terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Trova Ecológica 71 - Wanda de Paula Mourthè (MG)

Primeros Juegos Florales de Concepción - Chile - 2012 (Classificação Final)


Tema: IDENTIDADE

VENCEDORES:
(Por ordem alfabética)


A A de Assis (PR)
Entre o pássaro e o poeta
há perfeita identidade:
seu canto só se completa
se há completa liberdade.

A A de Assis (PR)
Bendita seja a nação
que tem como identidade
a cultura, a educação,
sobretudo a honestidade!

Carolina Ramos (SP)
Quem abraça a caridade,
sem esperar recompensa,
demonstra maior bondade,
se a identidade dispensa!

Clênio Borges (RS)
Felizes os corações
se a paz, em vez da maldade,
unir todas as nações
pela mesma identidade.

Ivone Taglialegna Prado (MG)
Se na saudade me enlaço,
e as esperanças se vão,
a identidade refaço
com retalhos de ilusão!

Mara Melinni de Araújo Garcia (RN)
Meu senhor, por caridade,
não me julgue em atos vãos...
Trago a minha identidade
nos calos das minhas mãos.

Renata Paccola (SP)
É na busca pela paz
e o conhecimento novo
que tantas vezes se faz
a identidade de um povo!

Rodolpho Abbud (RJ)
Prisioneiro da saudade,
escravo eterno do amor,
que, na minha identidade,
conste apenas, "Trovador"!

Vanda Fagundes Queiroz (PR)
Deus, oleiro de artes santas,
com saber, amor e zelo,
molda identidades... tantas...
sem repetir o modelo!
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MENÇÃO HONROSA:
(Por ordem alfabética)


Carolina Ramos (SP)
Mostrando a mão calejada,
exibe o trabalhador,
a identidade sagrada,
a prova do seu labor!

Clenir Neves Ribeiro (RJ)
Tenho tanta afinidade
e te amo,com tal apreço,
que na minha identidade
tem teu nome e endereço!

Edmar Japiassú Maia (RJ)
Da identidade ou do amor,
quando a perda se anuncia,
não se assuma um perdedor:
-Recorra à segunda via!

Mara Melinni de Araújo Garcia (RN)
Identidade é o segredo
que revela muito mais
do que a marca do teu dedo
e das tuas digitais...

Mara Melinni de Araújo Garcia (RN)
A identidade que encobre
cada não e cada sim,
vem da verdade mais nobre
que eu trago dentro de mim...!

Maurício Cavalheiro (SP)
Podem tentar arrancar
a identidade de um povo;
mas a raiz vai ficar
e a fará brotar de novo.

Nei Garcez (PR)
Só quem vive sem vaidade,
difundindo o que é o amor,
tem a mesma identidade
de seu próprio Criador.

Neide Rocha Portugal (PR)
Quando a vida não descora
a identidade dos brilhos,
o nosso brilho de outrora
se reflete em nossos filhos.

Relva do Egypto Rezende Silveira (MG)
Tu partiste!... E, no abandono,
perdi minha identidade,
pois nem de mim sou mais dono,
sendo escravo da saudade.

Renato Alves (RJ)
Brasileiro, professor,
casado, Terceira Idade
e aprendiz de trovador...
- Eis a minha identidade!

Rodolpho Abbud (RJ)
De um sonho de amor, perfeito,
que ela sem dó desprezou,
resta-me a placa,no peito,
que indaga, apenas:"Quem sou?"

Rodolpho Abbud (RJ)
Já fui sonho, fui saudade,
sombra e luz, frio e calor...
Perdi minha identidade,
quando perdi seu amor!

Wanda de Paula Mourthé (MG)
Pode ser uma utopia,
mas persigo a identidade
– que espero alcançar um dia –
entre o sonho e a realidade!

Wanda de Paula Mourthé (MG)
Nada deixou... nem saudade,
porque levou, na partida,
não só minha identidade,
mas a minha própria vida!

Wandira Fagundes Queiroz (PR)
Dos pais nos vêm a genética,
identidade e valores,
e de Deus a alma poética,
que acalanta os sonhadores.

Wandira Fagundes Queiroz (PR)
Mesmo em trovas mais dispersas,
por laços universais,
identidades diversas
congregam sonhos iguais.
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MENÇÃO ESPECIAL:
(Por ordem alfabética)


Ademar Macedo (RN)
Eu, tal qual num dossiê,
confesso e juro...É verdade:
de tanto eu “viver você,”
perdi minha identidade...

Delcy Canalles (RS)
Era tanta a identidade
que, entre nós dois, existia,
que até nossa intimidade,
nos versos , aparecia!

Dodora Galinari (MG)
Em toda manhã nascida
vê-se a mesma identidade:
dar mais vida à própria vida,
acordando a humanidade!

João Costa (RJ)
A perfeita identidade
de um poeta sonhador
é sua autenticidade
de Mensageiro do Amor.

Josafá Sobreira da Silva (RJ)
Teu jeito grácil me cega,
mas me aponta uma verdade:
se, entre dois, irrompe a entrega,
brota a mesma identidade!

Maria Conceição Fagundes (PR)
A UBT fez seu aceno
e encontrou identidade,
e a "rosa" em solo chileno
floresce em fraternidade!

Maria Lucia de Godoy Pereira (MG)
Encantar a humanidade
seja sempre a nossa meta,
fazer jus à identidade
de ser simplesmente poeta.

Roberto Resende Vilela (MG)
A educação esmerada,
ao preparar para o novo,
conduz, em sua escalada,
à identidade de um povo.

Sérgio Ferreira da Silva (SP)
Ante à multiplicidade
dos sentimentos que lavra,
o poeta é a identidade
de toda e qualquer palavra.

Thereza Costa Val (MG)
Tantas vezes disfarcei
o que sinto de verdade
que, agora, nem mesmo eu sei
qual a minha identidade!

Thereza Costa Val (MG)
Somos dois... mas somos um!
Temos tanta afinidade
que, entre nós, tudo é comum,
até mesmo a identidade...

Vanda Alves da Silva (PR)
Amizade e lealdade,
sempre juntas, de mãos dadas,
correntes de identidade
entre almas entrelaçadas!

Vanda Fagundes Queiroz (PR)
Temos vida paralela:
- a identidade pessoal
e o valor de ser parcela
na amplitude universal.

Comissão Julgadora para os I Jogos Florais de Concepción- Chile-2012:
Tema: IDENTIDADE- para Trovadores do Brasil e Portugal

Eduardo A O Toledo
Luiz Antonio Cardoso
Dorothy Jansson Moretti
Domitila Beltrame
Jose Ouverney
Marcos Medeiros

Coordenadores: Gislaine Canales
Jairo Gerak Millalonco Velásquez


Fonte:
Gislaine Canales, enviado por A. A. de Assis

José Expedito Rêgo (Vaqueiro e Visconde)


Em 1981, José Expedito de Carvalho Rego, publicou seu primeiro livro, Né de Sousa, biografia romanceada do Visconde da Parnaíba. Esse livro teve uma segunda edição, sob o título de Vaqueiro e Visconde.

Neste romance, José Rego retrata a trajetória de Manoel de Souza Martins, o Visconde de Parnaíba, revelando uma possibilidade de trajetória infantil no Piauí do século XIX, construída em meio rural, dando conta da existência de práticas diversas, construídas fora dos quadrantes escolares. O menino Né de Sousa, personagem do romance, embora tenha até aprendido a ler e a realizar alguns cálculos aritméticos com familiares, recebeu do vaqueiro Afonso as lições que o iniciaram na arte de campear o gado, de saber achar as vacas manhosas que escondiam as crias, a manusear o ferrão para auxiliar na captura dos bois, a laçar e derrubar os mais renitentes, a encaretá-los e levar até o curral, a curar as bicheiras, a conhecer a hora de cobrir os animais, saberes práticos que eram repassados às gerações mais novas no contato direto e cotidiano.

A obra aborda a vida de uma figura muito discutida da história piauiense e que lutou pela causa da emancipação política do estado: Manuel de Sousa Martins, o Visconde da Parnaíba. A ficção e a história são formulações da linguagem que apresentam um estreitamento de relações. Vários escritores buscam na História recursos para escreverem os seus romances.

José Expedito de Carvalho Rêgo soube retratar perfeitamente fatos históricos nesta obra. O romance cobre um vasto período de tempo, desde o nascimento do herói, em 1767 até a mudança da capital de Oeiras para Teresina, quando ele já se encontrava velho e em declínio.

Para uma melhor compreensão da obra, faz-se necessário que o leitor tenha alguma noção da História do Piauí.

Né Martins, pai de Né de Sousa, era pobre, mas portador de muita saúde e disposição para o trabalho. Ao se casar com Donana Rodrigues, recebeu como presente de casamento do seu sogro a fazenda Serra Vermelha, onde moravam quando nasceu Né de Sousa, primeiro filho do casal.

Né de Sousa, como era conhecido na redondeza, teve uma instrução que se resumia em aprender a ler e a contar, iniciando-se na língua latina com um tio afim – o Sargento-Mor Marcos Francisco de Araújo Costa.

Órfão de pai, teve que fazer-se homem prematuramente. Antes dos dezesseis anos já era o braço direito da mãe viúva. Auxiliava nos trabalhos da fazenda e na educação dos irmãos mais novos. Ingressou na carreira militar, o que representava a possibilidade de ascensão social e aquisição de títulos. Durante sua adolescência e mocidade trabalhava com afinco no intuito de aumentar o patrimônio da família, que fora herdado do pai e da avó e madrinha.

Casou, na flor da idade com sua prima Josefa Maria dos santos, com quem teve três filhos. Aos setenta e sete anos, contraiu segundas núpcias, a pedido do seu filho João, com a viúva Maria Benedita Dantas. Desse segundo casamento não teve filhos. Homem muito sensual, mesmo nos primeiros anos de casamento Josefa não lhe satisfazia mais completamente e, após o terceiro parto, tornou-se inútil para o amor.

Obrigado a encontrar uma saída para as suas necessidades sexuais, envolve-se com Sebastiana, conhecida carinhosamente como Tiana, uma mulata bem clara, filha do vaqueiro de uma de suas fazendas, a quem amou muito, quiçá até mais que sua esposa, que tinha uma saúde debilitada.

Quando Tiana faleceu, repentinamente, sentiu-se mais viúvo do que se tivesse perdido a esposa legítima, que passou a cuidar das filhas da amante do marido. Deixou numerosos bastardos, a quem amparou e educou com desvelo.

Manuel de Sousa Martins, homem de grande influência, prestou relevantes serviços à causa da emancipação política do Piauí, governando-o, depois por largos anos. Recebeu prêmios honoríficos como a Comenda da Ordem de Cristo, o Oficialato, Dignatário do Cruzeiro, o foro de Fidalgo Cavaleiro da Casa Imperial, o título de Barão da Parnaíba e por fim o de Visconde.

A partir da derrota na eleição de 7 de abril de 1822 começou a desarmonia entre Manuel de Sousa Martins e o governo, o que o levou a abraçar a causa do partido separatista e a trabalhar pela realização da Independência.

Sousa Martins é a figura mais discutida da história piauiense. À frente do Governo Provisório, tomou medidas acertadas e trabalhou com afinco, dirigindo a luta em toda a Província. Passou quase vinte anos no governo, desde a independência, em 1823, até 1843, na qualidade de presidente, o que garantiu ao Piauí a estabilidade social exigida pelo momento nacional. Fiel aos princípios e ditames de sua fé: a ordem e a disciplina, governou a província com pulso seguro e firme:

Estava caduco, podia morrer. Cumprira a missão. Os filhos criados dele não precisavam, nem Oeiras, a capital ia mudar para a Vila Nova do Poti. Os velhos fantasmas de Serra Vermelha brincavam na mente do velho visconde. (pág. 239)

Cometeu erros e tinha conhecimento dos mesmos porém esses erros eram frutos da malquerença e de paixão, foram antes do sistema de governo que do governante. Foi um instrumento do regime nascente, personalista e arbitrário de Pedro I.

