quarta-feira, 21 de abril de 2010

Durval Mendonça (Trovas que eu Dou à Vida !) Parte I


Felicidade - mosaico
de pedrinhas coloridas,
que, em meu destino prosaico,
não consigo ver unidas.

Poças que o mar faz na areia...
Ao vê-Ias, paro e medito
nessa humildade tão cheia
das estrelas do Infinito.

Eu luto desde menino,
com bravura redobrada,
neste jogo em que o Destino
joga de carta marcada.

Quando a noite vem descendo
e o mundo parece em calma,
existe um mundo fervendo
na inquietação de minha alma.

Eu conto por sete dedos,
sete sonos que me tiras,
porque tens sete segredos
por trás de sete mentiras.

Lágrima a lágrima faço
de amarguras meu rosário...
Vou levando, passo a passo,
minha cruz ao meu calvário.

Aleijadinho, com traços
que o teu cinzel pôs na História,
A Via Sacra dos Passos
levou teus passos à glória.

Entra o sol pela vidraça
e em teu leito empalidece,
deslumbrado pela graça
que teu corpo lhe oferece.

Quantas lágrimas choradas
numa angústia que comove...
É o retorno das jangadas...
Saíram dez, voltam nove...

Vejo os espaços profundos
contraditando os ateus.
Há, no mistério dos mundos,
toda a evidência de um deus...

Este olhar perdido e triste,
na curva, longe, da estrada,
é tudo que ainda existe
de uma promessa quebrada...

A praia é cama estendida,
onde o mar e a lua cheia...
- Cala-te, boca atrevida,
não fales da vida alheia!

A garoa é ouro fino
das arcas celestiais
que desce em fluido divino
na terra dos cafezais ...

Caminhos da minha infância
que a saudade inda percorre...
Tudo morreu na distância
e esta saudade não morre...

Vai o rio em cantochão...
Suas águas se lamentam.
Parecem pedir perdão
às pedras que as atormentam

Se um mendigo te procura
e tens escasso o dinheiro,
dá-lhe um gesto de ternura,
que talvez seja o primeiro...

Essa lágrima, luzindo
em teus olhinhos, meu bem,
é o sofrimento mais lindo
que vi no rosto de alguém

Minhas trovas são lampejos
em minha alma entristecida;
risonhos ou tristes beijos
que dou na face da vida.

O que me causa estranheza
num mundo assim tão estranho
é ver tamanha pobreza
e riquezas sem tamanho.

Se vai às compras, Maria
compra tudo que é preciso;
se o vendeiro não lhe fia,
paga à vista com um sorriso...

Ao fim de instantes felizes,
quando me dizes adeus,
parece, amor, quando o dizes,
que o céu vai ficar sem Deus.

A vida é roda de fogo,
gira em franco desatino...
Cartas sem naipe de um jogo
em que o parceiro é o Destino.

Da juventude risonha
perdido nos torvelinhos,
vi marias-sem-vergonha
florindo o pó dos caminhos.

Cai a noite e neste quarto
que há muito você não vê,
meu coração anda farto
desta escassez de você.

Cachaça sempre dá jeito,
quando a saudade me abafa:
ponho a cachaça no peito
e a saudade na garrafa

Pela noite, a, lua avança
atrás do sol, sem parar;
depois, frustrada, se lança
nos braços frios do mar.

Tempo, terrível moinho!
Mói a vida sem piedade
e deixa o pó no caminho
que conduz à eternidade...

Aleijadinho, os Profetas
- teu milagre de escultura -
têm almas, todas repletas
de tua imensa ternura.

Eu não pude ver ainda
a razão desse teu pranto;
uma lágrima tão linda
não a tem quem sofre tanto.

Como a lua é lisonjeira,
quando eu canto em serenata!
Ela aplaude a noite inteira,
batendo palmas de prata.

No caminho da virtude
há tantas pedras plantadas,
que, confesso, jamais pude
percorrê- lo, sem topadas.

Perdão, Senhor, se não pude
perdoar quem me ofendeu.
A vida tornou-me rude;
perfeito és Tu e não eu.

Coração, eu já lhe disse:
Tome cuidado, porque
eu faço muita tolice
depois... quem paga é você.

Já na casa dos oitenta,
na solidão dos meus dias,
que saudade dos setenta,
quando penso nas Marias!

Criança brava, e atrevida
faz da vassoura um corcel
e enfrenta os mares da vida
num barquinho de papel.

Eu vejo, de minha rede,
nas noites quentes de estio,
a lua matando a sede
nas águas frescas do rio.

Eu acredito que foi
em Belém, na gruta escura,
que os olhos triste do boi
ganharam tanta ternura.

Garoa... Frio... Demoras...
Serão seus passos? Oh! Não...
É o passo triste das horas
passando na solidão.

Como parece inclemente
este maldito ciúme:
Aperta o peito da gente
com travor de pedra-ume.

Nosso destino na vida
tem sempre este fim e só:
uma caveira esquecida
sobre um punhado de pó

Esta lágrima indiscreta,
que vês, agora, em meu rosto,
é o lamento de um poeta
na agonia do sol-posto.

Perdido em duras andanças,
cansado, devagarinho,
vou deixando as esperanças
junto aos cardos do caminho.

As pedras são singulares
- conversam dois capelães -
de umas se fazem altares,
outras se atiram nos cães.

Ao ver crianças em bando
que passam rindo, por mim,
fico feliz relembrando
os bandos que tive assim.

Este mar de cara feia,
de adamastores e lendas,
é o mesmo que, à lua cheia,
recobre as praias de rendas.

Como é triste o olhar parado
que, das grades da prisão,
pensativo, o encarcerado
deixa livre na amplidão...

Em meu barraco de zinco,
sem ninguém, sem afeição,
eu deixo a porta sem trinco,
mas só entra a solidão.

O caminho preferido,
aquele que tem mais graça,
tem placa, de "Proibido",
mesmo assim a gente passa.

Essas vitórias compradas,
que a gente vê a granel,
são farsas mal disfarçadas,
desses heróis de papel.
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Fontes:
– UBT Juiz de Fora
– Imagem = http://mensagensemppszelia.blogspot.com/

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