sábado, 15 de março de 2014

Fernando Bevilacqua (Árvores)

Árvores são como pessoas – quase sempre melhores.

Alguns, que afirmam se comunicar com elas, garantem que, embora não falem, entendem e respondem aos tratos carinhosos. Outros asseguram (coincidência ou não) que outras são fulminadas por olhares impregnados de ódio, inveja e frustração (isto vale mais para plantinhas frágeis).

Não fossem as camadas atmosféricas que envolvem o planeta, a Terra teria coloração verde e não azul, tal a presença massiva das árvores.

As árvores são vaidosas, não fossem elas do sexo feminino. Quantas são vistas com seus corpos retorcidos, em poses sensuais, até mesmo as que demonstram indisfarçável e assumida obesidade. E as que se enfeitam de flores, em flagrante exibição, aguardando, sem falsa modéstia, olhares extasiados e perplexos? Vaidosas sim, vulgares quase nunca. Expõem seus adereços sazonalmente, provocando a ansiedade da próxima vez. O que dizer do Ipê, a produzir “orgasmos visuais” e não mais do que durante parcos sete dias de exposição? Embora vaidosas e sensuais, nunca se apresentam despidas de suas roupagens, modestas que sejam. Os corpos lisos, “depilados”, culminam com cabeças coroadas por “cabeleiras” de várias tonalidades, tipos e volumes pilosos. Não abrem mão de suas vaidades: à medida que envelhecem, perdem suas melenas, veem seus “membros” fraturados por pequenos traumas (como se tivessem osteoporose, à semelhança dos humanos), e como não suportam se mostrar feias, com corpos esquálidos e sem viço, secam; preferem a morte e assim serem lembradas por suas exuberâncias da juventude. Quanta sabedoria, quanto desprendimento!

As árvores são temperamentais – mulheres como nunca! Plantadas em locais onde não poderão expandir suas raízes ou seus galhos ( no sonho de alcançar o firmamento), destroem calçadas, derrubam muros, danificam telhados, entopem bueiros e calhas, em avisos contra aqueles que pretendem domá-las. Respondem às amputações de seus membros (as podas) enchendo-se de novas energias, robustecendo-se, numa advertência de como resistem às agressões. Bem tratadas, acariciadas, adubadas com amor, fornecem de tudo o que se lhes pedir: a sombra para momentos de descanso e reflexão, ramos emplumados para proteger os viajantes dos mistérios da noite, palha para forrar o solo e acolher corpos apaixonados em delírios silvestres, casca e raízes para alívio e tratamento de dores e doenças, troncos para fabricação de sua jangada que o levará de volta ao lar, aquele mesmo construído com a madeira por elas fornecida. E mais: um galho bem apontado pode servir de arma de defesa ou de caça, a salvar sua vida ou matar sua fome.

As árvores são imprevisíveis. Vão ser femininas no inferno! Vistas de longe, há sempre a expectativa de momentos alvissareiros. Nem todas, contudo, irão participar de boas lembranças. Espinhos deixam arranhões dolorosos, folhas aveludadas escondem ardências, pruridos e inchações inesquecíveis, frutos atraentes e de aparência hipnótica e ingênua intoxicam, quando não matam. Fica aqui um alerta: árvores são fantásticas, mas nem sempre confiáveis. Com quem parecem esses seres, filhas de Deus, como nós?

Árvores são necessárias, indispensáveis, da mesma forma que pensam os homens (só os mais sábios) sobre as mulheres; sendo assim, precisam ser preservadas – árvores e mulheres. Deixem que as árvores morram espontaneamente. Não as matem. Elas têm a sabedoria do adeus.

Oh! mundo insensível, oh! pessoas insanas! No encontro de uma “árvore – mulher”, proteja-a, adube-a e regue-a sem cessar.

Eis a possível salvação!

Fonte:
IV Troféu Literatura da Natureza, in http://www.reinodosconcursos.com.br

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