domingo, 25 de outubro de 2015

António Aleixo (1899 - 1949)




António Fernandes Aleixo nasceu em Vila Real de Santo António, uma pequena cidade do Algarve, sul de Portugal, na fronteira com a Espanha, 18 de fevereiro de 1899 e faleceu em Loulé/Portugal, a 16 de novembro de 1949.
            Filho de um operário tecelão, teve uma infância de dificuldades e foi obrigado a abandonar os estudos antes de completar o segundo ano de escolaridade. Sua experiência com poesia surgiu ainda aos dez anos de idade: há, no sul de Portugal, um antigo costume de grupos de crianças que vão de porta em porta, à época das festas natalinas, cantar as “janeiras”, quadras que se vão repetindo, alterando-se apenas o nome do dono da casa, que é então homenageado em troca de algum dinheiro ou prenda natalina. Como o repertório de seu grupo se esgotara, Aleixo começou a inventar, por si próprio, as quadras para o pequeno grupo de cantores populares. A vida de António Aleixo, contudo, foi de sobrevivência difícil em meio à pobreza daqueles primeiros anos do século XX: foi tecelão, como o pai; serviu o exército, onde aprenderia de fato a ler e escrever, ainda que de forma rudimentar; depois, policial; imigrou para a França, onde exerceu o ofício de pedreiro; foi depois vendedor de cautelas de loteria – ocupações que mantinha em paralelo aos improvisos em praça pública, que, em pouco tempo, se tornaram uma nova fonte de renda, pois passou a se apresentar em festas populares e romarias, ocasiões em que começou também a vender seus versos impressos. Sobre suas várias profissões, escreveu Aleixo:
Fui polícia, fui soldado,
Estive fora da Nação,
Vendo jogo, guardei gado,
Só me falta ser ladrão.
(ALEIXO, 1978, p. 16)
            Em 1942, por iniciativa de um amigo de António Aleixo, um relojoeiro da cidade de residência do poeta, Loulé, fez-se imprimir em uma gráfica local uma folha datilografada com cerca de duas dúzias de quadras do poeta que ele, o comerciante, colecionara. Joaquim de  Magalhães, à época professor do Liceu de Loulé, recebeu um exemplar da pequena coletânea e, entusiasmado pela qualidade poética que observou na despretensiosa obra, propôs-se a fazer uma compilação das quadras de António Aleixo, servindo-lhe de “secretário” para coletar material suficiente para a publicação de um volume de poesias. Sobre esse fato, escreveu Aleixo:
Não há nenhum milionário
que seja feliz como eu
tenho como secretário
um professor do liceu.
(ALEIXO, 1983, p.102)
            António Aleixo, contudo, no mesmo ano de lançamento de seu primeiro livro, descobre-se também tuberculoso como a filha e, por conta da intervenção de diversos artistas de renome a seu favor, consegue internação em um sanatório na cidade de Coimbra. Naquela cidade, conheceu outros escritores, como Miguel Torga, e produziu um segundo volume de quadras, chamado Intencionais, e duas peças teatrais de inspiração vicentina, o Auto do CURAndeiro (sic) e o Auto da Vida e da Morte. A doença, contudo, não cedeu com sua estada no sanatório de Coimbra e, em 1949, António Aleixo viria a falecer na cidade de Loulé, de tuberculose. Por conta do temor do contágio e por desconhecimento, os vizinhos que atenderam ao poeta em seus últimos dias de vida atearam fogo a alguns dos muitos cadernos nos quais Aleixo registrou, incentivado por Joaquim de Magalhães, suas quadras e poemas.
            Uma das razões formais para o sucesso das quadras de António Aleixo é o uso quase que exclusivo de versos em redondilha maior. Norma Goldstein, em seu compêndio intitulado Versos, sons, ritmos, recorda que o “verso de sete sílabas [...] é o mais simples, do ponto de vista das leis métricas” e também o “verso tradicional em língua portuguesa”, que já era “freqüente em cantigas medievais” (GOLDSTEIN, 2001, p. 27) e perenizou-se nas cantigas de roda, quadras e canções populares. Outro recurso usado intuitivamente por Aleixo é a composição de rimas alternadas – ABAB – externas e consoantes, a qual auxilia no ritmo natural da fala em língua portuguesa e oferece fácil identificação por parte do leitor. Tais elementos formais são, ainda, característicos da literatura oral e das formas cantadas de poesia popular, gêneros dentro dos quais Aleixo desenvolveu seu talento poético.
