domingo, 27 de junho de 2010

Luiz Carlos Felipe (Contar Histórias : Uma Arte?)



Antes eu contava histórias porque queria mudar o mundo. Hoje eu conto histórias para que o mundo não me mude.

Não é novidade para ninguém a imagem de um ancião reunindo um grupo de pessoas jovens para contar a elas um “causo”, uma “lição de vida” ou uma parábola. O fato é que em torno do fogo (ou de um fogão à lenha) ou ainda de um toco de vela, muitos já experimentaram sensações que vão da fé à incredulidade. O fato é que nos acostumamos a “viajar” na voz do outro, aceitamos partir com nosso herói para as aventuras da vida. Todavia, sempre torcemos pela vitória do herói, pois, como é sabido, a vitória dele é a minha vitória, o sucesso dele é o meu sucesso e estamos sempre em busca de um “...e viveram felizes para sempre...”

Por essas razões, dominar a arte de contar histórias é um ato de altruísmo. Somos instrumento, um elo entre o mundo de lá (onde vivem as histórias) e o mundo de cá (onde há gente sofrendo, precisando de uma palavra de estímulo, ou uma boa dose de humor). O contador de histórias é uma criatura que carrega muitas “pessoinhas” dentro de si. Sua sabedoria materializada no olhar e no gesto faz brotar em nossa mente e em nosso coração os sentimentos que com o tempo perderam-se no corre-corre de nossas atividades cotidianas.

Por isso posso definir a contação de histórias como um exercício de ampliação, transformação e/ou enriquecimento da própria experiência de vida, para que essa seja renovada. Num encontro com o imaginário, com os medos, com as frustrações e, também, com as possíveis realizações que almejamos, poderemos desenvolver, primeiro em nós, e depois em nossos alunos, além da construção da realidade social, a formação de valores e conceitos para uma aprendizagem mais significativa, mais valiosa, associando teoria e prática, diversão e aprendizagem, paixão e leitura...

Dessa forma a atividade de contação de histórias não deve servir como um “tapa-buraco”, ela deve estar incluída na rotina diária da sala de aula. O professor deve estar bem preparado e criar rituais, os quais podem variar desde a montagem de um ambiente agradável (brinquedoteca, cantinho da leitura, por exemplo), até a incorporação ao ambiente da sala de aula de elementos da natureza (uma flor, uma vela acesa, cristais coloridos, incenso, um vaso de argila, uma toalha bonita, etc.) até uma música adequada, a qual, sempre que for cantada, dará início à contação.

Assim, nossos alunos estarão preparados para o que irão ouvir, pois, “contamos histórias, não para fazer dormir, mas sim, para “fazer acordar”. Acordar sonhos, medos secretos, frustrações, desgostos, amores, desamores, acordar para a vida, para a imaginação do impossível, do abstrato, do irreal, os quais podem muito bem transformar-se em soluções para os problemas mais adormecidos e os quais nem imaginávamos existir.

Para encerrar, deixo uma reflexão a todos os educadores, utilizando-me das palavras do Grupo Morandubetá Contadores de Histórias: “contar histórias é revelar segredos, é seduzir o ouvinte e convidá-lo a se apaixonar... pelo livro... pela história... pela leitura. E tem gente que ainda duvida disso.” .
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Luiz Carlos Felipe é professor de Contos Velados e Desvelados, no Instituto Aprender, em Joinville, SC. Especialista em Estudos Literários, contador de Histórias formado pela Casa do Contador de Histórias.

Fontes:
Revista Escrita , edição 12.
Imagem = http://umatoradolescente.blogspot.com

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