A 24 de janeiro de 1823, Manuel de Sousa Martins aclamou D. Pedro Imperador do Brasil, com a adesão de todo o povo ao novo regime. Foi em Oeiras que se deu a Independência, estabelecendo-se novo Governo e destituindo-se as autoridades portuguesas.

O Visconde nunca esqueceu sua origem humilde. Foi um presidente que boa convivência. Inspirava respeito, foi temido. Recebia a todos com afabilidade, na simplicidade de seus trajes caseiros. Muitas vezes, seu despotismo serviu para abrandar as calamidades públicas.

Né de Sousa aparece na obra Vaqueiro e Visconde como um ser humano, com suas amantes e filhos bastardos, cercado por figuras adejam sempre ao lado dos poderosos. É um romance sócio-político. Em todas as atividades e movimentos dos quais participou (Guerra pela Independência, Batalha do Jenipapo, Revolução dos Balaios, Rebelião de Pinto madeira) assumia compromisso de fidelidade para com os fatos e a história do Estado.

Conseguira tudo o que um homem poderia conquistar em uma cidade como Oeiras: poder, riqueza, prestígio, admiração de amigos, amor das mulheres e ódio dos inimigos. Teve a lealdade incondicional de muitos, foi bajulado por outros, desprezou o rancor dos invejosos. Dedicou-se acima de tudo à família e aos amigos. A morte levara as odiosidades, afastara os seres de sua maior estima, mas o desgosto maior de sua vida era a desunião da família, principalmente com seu irmão Joaquim Martins de Sousa.

Depois de exonerado da política, da administração, do prestígio, do sexo, aos oitenta anos, Né de Sousa assistia à decadência de Oeiras e na sua mente brincavam os fantasmas de sua meninice e de sua adolescência na Serra Vermelha:

Oeiras entrava em agonia, em decadência, se não viesse a desaparecer por completo. Ouvia-se falar em cidades extintas. Talvez se preservasse Oeiras, quando menos como cidade-relíquia. Oeiras era a própria história do Piauí. E Né de Sousa participava dessa história. Seu nome estaria ligado para sempre ás lutas da Independência e da Balaiada. Se Oeiras morrer, o Piauí perderá grande parte de sua vida. (pág. 239)

Vale ressaltar que, além do caráter histórico-instrucional, encontramos na obra vários aspectos relevantes a todo grande romance, como: o choque de ambições, a análise profunda da natureza humana, a revelação de ideologias, cenas idílico-amorosas, o amor na extensão dos desejos, tramas, conspirações, deslealdades, traições, ou seja, tudo que torna a leitura agradável e envolvente, integram o vasto universo de uma narrativa ficcional, mas com a presença de uma realidade humana e social exposta com segurança e equilíbrio.

A quase totalidade das personagens é real: Né Miranda é Manuel Inácio de Miranda Osório, figura muito conhecida no cenário político da Oeiras antiga; Padre marcos, Padre Pinto do Lago, o médico José Luiz de quem fala Gardner em seu livro Viagens pelo interior do Brasil são reais e familiares do autor de Vaqueiro e Visconde.

Apesar de o livro basear-se na História, apresenta partes de pura ficção. Lacunas da História foram preenchidas com a imaginação.

Todos os que conhecem a história do Visconde da Parnaíba sabem que ele teve amantes e filhos bastardos, mas ninguém conhece o nome das amantes. José Expedito criou então Tiana e Miquelina, amantes de Manuel de Sousa Martins. A obra apresenta também outros personagens de ficção: Zé Rolinha, apesar de fictício é perfeitamente verossímil; Dr. Pedroso, personagem inventado, que representa a oposição da classe média ao governo do famoso Né de Sousa.

José Expedito Rego diz que o Visconde da Parnaíba: Foi um grande homem, com defeitos e qualidades inerentes a todo ser humano e que foi sobretudo um produto da época em que viveu.

Com uma linguagem leve, apurada, acessível, com o uso de frases e expressões comuns ao seu tempo, o autor de Vaqueiro e Visconde expôs as virtudes e defeitos próprios do ser humano comum, descrevendo o visconde à imagem e semelhança dos homens simples e corajosos que construíram a história do Piauí.

José Expedito, um dos maiores romancistas da cidade de Oeiras soube com perfeição abordar temas dentro da obra, tudo dentro de um único contexto, onde o personagem protagonista, Manuel de Sousa Martins, se apresenta de forma sutil e ao mesmo tempo marcante, num cenário bastante diversificado.

Fonte:
Profa. Maria Cristina Araújo de Sousa, in Passeiweb.

Emilio de Menezes (Poemas Esparsos I)


TUAS TRANÇAS
A’ ...
.

Tudo o que eu vejo, me rodeia e fala,
Desde o arrulo das pombinhas mansas
Até dos sinos o tanger monótono,
Venham falar-me de tuas longas tranças...

Ai quantas noites em que o luar flutua
E a brisa geme dos pinheirais nas franças...
Eu vou sozinho, soluçando a medo
Beijar a sombra de tuas negras tranças

Ai... a lembrança dessa noite infinda
Em que voavas na rapidez da valsa
Deixou minh'alma retalhada em dores
Presa nos elos que essa trança enlaça;

É que inda hoje eu conservo intactas
As doces frases do valsar em meio
É que inda agora julgo estar sentindo
Arfar teu seio em delirante anseio;

O doce hálito que exalavas rindo
As meigas falas... o teu sorrir de então
Ai ... tudo... tudo para mim recorda
Louca esperança que alimentava em vão.

É que eu nutria essa esperança frívola,
Falsa quimera que se esvai e finda,
É que eu te adoro, te venero, santa
E curto em silêncio essa dor infinda

Por isso eu hei de como sempre amar-te
Preso nas chamas que do ar tu lanças
Dizer-te, sabes o que eu desejo, louco?
— Morrer envolto nas tuas negras tranças.

CONSOLO

Tudo! ... tudo morreu, mas n'alma brota Uma esperança ainda.
SÊNIO


A alma aberta. . . e chega-me a saudade
Do meu amor — coitado! — a enchê-la. . . a enchê-la...
Como me enchia o peito a felicidade
Dos bons sorrisos, dos carinhos dela.

E o martírio e a tristeza agora é tê-la
Ausente — ausente! ... e a cruel vontade
Que avulta e eu a tenho e é de vê-Ia,
Inda mais cresce aqui na soledade.

Mas nesta ausência em que — só de pensar —
Sinto que a vida vai-se me acabando,
Inda vem-me — feliz! — acalentar

As esperanças que ela dava quando,
— Cego de amor que a luz vai mendigando —
Ia pedir-lhe a esmola de um olhar.

SÚPLICA
Deixa esses mortos graves,Quero a luz desse olhar ase me consola.
( L. CORREIA: "Canção" — Volatas )


Se o teu olhar me conta, magoado,
Quando a dor me tem feito dentro d'alma,
Inda que o lábio cale, descorado,
Este martírio que o teu riso acalma,

E se deste sofrer encontro a palma
No teu piedoso riso, imaculado,
Por que não volves à alegria, à calma?
Por que me deixas triste e amargurado?

Descerra o lábio! A dor, o esquecimento;
Lança-me o sol do teu sorriso, basta
Para aquecer-me a alma em desalento.

A nuvem do pesar do rosto afasta:
— longe de nós a mágoa, o sofrimento;
Limpa-me o céu da tua fronte casta!

A UM RETRATO

Até vós! até vós! talismã sagrado
Daquele morto amor, daquele amor eterno,
Ides deixar-me só, e triste, e abandonado!
Ó meu fiel amigo, inseparável, terno!

Oh! meu leal companheiro, oh! testemunho amado
Deste sofrer sem termo, este martírio interno;
Até vós! até vós! a quem só hei confiado
Os meu dias de céu e os meus dias de inferno,

Ides abandonar-me, ides voltar contente,
Sujeitar-vos, feliz, ao doce julgo dela;
Mas quero que volteis tão límpido e nitente,

Que na morta expressão de vossa fronte bela
Não se note o vestígio, — esse vestígio ardente
Das lágrimas de dor que derramei por ela!

ASPIRAÇÃO

De uma vida sem fé ao glacial inverno
Furtei-me sacudindo o gelo da descrença.
Aquece-me outra vez este calor interno,
Anima-me outra vez uma alegria intensa.

Sinto voltar-me a minha antiga crença,
Creio outra vez no céu e no descanso eterno,
Pois creio em teu olhar, e na ventura imensa
Que ele encerra, e me mostra apaixonado e terno.

E quando deste corpo a alma arrebatada
Seja, e procure, flor, essa região sagrada
Que aos bons é concedida, esplêndida, a irradiar,

Aos sons celestiais de apaixonado hino
Abra-se para ela, olímpico, divino,
O infinito céu do teu sereno olhar.

O VIOLINO

São, às vezes, as surdinas
Dos peitos apaixonados
Aquelas notas divinas
Que ele desprende aos bocados...

Tem, ora os prantos magoados
Dessas crianças franzinas,
Ora os risos debochados
Das mulheres libertinas...

Quando o ouço vem-me à mente
Um prazer intermitente...
A harmonia, que desata,

Geme, chora... e de repente
Dá uma risada estridente
Nos "allegros" da Traviata.

A UM PESSIMISTA

Olhas o céu e o céu, todo em atra gangrena,
Se te mostra corroendo as rútilas esferas.
Baixas à terra o olhar e a terra, em outras eras,
Plena de gozo e amor, ora é de horrores plena.

Sangra a etérea região, sangra a região terrena
E o horizonte, que as une, inda mais dilacera-as.
E as próprias linhas — louco! em que a sânie verberas,
Podres vêm ao papel, podres brotam-te à pena.

Mas, se ao céu e se à terra, e se ao horizonte e ao verso,
Asco e náusea tressuando, a podridão atrelas
E nela vês tombar e fundir-se o universo,

Sobe do chão o olhar, baixa-o das nuvens belas
E volve-o dentro em ti, pois fora o tens imerso
Na própria irradiação das tuas próprias mazelas.

DIAFANEIDADES

Brumas, névoas, no espírito doentio
Passem-me, embora veladoramente,
Tu surgirás eterna flor do estio,
Radiante, rubra, tentadora, ardente.

Toldem-me a vista sóis, e fio a fio,
Trama ofuscante me perturbe a mente,
Eu te verei, eterna flor do frio,
Fria, polar, consoladora, albente.

Visão de fogo, aparição de gelo,
O mágico poder, estranho e raro,
Dás-me de tudo a ver, nítido e belo.

Pois tudo em ti, de amor abrigo e amparo,
Faz-se como este amor que tu'alma fê-lo
Diáfano, leve, transparente, claro.

LESMA

Passas. Ouço o rugir do vento que te leva!
Quando, da Arte, me ajoelho, no mystico delubro
Tu vens, lúdicro arfando, e ao espaço, a crocitar na treva.
E o impotente, o bêbado eu descubro.

Alimenta-te a inveja. O despeito te ceva.
O álcool atou-te a voz rouca e deu-te esse olhar rubro,
Que é o único clarão que do teu ser se eleva.
Mísero, a que do orgulho do régio manto encubro.

Anda! Beija-me nos pés, a clâmide inconsútil.
Eu piedoso Ca estendo ao desespero inerme!
Tu não és venenoso, o teu esforço é inútil!

O teu dente sutil não me passa a epiderme,
Oh! fonte do banal! oh! nascente do fútil!
Larva! tens o perdão! Tens a piedade, oh! verme!

INSTANTE NEGRO

Anda, acima de nós, na abóbada infinita
Em sinistro remígio, algum sinistro corvo
Que grasna ao nosso mal e à nossa dor crocita
Pondo, entre nós e o sol o seu feral estorvo!

