segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O Amor na Passarela I

Vicência Jaguaribe
POEMA-DE-AMOR

Relutei em fazer um poema de amor.
Escapou-me o tom e atropelei o ritmo.
As palavras se esconderam encabuladas
E a sintaxe embaralhou-se escandalizada.

Mas desdobrava-se um dia tão bonito!
– Um mar azul encontrando o infinito
Pássaros desafiando o pequeno espaço verde
Crianças conquistando os últimos recantos livres –
Que resolvi, se preciso, desafiar a morte.

As lembranças, lá, arrumadinhas nas gavetas.
Nas prateleiras, o aroma e o humor da juventude.
No cofre, a sete chaves, as últimas palavras ouvidas.
Os últimos beijos e as últimas carícias trocados.
As últimas cartas recebidas. Sim, palavras de amor.
Cartas de amor, ridículas, sim, pois
(Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.)

Foi só dispor o material em cima da mesa.
Sem muito esforço, recuperei o tom e o ritmo
Encontrei as palavras antes escondidas
Consegui, sem custo, descontrair a sintaxe.
De repente, olhei para o monitor. Vi o poema lá,
Adquirindo vida, a fazer-se quase sozinho.
Minutos depois, eis o poema de amor.
Ridículo. Sim.
Pois não seria poema de amor se não fosse
Ridículo.

Vicência Jaguaribe
AS RIMAS DO AMOR

Quis fazer um poema de amor.
Inútil tentativa, esforço vão.
As palavras escorregaram da página virtual
E, com a ironia habitual, olharam-me do chão.

Recolhi as palavras esparramadas.
Tentei fazer um poema de forma fixa.
Rimei, então, amor com flor.
Ouvi uma risadinha safada.
Riso de quem critica a ingenuidade
E a ignorância dos percalços da vida.

Então, rimei amor com dor.
A risadinha safada mudou de tom:
- Não dá para ser mais original?

Para falar de amor convém saber que o amor
– que nem sempre merece loas –
Rima não com palavras, mas com pessoas.
E, como todas as rimas, as do amor
Podem ser perfeitas ou imperfeitas.

Bom ter em mente – chocante embora –
Que as do amor são, em geral, imperfeitas.
E, para usá-las, paga-se juro de mora.
Raramente o amor, ipso facto,
Rimas perfeitas encontra.
O amor se realiza mesmo é na 25ª hora.

Silviah Carvalho
QUANDO CHEGA O AMOR

Chega o amor
E com ele o sofrimento,
O desalento a dor, a solidão...
Chega o amor


E vem trazendo a duvida;
E com medo de perder
O que nem sempre se possui
Vamos vivendo de ilusão,

Mas ele chega,
Quando não esperamos
Sempre acompanhado de coragem!
Alegria, temor e paz...

É uma força sobrenatural,
Que ignora a distancia,
Estado civil, raça, cor
Ou condição social,

Misto de sentimentos!
Que ultrapassa barreiras,
Para viver de momentos.
Entranhável afeto,

Ora paz ora guerra,
Conflitante, envolvente!
E quase sempre
Não chega a lugar algum

Insiste em ser dois, e às vezes,
Por muitas vezes! Tem que ser apenas um,
O amor é isso, ninguém explica,
A si mesmo se justifica

É como um pássaro cego
Que voando sem direção
Pousa em qualquer lugar...

E esse qualquer lugar,
Chamamos de coração.

Silviah Carvalho
TUDO POR VOCÊ

Já vi milagres acontecerem,
Desejos concretizados,
Já vi corações partidos,
De amores despedaçados.

Sonhos ressuscitados,
Amizades reconstruídas,
Mas nunca vi tanta mudança,
Desde que chegaste a minha vida.

Passas em meio ao meu coração,
Dominando minhas forças,
E não consigo me mover,
Como se minha vida esperasse por você.

Nascem flores onde passas em mim,
Nunca vi milagre assim...
Eu que tinha o sonho perdido no tempo,
E um coração vazio em mim.

Vejo-me agora a sonhar com você,
Esperar pelo momento de te ter,
A viver de você - tudo por você...

Me perguntas: Com o que te conquistei?
Eu, já não cria no amor! E agora vivo de amar-te!
Com as cordas do amor eterno me conquistastes,

Peço-te, não desate as cordas do amor,
Não tente compreende-las, nem discerni-las,
Deixa-me amá-lo, assim como amo!

Pois de qualquer forma amar-te-ia,
Mesmo se não visse seu rosto e não ouvisse sua voz,
...mesmo, se apenas lesse sua poesia.

Mesmo se no tempo não houvesse mais tempo,
E minha esperança houvera de novo perdida,
Amar-te ia mesmo assim... Por toda minha vida.

Miguel Russowski
ESPERANÇA

Esperança!... Não falhes, vem comigo!
Tu que és capaz de colorir o vento,
vem! – te peço - adoçar meu pensamento
com os favos de mel do amor antigo!

Esperança! Não deixa o desalento
se intrometer nesta ilusão que abrigo.
Não ponhas aqui dentro este inimigo
chamado:- “ Não te quero!” - não o aguento.

Esperança !... Perfuma meu agora
com a certeza que nuca se evapora
uma promessa feita à luz da lua.

Esperança!... Ó mentira deliciosa!
tu que anulas espinhos de uma rosa,
me faz, mais vez ouvir..: - Sou tua!

Vinicius de Moraes
SONETO DO AMOR TOTAL

Amo-te tanto meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te enfim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.

