Será que a Pati faria?...

13.
- Oh! meu amor! Onde a lua,
As estrelas? Que se passa?
- Mas o que fazes na rua,
Que é só ruído e fumaça?
14.
Aquele beijo roubado
Devolver-te? Só de um jeito!
Que o tires com um beijo dado
Agarradinha ao meu peito.

15.
Troveirei a noite inteira
Na janela do meu bem,
Mas, oh!, sorte traiçoeira!,
Troveirou o céu, também.

16.
Duvidas que o homem troveja
E queres prova, doutor?
O que faz quando verseja
E faz trova o trovador?

II. TROVAS METATROVÍSTICAS
A eficácia terapêutica de poetar; as intertextualidades inerentes a esses pequenos poemas; a grandeza do Santo que é o patrono dos trovadores:

1.
Depois das mais duras provas
E dos percalços da vida,
O trovador pensa em trovas
E leva a dor de vencida...

2.
Se, no caminho, uma pedra
Foi, um dia, inspiração,
Tão forte é a trova, que medra
Nas trilhas do coração.

3.
Não sobra melancolia,
Isso o dia-a-dia prova
Que não sare à melodia
Que há na alma da trova.

4.
No pobrezinho de Assis
Nossa força se renova
E nossa trova lhe diz:
“- Santo Patrono da trova!”

5.
O trovador, eu sustento,
O seu talento comprova
Talando o seu pensamento
No estreito leito da trova.

6.
Tão grande é o poder da trova
Que até a amplidão do universo
- e esta mesma o comprova –
Cabe em qualquer de seus versos.

7.
Porque se trova, na vida,
Com tanta ânsia fremente?
Para, à beleza, guarida
Dar no coração da gente.

8.
Na floresta de concreto
Do urbano trovador,
Dá-se o milagre completo
Quanto ele trova ... essa flor!

9.
Pela vida, de mãos dadas
Com a mais sublime estesia,
Me ponho pelas estradas
Com as trovas de cada dia.

10.
Não trovo por ser perfeito
Trovador, mas por saber:
Dever de casa, a ser feito,
Seja feito com prazer.

III. TROVAS DE CONTEMPLAÇÃO

1.
- Essência? – me perguntaste.
É a porçãozinha mais ínfima
Que sobra após o desbaste
Do que excede à parte íntima...

2.
Por mais que longa a distância
Entre corações leais,
Nada macula a constância
Com que eles se querem mais...

3.
Esta verdade não falha,
Certeza mais que palpite:
Para quem ama e trabalha
O Infinito é o limite.

4.
As perfeições do teu mundo
Amo e admiro, meu Deus,
Mas, poeta, me aprofundo
Em somar esforços meus...

5.
Em noites de céu escuro,
Quando não se pode vê-las,
É nosso anseio mais puro
Que acende a luz das estrelas.

6.
Não tenhas temor de nada,
Se vives honesto e bom.
Não se resume a trovoada
A um pouco de luz e som?

7.
Se a vida é duro embate
Que aos fracos sói abater,
“Combater o bom combate”
É “ajudar a viver”.

8.
Para que o esforço não falhe,
Pondo a perder a intenção,
Atente a cada detalhe,
Busque sempre a perfeição.

9.
O homem procura Deus
Com forte sede e incerteza
E, bem em frente aos olhos seus,
Está Deus na Natureza.

10.
Homem, meu filho, merece,
Esse nome, o que porfia
Em trabalho, amor e prece,
Nas lides de cada dia.

11.
Filho não é prevenção,
Cofre, poupança ou seguro;
Filho é carta de intenção
Que se consigna ao futuro.

12.
Temor é morte, variante
Escrita em modo invertido.
Temer é morrer bem antes
De enfrentar o que é temido.

13.
Temor a Deus? Não concordo
Nem penso viver ao léu.
Com Deus me deito e me acordo
E a Terra com ele é Céu.

14.
Consciente, sereno, altivo,
Em todo e qualquer momento
Deve ser o objetivo
Do cultor do pensamento.

15.
A força que reverdece
O coração sofredor
Provem do alívio da prece
Que vence tristeza e dor.
16.
A vida é para brilhar,
Deve o homem ser feliz;
Em vez de o vício adotar,
Corte o mal pela raiz.

17.
Na vida terás franquia,
Ao nascer, com esta certeza:
A cada meia alegria
Haverá uma tristeza.

18.
A mente lúcida, aberta
À incerta natureza,
Só de uma coisa está certa:
É impossível ter certeza.

19.
Assim vai a Humanidade,
Metade em alegre boemia,
Enquanto a outra metade
Restam suor e porfia.

20.
Temor eu tenho de, um dia,
Descobrir que não vivi
Aventuras, fantasias,
Somente porque as temi.

21.
É hora, de vez por todas,
De deixar da vida a esmo;
Pretendo contrair bodas
E viver comigo ... mesmo.
22.
Se o progresso é despedida
De tudo bom que conheço,
A ir pra frente na vida
Prefiro ir ... de regresso.

23.
“- Ajuda!” – diz meu netinho,
Sempre que quer um socorro.
E corro, vou ligeirinho,
Que ao meu futuro que corro.

24.
Tem sido uma dura andança
Toda minha vida a buscar
Sossego, paz e bonança
... se a tempestade passar.

25.
A natureza, com sono,
Chega a mudar de estação,
Pra descansar, no outono,
Dos excessos do verão.

26.
Querer nem sempre é poder,
Mas, se pudesse eu queria
Deixar de inútil querer:
Seu eu quisesse, poderia?

27.
Nos burburinhos urbanos,
Em que a vida perde a graça,
Uns toques restam, humanos,
No bucolismo da praça..

28.
Caminhava eu num sentido,
Em outro ela, com graça,
Nosso mundo resumido
Em nosso encontro na praça.

29
Causa a distância, querida,
Imenso dó que assim meço:
Maior a dor da partida,
Mais o prazer do regresso.

30.
Se, no Juízo Final
For dar meu depoimento
Contra ti e por teu mal,
Serei réu de esquecimento.

31.
Meu amor é assim, total,
Por isso posso afirmar
Que se ele te fizer mal
Renuncio a te amar.

TROVAS DE LOUVAÇÃO

A uma cidade, cujo nome já é um verso perfeito;
a personalidades dignas de encômios:

1.
Redondilha que seduz,
Cantá-la bem nos compete;
Reluz a antiga Queluz,
Conselheiro Lafaiete!

2.
Luiz Otávio, é a prova
De que é capaz a poesia
De resistir pela trova:
LuizOtáviomania... (1)

3.
Do país que atravessaste
Em aturados estudos,
Euclydes, tu nos deixaste
A epopéia de Canudos.

4.
Luiz da Câmara Cascudo,
Para que o Brasil melhore,
Fixou-lhe, em amplo estudo,
Como é rico o seu folclore...

5.
Em quatro versos, concisa,
Clara, completa, notável,
A trova sempre realiza
O ideal de Luiz Otávio.

6.
Caxias, tu és legenda
De civismo, força e glória,
Sereno em qualquer contenda,
Bondoso, em qualquer vitória...

7.
Ao coibir-lhe agravos,
As tuas ordens, Caxias,
Dão lições aos nossos bravos
De humanismo e fidalguias.

Fonte:
Academia de Letras de Viçosa
http://www.alv.org.br/

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