Anda, abaixo de nós, uma víbora aflita
Que assalta o nosso sangue e o suga sorvo a sorvo!
A terra é para nós uma furna maldita.
O céu é para nós um teto negro torvo!

Terra e céu, contra nós, se conspiraram ambos.
A vida é um volutabro, e o sofrer não se exprime
Com que andamos por ela esfalfados e bambos.

Nem mais ao próprio poeta há um amor que o reanime,
— Em vez dele hoje entoar, himnos e dithyrambos,
Canta a glória suprema e a volúpia do Crime! ...

Fonte:
Obra Reunida, de Emílio de Menezes. RJ: Livraria José Olympio, 1980.

Pedro Malasartes (De como Malasartes Faz Mais Uma que Parecia Duas )


Eram já por umas dez da noite. O Malasartes bateu à porta e pediu pousada, dando o nome de doutor Fulano, que vinha visitar aquela terra. O Juiz costumava entrar tarde, pois ficava até à meia-noite fora de casa, jogando marimbo com um seu compadre. E vai então o filho do Juiz na sua simplicidade, mandou entrar o hóspede e, depois de um bom chá, deu-lhe pousada, no quarto da sala, onde o Juiz costumava se vestir. E quando o Juiz chegou, o filho lhe contou o que se tinha passado e o tolo ficou muito satisfeito daquela hospedagem.

E vai então lá pela madrugada o Malasartes começou a sentir umas coisas na barriga...Procurou o vaso e, não o encontrando, abriu a janela... mas lá fora havia uma cachorrada, que foi um barulho de latidos que nunca se viu.

O Malasartes estava suando frio: Mas nisto avistou na prateleira uma caixa. Abriu, havia dentro uma cartola de pelo. Estava salvo! Tirou a cartola, fez nela o que quis, pôs outra vez na caixa e esta no lugar onde antes estava.

De manhã, quando ouviu tropel dos criados saiu e... este mundo é meu!...

Quando vieram chamar o Malasartes para o café, não o acharam mais.

À hora do almoço, o Juiz saiu do quarto e foi para o cômodo em que se costumava vestir.

Era dia de júri. Vestiu a sobrecasaca, e, distraído, tirou a cartola que enterrou, de um golpe, na cabeça.

Para que tal fizeste! Ficou com a cara enlameada e sentiu um cheiro que quase o afogou. Começou então a gritar. A família veio toda, pensando que tinha acontecido alguma desgraça. Ao vê-lo naquele estado, correram todos a buscar socorro. O filho trouxe-lhe um banho, a filha água florida, a mulher sabonete de cheiro.

E depois houve risada que não foi brinquedo, enquanto o Juiz bufava de raiva. E os jurados já estavam cansados de esperar por ele...

Mas o Malasartes já estava longe. Até parecia que tinha parte com Beizebum.

Machado de Assis (Queda que as Mulheres Têm para os Tolos)


ADVERTÊNCIA

Este livro é curto, talvez devera sê-lo mais.

Desejo que ele agrade, como me sai das mãos; mas é com pesar que me vanglorio por esta obra.

Falar do amor das mulheres pelos tolos, não é arriscar ter por inimigas a maioria de um e outro sexo?

Diz-se que a matéria é rica e fecunda; eu acrescento que ela tem sido tratada por muitos. Se tenho, pois, a pretensão de ser breve, não tenho a de ser original.

Contento-me em repetir o que se disse antes de mim; minhas páginas conscienciosas são um resumo de muitos e valiosos escritos. Propriamente falando, é uma comparação científica, e eu obteria a mais doce recompensa de meus esforços, como dizem os eruditos, se inspirasse aos leitores a idéia de aprofundar um tão importante exemplo.

Quanto à imparcialidade que presidiu à redação deste trabalho, creio que ninguém a porá em dúvida.

Exalto os tolos sem rancor, e se critico os homens de espírito, é com um desinteresse, cuja extensão facilmente se compreenderá.

I

Il est des noeuds secrets, il est des sympathies.

Passa em julgado que as mulheres lêem de cadeira em matéria de fazendas, pérolas e rendas, e que, desde que adotam uma fita, deve-se crer que a essa escolha presidiram motivos plausíveis.

Partindo deste princípio, entraram os filósofos a indagar se elas mantinham o mesmo cuidado na escolha de um amante, ou de um marido.

Muitos duvidaram.

Alguns emitiram como axioma, que o que determinava as mulheres, neste ponto, não era, nem a razão, nem o amor, nem mesmo o capricho; que se um homem lhes agradava, era por se ter apresentado primeiro que os outros, e que sendo este substituído por outro, não tinha esse outro senão o mérito de ter chegado antes do terceiro.

Permaneceu por muito tempo este sistema irreverente.

Hoje, graças a Deus, a verdade se descobriu: veio a saber-se que as mulheres escolhem com pleno conhecimento do que fazem. Comparam, examinam, pesam, e só se decidem por um, depois de verificar nele a preciosa qualidade que procuram.

Essa qualidade é... a toleima!

II

Desde a mais remota antiguidade, sempre as mulheres tiveram a sua queda para os tolos.

Alcibíades, Sócrates e Platão foram sacrificados por elas aos presumidos do tempo. Turenne, La Rochefoucauld, Racine e Molière, foram traídos por suas amantes, que se entregaram a basbaques notórios. No século passado todas as boas fortunas foram reservadas aos pequenos abades. Estribadas nesses exemplos, as nossas contemporâneas continuaram a idolatrar os descendentes dos ídolos das suas avós.

Não é nosso fim censurar uma tendência, que parece invencível; o que queremos é motivá-la.
Por menos observador e menos experiente que seja, qualquer pessoa reconhece que a toleima é quase sempre um penhor de triunfo. Desgraçadamente ninguém pode por sua própria vontade gozar das vantagens da toleima. A toleima é mais do que uma superioridade ordinária: é um dom, é uma graça, é um selo divino.

"O tolo não se faz, nasce feito."

Todavia, como o espírito e como o gênio, a toleima natural fortifica-se e estendesse pelo uso que se faz dela. É estacionária no pobre-diabo, que raramente pode aplicá-la; mas toma proporções desmarcadas nos homens a quem a fortuna, ou a posição social cedo leva à prática do mundo. Este concurso da toleima inata e da toleima adquirida é que produz a mais temível espécie de tolos, os tolos que o acadêmico Trublet chamou "tolos completos, tolos integrais, tolos no apogeu da toleima."

O tolo é abençoado do céu pelo fato de ser tolo, e é pelo fato de ser tolo, que lhe vem a certeza, de que, qualquer carreira que tome, há de chegar felizmente ao termo. Nunca solicita empregos, aceita-os em virtude do direito que lhe é próprio: Nominor leo. Ignora o que é ser corrido ou desdenhado; onde quer que chegue, é festejado como um conviva que se espera.

O que opor-lhe como obstáculo? É tão enérgico no choque, tão igual nos esforços e tão seguro no resultado! É rocha despegada, que rola, corre, salta e avança caminho por si, precipitada pela sua própria massa.

Sorri-lhe a fortuna particularmente ao pé das mulheres. Mulher alguma resistiu nunca a um tolo. Nenhum homem de espírito teve ainda impunemente um parvo como rival. Por quê?... Há necessidade de perguntar por quê? Em questão de amor, o paralelo a estabelecer entre o tolo e o homem de siso, não é para confusão do último?

III

Em matéria de amor, deixa-se o homem de espírito embalar por estranhas ilusões. As mulheres são para ele entes de mais elevada natureza que a sua, ou pelo menos ele empresta-lhes as próprias idéias, supõe-lhes um coração como o seu, imagina-as capazes, como ele, de generosidade, nobreza e grandeza.

Imagina que para agradar-lhes é preciso ter qualidades acima do vulgar. Naturalmente tímido, exagera mais ao pé delas a sua insuficiência; o sentimento de que lhe falta muito, torna-o desconfiado, indeciso, atormentado. Respeitoso até à timidez, não ousa exprimir o seu amor em palavras; exala-o por meio de uma não interrompida série de meigos cuidados, ternos respeitos e atenções delicadas. Como nada quer à custa de uma indignidade, não se conserva continuamente ao pé daquela que ama, não a persegue, não a fatiga com a sua presença. Para interessá-la em suas mágoas, não toma ares sombrios e tristes; pelo contrário, esforça-se por ser sempre bom, afetuoso e alegre junto dela.

Quando se retira da sua presença, é que mostra o que sofre, e derrama as suas lágrimas em segredo.

O tolo, porém, não tem desses escrúpulos. A intrépida opinião que ele tem de si próprio, o reveste de sangue frio e segurança. Satisfeito de si, nada lhe paralisa a audácia. Mostra a todos que a ama, e solicita com instância provas de amor. Para fazer-se notar daquela que ama, importuna-a, acompanha-a nas ruas, vigia-a nas igrejas e espia-a nos espetáculos. Arma-lhe laços grosseiros. À mesa, oferece-lhe uma fruta para comerem ambos, ou passa-lhe misteriosamente, com muito jeito, um bilhete de amores. Aperta-lhe a mão a dançar e saca-lhe o ramalhete de flores no fim do baile. Numa noite de partida, diz-lhe dez vezes ao ouvido: "Como é bela!", porquanto revela-lhe o instinto, que pela adulação é que se alcançam as mulheres, bem como se as perde, tal como acontece com os reis. De resto, como nos tolos tudo é superficial e exterior, não é o amor um acontecimento que lhes mude a vida: continuam como antes a dissipá-la nos jogos, nos salões e nos passeios.

IV

O amor, disse alguém, é uma jornada, cujo ponto de partida é o sentimento, e cujo termo inevitável a sensação. Se é isto verdade, o que há a fazer, é embelecer a estrada e chegar o mais tarde possível ao fim. Ora, quem melhor do que o homem de espírito sabe parolar à beira do caminho, parar c colher flores, sentar-se às sombras frescas, recitar aventuras e procurar desvios e delongas?

Um caracol de cabelos mal arranjado, um cumprimento menos apressado que de costume, um som de voz discordante, uma palavra mal escolhida, tudo lhe é pretexto para demorar os passos e prolongar os prazeres da viagem. Mas quantas mulheres apreciam esses castos manejos, e compreendem o encanto dessas paradas à borda de uma veia límpida que reflete o céu? Elas querem amor, qualquer que seja a sua natureza, e o que o tolo lhes oferece é-lhes bastante, por mais insípido que seja.

V

O homem de espírito, quando chega a fazer-se amar, não goza de uma felicidade completa. Atemorizado com a sua ventura, trata antes de saber por que é feliz! Pergunta por que e como é amado; se, para uma amante, é ele uma necessidade, ou um passatempo; se ela cedeu a um amor invencível; enfim, se é ele amado por si mesmo. Cria ele próprio e com engenho as suas mágoas e cuidados; é como o Sibarita que, deitado em um leito de flores, sentia-se incomodado pela dobra de uma folha de rosa. Num olhar, numa palavra, num gesto, acha ele mil nuanças imperceptíveis, desde que se trata de interpretá-las contra si. Esquece os encômios que levemente o tocam, para lembrar-se somente de uma observação feita ao menor dos seus defeitos e que bastante o tortura. Mas, em compensação desses tormentos, há no seu amor tanto encanto e delícias! Como estuda, como extrai, como saboreia as volúpias mais fugitivas até a última essência! Como a sua sensibilidade especial sabe descobrir o encanto das criancices frívolas, dos invisíveis atrativos, dos nadas adoráveis!

