domingo, 24 de novembro de 2013

Braga Montenegro (Suspeita)

vedi, caro, che si guadagna a chieder certi prechè? Ti bagni i piedi.
Pirandello (Mattia Pascal)

                 O olhar da doente percorreu em volta o quarto e fixou-se, por fim, cansado e cheio de angústia, sobre um rosto amarrotado de vigílias e de cuidados, que ao lado do leito velava infatigavelmente.

                – Estou suando... Que horas são?

                – É tarde. Madrugada... bem três horas. Acalme-se.

                – Preciso mudar de roupa. Estou suada, com frio... (Não seria o delírio?!)

                João Vieira palpou o braço que a mulher lhe estendia. A pele mirrada por tantos dias de doença estava umedecida de suor. Depois lhe passou a mão pela fronte, levantando o cabelo aparado sob o capacete de borracha. Há dezoito dias consecutivos que a febre queimava aquele corpo dolorido, a despeito dos sacos de gelo, das injeções e dos médicos. Os médicos! Cada um que chegava receitava novos remédios: “Vamos ver.” Ao cabo de alguns dias, a uma sua interrogação mais aflita, respondiam com evasivas: “Pode ser... o caso é grave...” E maior lhe ficava no peito o desespero, a sensação tremenda do irremediável.

                – É. Está molhada de suor. Quer trocar a camisa?... Vou chamar alguém. – Marchou para a porta e logo voltou-se, mudando de resolução. Abriu o camiseiro e tirou, dentre o desalinho de uma gaveta atulhada, algumas peças de roupa.

                Suspendeu com cuidado o corpo desfalecido, amparou a cabeça e as costas doentes com o braço esquerdo e foi de leve despindo-a. “Coitadinha; pele e ossos!” Sentiu lágrimas nos olhos. “Coitadinha!” Mudou todos os panos da cama, devagarinho, com muito jeito para não magoá-la, entre os gemidos dela e as suas lágrimas de piedade. “Coitadinha... os médicos já não têm mais esperança!...”

                – Está melhor? – Não esperou resposta. – Vamos tomar a temperatura... – Houve um silêncio repleto de ansiedade. – Que?! 36 graus e dois décimos! A febre cedera; ficaria boa... Retirou o gelo. Ah! Se não fosse mais preciso! Inquietava-o, todavia, aquela prostração, aquele acabamento. Estava muito fraca. Até que ficasse restabelecida demandava tempo... Felizmente a febre passara. Chegou-se muito a ela e falou carinhosamente, os lábios bem próximos às suas faces muito brancas e enceradas – a caveira desenhando-se-lhe sob a pele encolhida:

                – Meu bem, agora você vai ficar boa... Como você se sente? Está melhorzinha? Procure dormir; a febre já passou.

                Ela nada respondeu, de pálpebras cerradas, como numa vertigem. O suor escorria-lhe nas frontes, no pescoço, no corpo todo, molhando mais roupas que ele não se cansava de mudar. De repente, ela estremeceu como num arrepio de frio, abriu muito os olhos e, brando, tocou com os dedos vacilantes no rosto dele, que se lhe inclinava por cima do busto.

                – Querido... eu vou morrer. Estou gelada... os pés... É melhor, João. Tanto tempo... e depois!... Mas eu te amo, querido... Muito! Perdoa a tua mulherzinha, meu bem. (Estaria delirando?!) – Chegou mais o ouvido à boca que pronunciava aquelas palavras confusas e dolorosas. – Eu te enganei, João. Adoeci, vou morrer... É para nosso bem. De que servia eu viver dessa maneira?... Perdoa... Amo-te muito! Muito!

                Num gesto rápido, deixou as mãos se abaterem sobre os lençóis, repuxando-os com os dedos crispados. Abriu a boca duas vezes, e na sua fisionomia passou como que um retalho levíssimo de gaze...

                – Fale, fale... Diga mais alguma cousa!... Ande, diga mais alguma cousa!... Diga que está mentindo, meu bem!...

