terça-feira, 21 de junho de 2011

Carlos Nóbrega (Antologia Poética)


EM RISTE

de que um obelisco
acusa o céu?

ele mesmo tão impuro
entre potência e solidão

MATÉRIA DE CONSUMO

Quando a primeira luz
caiu no primeiro olhar
nunca mais a paisagem foi a mesma

O BANCO DA GARE

tu que estás morto
sentado num banco da gare
esperando
- vieste pegar o trem?

não não
vim esperar o trem passar:
- vim pegar o tempo.
mas para tu que estás morto
- o tempo não já
passou?
sim sim
o tempo já passou
- Mas eu vim pegá-lo.

O MAR

Oh grande falta de sombra
incendiada
Azul que arde.
Só sal e
vento e sol e
coisa infinda.
Eterna tarde.

O MAR II

O Insone. O que é um abraço só
cheio de nomes: o índico...
O impaciente. O sêmen espumante
de todos os entes.
E o bolero-de-ravel
que ele repete sempre

O PASSADO

Tudo vive a cair
lentamente
Lentamente
indo ao chão
como um som
vem caindo
em busca de repouso
- lentamente
à sua cova de silêncio

O VENTO


Já tão velhinho
o velhinho
que não envelhece
mais -
Se dissipa
em cabelos e olhares
Vai no vento
como os jornais

OS OLHOS IDOS


oh por que
o olho morre antes da vida
como se o pássaro
antes do vôo
e o homem antes do sonho
como se tudo fosse apenas
uma grande lua
sem haver noite

OS RELÓGIOS


1 galo que é feito de sol
canta sua canção de sangue
canta com sua voz de sonho,
com seu olho de cor e sal
para as sombras que estão por vir

SUBSTANTIVO CONCRETO

No quarto do morto
ainda sentíamos
das noites mais fundas
A matéria dos seus sonhos
- -
Tocar-nos

UM GATO

meio de louça
meio de sombra
imóveis sobre
si mesmo
o objeto de carne
e espera
espera que a tarde
se vá
de seus olhos
de tédio e sono

Fonte:
http://www.jornaldepoesia.jor.br/carlos.html

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