O tolo é um amante sempre contente e tranqüilo. Tem tão robusta confiança nos seus predicados, que antes de ter provas, já mostra a certeza de ser amado. E assim deve ser. Em sua opinião faz uma grande honra à mulher a quem dedica os seus eflúvios. Não lhe deve felicidade; ele é que lha dá; e como tudo o leva a exagerar o benefício, não lhe vem à idéia de que se possa ter para com ele ingratidões. Assim, no meio das alegrias do amor, saboreia ainda a embriaguez da fatuidade. Mas como, em definitivo, é ele próprio o objeto de seu culto, depressa o tolo se aborrece, e como o amor para ele não é mais que um entretenimento que passa, os últimos favores, longe de o engrandecerem mais, desligam-no pela sociedade.

VI

O homem de espírito vê no amor um grande e sério negócio, ocupa-se dele como do mais grave interesse de sua vida, sem distração, nem reserva. Pode perder nele algumas das suas qualidades viris, mas é para crescer em abnegação, em dedicação, em bondade. Suporta tudo daquela que ama sem nada exigir dela. Quando ela atende a alguns dos seus votos, quando previne alguns dos seus desejos, longe de ensoberbecer-se, agradece com uma efusão mesclada de surpresa. Perdoa-lhe generosamente todos os males que lhe causa porque, muito orgulhoso para enraivecer-se ou lastimar-se, não sabe provocar, nem a piedade que enternece, nem o medo que faz calar. Oh! que inferno, se a má ventura lhe depara uma mulher bela e má, uma namoradeira fria de sentidos, ou uma moça de rabugice precoce!

Sofre então vivamente com a perfídia da mulher amada, mas desculpa-a pela fragilidade do sexo. A sua indulgência pode então conduzi-lo à degradação. Ele segue a olhos fechados o declive que o arrasta ao abismo, sem que a queixa, a ambição, a fortuna possam retê-lo.

O néscio escapa a estes perigos. Como não é ele quem ama, é ele quem domina. Para vencer uma mulher finge por alguns momentos o excesso de desespero e de paixão; mas isso não passa de um meio de guerra, tática de cerco para enganar e seduzir o inimigo. Logo depois recobra ele a tirania, e não a abdica mais. Para entreter-se nisso, tem o tolo o seu método, as suas regras, a sua linha de conduta.

É indiscreto por princípio, porquanto divulgando os favores que recebe, compromete a que lhe concede e ao mesmo tempo afasta as rivalidades nascentes. É suscetível pela razão, cioso por cálculo, a fim de promover estes proveitosos amuos, que lhe servem, a seu grado, para conduzir a uma ruptura definitiva, ou para exigir um novo sacrifício. Mostra uma cruel indiferença, indicando pouca confiança nas provas de simpatia que lhe dão. Num baile, proibindo à sua amante de dançar, não faz caso dela, de propósito. Aflige-a com aparências de infidelidade, falta à hora marcada para se encontrarem, ou, depois de se ter feito esperar, vem, dando desculpas equívocas de sua demora. Hábil em semear a inquietação e o susto, faz-se obedecer à força de ser tirano, e acaba por inspirar uma afeição sincera à força de promovê-la.

VII

O homem de espírito, assustado com o vácuo imenso, que deixa no coração uma afeição que se perde, só rompe o laço que o prende à causa de dilacerações interiores.

Como bem se disse, sendo preciso um dia para conseguir, é preciso mil para se reconquistar. Mesmo no momento em que volta a ser livre: quantas vezes um sorriso, um meneio de cabeça, uma maneira de puxar o vestido, ou de inclinar o chapelinho de sol, não o faz recair no seu antigo cativeiro!

De resto, a mulher, a quem ele tiver revelado o segredo do seu coração, ficará sempre para ele como ser à parte. Não a esquece nunca.

Morta, ou separado, nutre por aquela que a perdeu longas saudades. Perseguido pela lembrança que dela conserva, descobre muitas vezes que as outras mulheres por quem se apaixona só têm o mérito de se parecerem com ela. Dá-se ele então a comparações que o desvairam, que o irritam, que o põem fora de si, exigindo no seu trajar, no seu andar e até no seu falar alguma coisa que lhe recorde o seu implacável ideal.

E se é ele o abandonado, que de torturas que sofre!

Viver sem ser amado parece-lhe intolerável. Nada pode consolá-lo ou distraí-lo. No caso de tornar a ver os sítios que foram testemunhas da sua felicidade, evoca à sua memória mil circunstâncias perseverantes e cruéis. Ali está a cerca cheirosa, cujos espinhos rasgaram o véu da infiel; aqui, o rio que a medrosa só ousava atravessar amparada pela sua mão; além está a alameda, cuja areia fina parece ter ainda o molde de seus ligeiros passos. Contempla na janela as longas e alvas cortinas, no peitoril os arbustos em flor, na relva a mesa, o banco, as cadeiras em que outrora se sentaram.

É possível que ela tenha mudado tão de repente? Pois não foi ainda ontem que de volta de um passeio ao bosque, lhe enxugou o suor da testa, e que se prendia em doce e estranho amplexo?...

Hoje, nem mais doçuras, nem mais apertos de mão, nem mais dessas horas ébrias em que todo o passado ficava esquecido! Ele está só, entregue a si mesmo, sem força, sem alvo: é o delírio do desespero.

O tolo está acima dessas misérias. Não o assusta um futuro prenhe de qualquer inquietação aflitiva. Sempre acobertado pela bandeira da inconstância, desfaz-se de uma amante sem luta, nem remorsos; utiliza uma traição para voar a novas aventuras. Para ele nada há de terrível em uma separação, porque nunca supõe que se possa colocar a vida numa vida alheia, e que fazendo-se um hábito dessa comunidade de existência, faz-se pouco novamente sofrer, quando ela tiver de quebrar-se.

Da mulher, que deixa de amar, ele só conserva o nome, como o veterano conserva o nome de uma batalha para glorificar-se, ajuntando-o ao número das suas campanhas.

VIII

Há uma época em que custa-se muito a amar. Tendo visto e estudado um pouco a mulher, adquire-se uma certa dureza que permite aproximar-se sem perigo das mais belas e sedutoras. Confessa-se sem rebuço a admiração que elas inspiram, mas é uma admiração de artista, um entusiasmo sem ternura. Além disso, ganha-se uma penetração cruel para ver, através de todos os artifícios de casquilha, o que vale a submissão que elas ostentam, a doçura que afetam, a ignorância que fingem. E prenda-se um homem nessas condições!

De ordinário, é entre trinta a trinta e cinco anos, que o coração do homem de espírito fecha-se assim à simpatia e começa a petrificar-se. É possível que nele tornem a aparecer os fogos da mocidade, e que ele venha a sentir um amor tão puro, tão fervente, tão ingênuo como nos frescos anos da adolescência; longe de ter perdido as perturbações, as apreensões, os transportes da alma amorosa, sente-os ele de novo com emoção mais profunda e dá-lhes um preço tanto mais elevado, quanto ele está certo de não os ver renascer.

Oh! então lastima-se o pobre insensato! Ei-lo obrigado a ajoelhar-se aos pés de uma mulher para quem é nada o mérito de caminhar pouco e pouco atrás de sua sombra, de fazer exercício em torno aos seus vestidos, de se extasiar diante de seus bordados, de lisonjear os seus enfeites. Ai, triste! esses longos suplícios o revoltam, e, Pigmalião desesperado, afasta-se de Galatéia, cuj o amor se não pode reanimar.

Esses sintomas de idade são desconhecidos ao tolo, porquanto cada dia que passa não lhe faz achar no amor um bem mais caro, ou mais difícil a conquistar. Não tendo sido, nem melhorado, nem endurecido pelos reveses da vida, continuando a ver as mulheres com o mesmo olhar, exprime-lhes os seus amores com as mesmas lágrimas e os mesmos suspiros que lhes reserva para pintar os antigos tormentos. E como ele só exigiu sempre delas aparências de paixão, vem facilmente a persuadir-se que é amado. Longe de fugir, persevera e — triunfa.

IX

O homem de espírito é o menos hábil para escrever a uma mulher. Quando se arrisca a escrever uma carta, sente dificuldades incríveis. Desprezando o vasconço da galanteria, não sabe como se há de fazer entender. Quer ser reservado e parece frio; quer dizer o que espera e indica receio; confessa que nada tem para agradar, e é apanhado pela palavra. Comete o crime de não ser comum ou vulgar. As suas cartas saem do coração e não da cabeça; têm o estilo simples, claro e límpido, contendo apenas alguns detalhes tocantes. Mas é exatamente o que faz com que elas não sejam lidas, nem compreendidas. São cartas decentes, quando as pedem estúpidas.

O tolo é fortíssimo em correspondência amorosa, e tem consciência disso. Longe de recuar diante da remessa de uma carta, é muitas vezes por aí que ele começa. Tem uma coleção de cartas prontas para todos os graus de paixão. Alega nelas em linguagem brusca o ardor de sua chama; a cada palavra repete: meu anjo, eu vos adoro. As suas fórmulas são enfáticas e chatas; nada que indique uma personalidade. Não faz suspeitar excentricidade ou poesia; é quanto basta; é medíocre e ridículo, tanto melhor. Efetivamente o estranho que ler as suas missivas, nada tem a dizer; na mocidade o pai da menina escrevia assim; a própria menina não esperava outra coisa. Todos estão satisfeitos, até os amigos. Que querem mais?

X

Enfim, o homem de espírito, em vista do que é, inspira às mulheres uma secreta repulsa. Elas se admiram com o ver tímido, acanham-se com o ver delicado, humilham-se com vê-lo distinto.

Por muito que ele faça para descer até elas, nunca consegue fazê-las perder o acanhamento; choca-as, incomoda-as, e esse acanhamento, de que ele é causa, torna frias as conversações mais indiferentes, afasta a familiaridade e assusta a inclinação prestes a nascer.

Mas o tolo não atrapalha, nem ofusca as mulheres. Desde a primeira entrevista, ele as anima e fraterniza-se com elas. Eleva-se sem acanhamento nas conversas mais insulsas, palra e requebra-se como elas. Compreende-as e elas o compreendem. Longe de se sentirem deslocadas na sua companhia, elas a procuram, porque brilham nela. Podem diante dele absorver todos os assuntos e conversar sobre tudo, inocentemente, sem conseqüência. Na persuasão de que ele não pensa melhor, nem contrário a elas, auxiliam o triste, quando a idéia lhe falta, suprem-lhe a indigência. Como se fazem valer por ele, é justo que lhe paguem, e por isso consentem em ouvi-lo em tudo. Entregam-lhe assim os seus ouvidos, que é o caminho do seu coração, e um belo dia admiram-se de ter encontrado no amigo complacente um senhor imperioso!

XI

Compreende-se, por este curto esboço, como e quanto diferem os tolos e os homens de espírito nos seus meios de sedução. A conclusão final é, que os tolos triunfam, e os homens de espírito falham, resultado importante e deplorável, nesta matéria sobretudo.

XII

Depois de ter indagado as causas da felicidade dos tolos, e da desgraça dos homens de espírito: perderemos tempo precioso em acusar as mulheres? Não hesitamos em deitar as culpas sobre os homens de espírito, como fez o profundo Champcenets.

Por que não estudam os tolos, diz-lhes este autor, para conseguir imitá-los? Há de custar-vos muito fazer um tal papel: mas há proveito sem desar? E depois, quando assim sois a isso obrigado, visto como não vos dão outro meio de solução, querer subtrair o belo sexo a império dos tolos, descortinando-lhe a perversidade do seu gosto, é coisa em que ninguém deve pensar, é uma loucura; fora o mesmo que querer mudar a natureza, ou contrariar a fatalidade.

Porquanto, ficai sabendo, continua Champcenets, que as mulheres não são senhoras de si próprias; que nelas tudo é instinto ou temperamento, e que portanto elas não podem ser culpadas de suas preferências. Só respondemos pelo que praticamos com intenção e discernimento. Ora, qual delas pode dizer que predileção a impele, que paixão a obriga, que sentimento a faz ingrata, ou que vingança lhe dita as malignidades? Debalde procurareis delas tão cruel prodígio; nenhuma é cúmplice do mal que causa: a este respeito, o seu estouvamento atesta-lhes a candura.