                A manhã se insinuava, fria e triste, através das vidraças e por entre as frestas dos postigos, enchendo o quarto, vinha do jardim o cheiro ativo dos bogaris e resedás.
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                 Do enterro se encarregara um cunhado de João Vieira. – Cousa que não ficasse muito cara, que não podia; segunda ou mesmo terceira classe.

                Logo às primeiras horas da tarde, a casa começou a se encher de gente; vizinhos, parentes da morta, amigos, curiosos. Vagava por todos os aposentos um cheiro horroroso de flores, de mistura com desinfetantes e fumaça de velas. João observava todo aquele movimento, aquela verdadeira balbúrdia, com ar distante. Cousa esquisita: a presença da esposa, ali, emudecida para sempre, pouca sensação de desgosto lhe trazia. Estava atordoado, quase insensível. As palavras dela pouco antes de morrer (seria o delírio?!) e a morte afinal, que nos primeiros momentos tanta amargura e tantas lágrimas lhe custaram, eram para ele, agora, como um entorpecimento: uma sensação muito desagradável porém não dolorosa. E o seu espírito divagava, fixava-se em cousas indistintas, abstraindo-se, quase completamente, da tragédia que o vitimava.

                A imaginação o levava ao sertão distante onde nascera, à fazenda dos pais já velhos e cada vez mais apegados à terra onde sempre viveram. Lembrava-se dos irmãos, homens broncos e generosos como crianças, que por lá se casaram e se encheram de filhos. Ele, nem filhos tivera! Sentia-se como uma ovelha desgarrada. Logo em pequeno, botaram-no num colégio de religiosos de sua cidade sertaneja; depois viera para a capital estudar e arranjar emprego... Por que não ficara com os seus, a viver suavemente como eles, sem grandes alegrias nem grandes tristezas? Mas era assim... diferente, como se nunca tivesse família.

                Um automóvel, parando à porta, tirou-o de seus devaneios. Logo mais chegaram outros carros e deles saltaram indivíduos circunspectos metidos em roupas escuras; gente, talvez, da amizade do sogro, gente que ele nem conhecia. Via sujeitos de caras compungidas – caras de profissionais de solenidades – chegarem-se a ele, tocarem-lhe o ombro e murmurarem palavras titubeantes de sentimento e tristeza. Via-os, depois, formarem grupos pelos cantos e na calçada, em conversações amistosas, alegres...

                Afinal, o enterro saiu. Em breve a casa estava vazia.

                Quando ficou só, tomou-o uma piedade imensa por si mesmo e chorou perdidamente.
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                 Ao voltar para o trabalho já se havia celebrado a missa de sétimo dia. Tinha ido à igreja; não porque fosse religioso... Fora. O que diria a família da finada se ele não comparecesse àquele “ato de caridade cristã”, como diziam os avisos fúnebres dos jornais? Seria uma indelicadeza... Embora tivesse de suportar as mesmas caras compungidas e falsas do dia do enterro. Era preferível à censura (“eu não esperava isto de sua parte!”) dos parentes afins, às perguntas capciosas dos colegas: – “Vieira, você nem foi à missa... Estava doente? Eu estive lá. Por que você não foi?...” Sabiam que ele não frequentava a igreja, que não estivera doente, mas gozavam a sádica maldadezinha dissimulada nas dobras de falso interesse.

                Fora. Isto o fizera sofrer. Desejara cuspir na face de toda aquela gente ridícula que pretendia fazer dele um instrumento para a sua piedade de circunstância e de mentira. Estúpidos que não percebiam sequer a dor que o magoava!...