Adalgisa Nery
POEMA DA AMANTE

Eu te amo
Antes e depois de todos os acontecimentos,
Na profunda imensidade do vazio
E a cada lágrima dos meus pensamentos.
Eu te amo
Em todos os ventos que cantam,
Em todas as sombras que choram,
Na extensão infinita dos tempos
Até a região onde os silêncios moram.
Eu te amo
Em todas as transformações da vida,
Em todos os caminhos do medo,
Na angústia da vontade perdida
E na dor que se veste em segredo.
Eu te amo
Em tudo que estás presente,
No olhar dos astros que te alcançam
E em tudo que ainda estás ausente.
Eu te amo
Desde a criação das águas,
desde a idéia do fogo
E antes do primeiro riso e da primeira mágoa.
Eu te amo perdidamente
Desde a grande nebulosa
Até depois que o universo cair sobre mim
Suavemente.

Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)
O AMOR É UMA COMPANHIA

O amor é uma companhia.
Já não sei andar só pelos caminhos,
Porque já não posso andar só.
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo.

Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo.
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar.
Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas.
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela.

Todo eu sou qualquer força que me abandona.
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio.

Florbela Espanca
OS VERSOS QUE TE FIZ

Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer!

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!

Amo-te tanto! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

Cesário Verde
Eu e ela

Cobertos de folhagem, na verdura,
O teu braço ao redor do meu pescoço,
O teu fato sem ter um só destroço,
O meu braço apertando-te a cintura;

Num mimoso jardim, ó pomba mansa,
Sobre um banco de mármore assentados.
Na sombra dos arbustos, que abraçados,
Beijarão meigamente a tua trança.

Nós havemos de estar ambos unidos,
Sem gozos sensuais, sem más ideias,
Esquecendo para sempre as nossas ceias,
E a loucura dos vinhos atrevidos.

Nós teremos então sobre os joelhos
Um livro que nos diga muitas cousas
Dos mistérios que estão para além das lousas,
Onde havemos de entrar antes de velhos.

Outras vezes buscando distração,
Leremos bons romances galhofeiros,
Gozaremos assim dias inteiros,
Formando unicamente um coração.

Beatos ou pagãos, vida à paxá,
Nós leremos, aceita este meu voto,
O Flos-Sanctorum místico e devoto
E o laxo Cavalheiro de Flaublas...

Armando C. Sousa
TROVAS DE AMOR

Vida que vive com mágoa
Precisa muita atenção
Como rio procura água
O amor um coração

Teus beijos e adoração
Mostra o quanto me ama
Faz-me sentir emoção
De um amor que não engana

Aperta-me com um abraço
Deixa nele teu carinho
Duas bocas sem espaço
Seladas com um beijinho

União de duas bocas
Dois pensamentos chegados
Nossas paixões são loucas
Não há amor sem pecados

Estende-me a tua mão
Vamos caminhar vida fora
Eu dou-te meu coração
Tu dás-me o teu sem demora.

Humberto de Campos
TU

Quando alguém me pergunta, por ventura,
Quem me faz de outros tempos diferente,
Pensas tu que teu nome se murmura,
Que o exponho à ânsia voraz de toda gente?

Não; digo apenas o seguinte: é pura,
Casta, simples e meiga: é uma dolente
Cauta rola de tímida candura,
Flor que menos se vê do que se sente.

Mimo de graça e de singeleza;
Clara estrela arrancada a um céu profundo:
Doce apoteose da Delicadeza...

Nesse ponto, de súbito, me calo;
E, sem dizer teu nome, todo mundo
Fica logo sabendo de quem falo!

Olegário Mariano
VOCÊ NUNCA ESTÁ SÓ…

Você nunca está só. Sempre a seu lado
Há um pouquinho de mim pairando no ar.
Você bem sabe: o pensamento é alado...
Voa como uma abelha sem parar.

Veja: caiu a tarde transparente.
A luz do dia se esvaiu... Morreu.
Uma sombra alongou-se a seus pés mansamente...
Esta sombra sou eu.

O vento ao pôr do sol, num balanço de rede,
Agita o ramo e o ramo um traço descreu.
Este gesto do ramo na parede
Não é do ramo: é meu.

Se uma fonte a correr, chora de mágoa
No silêncio da mata, esquecida de nós,
Preste bem atenção nesta cantiga da água:
A voz da fonte é a minha voz.

Se no momento em que a saudade se insinua
Você nos olhos uma gota pressentiu,
Esta lágrima, juro, não é sua...
Foi dos meus olhos que caiu...

Antonio Manoel Abreu Sardenberg
ALMA

Quando a vida vem sussurrar baixinho
Dizendo coisas que se quer ouvir,
Deixe o recado chegar de mansinho,
Que toda a alma também quer sentir.

Prepare o peito para uma festa,
Faça um convite para ela entrar,
Reparta o resto todo que inda resta,
Pois dividir é muito mais que dar.

E deixe o amor enaltecer a vida
Dando guarida ao pobre coração.
Quando chegar a hora da partida,
Que nos sussurre a voz da emoção.

E que o acalanto de linda cantiga
Deixe que venha a paz que tanto acalma
Trazendo junto a esperança antiga
Que ainda vive dentro dessa alma.

Ialmar Pio Schneider
SONETO DA ESPERA

O que me falta nesta vida, penso...
são uns carinhos sempre desejados.
É ter, enfim, um forte amor imenso
que contenha recíprocos agrados.

Pois assim cada vez mais me convenço
quanto sofreram os desenganados
e como foi triste o caminho extenso
dos que viveram sempre abandonados.

Uma esperança ainda me seduz
nestes momentos em que logro vê-la
cercada de resplandecente luz.

E meu olhar a fita ansiosamente
como quem busca na distante estrela
um lenitivo ao que sua alma sente...

Fontes:
Colaboração de Antonio Manoel Abreu Sardenberg

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