Por que vos obstinais em pedir-lhes o que a Providência não lhes deu? Elas se apresentam belas, apetitosas e cegas: não vos basta isto? Querê-las com juízo, penetrantes e sensíveis, é não conhecê-las.

Procurai as mulheres nas mulheres, admirai-lhes a figura elegante e flexível, afagai-lhes os cabelos, beijai-lhes as mãos mimosas; mas tomai como um brinquedo o seu desdém, aceitai os seus ultrajes sem azedume, e às suas cóleras mostrai indiferença. Para conquistar esses entes frágeis e ligeiros, é preciso atordoá-los pelo rumor dos vossos louvores, pelo fasto do vosso vestuário, pela publicidade das vossas homenagens.

XIII

Sim, sim, é mister ousar tudo para com as mulheres.

Fonte:
Obra Completa, Machado de Assis, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, V.III, 1994.
Publicado originalmente em A Marmota, Rio de Janeiro, 19, 23, 26 e 30/04 e 03/05/1861.

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 463)


Uma Trova de Ademar

Perdido, pois, nas rotinas,
nos labirintos da dor,
encontrei entre as ruínas
pedaços do nosso amor...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


A travessia é mais triste
se, no meio do caminho,
nossa esperança desiste
e a gente segue sozinho!
–THEREZINHA BRISOLLA/SP–

Uma Trova Potiguar


Onde há fé, nada termina...
Jesus Cristo, o Redentor,
lá do céu, abre a cortina
enchendo o mundo de amor!
–EVA GARCIA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Restou do “conto de fada”
que a gente outrora vivia,
uma cama desmanchada
numa palhoça vazia.
–ALFREDO VALADARES/MG–

Uma Trova Premiada


2002 - Belém/PA
Tema: FRUTO - M/H


Nos becos da iniquidade,
os órfãos do ter e ser
são frutos que a sociedade
semeia... e não quer colher!...
–JOÃO FREIRE FILHO/RJ–

Simplesmente Poesia

O Beija-Flor!
NEMÉSIO PRATA/CE


No jardim ensolarado,
repleto de belas flores
exalando seus olores,
dava-se um lindo bailado
que nos deixou encantado!

Um pequeno beija-flor,
com roupagem multicor,
saltitando, todo prosas,
sorvia das lindas rosas,
seu doce néctar do amor!

Estrofe do Dia

Tenho feito repente sobre a Síria,
explorando as belezas de Damasco,
o que seria o rio sem o Vasco
e da história do caso de Walquíria?
Mas o verso legítimo não tem gíria
e o improviso só chega a perfeição
se for feito sentado num oitão
com os bichos fazendo companhia;
eu só sinto o sabor da poesia
quando eu canto essas coisas do sertão.
–HELENO ALEXANDRE/PB–

Soneto do Dia

Aos Poetas
–ADEVAL SOARES/PE–


Quem é poeta e tem a liberdade
Escreve os versos que a mente cria
E vive às regras da simplicidade
Buscando os raios da sabedoria.

Corre na busca da felicidade
Debulha a mágica que há na poesia,
Mostra talento e tem na humildade
Os instrumentos da sua alegria.

Descreve a paz na paz do seu sorriso,
Caminha firme com olhar conciso
Mantendo sempre seu jeito comum.

Transforma a vida pelos versos seus
Recebe as luzes do amor de Deus
E as distribui, sem problema algum.

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

A. A. de Assis (A Província do Guairá: Um pouco da história do antes de Maringá) Parte 3


AS REDUÇÕES JESUÍTICAS

-E deu certo o esquema?

-Nem tanto. Os padres chegaram com ordem expressa do governador e do bispo de Assunção para, em nome do rei, impedir a escravização dos índios. Isso irritou muito os colonizadores. Habituados a utilizar a mão de obra indígena, sentiram-se “traídos”, passando então a sabotar o trabalho dos jesuítas. Apesar, porém, dessas dificuldades, foram implantadas as reduções, umas vinte, ao longo dos rios.

-Onde exatamente?

-Distantes cerca de 45 quilômetros umas das outras, as reduções eram uma espécie de “municípios indígenas”, formando uma confederação em que os administradores de Ciudad Real e Villa Rica não podiam interferir. As duas primeiras foram erguidas em 16l0: Nossa Senhora do Loreto e Santo Inácio, na confluência do Pirapó com o Paranapanema. Em seguida formaram-se muitas outras, entre as quais se destacavam as de São José, São Francisco Xavier, Encarnação e São Miguel, no rio Tibagi; Jesus Maria e Santo Antônio, no rio Ivaí; São Tomé e Sete Arcanjos,no rio Corumbataí; e Santa Maria, no rio Iguaçu, perto das cataratas. Compunham, juntas, o que se sonhou ser a República Teocrática Guarani.

-Comovente utopia!

-De fato. Mas vamos em frente: as reduções, que como eu lhe disse obedeciam a um esquema semelhante ao da Praça Dom Pedro II, de Maringá, tinham ao centro um grande largo para festas, esportes e outras atividades coletivas; em torno, a igreja, a escola, um salão de oficinas e artesanatos, o escritório do alcaide e demais repartições públicas (cabildo, armazém, enfermarias etc.) e, em fileiras, os pavilhões residenciais dos índios, cabendo a cada família um aposento com divisões internas feitas de couro e esteira. No pátio havia ainda um relógio de sol. Em algumas reduções, mantinha-se também um alojamento para hóspedes eventuais. Nas terras em volta formavam-se as lavouras e os pastos para criação de gado.

-Quem administrava a aldeia?

-Em cada redução moravam dois ou três padres, que era ao mesmo tempo sacerdotes, médicos, professores, catequistas, contabilistas, engenheiros, veterinários, agrônomos... A administração geral, todavia, era exercida pelos próprios índios, que escolhiam, por eleição direta, o alcaide (prefeito), o corregedor (encarregado dos assuntos judiciários) e os membros do cabildo (conselho de chefes setoriais). O regime político era uma forma primitiva de socialismo, preservando os costumes tribais.

-Tinham tudo em comum?

-Edifícios, ferramentas e outros bens pertenciam à comunidade. A produção da terra e das oficinas era distribuída de forma equitativa entre as famílias. A produção excedente era exportada via Assunção, sobretudo a erva-mate. Com os lucros desse comércio, realizavam-se melhoramentos nas aldeias.

-E os índios se adaptavam facilmente a essa forma de vida?

-Os jesuítas eram muito hábeis. Sabiam como conquistar a simpatia dos nativos, a ponto de convencê-los a andar vestidos. Os homens usavam calções; as mulheres, longas saias, embora continuassem pintando o rosto e enfeitando os cabelos com charmosos cocares. Com os missionários os índios aprenderam técnicas agrícolas e pecuárias, aprimoraram-se na produção de tecidos, tornaram-se carpinteiros, ferreiros, fundidores, pintores, escultores. As crianças freqüentavam a escola, aprendiam a ler e escrever, até em latim...

-Como era o regime de trabalho?

-Não se permitia a ociosidade, e a disciplina era rigorosa, mas ninguém trabalhava mais que seis horas diárias, respeitando-se os domingos e os dias santos. Havia tempo para o lazer, para o estudo, para o namoro, para as orações, como em qualquer sociedade organizada.

-Muito bonito. Mas não teria sido uma forma de agressão à cultura original dos índios?

-Esse é um assunto bastante polêmico. Discute-se sobre até que ponto teria sido válida a “ajuda” dos jesuítas. Talvez os indígenas tivessem sido mais felizes sem essa intromissão na vida deles. Quem sabe? Pode-se afirmar, contudo, a favor dos religiosos, que suas intenções eram honestas. A obra que tentaram realizar junto aos guaranis merece máximo respeito.

OS CAÇADORES DE GENTE

-Não deu certo, principalmente, por quê?

-Durante alguns anos os aldeados prosperaram em relativa paz. Os espanhóis de Ciudad Real e Villa Rica se conformavam em manter a seu serviço uns poucos nativos preados nas matas e aos quais diziam remunerar na forma de alimentação e roupas... como se os índios precisassem disso. Era um modo disfarçado de escravizá-los. A maior ameaça, entretanto, eram os portugueses de São Paulo, que à caça de índios penetravam seguidamente a região do Guairá Vinham pelos rios ou pelo Caminho do Peabiru.

-O Tratado de Tordesilhas não vigorava mais?

-Portugal e Espanha estando na época sob o mesmo rei, o Tratado foi mais ou menos esquecido. Alinha divisória era facilmente “furada”, de um lado e de outro. Os castelhanos tentando conquistar a costa leste e os lusitanos invadindo o sertão. Em 1607, Manuel Preto, um terrível sertanista, já estivera nas matas do Guairá. Consta que até 1612 os paulistas já haviam levado daqui uns 5 mil nativos.

-O senhor disse que havia uma lei proibindo a escravização de índios...

-Ocorre que Madri estava muito longe para fiscalizar o cumprimento da lei. Por outro lado, os fazendeiros paulistas enfrentavam grave crise: sem mão de obra indígena, diziam sem impossível prosseguir a colonização. Até ameaçaram abandonar as terras. No litoral os índios tornavam-se escassos: muitos deles fugiam para lugares distantes, os demais estavam envelhecendo e morrendo. Era urgente renovar a escravatura, e a solução seria buscar nativos no Guairá.

-E foi assim que os bandeirantes se tornaram “caçadores de gente”...

-Os primeiros bandeirantes eram portugueses arrojados e ambiciosos que vieram para o Brasil atraídos pelo sonho do enriquecimento rápido. Despertando neles a sede do ouro, Portugal usava-os para expandir seu domínio em terras brasileiras e conquistar parcelas do chão espanhol além da linha de Tordesilhas. Como a essa altura já estavam todos desiludidos da esperança de encontrar montanhas de ouro, prata e esmeralda nos sertões a sudoeste de São Paulo, a nova forma de lançá-los mata adentro era incentiválos a caçar outro “tesouro”, os nossos irmãos índios, altamente cotados no mercado de escravos.

-Os donos da terra transformados em “ferramentas de trabalho” dos invasores...

-Durante vários anos os bandeirantes vasculharam as florestas do Paraná. Nas primeiras incursões não lhes foi muito fácil prear os nativos: tinham de usar diversos artifícios, como, por exemplo, oferecer presentes, embebedá-los com cachaça e depois acorrentá-los. Passaram então a botar “olho gordo” nas reduções, em cada uma das quais viviam perto de 4 mil índios. Bastaria aos caçadores fazer o cerco em torno da aldeia e “colher”, numa só investida, milhares de “peças”.

-Isso significa que os jesuítas, nucleando os guaranis, sem querer acabaram facilitando o “trabalho” dos paulistas...

-O diabólico projeto foi discutido em São Vicente e São Paulo, formando-se na ocasião uma arrasadora bandeira, tipo “arrastão”, cujo comando foi entregue ao sanguinário Antônio Raposo Tavares.

-O Raposo Tavares que é nome de praça em Maringá?

-Ele mesmo. Se eu fosse vereador trocava o nome da praça. Esse homem, a meu ver, não merece homenagem alguma.

-Poderia ser Praça Montoya, como alguém já sugeriu. Ou Praça do Trabalho. Ou Praça do Café, lembrando o produto que deu o impulso inicial no desenvolvimento da região.