                Entrou no escritório mais cedo do que a hora regulamentar. Lá estavam apenas o Gerente, os contínuos e um ou outro funcionário mais zeloso. Sentia-se verdadeiramente desambientado. Tinha de esperar o colega que o substituíra na ausência. Aquilo não devia estar muito em ordem. Derreou o paletó pelos ombros fatigados e pendurou-o no cabide ao lado da carteira. Pensou na maçada que iria sofrer do Subgerente quando tivesse de acertar com ele as suas faltas: parte deveria ser convertida em férias e do restante que iriam fazer? Ele bem precisava que elas fossem abonadas. Seria um ótimo auxílio. Qual! Não pensasse ele nisso. Bando de somíticos!... – “Não podemos, seu Vieira; os lucros têm sido poucos; o senhor é um bom auxiliar; creia que temos boa vontade...” Ele que se lixasse! Que iria fazer sem dinheiro para tanta despesa? As contas das farmácias e dos médicos eram grandes, sem dúvida. Não cogitara ainda de nada. Sabia que não tomaria pé. Era um desgosto ver as dívidas enormes e ele sem ter donde tirar. – Doutor, faça um abatimento. E o médico, afetando generosidade: – “Está bem, vinte pro cento, é preço que não faço para ninguém. Sai a visita a menos de quinze mil réis. Acho que não é muito sacrifício; o senhor é bem colocado...”

                Bem colocado! Um conto de réis mensal de nada vale. As contas eram grandes... Possuía os móveis, mas desses pouco conseguiria apurar porque ainda não fizera um ano de comprados e havia a liquidar algumas prestações. Sobrariam, talvez, uns dois contos. Isto num cálculo otimista. Que valia em comparação ao que tinha de pagar? O aluguel da casa estava atrasado de dois meses. Só aí quinhentos mil réis! E a mercearia? E a luz? Até à lavadeira devia. Estava inteiramente descontrolado.

                Soaram oito horas no velho relógio que se prendia à parede, lisa e manchada de bolor, entre dois retratos de sujeitos graves abotoados até o queixo. Já por todo o escritório se fazia ouvir o matraquear enervante das máquinas de escrever, e o Subgerente, passeando de um lado para o outro, exercia rigorosa fiscalização pelas carteiras e sobre os empregados. Recebia o serviço que o colega lhe passava com muitas explicações e algumas desculpas. Em breve, a atenção presa à tarefa, esquecia as suas infelicidades.
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                À noite, só no quarto (alugara um quarto num sexto andar, onde morava desde que enviuvara), assaltavam-no pensamentos cruéis, dúvidas terríveis. Voltavam-lhe à ideia as palavras da morta. Há quantos dias aquilo o atormentava! Por que não deixar ficar no rol das cousas extintas, desaparecidas para sempre, já que o motivo de tudo cessara? Embalde procurava dar freio à imaginação exacerbada. A quem ela teria se referido? Desesperava ao imaginar-se ridículo, alguém a considerá-lo um pobre diabo enganado. Evitava os amigos; todo homem que pudesse ter tido qualquer conhecimento com ela... Pensou no Gerente. Abalaram-se-lhe os nervos numa comoção mais forte. Lembrava-se de um dia em que a mulher o fora procurar no trabalho, e o Gerente, muito risonho, pondo à mostra a dentadura magnífica, a atendera solícito, recostando-se ao balcão e palestrando enquanto o contínuo ia chamar o “seu Vieira”. De logo, achava absurdo o que imaginara: não, não podia ser... Um rapaz distinto, muito delicado com os auxiliares, de hábitos morigerados... O Subgerente, sim, era um peste; mesquinho até com o que não lhe pertencia. Mas não se tratava deste, certamente, que já era velhusco e de aspecto bastante ridículo e singular, sempre metido numa vestimenta de pano e feitio de segunda ordem. Não se trataria certamente de nenhum dos seus colegas... De quem?

                Esforçava-se para afastar de si essa obsessão que lhe ia consumindo aos poucos as energias, envolvendo-o irremissivelmente. “Talvez não tenha havido cousa alguma, racionava, tenha sido apenas uma tentação, um desejo como tantos que se nos apresentam na vida mas que repelimos imediatamente. É assim... A consciência reprova a intenção desonesta, sobrevindo o remorso de uma falta que não cometemos, pelo simples fato de nos julgarmos capazes de cometê-la. Subconscientemente, o delírio traiu-a. foi, foi só isto mesmo... muito complicado, mas assim...”

