quarta-feira, 19 de março de 2014

Pedro Du Bois (Ondas de Poemas) II

CONTATO

antenas
      ouvidos atentos rastreiam
      universos no conhecido
      espaço de quase nada

procuram seres
               que se comuniquem
                                  conosco

estamos aqui
e queremos entender vocês

não há resposta
           além das ondas
           regulares de rádio

estática
na pulsação das estrelas
e nas estradas estelares

a preocupação do humano egoísmo
preso em considerações terrenas
no esquecer o principal: sermos
merecedores da resposta
                e do contato

FERRO
 

no trabalho os homens
       usam suas forças
                        habilidades
malham o ferro
cortam o ferro
fazem com o ferro armações
do esqueleto posto em pé
entre tábuas e pregos

concretada sustentação

                      o prédio
                   o vento e a luz
                o sombreamento

o ferro estaqueado pelo homem
introduz futuras paisagens
fosse nova a área oferecida
pela tragédia descortinada

vista e cansaço na prisão
                        reconfortante dos anos

homens trabalham rápidos
com suas máquinas de cortar o ferro
                                   entortar o ferro
                                   dar forma à disforme
            montanha de onde o ferro é retirado.

CAPAZ

Capaz de irradiar
o fato no sacrilégio
do acontecimento em lance
rápido de ataque. A sistematização
da defesa no entorno da praça. O contorno
do pássaro em ares enjaulado. Imprimir
no verso o movimento lento das parábolas.
Imprimir no selo a marca da passagem.

Ter na capacidade adjetivada
do referendo o dogma não acontecido.

ANO NOVO
 

Fosse o bem-vindo ano da fartura
dos deuses acomodados em abóbadas
silenciosas e calmas. Tempos de calmaria
e sossego sem doenças e telúricos cantos
dos que sofrem os momentos

o vento forçando a janela
a vidraça impedindo a vista: olhos
descansados do trabalho. O início
no recomeço da solidez repetida
dos sapatos sobre o piso. O ano
esperado nas bodas entre o bem
e o sacrifício exigido na ressurreição
das ideias atordoadas em estrondos

fosse chegado o tempo do reencontro
na descontinuada forma de não irmos
                                               embora.

TRADUZIR-ME

a tradução no ouvido atento
dos gestos e das falas
                      cala a palavra
mal dita
       - seja a minha -

outra a sequência
em que as mãos revelam a tese
da solidão sofrida

     não esqueço a leitura
                           amena
das flores em açucenas
          o olhar moreno dos fogos
e das pedras o estilhaço
sobre a vidraça

          repito a noite
de prazeres na linguagem
que acalma o palavrão nas lutas
em dias de raivas
              e amores

traduzido no espírito de conta-gotas
nas frias manhãs de calendários
incompreendidos - sem o tempo
                                    permaneço
na plenitude da palavra significante
das horas cheias em que alego
a confidência e me sufoco.

NASCER

Conhece do mar a correnteza
a força a cor e as ondas
restabelece com o ar relação de força
ao planar o objeto e contar o espaço
em velocidade no desfazer a terra
em pedaços loteados nos alicerces
das casas altas: reanima o corpo
sob o estupor da música
e se deixa ficar: a vida é a mesma
                    desde quando gerado.

ETERNO
 

O corpo desaparece
na imaterialidade
que conhecemos
como o todo

tolo espírito
não freado
na saudade
do diariamente
consumido

sem o corpo
          - posto abaixo -
na lembrança e impossibilidade
do futuro: não há futuro
                na eternidade.

VIDAS

Descendente da geração
perdida em experimentos
de foscas luzes
                prisões primeiras
em esgarçados tecidos libertários
de ouvidos atentos aos chamados
na concretização dos gritos
de descoberta: a igualdade
se faz ao largo
e águas cobrem a face
no naufrágio provocado
em defesa. O rito permanece
no toque sutil do locutor
esportivo: jogo apresentado
ao transeunte distraído
em regras que resgatam o barco
na liberdade tardia e inconsequente
do preço cobrado na passagem.

IMENSIDÃO

as dúvidas dos antepassados
complexas em desdobramentos
e no aprofundamento da ignorância
com que nos deparamos pelo tempo

ao longe a vista alcança calores
em que a imagem é traduzida
e se faz bela e conhecida
com a imaginamos

não é a resposta e a aposta
continua aberta ao desígnio
da imaginação abstrata
retratada em idiossincrasias

a vontade retorna ao tema
e o teorema se faz na imensidão
espacial que nos seduz

Fonte:
O Autor

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