quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

J. G. de Araújo Jorge ("Os Mais Belos Sonetos que o Amor Inspirou") Parte 19


José Corrêa da Silva Júnior
(Pilar/ AL, 22 janeiro 1893 –  Santos/SP, 9 setembro 1972).

" PUDOR “

Ama-me assim, sem ânsias nem clamores,
sem amostras no olhar de coisa alguma,
num silêncio feliz, num gesto, em suma,
furtivo às aparências exteriores.

Deixa que o teu amor a paz resuma
essas noites propícias aos amores,
em que os gritos das luzes e das cores
ficam velados através da bruma.

Ama-me assim, como se as nossas vidas
duas árvores fossem diferentes,
por desiguais radículas nutridas...

E como se a alegria que abafamos
amargasse nos frutos renascentes
e entristecesse os pássaros nos ramos. . .
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Corrégio de Castro
(sem dados biográficos)

" FLOR DO HELIANTO (GIRASSOL) "

Conheces, certo, aquela flor dourada
que volta a face para o sol nascente
e, tendo a face para o sol voltada,
constante o segue, desde a aurora ao poente.

E já notaste que, se anuviada
a esfera de turquesa não consente
se perceba o astro louro, a flor amada
mesmo sem vê-lo, segue o sol ausente?

Também minha alma é como a flor do helianto.
Desde o instante feliz em que te vi
como tocada de um suave encanto,

- não sei que força estranha que senti -
pois em riso ela esteja, esteja em pranto,
trago-a sempre voltada para ti!
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Cruz e Souza
João da Cruz e Souza,
(Florianópolis/SC, 24 novembro 1862 – Antonio Carlos/MG, 19 março 1898)

" CORPO "
VII

Pompas e pompas, pompas soberanas
Majestade serene da escultura
A chama da suprema formosura,
A opulência das púrpuras romanas.

As formas imortais, claras e ufanas,
Da graça grega, da beleza pura,
Resplendem na arcangélica brancura
Desse teu corpo de emoções profanas.

Cantam as infinitas nostalgias,
Os mistérios do Amor, melancolias,
Todo o perfume de eras apagadas...

E as águias da paixão, brancas, radiantes,
Voam, revoam, de asas palpitantes,
No esplendor do teu corpo arrebatadas!

ENCLAUSURADA

Ó Monja dos estranhos sacrifícios.
Meu amor imortal! Ave de garras
e asas gloriosas, triunfais, bizarras,
alquebradas ao peso dos cilícios.

Reclusa flor que os mais revéis flagícios
abalaram com as trágicas fanfarras,
quando em formas exóticas de jarras
teu corpo tinha a embriaguez dos vícios.

Para onde foste, ó graça das mulheres,
graça viçosa dos vergéis de Ceres,
sem que o meu pensamento te persiga?!

Por onde eternamente enclausuraste
aquela ideal delicadeza de haste,
de esbelta e fina ateniense antiga?!

" MAGNÓLIA DOS TRÓPICOS "
                                                 À Araújo Figueredo

Com as rosas e o luar, os sonhos e as neblinas,
Ó magnólia de luz, cotovia dos mares,
Formaram-te talvez os brancos nenúfares
Da tua carne ideal, de correções felinas.

O teu colo pagão de virgens curvas finas
É o mais imaculado e flóreo dos altares,
Donde eu vejo elevar-se eternamente aos ares
Viáticos de amor e preces diamantinas.

Abre, pois, para mim os teus braços de seda
E do verso através a límpida alameda
Onde há frescura e sombra e sol e murmurejo;

Vem! com a asa de um beijo a boca palpitando,
No alvoroço febril de um pássaro cantando,
Vem dar-me a extrema-unção do teu amor num beijo.
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Cruz Oliveira
(Júlio Auto da Cruz Oliveira)
(Maceió/ AL, 5 dezembro 1880 – ????)

" OLHOS "

Olhos! Tantos amei quantos me abandonaram. . .
Tantos cobri de bens, de inefáveis ternuras,
quantos me querem mal, que em lugar me deixaram
de minhas ilusões, desilusões bem duras.

E dizer que os perdoei: que mau grado amarguras
de que venho de encher dias que se passaram,
só lhes desejo o bem das carícias mais puras
- que hoje me apraz perdoar os que me não perdoaram!

E isso me cura um pouco esse desgosto imenso
de amá-los, esse tédio, a fartura, o cansaço
da vida; e me dá mesmo um prazer quando penso

nas vezes em que a sós eles se consideram
e me admiram mais, pelo bem que lhes faço,
do que eles pelo mal que sempre me fizeram.
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Cynthia Castello Branco
(sem dados biográficos)

" PROFANAÇÃO "

Tenho-lhe um ódio quase extravagante
depois de havê-lo amado com loucura...
As vezes penso que se o amor não dura,
tece correntes, mesmo agonizante!

Sinto-me escrava dele e a cada instante
pergunto-me a razão desta clausura! . . .
Talvez porque nascendo é uma ventura,
o amor que morre é sempre vigilante.

Quero afastar os laços que me prendem
ao meu destino, assim como se eu fora
este chão que ele pisa . . . E, entretanto,

garras do Tempo sobre mim se estendem
e é uma vertigem doida, embriagadora,
odiá-lo assim depois de amá-lo tanto!

Fonte:
– J.G . de  Araujo Jorge . "Os Mais Belos Sonetos que o Amor Inspirou". 1a ed. 1963

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