                Estes solilóquios tomavam-lhe horas inteiras. Pesava os prós e os contras, procurava reconstituir fatos, circunstâncias, contradições. O passado lhe aparecia como numa névoa, através da exaltação que o possuía. Só lhe vinham à memória os momentos felizes de enleio amoroso. Encontrara na companheira o amigo único que constantemente desejara. Era um tímido e um orgulhoso, por isso nunca fizera, jamais faria amigos. Criara em torno de sua pessoa um círculo refratário onde se apagavam todas as expansões, todas as simpatias. A mulher compreendera isto muito bem. Suprira toda a sua necessidade de afeto. Como poderia supor-se enganado por ela?... Amara-a com uma paixão tão sadia que se, como acontecera algumas vezes, a procurava à noite, sob a excitação de um sonho erótico, sofria depois remorsos como se tivesse cometido uma prevaricação.

                A essa evocação sensual e íntima, sofria até ao desespero. Doía-lhe pensar que alguém, quando ele se ausentava para o trabalho, entrasse ocultamente em sua casa ou que a mulher frequentasse lugares suspeitos, para consentir a outrem a posse, mesmo que fosse o espetáculo, do seu corpo branco e perfeito. Rememorava com tal veemência os encantos da companheira, que era como se a tivesse ali, bem junto, numa presença querida e desejada. “Via”-lhe os seios redondos e acentuadamente convexos, a pele morna e perfumada, o rosto bonito onde os olhos se enlanguesciam grandes e negros; “ouvia” a sua fala, o rumor dos seus beijos; “sentia” a carícia violenta dos seus abraços... e chorava de despeito, infeliz como uma criança batida.

                João Vieira atravessou a rua e, ao subir o passeio, de distraído que ia, abalroou com um sujeito de óculos que, à beira da calçada, lia um jornal. O choque, nas circunstâncias por que se deu, foi mais desastroso que violento. Os óculos do homenzinho se lhe despregaram do rosto e, antes que os tivesse salvos entre os dedos, houve uma série de gestos rápidos e atabalhoados, de que lhe resultou a queda do chapéu, do jornal e de alguns níqueis que se espalharam pelo calçamento.

                – O senhor vem cego?... – berrou furioso.

                – Desculpe, cavalheiro – fez João Vieira, um tanto vexado ao perceber a irritação, os cabelos revoltos, a gravata amarrotada de seu interlocutor.

                – Desculpe, cousa nenhuma... seu estúpido!

                – Já lhe pedi desculpas, meu amigo e já lhe disse que não foi por gosto... Então, entenda como quiser!... – respondeu energicamente.

                – Parece que vem doido! – ainda disse o outro, batendo na palma da mão o feltro empoeirado do chapéu.

                João Vieira, percebendo que o incidente degenerava numa discussão inútil e ridícula, afastou-se com o coração batendo de excitação. “Só a mim isto acontece; que cousa irritante!...” disse consigo.

                Procurou um banco no jardim para descansar e ler um pouco. Mas não pôde fixar a atenção na leitura. Contemplou, através da reduzida iluminação, o céu enluarado e macio. Lá estavam as constelações de que ele nada sabia quando era pequeno e dava-lhes nomes poéticos: Sete-estrelo, as Três-Marias, os Três-Reis, o Cruzeiro, o Rosário, como toda a gente da sua terra sertaneja. Assim ficou muito tempo, gozando a frescura do vento noturno que lhe afagava as faces e apaziguava o espírito. Uma doçura imensa lhe penetrou os nervos, encheu-lhe a alma.

                No relógio da praça bateram nove badaladas. Tinha de ir ao quarto. Decidira fazer uma arrumação em regra nas suas cousas, que ainda não haviam tomado lugares definitivos. Levantou-se e saiu assobiando, baixinho, uma melodia predileta.