-Estou de pleno acordo. Mas voltemos à história. Raposo Tavares, então com 30 anos, era um homem alto, arrogante, ambicioso e frio. Português nascido no Além-Tejo, viera para São Paulo já fazia uns 10 anos. Tinha muitos inimigos, mas, pela sua fama de valente e pela capacidade de liderança em tarefas desse tipo, foi o escolhido para chefiar o ataque às reduções, assessorado pelo velho e experiente Manuel Preto. Saiu de São Paulo no dia
18 de setembro de 1628, com 69 portugueses, 900 mamelucos (mestiços de brancos com índios) e 3 mil nativos aliados (na maioria escravos), dirigindo-se à região do Guairá. Sabiam que os espanhóis de Ciudad Real e Villa Rica não lhes fariam oposição, interessados que estavam em também escravizar os índios. Em defesa dos guaranis haveria, portanto, e tão somente, a força moral dos jesuítas.

-Foram chegando e destruindo tudo?...

-Não exatamente, Raposo acampou a tropa nas proximidades da redução de Santo Antônio e, acompanhado de pequena guarda, fez uma “visita de cortesia” ao padre Mola, cura da aldeia. Almoçaram juntos. Durante a conversa, afirmou cinicamente que seu propósito era colaborar na conversão dos índios levando-os para São Paulo a fim de viverem com famílias cristãs, que lhes ensinariam os “bons costumes”. O jesuíta retrucou, argumentando que o Cristo não aprovaria tal método de “conversão na marra”, preferindo deixar os nativos onde estavam, confiados à paciente e amorosa catequese dos missionários. “O pastor não escraviza as suas ovelhas”, acrescentou. O bandeirante não se deu por vencido. Citou uma nova lei editada por Filipe III, na qual se mantinha a proibição de submeter os índios a trabalhos forçados, permitindo-se todavia a escravização daqueles considerados “turbulentos” ou que fossem feitos prisioneiros em “guerra justa”. -Inventar uma “guerra justa” não deveria ser difícil...

-Dou-lhe um exemplo: os caçadores de gente erguiam cruzes ao lado dos seus acampamentos; dois dias após, alegavam que faltava uma cruz e punham a culpa nos índios, acusando-os de “desrespeito à religião”. Era o bastante para iniciarem uma “guerra justa”, aprisionando centenas de “inimigos da fé”.

-E os padres não podiam fazer nada?...

-Bem que tentavam, mas como? Naquele tal encontro com Raposo Tavares, padre Mola fez o possível, porém o máximo que conseguiu foi obter do perverso a “generosa” promessa de que só levaria índios pagãos, deixando em paz os batizados.

-Coitados dos pagãos...

-Era uma estratégia. O missionário, sabendo que os arcos e flechas dos guaranis pouco valeriam contra a pólvora dos agressores, aceitou o acordo como forma de ganhar tempo.

-Começo a entender.

-Enquanto isso, procuraria batizar o máximo possível de nativos, aldeados ou não, e mandaria emissários aos padres das outras reduções sugerindo que tomassem a mesma providência.

-Os bandeirantes cumpriram o acordo?

-O que você acha?... Raposo era manhoso. Também ele estava querendo ganhar tempo, à espera de um pretexto para atacar. O pretexto surgiu quando o sertanista ficou sabendo que o padre Mola andava a acolher em Santo Antônio escravos fugidos, que escapavam tanto dos paulistas quanto dos espanhóis.

-Ai então...
–––––––––––-
continua…

O e-book pode ser feito o download no blog do Assis http://aadeassis.blogspot.com

Fonte:
A. A. de Assis (A Província do Guairá: Um pouco da história do antes de Maringá). e-book. 2011.

J. G. de Araújo Jorge (Quatro Damas) 15a. Parte, final


" TRAGO AMARGO "



Dispenso as palavras
de conforto...

Tomarei como um trago amargo
o meu desgosto...

- Amor morto:
amor posto.

" TROVADOR "

E vou iludindo, assim,
aos outros
e a mim...

Sigo
a espalhar cantiga,
trovador de alma triste
e alegre bandolim…

"TUDO?... NADA?..."

Que hei de dizer-te se nada te posso dizer?
Se tudo sabes sem uma palavra em meus lábios.
Se meus olhos toda vez que te encontram
se confessam como um pecador,
e eu não posso evitar que eles falem por mim
e revelem aos teus olhos meu segredo de amor?...

Que hei de dizer-te? Se nada te posso dizer...
Se devo parecer um incoerente, um tolo...
Se só me resta afinal esse consolo
de me confessar toda vez que meu olhar
encontra o teu olhar. . .

Há tanta coisa ao redor. . . tanto cenário inútil
ao nosso encontro,
- encontro só meu,
pois que afinal nem sei se ao me veres, me vês,
ao cruzar meu passo com o teu...

Tão complicada esta vida... E como seria simples
amar-te
tomar-te como uma criança em meus braços, beijar-te...
(Perdoa, amor, estas coisas que penso
e a estas horas tardes, componho... )
- tomar-te só para mim, e dividir contigo
pedaço por pedaço, inteirinho, este amor,
este sonho...

Chamo sonho a este amor com que me embriago,
amargo pensamento onde apenas é doce
a tua presença,
perdoa, amor: pensar em- ti, era, a principio, vago,
no começo, nem supus que importante isto fosse,
hoje, pensar em ti já é quase uma doença...

Que hei de dizer-te, afinal, se nada posso esperar...
Se temo que tudo se desmanche...
Receio pronunciar qualquer palavra, a palavra
que seria essa pequena pedra deslocada,
capaz de provocar uma avalanche!
... e sepultar
este sonho, e fazer de tudo...
... nada!

" UM NOVO AMOR "

E de repente... (parece incrível)
- o tudo de antes, não existe mais
não interessa...

Um novo amor, amor,
é sempre um mundo novo
que começa!

Não importa a experiência que tiveste
ou que julgas Ter,
nem essa íntima e inútil convicção
de que nada mais poderia em tua vida
surpreender o coração...

Não importa o percorrido
o conquistado,
ou o que antes foi desejado
por teu marinheiro coração,
- um novo amor
começa tudo do chão...

é como se abrisses os olhos para a vida
naquele instante,
como se para trás nada tivesse havido...
Nasces com um novo amor! E viverás de novo
o mistério deslumbrante
do que há de acontecer, como se nunca tivesse
acontecido...

De repente
nada mais resta,
o ontem, foi uma noite que passou,
- o hoje é o que importa, é o que se vai viver...

Um novo amor, é uma festa,
é uma nova alegria...
Um novo amor, amor, é um novo dia
que vai nascer!

" VAGA "

E um dia,
levaste com um gesto de vaga sobre a areia
tudo o que havia em minha vida...

Com um vai-vem de vaga, apagaste
tudo,
e restou a praia limpa, a areia branca,
e uma manhã de sol, sem brumas...

E a tua presença de vaga
vaga ternura , em vagas
de carícias a envolver-me todo
de espumas…

" VARIAÇÕES SOBRE O AMOR "

I
Agora que te amo
concluo e proclamo:
nunca haverá um amor igual ao outro,
podes crer...

Como não há o mesmo beijo, o mesmo olhar,
a mesma ternura,
o mesmo prazer...

II
O amor é como o perfume...
Uma vez que se sente
nunca mais se mistura ou se pode esquecer
completamente...

III
Tu pensas que amas muitas vezes...

Engano, puro engano,
esse é um estranho milagre do coração
humano
que custei a entender,
e que ainda não compreendes talvez:

- toda vez que se ama
é a primeira vez...

IV
Nunca se ama duas vezes
porque apesar de um só, o amor não se repete
no coração da gente...

O amor é como o mar...
- único, múltiplo,
diferente...

V
Os amores são como as ondas
no mar...
Parecem todas iguais quando espumam, distante,
e se põem a avançar...

Entretanto, nunca haverá uma onda
igual àquela que se elevou, cresceu
e se desfez...
Toda onda é onda somente
uma vez...

VI
Um amor é sempre assim
novo, diferente,
e surpreendente,
nada tem com o amor que passou
que floriu, que murchou,
como uma onda, ou uma flor...

Um novo amor, ( que importa o coração
viajado
e sofrido?)
é sempre um novo amor!

Que importa se é velho o barco?
Importa é o novo roteiro
a nova paisagem...

Um novo amor é sempre o primeiro...
É sempre uma nova viagem...

Fonte:
J. G. de Araujo Jorge. Quatro Damas. 1. ed. 1964.

O Índio na Literatura Brasileira (Estante de Livros) 6


MOTT, Odete de Barros. Marco e os índios do Araguaia.

Conta a aventura de Marco, um menino paulistano, viajando de férias às margens do Rio Araguaia. Ele visita os índios Karajá, Tapirapé e Gorotire e descobre como vivem. Descobre, ainda, que os índios são pessoas sensíveis e inteligentes e que possuem sua própria cultura. O livro traz descrições da região do Araguaia, da natureza, fauna, flora e população.

MOTT, Odete de Barros. Nas margens do Araguaia.

Apresenta três lendas dos índios Karajá, que são transmitidas aos mais jovens como um fator importante de preservação da sua cultura. A primeira história: De onde veio o povo Carajá, refere-se à origem desse povo; a segunda, Como Kananchiué levou o sol para a terra Carajá; e a terceira, Como Kati-Bené – o jabuti – maliciou Budoé – o veado, são algumas das histórias contadas pelos Karajá, à noite, ao pé do fogo.

MUNDURUKU, Daniel. Histórias de índio.

Conta a história de Kaxi, um garoto Munduruku que tem uma infância feliz. Brinca, nada, pesca, faz artesanato e ouve histórias. Mas Kaxi é especial, pois o pajé o escolheu para ser seu sucessor. Fala da iniciação à vida adulta, apresentando a cultura indígena a partir do ponto de vista de um narrador pertencente a ela. Na segunda parte, o autor relata suas experiências no mundo dos brancos e, na terceira, descreve a atual situação dos povos indígenas no Brasil, assim como alguns dos seus hábitos, ritos, música, lendas e diversidade cultural e lingüística.

MURAT, Heitor Luiz. Morandubetá (fábulas indígenas).

Reúne várias lendas indígenas, com um tratamento mais próximo da fala do próprio índio. Traz também lições riquíssimas da moral praticada por eles, quando ainda eram donos e senhores da Terra Brasilis.

NEAIME, Lica. De como o dia virou noite e a noite virou dia e noite.

Narra um contos de fadas, em que o herói e a heroína partem em missão sagrada: trazer de volta o sol que deixou de brilhar, fazendo descer uma noite imensa sobre a floresta, bichos e homens. Nessa busca, cruzam com leões, cobras, aranhas, a lua e também seres mágicos que, apoiando ou afrontando, participam da empreitada. Cheio de sustos, algum humor e muito movimento, o enredo acaba colocando os heróis no cume de uma montanha, onde devem convencer o sol a voltar a brilhar.

NICOLELIS, Giselda Paporta. Macapacarana.

Aborda a questão do choque cultural. É o que vive Gerson, um garoto que sai de São Paulo para morar com o pai no Amapá. Ali ele descobre outro Brasil: o dos rios, das matas, dos garimpos e dos animais em extinção. É com o índio José que Gerson aprende a amar e a entender esse outro país.

NISKIER, Arnaldo. Aventura do Curupira.

Narra uma história cujo herói é o Curupira, uma lendária figura das matas amazônicas, uma mistura de diabinho e índio Tapuia, protetor dos animais e da natureza e inimigo feroz dos caçadores clandestinos.

NOSSOS índios. Porto Alegre: Editora Kuarup

Apresenta ilustrações sobre a cultura dos índios do Xingu, para as crianças colorirem.

NUNES, Marconde Rangel; BARRETO, Felicitas.Oku-Cúri: arco-íris,indiozinho brasileiro.

Aborda a diversidade no âmbito das culturas, hábitos, costumes e brincadeiras dos povos indígenas, numa linguagem acessível às crianças.

OLIVEIRA, Alan Roberto de. Amazônia.

Conta a aventura de Caco e Mister David, seu padrinho, que se perdem na Amazônia e acabam conhecendo de perto os conflitos entre índios e garimpeiros. Nasce uma grande amizade, transformando a relação entre os dois em amor de pai e filho.

