sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Antônio Lôbo (Os Novos Atenienses)


O perfil intelectual de Antônio Lôbo, no panorama da Literatura Maranhense, tem como paradigma as próprias concepções que ele expressou no texto de uma obra que, sem vias de dúvida, é precursora, fundadora, mestra e pioneira, no campo da crítica e teoria literária maranhense, Os Novos Atenienses, editada em primeira edição pela Tipografia Teixeira, em São Luís do Maranhão, 1909; reeditada pelo SIOGE, sob os auspícios da Academia Maranhense de Letras, em 1970, quando da passagem do Centenário de Nascimento do Autor.

Em Os Novos Atenienses, Antônio Lôbo analisa o renascimento da cultura e da literatura maranhense, procurando registrar e resgatar o momento literário de então, bem como a vida e a obra dos escritores que se destacaram na primeira década do século XX, apresentando em seu discurso uma leitura bem peculiar, que classificaríamos até de profética, dada a verdadeira atenção para as entrelinhas e os subentendidos usados por ele, com certeza para driblar a ditadura das letras da sociedade aristocrática da época, elitista, cartesiana, conservadora e puritana, sobretudo hipócrita, toda poderosa em seu círculo radicalmente fechado.

Sem dúvida, para falar dessa fase imediatamente finissecular, ele se estrutura nos precedentes, um momento áureo e de apogeu da Literatura Maranhense, em razão do qual o Maranhão mereceu o epíteto de Atenas Brasileira. Momento marcante, representado por escritores, eruditos, intelectuais e homens cultos do porte de Sotero dos Reis, Odorico Mendes, João Lisboa, Henriques Leal, Gonçalves Dias e poucos outros.

Os marcos anunciadores desse renascimento, na prática, são a fundação da Oficina dos Novos, em 28 de julho de 1900, que teve, como idealizador e responsável, o próprio Antônio Lôbo, e da Renascença Literária, em 17 de março de 1901, movimento cultural dissidente, encabeçado por Nascimento Moraes.

O principal mérito da obra Os Novos Atenienses, de Antônio Lôbo, está no caráter da novidade e autenticidade do documento para a época e para hoje, pelo fato de o texto ter vários olhares, leituras e diálogos, cujo descortino aponta para um universo semântico simultaneamente fixado no presente de então, na grande noite negra que o precedeu, num passado áureo e no futuro. Tempo esse sempre escasso e gasto por antecipação por quantos se equivocam sobre o que seja imortalidade. Inquestionavelmente, um manifesto, um documento referencial único, que funda, paralela e simultaneamente, uma teoria e uma crítica literária, portanto uma obra pioneira, no gênero, como referencial de visão crítica de uma época. Entre outros méritos está, também, o de registro e resgate dos movimentos, jornais e revistas literárias que cobrem o final do século XIX e o início do século XX.

Lendo Os Novos Atenienses, tomamos conhecimento da cultura literária de um escritor e de toda uma congregação geracional, aglutinada em torno deste como mentor intelectual, que se impôs por mérito e por necessidade. Temos consciência do quanto esta obra é indispensável, para que se possa fazer justiça aos que, do passado, passaram ao tempo presente, literariamente. Travamos conhecimento com a seriedade de propósitos e comprometimento de um homem de firmeza de caráter admirável, como Antônio Lôbo, para com a literatura e a sociedade maranhense. Um homem que preferiu morrer a corromper-se em qualquer plano. Não houve nem há tantos maranhenses da sua estirpe, muito pelo contrário. Com ele, podemos viajar para o passado e conviver com uma visão preconceituosa e restritiva que a intelectualidade maranhense tinha sobre a criação literária.

Lendo-se o texto de Antônio Lôbo, tem-se a antevisão de que, no Maranhão do início do século XX, ainda predominava a tacanha concepção parnasiana, equivocada, sobre o que seja a essência do poético ou da poesia. Portanto, poeta ainda era o doutor em se tratando de versificação e metrificação. E ele próprio fez certas concessões a esse tipo de pensamento, creditando, na teoria, conceitos sobre os quais, na prática, não referendara.

Felizmente, quando lemos Antônio Lôbo, percebemos, nas entrelinhas, que os seus verdadeiros eleitos não eram, senão, aqueles que a elite cultural da época considerava malditos, decadentes ou manquê, já que ele próprio, no mais belo poema que publicou, Por Amor de uns Olhos, paradoxal e contraditoriamente, se expressou como um legítimo simbolista, contrariando os cânones parnasianos, tão em voga, porém já retrógrados para poetas da estirpe de excêntricos como Maranhão Sobrinho, I. Xavier de Carvalho, Luís Carvalho e Alfredo de Assis, dentre poucos outros, que viveram o tempo cronológico de sua geração e muito além.

