sábado, 15 de março de 2014

Lacy José Raymundi (Baú de Trovas)


À franga, com voz de plumas,
diz a mãe, cheia de pena:
- Aos ovos tu te acostumas,
logo após uma centena...

Alguém me disse, na esquina,
e de repetir não cesso:
"A educação é uma usina
que nos conduz ao progresso!...”

Ali moram quatro viúvas
outrora cheias de graças,
mas, daquelas quatro “uvas”
hoje restam quatro “passas...”

A noite estende seu manto
de silêncio nos caminhos,
e a aurora quebra esse encanto,
pela algazarra dos ninhos…

Ao ver um homem baixinho,
entendo porque não presto,
pois penso do coitadinho:
- "Aonde ficou o resto?..."

A visão que me produz
um vagalume na altura,
me lembra um pingo de luz
brilhando na noite escura...

Cada níquel que se gasta
em armas de fazer guerra
é mais um passo que afasta
a Paz da face da Terra!

Cai a noite. O escuro lacra
a luz dos olhos tranquilos,
e eu ouço a música sacra
da serenata dos grilos.

Da dura lida da roça,
que bem cedo principia,
os estultos fazem troça,
os sábios fazem poesia!

Deixo claro nesta pauta:
sigo tão só, no caminho,
como segue um astronauta
posto no espaço, sozinho.

Deus, para ter um modelo
de um ser que transmite amor,
tomou de um homem e fê-lo
o Primeiro Trovador.

Diz o frango, só de tanga,
dando no pai, longo amplexo:
"Galo velho! Por que a zanga
se sou do terceiro sexo?!

Dos teus lábios purpurinos
o beijo que me estás dando
lembra um licor dos mais finos
que se degusta sonhando!…

É mentira ou é verdade?
É verdade ou é mentira?
Se a mulher disser a idade
não acredite: confira!...

É na comunhão singela
da cuia do chimarrão,
que nosso pago nivela
o campeiro e seu patrão!

Esta questão se renova
sem solução, lhe asseguro:
por que razões, franga nova
se amarra em galo maduro?!…

Eu fico pasmo, por certo,
vendo Deus, perfeito assim,
esquecer o cofre aberto
do perfume do jasmim...

Felicidade, entrevejo
na comunhão que componho
entre o vinho do teu beijo
e o champanha do meu sonho.

Há, doutor, um repelente,
que me livre, volta e meia,
deste perigo iminente
do assédio de mulher feia???

Há muito tempo eu suspeito
da devoção aparente:
nem sempre uma cruz no peito
põe Cristo dentro da gente!

Num gesto brusco e banal,
de verdadeira loucura,
pinguei um ponto final
numa história de ternura...

O cravo que foi cravado
em cada chaga de Cristo,
lamentou ser fabricado
e obrigado a fazer isto!...

O licor que me apetece
e não me deixa ressábios,
não vem da vinha ou da messe,
vem do rubor dos teus lábios…

O pinguço diz, sem graça,
ante às águas da cachoeira:
- Se tudo fosse cachaça,
ah! que baita bebedeira!

Para aplacar meus cansaços,
eu, que buscava repouso,
no aeroporto dos teus braços
achei meu campo-de-pouso...

Problema, me diz um trouxa,
pensando com parcimônia,
é ter a bexiga frouxa
em festa de cerimônia...

Quando os vejo, todo o dia,
sempre me espanta, não nego,
perceber no olhar do guia
a luz dos olhos do cego!

Se a luz dos teus olhos tenho
como um farol que me guia,
não temo, por onde venho,
percalços da travessia!...

Se examino meu extrato
sinto arrepios na espinha,
que o juro não é barato
e a conta está ‘vermelhinha”!

Se o teu portão dorme aberto
me assanha um louco palpite
de que chegando bem perto
vais sussurrar-me um convite...

Sobre o veludo da mesa
deslizam sonhos fugazes
ante a total incerteza
dos coringas e dos ases. . .

Taças, champanhas, licores,
pelo chão roupas revoltas,
por certo o deus dos amores
por aqui andou às soltas…

Tanto fumo tem passado
pelos seus pulmões que até
o Raio-X tem mostrado
fuligem de chaminé…

Teu amor tem tal formato,
estás a mim tão ligada,
como um chicle no sapato
que não desgruda por nada…

Toda mulher que suspeita
que tem um marido esperto,
adormece, quando deita,
mas mantém um olho aberto...

Tu me pedes que eu aponte
o que é distância, em verdade?
- Distância é apenas a ponte
entre o amor e a saudade!...

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