OLIVEIRA, Jô. Kuarup: a festa dos mortos - lenda dos povos indígenas do Xingu.

Aborda o tema Kuarup, festa em homenagem aos mortos realizada pelos índios do Xingu, por meio da arte seqüencial, ou seja, a arte de contar história com imagens.

OLIVEIRA, Rui de. A lenda do dia e da noite.

Apresenta a adaptação de uma lenda dos índios Karajá sobre a criação do dia e da noite. A referência visual adotada nas ilustrações foi a arte plumária, a cestaria e pintura corporal.

OLIVIERI, Antônio Carlos. Uiramirim contra os demônios da floresta.

Narra a aventura de Uiramirim, índio Tupi de 15 anos que, após se embrenhar na mata com um pirata – capitão Lafitte, vê-se em apuros, tendo de enfrentar três demônios da floresta: a Mula-sem-cabeça, a Boiúna e o Capelobo. E tudo isso para salvar sua pele e libertar seu amigo, aprisionado por indígenas.

OLIVIERI, Antônio Carlos. Uiramirim contraos piratas.

Narra uma aventura do tempo em que o Brasil se dividia em capitanias hereditárias e o açúcar era sua principal riqueza. Prisioneiro em um navio pirata, Uiramirim, um índio Tupi de 15 anos, envolve-se numa incrível aventura, em que aparecem piratas, um padre traidor, uma mocinha prisioneira e o jovem Dom Manoel Gorducho, um português de 12 anos, vaidoso e mimado, do qual o indiozinho era escravo. Uiramirim é o grande herói dessa história de piratas.

PATRIOTA, Margarida. Olhando a terra,arregalado:contos do índio brasileiro.

Apresenta dez mitos dos povos indígenas brasileiros, entre os quais os Bororo, Pareci e Apinajé. Compõem o livro as seguintes histórias: Olhando a terra, arregalado; O papagaio que faz Kra; Ahã, venceremos; O mundo subterrâneo; Canção do derradeiro Kupe – dyeb; O maguari e o sono; Coisa de anta; Artimanhas de Bahira; O roubo do fogo e História de índio ninguém entende.

PEREIRA, André; VILAÇA, Aparecida. Nós e os índios.

Apresenta os costumes de algumas sociedades indígenas brasileiras. Os autores estimulam uma comparação destes com os hábitos dos moradores das grandes cidades. As diferenças e semelhanças entre a vida do leitor e a dos indígenas, a existência de características particulares em diferentes aldeias e o reconhecimento e respeito às culturas
diferenciadas são temas tratados nesta obra.

PONTES NETO, Hildebrando. Mikai Kaká.

Narra uma história adaptada de uma lenda do povo Maxakali, que vive em Bertópolis, no estado de Minas Gerais.

PRADO, Lucília Junqueira de Almeida. Vá pentear macacos.

Narra a estória de um menino cheio de esperteza e muito curioso, chamado Japi, cujo pai já não sabe mais como responder a tantas perguntas que o menino lhe faz. Até que, um dia, manda que ele vá pentear macacos. Ao procurá-lo, arrependido, e encontrá-lo rodeado por macacos, compreende: “para filho obediente, não se pode dar ordem sem tino”.

RIBEIRO, José Hamilton. A vingança do índio cavaleiro.

Narra a história de uma nação indígena muito especial: os Kadiwéu, da Serra da Bodoquena, no Mato Grosso do Sul. Sua ar te, principalmente o desenho e a pintura, aproxima-os dos Incas. O uso do cavalo fez deles os “índios cavaleiros” do Brasil, pastores e guerreiros. Depois de quase dizimados pela “peste branca”, os Kadiwéu estão agora se organizando em torno de um plano de vingança contra o “civilizado”.

RIOS, Rosana. O passado nas mãos de Sandra.

Narra a aventura de Sandra, seu primo e sua avó, no litoral, nas férias de julho. Sandra tem um estranho poder psíquico: ao tocar nos objetos, consegue visualizar cenas do passado, em que aqueles objetos estiveram presentes. Sandra revive momentos da história do Brasil
do século XVI, até que, aos poucos, uma importante missão lhe é apresentada: descobrir a localização das terras pertencentes aos índios Guarani, evitando assim que um homem chamado seu Abílio avance sobre elas com seu empreendimento imobiliário. O grupo enfrenta diversos perigos, muitas coisas ruins acontecem, mas, para cumprir sua missão, Sandra conta com a ajuda do último descendente dos Guarani, o velho índio Iruma.

Fonte:
Moreira, Cleide de Albuquerque; Fajardo, Hilda Carla Barbosa. O índio na literatura infanto-juvenil no Brasil. - Brasília: FUNAI/DEDOC, 2003.

Lendas e Contos Populares do Paraná (Antonio Olinto – Arapoti – Balsa Nova – Campina do Simão)


ANTONIO OLINTO
Padre João


O Padre João Michalczuch, da Igreja ucraniana, tinha grandes atividades no município como médico, professor, lavrador, entre outras coisas. Ele obrigava os fiéis a colaborarem com três dias de serviço no plantio e na colheita, gratuitamente. Era muito famoso pelo seu atendimento como médico de crianças e idosos.

Relata-se que ele coletou entre os fiéis diamantes, pedras preciosas e ouro para a confecção do quadro, existente até hoje, da Nossa Senhora dos Corais. Contam que possuía muitas coisas valiosas, como objetos em ouro. Quando morreu, seus pertences de valor foram enterrados junto no caixão, guardado por uma cobra, que muitas pessoas dizem ter visto.

O achado

Certa noite de lua cheia, um homem chamado Sebastião Chaves saiu de sua residência para pegar água, era mais ou menos meia-noite. Aí começou a sair fumaça de um tronco. Ele começou a se apavorar, mas ficou por ali; de repente saiu uma mulher fumando cachimbo e falou:

– Tenho um Guardado para você.

Ele respondeu:

– O que você quer em troca?

Ela falou:

– Quero que mande rezar cem missas para mim, aí poderá pegar o seu Guardado.

Ele mandou rezar as missas. Numa outra noite de lua cheia, ele foi ver o seu Guardado. No local, começou a cavar onde a mulher aparecera. De repente, ouviu um barulho e olhou para trás, era um cavalo. Continuou a cavar e novamente ouviu o barulho, olhou era o cavalo que, em seguida, se transformou em mulher. Ela então perguntou ao Sebastião:

– Mandou rezar as missas para mim?

Ele respondeu:

– Sim, mandei como você me pediu.

A mulher disse:

– Pode pegar o seu Guardado.

Ele olhou no buraco que havia cavado e viu uma caveira, que era de seu tio.

O pote de ouro

Aconteceu no dia 22 de dezembro de 1991. Essa história tem como personagens o senhor Casimiro e Joacir. Esses dois homens acreditavam que nas redondezas de um rio, que divide as localidades de Lagoa da Cruz e Arroio da Cruz, existiam coisas de valor, como moedas de ouro ou pedras preciosas.

No dia 22 de dezembro, os dois homens beberam um pouquinho a mais da conta e resolveram partir em busca do tesouro que acreditavam que existia. Levaram de casa algumas
sacolas, ferramentas para cavar, um rosário e água benta. Chegando à beira do rio, começaram a cavar e, como estavam embriagados, encontraram coisas que afirmavam existir.

Contavam que tinham encontrado várias correntes e pedras de valor. Tudo o que eles tiravam, lavaram com água benta, antes de guardar na sacola. Em casa começaram a alardear, falando que eram ricos e não precisariam mais trabalhar. O povo, já atormentado com o discurso dos dois, abriu as sacolas para ver o que havia de tão valioso. Ao abrirem, encontraram pedras de cascalho e maços de capim. Os dois, sem saber o que falar e passando uma enorme vergonha em frente das pessoas, disseram que tudo aquilo era obra do demônio e que ao colocaram água benta nas pedras e correntes, esta as transformou em cascalho e capim.

ARAPOTI
O pote de ouro


Segundo antigos moradores da Fábrica de Papel, há muito tempo atrás alguém enterrou um pote de ouro próximo ao rio do Chico. Dizem que algumas pessoas recebiam as visões do local através de sonhos. Segundo as revelações que lhes eram feitas, deveriam ir à noite para desenterrar a fortuna.

Porém, cada vez que alguém se aventurava a arriscar a sorte dirigindo-se ao local, aparecia um esqueleto falante ordenando que o levasse a determinado lugar, e, sem a permissão da pessoa, montava em suas costas afirmando que, se fizesse isso, dar-lhe-ia em troca o pote de ouro. Muitas pessoas que por ali passam, à meia-noite, afirmam ouvir gemidos e barulho de ossos estalando.

Os mais antigos dizem que são os ossos do esqueleto que fazem barulho e que os ruídos são os gemidos das pessoas, que querem se libertar do fardo macabro que têm às costas. Ouvem-se, também, os gemidos desesperados pedindo socorro e os gritos de dor causados pelos ossos pontiagudos do esqueleto.

BALSA NOVA
Tesouro dos Carros


Na fazenda dos Carros, município de Balsa Nova, na parte que fica em baixo da serra havia uns pés de canela bem altos e diziam que lá havia dinheiro enterrado. Dizem que um tal de Avelino Louco foi lá procurar e apareceu um negrinho, que disse que se ele matasse o filho mais velho e levasse o corpo ele mostrava o enterro. Alguns dizem que ele chegou a levar o filho até a beira do capão, mas o piá desconfiou e fugiu; o homem ficou meio variado depois disso, e esta é a razão do seu apelido.

Com relação ao guardião do dinheiro dos Carros, contam que, quando o dono foi enterrar a panela, perguntou a um escravo se ele tomava conta do dinheiro e como o negro disse que sim, ele matou o homem e enterrou junto; o escravo é a visagem que cuida do tesouro enterrado

CAMPINA DO SIMÃO
Lenda do caixão branco


Conta-se que antigamente havia na região um senhor muito sovina. Ele economizava até na alimentação. Quando chegavam visitas em sua casa, recebia-as somente na varanda, não recolhendo-as ao interior da casa.

Não desejava correr o risco de ter que alimentá-las, não oferecia nem mesmo o costumeiro chimarrão.

Quando chegava o horário das principais refeições chamava sua esposa para conversar com as visitas, ia até a cozinha para comer e voltava rapidamente para continuar a conversa. As pessoas mais idosas contam que o sovina enterrava todo o dinheiro que recebia dos pinheiros que comercializava.

Ocorre que após o seu falecimento passaram a acontecer coisas estranhas. Conta-se que se alguém passar depois da meia-noite em frente à casa onde ele morava, aparece um caixão branco, que voa em direção onde ele enterrou o dinheiro. Atualmente, as terras que lhe pertenciam foram compradas. O novo dono não faz outra coisa, a não ser procurar o dinheiro enterrado.

Fonte:
Renato Augusto Carneiro Jr. (coordenador). Lendas e Contos Populares do Paraná. 21. ed. Curitiba : Secretaria de Estado da Cultura , 2005. (Cadernos Paraná da Gente 3).

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 462)

Por-do-sol em Ouro Preto/MG
Uma Trova de Ademar

A lua, sem trocadilho,
na insensatez de um açoite,
de dia esconde o seu brilho
para ser a luz da noite.
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional

Cansei de crer tolamente
nos meus sonhos de menino.
Nem sempre o que agrada a gente
também agrada ao destino!
–ARLINDO TADEU HAGEM/MG–

Uma Trova Potiguar


Abrindo a linda cortina,
por onde o tempo esvoaça,
a vida é benção divina
em cada dia que passa.
–IEDA LIMA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Contigo um dia em meus braços,
perdi a calma, querida,
e agora sigo os teus passos,
buscando a calma perdida!
–ALOÍSIO ALVES DA COSTA/CE–

Uma Trova Premiada


2009 - Taubaté/SP
Tema: ALVORADA - M/H


Este poeta deduz
que Deus, vendo a obra acabada,
disse então: “Faça-se a luz”!
E eis a primeira alvorada!
–FRANCISCO MACEDO/RN–

Simplesmente Poesia

Os Velhos Tempos.
–OLGA AGULHON/PR–


Os velhos tempos,
há muito sepultados,
estão longe da memória de uns
e assombram a memória de outros.

