sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Soares de Passos (Partida)


Ai, adeus! acabaram-se os dias
Que ditoso vivi a teu lado;
Soa a hora, o momento fadado:
É forçoso deixar-te e partir.
Quão formosos, quão breves que foram
Esses dias d'amor e de ventura!
E quão cheios de longa amargura
Os da ausência vão ser no porvir!

Olha em roda estas margens virentes:
Já o outono lhe despe os encantos;
Cedo o inverno com gélidos mantos
Baixará das montanhas dalém.
Tudo triste, sombrio, e gelado,
Ficará sem verdura nem flores:
Tal meu seio, privado d'amores,
Ficará de ti longe também.

Não sei mesmo, não sei se o destino
Me dará que eu te abrace na volta...
Ai! quem sabe onde a vaga revolta
Levará meu perdido baixel?
Sobre as ondas, sem norte, e sem rumo,
Açoutado por ventos funestos,
Sumirá por ventura seus restos
Nas voragens d'ignoto parcel.

Mas ah! longe esta ideia sombria!
Longe, longe o cruel desalento!
Após dias d'amargo tormento
Virão dias mais belos talvez.
Dá-me ainda um sorriso em teus lábios,
Uma esp’rança que esta alma alimente,
E na volta da quadra florente
Eu coas flores virei outra vez.

Mas se as flores dos campos voltarem
Sem que eu volte coas flores da vida,
Chora aquele que em tumba esquecida
Dorme ao longe seu longo dormir;
E cada ano que o sopro do outono
Desfolhar a verdura do olmeiro,
Lembra-te ainda do adeus derradeiro,
Deste adeus que te disse ao partir!

Fonte: 
Poesias de Soares de Passos. 1858 (1ª ed. em 1856). http://groups.google.com/group/digitalsource

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