                Entre os móveis que trouxera de casa para o quarto havia uma pequena escrivaninha encimada de uma estante, e que era de uso da esposa. Esse móvel tinha duas gavetas e uma delas estava trancada, cousa que somente agora notava. Procurou nos escaninhos, dentro da outra gaveta, por toda a parte, nas outras peças, a chave que desse ali.

                Nada.

                Ocorreu-lhe, então, uma suspeita cruel: quem diria se aí não estava a prova de tudo? Febrilmente, com o auxílio de uma espátula de metal, machucando os dedos, forçou a tábua. Abriu. Percebeu, de logo, um maço de cartas amarrado com um torçal de seda. Rompeu o amarrilho e uma onda de perfume o envolveu. Quanta recordação! O perfume que sempre usara quando noivo e de que as suas cartas estavam impregnadas. Curioso até à agonia e um tanto ressabiado de nada ter encontrado que lhe confirmasse as suspeitas, prosseguiu na busca, mais nervoso, com o coração a esmurrar-lhe o peito, dolorosamente. Procurava uma prova, queria a certeza, mas quanto horror sentia de encontrar essa prova, de ter essa certeza! Tinha, agora, um livro entre as mãos. Lia-se-lhe na capa, em letras douradas: “Diário de A...”

                Folheou algumas páginas escritas com letra miúda e vulgar, numa linguagem ingênua, às vezes preciosa. “O bom gosto não era o seu forte...” – pensou. Premiu o livro entre o polegar e o índex e as folhas escorregaram céleres, até que viu o seu nome e parou recomeçando a leitura:

                “3 de março – Papai nem mamãe querem que eu me case com João, mas que hei de fazer, se o amo?” A nota era longa. Enterneceu-se. Umedeceram-se-lhe os olhos e reprimiu um soluço que se lhe quebrou na garganta. Passou adiante:

                “24 de dezembro – Afinal, casei-me. Hoje, véspera de Natal – parece um sonho! – estou a sós com o homem que amo...” Este registro seguia; sóbrio às vezes, piegas quase sempre, todavia de uma grande sinceridade e pleno de recordações agradáveis.

                Leu outras páginas. Todas revelavam a história de sua ternura, de seu pobre amor interrompido... continuou lendo:

                “6 de julho – ... quem me dera um filho!”

                “12 de julho – O dia está muito quente. Sinto-me fatigada e só. Aborreço-me. A leitura me enfada e o tédio me possui... Não tenho um filho. Por que João não está a meu lado? O movimento da rua me enerva, provoca-me gritos que reprimo com receio de enlouquecer. Para qualquer lado que me volte encontro o vazio. Vou chorar. Estou me tornando tola...”

                “25 de julho – ... e ele me persegue por toda a parte onde vou... Sinto os seus olhares lúbricos sobre mim, às vezes com tal persistência que me imagino nua. Já não sei com que força estou resistindo. Que será de mim?!”

                “26 de julho – Só a meu marido amo. Disto estou certa... Contudo sei que não posso fugir à opressiva sensualidade que dele me vem... Tenho medo, mas me aproximo desejosa... As minhas resistências diminuem... diminuem...”

                “30 de julho – Estou como se fora a mariposa em torno da luz. Por que João não me salva?... Mas como poderia ele fazer alguma cousa em meu benefício, se não percebe a miséria em que estou envolvida, se eu sou pusilânime e nada lhe confesso para que ele me salve, para que ele me guarde?”
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                “29 de agosto – Estou doente; tenho febre. Ah! Se eu morresse!”

                Rasgou, uma por uma, as folhas do Diário e, riscando um fósforo, queimou-as todas. Tirou o paletó do cabide, vestiu-o, aprumou o chapéu na cabeça. Ao sair, encontrou o zelador do prédio, metido numa camisa de listras horizontais, a se balançar no seu andar compassado de símio.

                – Boa noite, meu patrão; para onde ainda vai assim a estas horas? – fez o moleque piscando um olho, malicioso.

 (Braga Montenegro, Uma Chama ao Vento, 2ª ed. Fortaleza, Edições UFC, 1980)

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

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