O tempo, hoje, passa tão rápido...
mas os velhos tempos
escorriam lentamente
como as águas quase imóveis
do Lago Negro
do sul de minhas lembranças.

Estrofe do Dia

Poetas não são doutores
nem são peças de museus,
ricos sim por possuírem
a força dos dotes seus,
gênios das suas virtudes
exemplo e magnitudes
seguindo as ordens de Deus.
–MONTEIRO FIRMINO/PB–

Soneto do Dia

Lendo "Apelo".
“A Eno Teodoro Wanke”
–CAROLINA AZEVEDO DE CASTRO/PE–


Penso que estes apelos sucessivos,
todos cheios das mesmas intenções,
vão trazer resultados positivos,
eliminando o ódio entre as Nações.

Confiamos, refertos de emoções,
que cessem estes planos destrutivos;
não deviam pulsar os corações
que alimentam desejos negativos.

Que teu apelo traga paz à Terra,
atenuando os ímpetos de guerra,
que o homem bom, transforma num perverso!

Que Deus lhes mostre o luminoso trilho,
o mesmo que apontou para o seu Filho,
em prol da perfeição deste Universo!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Guerra Junqueiro (João e os seus Camaradas)


Era uma vez uma viúva com um filho único.

Ao cabo de um Inverno rigoroso, possuía apenas um gaio e meio alqueire de farinha) João resolveu-se a correr mundo, à busca de fortuna. A mãe coseu o resto da farinha, matou o galo, e disse-lhe:

– Que é que preferes: metade desta merenda com a minha bênção, ou toda com a minha maldição?

– Que pergunta! respondeu o pequeno. Nem por quantos tesouros há no mundo eu queria a tua maldição.

– Bem, meu filho, replicou a mãe carinhosamente. Leva tudo, e que Deus te abençoe.

E partiu. Foi andando, andando, até que encontrou um jumento, que tinha caído num atoleiro, de onde não podia sair.

– Oh! João, exclamou o burro, tira-me daqui, que estou quase a afogar-me.

– Espera, respondeu o João.

E, formando uma ponte com pedras e ramos de árvores, conseguiu tirar o quadrúpede do atoleiro.

– Obrigado, disse-lhe ele, aproximando-se do João. Se te posso ser útil, aqui me tens ao teu dispor. Aonde vais tu?

– Vou por esse mundo fora, a ver se ganho a minha vida.

– Queres tu que eu te acompanhe?

– Anda daí.

E puseram-se a caminho.

Ao passarem por uma aldeia, viram um cão perseguido pelos rapazes da escola, que lhe tinham atado ao rabo uma chocolateira velha. O pobre animal correu para o João, que o acariciou, e o jumento pôs-se a ornear de tal maneira, que os rapazes com o medo deitaram todos a fugir.

– Obrigado, disse o rafeiro a João. Se para alguma coisa te for prestável, aqui me tens às tuas ordens. Aonde vais tu?

– Vou por esse mundo de Cristo, a ver se ganho a minha vida.

– Queres que te acompanhe?

– Anda daí.

Quando saíram da aldeia pararam junto de uma fonte. O pequeno tirou a merenda do alforje e repartiu-a com o cão. O burro pastou alguma erva que por ali havia. Enquanto jantavam, apareceu um gato esfaimado a miar lastimosamente.

– Coitado! exclamou o João. E deu-lhe uma asa de frango.

– Obrigado, disse o gato. Oxalá que um dia eu te possa ser útil. Aonde vais tu?

– Procuro trabalho. Se queres, anda conosco.

– De boa vontade.

Os quatro viajantes puseram-se a caminho. Ao cair da tarde, ouviram um grito dilacerante e viram uma raposa correndo a toda a brida com um galo na boca.

– Agarra! agarra! bradou o pequeno ao cão.

E no mesmo instante o cão atirou-se atrás da raposa, que, vendo-se em perigo, largou o galo para correr melhor. O galo pulando de contente, disse ao João:

– Obrigado. Salvaste-me a vida. Nunca me esquecerei. Aonde vais tu?

– Arranjar trabalho. Queres vir conosco?

– De boa vontade.

– Então anda. Se te cansares, empoleira-te no jumento.

Os viajantes continuaram a jornada com o seu novo companheiro. Sentiram-se todos fatigados e não avistaram à roda nem uma quinta, nem uma cabana.

– Paciência, disse o João, outra vez seremos mais felizes. Resignemo-nos hoje a dormir ao ar livre; além disso a noite está sossegada e a relva é macia.

Dito isto, estendeu-se no chão; o jumento deitou-se ao lado dele, o cão e o gato aninharam-se entre as pernas do burro complacente e o gaio empoleirou-se numa árvore.

Dormiam todos um sono profundíssimo, quando de repente o galo começou a cantar.

– Que demônio! disse o jumento acordando todo zangado. Porque estás a gritar?

– Porque já é dia, respondeu o galo. Não vês ao longe a luz da madrugada, que vem rompendo?

– Vejo uma luz, disse o João, mas não é do Sol, é de uma lanterna. Provavelmente há ali alguma casa, onde nos poderíamos recolher o resto da noite.

Foi aceite a proposta. Partiu a caravana, foi andando, andando, através dos campos até que parou junto da casa do guarda de um grande castelo, donde saiam gargalhadas, gritos confusos, cantos grosseiros e blasfêmias horríveis.

– Escutem, disse o João; vamos devagarinho, muito devagarinho, a ver quem é que está lá dentro.

Eram seis ladrões armados de pistolas e de punhais, que se banqueteavam alegremente, sentados a unta mesa principesca.

– Que rico assalto acabámos de dar, disse um deles, ao castelo do conde, graças ao auxílio do seu porteiro. Que bom homem este porteiro! À sua saúde!

– À saúde do nosso amigo! repetiram em coro todos os ladrões.

E de um trago despejaram os copos.

João voltou-se para os companheiros, e disse-lhes em voz baixa:

– Uni-vos uns aos outros o melhor que puderdes, e, assim que vos der sinal, rompei todos ao mesmo tempo numa gritaria diabólica.

O burro, levantando-se nas patas traseiras, lançou as mãos ao peitoril de uma janela, o cão trepou-lhe à cabeça, o gato à cabeça do cão e o galo à cabeça do gato. João deu o sinal, e estourou à uma o ornear do jumento, os latidos do cão, o miar do gato e os gritos estridentes do galo.

– Agora, bradou o João, fingindo que comandava um destacamento, carregar armas! Dai-me cabo dos ladrões: fogo!

No mesmo instante o jumento quebrou a janela com as patas, zurrando cada vez mais; os ladrões atemorizados refugiaram-se no bosque, saindo precipitadamente por urna porta falsa.

João e os seus companheiros penetraram na sala abandonada, comeram um excelente jantar, e deitaram-se em seguida. – João numa cama, o burro na cavalariça, o cão numa esteira ao pé da porta, o gato junto do fogão e o galo no poleiro.

Ao princípio os ladrões ficaram muito contentes, por se verem sãos e salvos na floresta. Mas depois começaram a refletir.

– Era bem melhor a minha cama, do que esta erva tão úmida, disse um deles.

– Tenho pena do frango que eu começava a saborear, disse o outro.

– E que rico vinho aquele! acrescentou o terceiro.

– E o que é mais lamentável, exclamou um quarto, é ficar-nos lá todo o dinheiro, que, com a ajuda do criado do conde, tínhamos tirado das gavetas.

– Vou ver se torno lá a entrar! disse o capitão.

– Bravo! exclamaram os ladrões.

E pôs-se a caminho.

Já não havia luz na casa; o capitão entrou às apalpadelas, e dirigiu-se para o fogão; o gato saltou-lhe à cara e esfarrapou-lha com as garras. Soltou um grito doloroso, correu para a porta, mas infelizmente pisou o rabo do cão, que lhe deu uma grande dentada. Gritou de novo, e conseguiu por fim transpor o limiar da porta. Mas quando ia a sair, o galo atirou-se a ele, rasgando-o com o bico e com as unhas.

– Anda o diabo nesta casa! exclamou o capitão, como poderei eu sair?

Julgou encontrar refúgio na estrebaria; mas o burro atirou-lhe uma parelha de coices, que o deixou quase morto no meio do chão.

Passado algum tempo veio a si; apalpou o corpo, viu que não tinha nem pernas nem braços partidos, ergueu-se e tornou para a floresta.

– Então? então? perguntaram-lhe os camaradas assim que o viram.

– Nada feito, exclamou ele. Mas antes de tudo arranjem-me uma cama para me deitar e cataplasmas de linhaça para pôr neste corpo, que o trago num feixe. Não podeis imaginar o que sofri. Na cozinha fui assaltado por uma velha que estava a cardar lã, e arrumou-me na cara com o sedeiro, deixando-me neste miserável estado. Quando ia a sair a porta, um demônio de um remendão atravessou-me as pernas com a sovela. Logo depois, Satanás em pessoa atirou-se a mim, despedaçando-me com as garras. Na estrebaria deram-me uma paulada que me ia matando. Se vocês me não acreditam, vão lá e experimentem.

– Acreditamos, disseram os companheiros, vendo-lhe a cara e o corpo todo ensanguentado. Não seremos nós que lá tornaremos.

Pela manhã, João e os seus camaradas almoçaram ainda excelentemente, e partiram em seguida para restituir ao conde o dinheiro que os ladrões lhe tinham roubado. Meteram-no cuidadosamente dentro de dois sacos, com que carregaram o jumento. Foram andando, andando, até que chegaram à porta do castelo. Diante dessa porta estava o malvado do porteiro com uma libré esplêndida, meias de seda, calções escarlates, o cabelo empoado.

Olhou com ar de desprezo para a pequenina caravana, e disse a João:

– Que vindes aqui buscar? Não há lugar para os recolher, vão-se embora.

– Não queremos nada de ti, respondeu João. O dono do castelo far-nos-á um bom acolhimento.

– Fora daqui, vagabundos, exclamou o porteiro enfurecido. Ponham-se a andar imediatamente, quando não atiro-lhes já às pernas os meus cães de fila.

– Perdão, só um instante, replicou o gaio empoleirado na cabeça do jumento; não me poderias dizer quem é que abriu aos ladrões na noite passada a porta do castelo?

O porteiro corou. O conde que estava à janela, disse-lhe:

– Ó Barnabé, responde ao que este galo te acaba de perguntar.

– Senhor, replicou Barnabé, este galo é um miserável. Não fui eu que abri a porta aos seis ladrões.

– Gomo é então, meu velhaco, tornou o conde, que tu sabes que eram seis?

– Seja como for, disse João, aqui lhe trazemos o dinheiro roubado, pedindo-lhe unicamente que nos dê de jantar e nos recolha esta noite, porque vimos cansados do caminho.

– Ficai certos que sereis bem tratados.

O burro, o cão e o galo, levaram-nos para a quinta. O gato ficou na cozinha. E enquanto a João, o conde reconhecido, vestiu-o dos pés à cabeça com um vestuário magnífico, deu-lhe um relógio de ouro e disse-lhe:

– Queres ficar comigo? És esperto e honrado, serás o meu intendente.

João aceitou a proposta e mandou vir a sua velha mãe para ao pé de si. Casou depois com uma linda rapariga, e viveu sempre felicíssimo.

Fonte:
Guerra Junqueiro. Contos para a infância.