quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Alfredo Mendes (Caderno de Poemas) I

A LIBERDADE 

Que se eliminem todas as grilhetas.
Que sejam retiradas as mordaças
Que seja o mundo livre de arruaças,
dos ditadores tipo, proxenetas.

Que se ouçam de novo as trombetas,
Anunciando ao povo novas graças.
Já bastam tantos ódios e desgraças,
Retirem as promessas das gavetas.
  
As promessas de paz anunciadas
E por conveniência propaladas.
Se querem dividendos receber.

Ao teatro da guerra digam não!
A Terra é um planeta em convulsão...
Não ponham tantos povos a sofrer!

AMAR O PRÓXIMO

Amar sem condição, amar somente!
Abrir o coração ao semelhante.
Fazer do nosso amor, uma constante,
E nas horas amargas, ‘star presente!

Amar sem condição, devotamente.
Amar só por amar, ser tolerante.
Com o próximo, não ser arrogante,
P’ra com seus impropérios, indulgente!

Tratemos toda a gente tal e qual.
Com a mesma ternura, e modo igual,
Como gostamos nós de ser tratados!

Se estendermos a todos nossas mãos!
E fizermos vivência como irmãos!
Por certo nós seremos mais amados!

A MINHA GUITARRA
(Sextilhas)

Dedilhei a guitarra em tom dolente.
Foi saindo um acorde confrangente,
Como um soluço preso na garganta!
O seu tanger é fado, mal fadado…
É fífia em coração atraiçoado,
Ciúme que no peito se agiganta!

A adaga que lançaste me acertou.
Teu beijo de mentira envenenou,
O ar que recebi da tua boca!
Que triste fado foi o nosso amor,
Uma letra sem rima, sem primor,
Cantada por fadista de voz rouca!

O ventre da guitarra soluçou.
A melodia, em ais se transformou…
Emitindo o tinir de alguém gemendo.
É a minha guitarra se finando…
As suas cordas frouxas se soltando,
Enquanto nossos fados vão morrendo!

 CALENDÁRIO

Arranquei uma folha ao calendário.
Foram mais trinta dias que passaram.
Tentei imaginar quantos ficaram,
privados deste gesto tão primário!

E a quantos foi mostrado o itinerário,
que as leis do passamento decretaram!
E o sono mais que eterno iniciaram...
Com suas mãos envoltas num rosário!
  
E tento equacionar o tempo ido.
Analisar o tempo decorrido...
E quantas folhas posso ‘inda mudar!

Fito o meu calendário e o seu mês!
E penso que chegada a minha vez...
A folhinha não mais vou arrancar!

CONTRADIÇÃO
 

Tenho meu coração amordaçado,
as asas lhe cortei p’ra não voar.
Não vá fugir de mim e te contar,
quanto anseio que estejas a meu lado!

Quero que faças parte do passado.
Não quero mais de ti me recordar.
Quero rasgar lembranças, apagar...
O sabor do teu beijo apaixonado!

A luz do teu olhar quero esquecer.
Teus lábios de carmim, não quero ver,
desejando o calor dos lábios meus!

Eu não quero teu corpo desejar...
Mas quanto mais eu quero me afastar,
mais desejo cair nos braços teus!

CORTAR O PASSADO

Rasguei as lembranças do tempo passado.
Os sonhos guardados, desfiz em pedaços.
Da caixa com fotos atada com laços,
Eu fiz um braseiro; foi tudo queimado!

Tristeza, amargura, tirei do meu lado.
Mandei-as embora para outros espaços.
Fugi da mentira, dos falsos abraços…
Que às vezes sentia, ao ser abraçado!

Do zero farei, outra forma de vida.
Será mais concreta, serena, sentida,
Apenas cercado p’los grandes amigos.

Amigos que sabem, o que é amizade.
Que no peito ostentam a fraternidade,
Que é arma letal para os seus inimigos!

DIA DA MULHER

Hoje se cantam odes à mulher.
Dizem ser o seu dia especial.
Hoje a mulher é símbolo nacional,
é superior a tudo e a qualquer!
  
Chegado o amanhã não é sequer,
lembrado o seu carinho maternal!
Tudo volta à rotina natural...
Outro ano virá, se Deus quiser!

Sendo por este, ou por aquele motivo.
Se foi criando um dia mais festivo,
ao sabor do que mais se lhe aprouver...
  
Os homens podem dias inventar...
Mas por mais voltas que lhes possam dar...
Sempre os dias serão: de ti, mulher!

ERRANTE

Caminhei pela noite sem destino.
Errando como um pobre peregrino
Que busca avidamente a fé de Deus.
A luz que iluminava meu caminho.
‘scondia tanto cravo, tanto espinho...
que foi rasgando a carne aos braços meus!

Indiferente à dor, ao sofrimento.
Ao frio gelado, à chuva, ao forte vento
Que me sulcava a face cruelmente.
Segui o meu caminho sem traçado,
Ao acaso, sem ter rumo acertado...
Seguia por seguir, seguia em frente!

Sentia-me empurrado por alguém...
Seria alguma força do além
Dando impulso à inércia dos meus passos?
Que forças me empurravam desse jeito?
Apertei minhas mãos juntas ao peito,
E tive a sensação de mil abraços!

Mil abraços de amor e de ternura,
Que eram bálsamo p’ra tanta tortura,
Que germinava dentro do meu ser!
Era farol intenso a me indicar
O caminho melhor p’ra te encontrar,
Que eu sabendo, fingia não saber!

Cheguei por fim a Ti, meu Bom Jesus!
À minha escuridão Tu deste luz,
E foste iluminando os passos meus.
A paz reencontrei no teu caminho.
Já não ando perdido, tão sozinho...
Obrigado por tudo Meu Bom Deus!

(2º Prémio Literário - Paul Harris 2001)

FANTASIA

Queria ser o Sol que te bronzeia.
O gel que no teu corpo vais usar.
O colar que teu colo vai beijar...
E ser para o teu mal, a panaceia!

Ser a seda que fez a tua meia.
O perfume que tens p’ra te aromar.
O lencinho que tens para limpar,
A lágrima teimosa que te enleia!

O lençol que te aquece em noite fria.
Do sonho, ser a tua fantasia.
De corpos se fundindo ternamente.

Ser o copo que toca em tua boca.
E ser o tal, da tua noite louca...
E te ficar beijando loucamente!

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