quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Fábio Rocha (Antologia Poética)


LOBOS

Escrever
Meu corpo se enche de emoções dementes,
como uma taça sob torneiras intermitentes.
Se não fosse a poesia,
para onde ela transbordaria?

FÉRIAS

A Fábio, Eduardo, Suzana e José Ronaldo Neto

Lá vai o turista
subindo a ladeira.
E corre o pivete
atrás da carteira...
Lá vem o turista
descendo a ladeira.

JARDIM

A Marta, Mário, Ilka e Salvador

Do velho terraço cheio de limo,
pedaço cinzento de sua infância,
via as sombras da grande amendoeira.
O balanço enferrujado,
as grandes e barulhentas folhas caídas...
Parecia algo intocado, sagrado.
Um copo de água estagnado
era visitado
por miúdos pardais sedentos.
As amêndoas serviam de giz
para escrever nas paredes
que era um menino feliz.

BRILHO

A Alessandra

Sempre haverá
estrelas no céu.
As nuvens passam,
as tempestades se acalmam...
Sempre haverá
estrelas no céu.
Pingue a última gota
de esperança do coração...
Sempre haverá
estrelas no céu.
E nelas verei teu sorriso.

CHUVA ATUAL

Vendo a chuva que cai agora,
lembro daquela
que choveu outrora.
Escorrendo pelas folhas, naquele dia...
Hoje chove a melancolia.
Há o frio, Há poças,
há o cheiro da chuva na terra,
há tristeza em cada gota.
Algo nas nuvens se move.
Quem chora quando chove?
O pior é que a cada dia,
aquilo que já choveu,
de novo jamais chover poderia.

O VIGIA

O vigia
vigia.
Raios de luz esguia
iluminam a rua vazia.
O vigia
vigia.
Uma brisa suave e fria
traz cheiro de terra molhada e assobia.
O vigia
vigia.
Em sua mente toca uma canção da utopia
que há muito não se ouvia.
Mas é triste a canção.
E só traz mais solidão
e melancolia.

DEFINIÇÃO

A Daishoo

A vida é
como a lágrima que cai.
De tristeza ou alegria,
cai com poesia.
Algumas caem rebeldes, brigando.
Outras se deixam levar.
Caem tristes, felizes, esperançosas,
melancólicas, rebeldes, carentes ou desgostosas.
Mas todas que dos olhos saem,
sem exceção, caem.
E feliz da gota
que chega ao mar,
após cair longamente,
a procurar.
E a comunhão eterna, total e imutável
encontrar.
(Não conte a ninguém não,
mas algumas gotas que se juntam tem essa sensação,
mesmo antes do fim da queda.)

SOLIDÃO

Não estou só.
Há ácaros em minha pele,
insetos escondidos em meu quarto,
células estranhas em meu sangue,
vírus em animação suspensa no ar
e sua forte presença
em meu coração.

Fonte:
ROCHA, Fábio. A Magia da Poesia. Rio de Janeiro: Papel Virtual Editora, 2000.
Editoração Eletrônica: Ana Petrik Magalhães

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