POR AMOR DE UNS OLHOS
Antônio Lôbo
...........................................................
Olhos que lembram preces e luares,
Céus estrelados, vagas marulhantes,
Guitarras a gemer, harpas cantantes,
Noites de amor em flóridos pomares,
...........................................................
Olhos que evocam, sugestivamente,
Umas paisagens líricas de sonhos,
Sob o clarão nostálgico e tristonho
De um perene luar, saudoso e algente,

Vagos queixumes, indecisas mágoas,
Prantos convulsos, nalgum sítio ermo
Harpejos tristes de alaúde enfermo,
Cisnes boiando sobre claras águas,

Velas que passam deslizando mansas,
Por tardes tristes, invernosas, frias,
Um desfilar de castas utopias,
Todo um cortejo branco de esperanças;
Olhos que a gente nunca mais esquece,
Como eu vos amo e quero, saiba embora
Que não se fez pra mim à luz da aurora
Que nas vossas pupilas resplandece,

Que as horas passem, que se volvam os dias,
Que os anos se amontoem sobre os anos,
Que um após outro cheguem os desenganos,
Que uma após outra fujam as alegrias,

Sempre na mente vos trarei brilhando,
Sempre em minhalma vivereis luzindo,
Olhos que um dia eu conheci sorrindo,
Olhos que após abandonei chorando.

(Moraes, Jomar. Vida e Obra de Antônio Lôbo. São Luís: Revista Legenda Editora, 1969. p.53-55.)

OS NOVOS ATENIENSES: A OFICINA DOS NOVOS & A RENASCENÇA LITERÁRIA

Essa agremiação, instalada a 28 de julho de 1900, sob o patronato de Gonçalves Dias, por Francisco Serra, João Quadros e Astolfo Marques, foi a Oficina dos Novos, que ainda hoje se mantém nesta capital, e cuja direção ficou assim composta: Presidente, Francisco Serra; Vice-Presidente, Luís Carvalho; Secretário-Geral, Astolfo Marques; Tesoureiro, Monteiro de Sousa; 1º Secretário e Bibliotecário, Maranhão Sobrinho.(...) O seu quadro social, que se foi sucessivamente alargando, conta hoje 30 sócios efetivos, 40 sócios honorários e 51 sócios correspondentes. A Oficina fez-se representar na imprensa por um periódico: Os Novos,(...).

Depois da publicação do primeiro número de Os Novos, isto é – a 16 de agosto de 1900, surgia na imprensa literária da terra, outro periódico – A Atualidade, - dirigido por Luís Carvalho e Henrique Fernandes, com a colaboração de Fran Paxeco, Damasceno Ferreira, Raimundo Santiago, Luís Serra, Maranhão Sobrinho, Viriato Correia, João Quadros e Agostinho Reis. Este último mantivera, anteriormente, outra folha literária, também de publicação periódica, em que haviam colaborado, I. Xavier de Carvalho e A. dos Reis Carvalho.

No ano seguinte, isto é – em 1901, desligava-se da Oficina dos Novos, um grupo de moços, para ir fundar uma nova sociedade.: A Renascença Literária, representada logo na imprensa por um mensário – Renascença, que viveu de 1901 a 1902, redigido por I. Xavier de Carvalho, Nascimento Mo-raes, M. George Gromwell, Otávio Galvão, Rodrigues de Assunção, Leôncio Rodrigues, Leslie Tavares e Caetano Sousa.

NOTA

É interessante notar que, até quando Antônio Lôbo faz certas restrições relacionadas ao modo peculiar como alguns poetas manejavam a mimésis, em nível da estesia, ou seja, como percebiam a beleza, de uma maneira estranha, extravagante, a exemplo de I. Xavier de Carvalho e Maranhão Sobrinho, que operaram os poemas, privilegiando as percepções sensoriais, é com uma diplomacia que desarma qualquer ânimo de antítese. Porque, primeiro, ele exalta, engrandece, amacia o ego, como um conterrâneo orgulhoso e ufanista dos irmãos que tem, para, em seguida, censurar, mas, ainda na censura, elogioso. Percebe-se que, no fundo, ele era um simpatizante da ousadia dos jovens pares, poetas que hoje são reconhecidos como legítimos antecipadores do Modernismo, por haverem criado uma autêntica maneira de se significar no discurso, através da alegoria, em nível da trapaça e do fingimento de que tão bem nos falou Fernando Pessoa. Luís Carvalho e Alfredo de Assis são exemplos típicos dessa aspiração que consagrou poetas como I. Xavier de Carvalho e Maranhão Sobrinho, que souberam construir textos, cujas bases são a sinestesia, a onomatopéia, a prosopopéia, a aliteração, o paradoxo, a ambigüidade, esse contraditório, portanto, ao estilo parnasiano, gerador das funções da linguagem no aceso do poético e metalingüístico. Luís de Carvalho, por exemplo, é alegoria pura, aliteração, sinestesia, onomatopéia, prosopopéia, a nos lembrar o soneto Moenda, de Da Costa e Silva.

Fonte:

Nenhum comentário: