sábado, 9 de agosto de 2008

Maurício Cavalheiro (O Papagaio)

Os passos pressurosos eram para abreviar o tempo de retorno ao lar. A expectativa em revelar a sua nova aquisição, não desfazia aquele sorriso no rosto. Os transeuntes, curiosos, olhavam-no segurando uma enorme embalagem, cuja proteção plástica, impedia desvendar o seu conteúdo.

Abriu o portão, gritando:

- Benhê! Jonzinho! Nininha!

Os filhos, que brincavam no balanço, correram ao encontro do pai.

- O pai chegou, mãe!

A esposa abriu a porta enxugando as mãos no avental.

- Que gritaria é essa???

- Tenho uma surpresa para vocês. Tenho certeza que irão gostar.

A esposa e os filhos, seguiram-no até o quintal. Ele ordenou-lhes que se sentassem.

Depositou o pacote no chão e, segurando a embalagem, puxou-a ligeiramente. Quis semelhar-se com um mágico.

- Tcham! Tcham! Tcham! Tcham! Gostaram?

O filho de três anos, espremeu os olhinhos e questionou:

- Por que o senhor comprou uma galinha, pai?

- Não é uma galinha, filho - disse a mãe com ternura - é um louro.

- Mas ele é verde, mãe... Louro não é amarelo? Indagou a filha.

- É um papagaio - definiu o pai - Pretendo ganhar muito dinheiro com ele. Vou ensiná-lo a falar, a cantar o Hino Nacional... Todos os programas de televisão vão querer entrevistá-lo... Aí eu peço uma grana preta... Vamos ficar ricos! Agora preciso escolher um lugar para ele ficar...

- Que tal ali? Sugeriu a esposa.

Suspenderam a gaiola do bípede emplumado sob o telhado da área de serviço. Naquele mesmo dia, o marido repetiu algumas palavras para a ave, que permaneceu alheia aos ensinamentos.

Meses se passaram e, mesmo com a insistência daquela doutrina, o animal não evoluía. Raramente ouvia-se um curupaco.

- Talvez eu não seja um bom professor! Confidenciou certa vez a um amigo.

- Não é nada disso... já li uma reportagem sobre adestramento de animais... Pra ensinar um bichinho, é necessário que ele receba muito carinho e compreensão.

Naquele dia, o marido voltou decidido a acariciar o papagaio. Certamente o seu amigo estava com a razão. Quem não gosta de um carinho?

Loro! Curupaco! Começou a falar, abrindo a portinha da gaiola para fazer um cafuné no cocuruto do papagaio. Diga: CO-MI-DA! CO-MI-DA!

O papagaio olhou desconfiado e abriu o bico. "Ele vai falar", pensou. Quando a mão aproximava-se da ave, esta mordeu-lhe o indicador, que só foi liberado depois de um palavrão gritado.

No outro dia, com o dedo enfaixado, encontrou-se novamente com o amigo.

- E aí? Conseguiu fazer o bicho falar?

- Que nada! - Respondeu constrangido - Além de não dizer nenhuma palavra, ainda me fere o dedo.

- Você já reparou que os animais quando obedecem ao dono, recebem alimento? Por que você não faz o mesmo?

- Mas ele não me obedece.

- Então não lhe dê comida até que ele faça o que você quer.

Resoluto, confiou mais uma vez no amigo.

- Loro! Curupaco! Ou você fala alguma coisa ou não lhe dou comida. Entendeu?
O papagaio continuou indiferente diante da ameaça. Entretanto, a partir daquele dia ficou terminantemente proibido a alimentação do animal.

- Quem se atrever a dar comida pro papagaio, vai se ver comigo. ENTENDERAM?

Ninguém se atreveria a contrariar a determinação daquele homem severo, capitão reformado do exército.

Naquela semana o papagaio não foi alimentado.

Certo dia, a mulher varrendo o chão, ouviu uma voz esganiçada e debilitada:

- Co... mi... da!

Olhou para todos os lados mas não havia ninguém. Seus filhos estavam na escola.

- Co... mi... da!

Surpreendeu-se quando percebeu que o papagaio finalmente falava. Jogou a vassoura e correu ao telefone.

- Querido! O papagaio tá falando! Venha depressa!

Estupefata, tanto quanto como quando ouvira a primeira palavra pronunciada por um filho seu, retornou para próximo da gaiola.

- Co... mi... da... Co... mi... da....

O marido entrou correndo e ainda conseguiu ouvir a ave dizer:

- Co... mi... da...

- Traga as sementes de girassol, mulher... Traga o girassol – berrou.

A mulher obedeceu. Porém, quando entregou o pacotinho ainda lacrado ao marido, ouviu o papagaio repetir a palavra e tombar na gaiola.

Era muito tarde. O papagaio havia morrido de fome e destruído o sonho do marido em se tornar milionário.

Fonte:
http://www.diariolac.com.br/

Um comentário:

Anônimo disse...

Zéca, parabéns pelo seu blog, e pela sua luta para difundir a literatura. Estive ausente por um tempo, mas estarei por aqui, sempre que puder, para me informar melhor, e prestigiar su luta, nossa luta. Confesso que lendo seu histórico fiquei emociado. Tenho muito orgulho de ter um primo, amigo, e pessoa tão culta ao lado. Mas, às vezes, mesmo podendo ter contato fácil, ou estando ao lado, nos distanciamos. Cara, um grande abraço, para tu, grande José Feldman, para minha prima querida Alba, e para sua legião de gatos e cães.

José Eduardo Calcinoni (Dudu)