sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Teatro de Ontem e de Hoje (O Cão Siamês)

Peça de Antônio Bivar lançada em 1969, na esteira do sucesso aberto por Cordélia Brasil, traz uma marcante interpretação de Yolanda Cardoso, que divide a cena com Antonio Fagundes, sob a direção de Emílio Di Biasi. A encenação é materialmente modesta, mas iluminada pelos intérpretes. Espetáculo cult, faz breve temporada e tem pouco público.

A peça é centrada na figura de Alzira, uma explosiva outsider, crítica, bem informada, desbocada e irreverente, que atende a Ernesto, vendedor de enciclopédias que bate à sua porta. O rapaz, casado e com filhos pequenos, revela-se uma pessoa sem sonhos, conformado com sua vida modesta e sem perspectivas. O encontro entre figuras tão díspares produz um conflito: o anarquismo de Alzira triunfa, massacrando a racionalidade de Ernesto. Para Emílio Di Biasi, "Alzira é uma heroína marginal, já que ela faz a apologia de tudo o que vai contra os princípios do que se convencionou chamar sociedade. A sociedade absurda de Ernesto contra o absurdo mundo de Alzira. [...] Ela se recusa a qualquer tipo de sentimentalismo pessoal e leva seu subconsciente violento até as últimas conseqüências".1

Em 1970, o diretor Antônio Abujamra monta o texto no Rio de Janeiro, retrabalhado e aumentado por Bivar, com a mesma atriz e com Marcelo Picchi vivendo Ernesto. A encenação alcança grande sucesso e repercussão, rebatizada como Alzira Power, retorna posteriormente para São Paulo, onde faz longa carreira.

A encenação carioca desperta vivo entusiasmo na crítica especializada, como anota Henrique Oscar no seu comentário: "O espetáculo de Abujamra está todo apoiado numa hábil direção de atores. Neste sentido, o rendimento obtido com Yolanda Cardoso é muito grande. Ela assume o papel com uma garra impressionante. Outro que se sai muito bem é o ator paulista Marcelo Picchi, em seu segundo desempenho profissional. Num papel que pede muito menos do intérprete do que sua parceira, ele tem um trabalho perfeitamente realizado, inclusive nos momentos mais perigosos que o texto lhe exige".2

Antônio Bivar completa em seu livro detalhes peculiares sobre a montagem de Abujamra: "Tirando o Hair, onde todos ficavam nus, Alzira era novidade também por, além de ser uma peça que falava fundo às mulheres - como nenhuma peça brasileira até então (a personagem-título era uma libertária desvairada) - tinha, como sobremesa, a exibição demorada e ritualística de um rapaz pelado. Não estava no texto, era coisa da direção picárdica de Antonio Abujamra".3

Yolanda Cardoso recebe, com este desempenho, todos os prêmios como melhor atriz do ano, tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo.

Notas

1. ALZIRA POWER OU O CÃO SIAMÊS DE ALZIRA PÔ... LÔCA. Direção e texto Emílio Di Biasi. São Paulo, 1969. 1 folder. Programa do espetáculo, apresentado no Teatro Ruth Escobar em agosto de 1969.

2. OSCAR, Henrique. Diário de Notícias. Rio de Janeiro, jul. 1970.

3. BIVAR, Antonio. Longe Daqui Aqui Mesmo. São Paulo, Best Seller, 1995, p. 17.


Fonte:
Enciclopédia Itaú Cultural

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