            Embora praticasse formas tradicionais de poesia, em si mesmas limitadoras – o quarteto de sentido completo e a sextilha –, Aleixo impunha a esse gênero um traço bastante peculiar de narrativa e de crônica do cotidiano. Seus temas principais oscilavam entre a crítica social, os infortúnios de uma vida miserável e os acontecimentos pontuais do cotidiano português. Curiosamente, quase nada de sua produção ecoa os temas amorosos ou o saudosismo tão presentes na poesia lusitana que o antecedeu:
Nas tuas horas mais tristes
de mágoas e desenganos,
pensa que já não existes,
que morreste há muitos anos.
(ALEIXO, 1983, p. 85)
            Considerado um dos poetas populares portugueses de maior relevo, afirmando-se pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo também é recordado como homem simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.
            No emaranhado de uma vida cheia de pobreza, mudanças de emprego, emigração, tragédias familiares e doenças, na sua figura de homem humilde e simples houve o perfil de uma personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem parte profissões como tecelão, polícia e servente de pedreiro, trabalho este que, como emigrante, exerceu em França.
            De regresso ao seu Algarve natal, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde passou a vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas, atividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a alcunha de «poeta-cauteleiro».
            Faleceu vítima de uma tuberculose, a 16 de novembro de 1949, doença que tempos antes havia também vitimado uma de suas filhas.
            Poeta possuidor de uma rara espontaneidade, de um apurado sentido filosófico e notável pela «capacidade de expressão sintética de conceitos com conteúdo de pensamento moral», Aleixo tinha por motivos de inspiração desde as brincadeiras dirigidas aos amigos até à crítica sofrida das injustiças da vida. É notável em sua poesia a expressão concisa e original de uma "amarga filosofia, aprendida na escola impiedosa da vida".
            A sua conhecida obra poética é uma parte mínima de um vasto repertório literário. O poeta, que escrevia sempre usando a métrica mais comum na língua portuguesa (heptassílabos, em pequenas composições de quatro versos, conhecidas como "quadras" ou "trovas"), nunca teve a preocupação de registrar suas composições. Foi o trabalho de Joaquim de Magalhães, que se dedicou a compilar os versos que eram ditados pelo poeta no intuito de compor o primeiro volume de suas poesias (Quando Começo a Cantar), com o posterior registro do próprio poeta tendo o incentivo daquele mesmo professor, a obra de António Aleixo adquiriu algum trabalho documentado. Antes de Magalhães, contudo, alguns amigos do poeta lançaram folhetos avulsos com quadras por ele compostas, mais no intuito, à época, de angariar algum dinheiro que ajudasse o poeta na sua situação de miséria que com a intenção maior de permanência da obra na forma escrita.
            Estudiosos de António Aleixo ainda conjugam esforços no sentido de reunir o seu espólio, que ainda se encontra fragmentado por vários pontos do Algarve, algum dele já localizado. Sabe-se também que vários cadernos seus de poesia, foram cremados como meio de defesa contra o vírus infeccioso da doença que o vitimou, sem dúvida, um «sacrifício» impensado, levado a cabo pelo desconhecimento de seus vizinhos. Foi esta uma perda irreparável de um patrimônio insubstituível no vasto mundo da literatura portuguesa.
            A opinião pública aceitou a primeira obra de António Aleixo com bom agrado, tendo sido bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1.100 exemplares, o livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao Poeta Aleixo uma pequena melhoria de vida, contudo ensombrada pela morte de uma filha sua, com tuberculose. Desta mesma doença viria o poeta a sofrer pelos tratamentos que a vida lhe foi impondo, tendo de ser internado no Hospital – Sanatório dos Covões, em Coimbra, a 28 de junho de 1943.
            Em Coimbra começa uma nova era para o poeta que descobre novas amizades e deleita-se com novos admiradores, que reconhecem o seu talento, de destacar o Dr. Armando Gonçalves, o escritor Miguel Torga, e António Santos (Tóssan), artista plástico e autor da mais conhecida imagem do poeta algarvio, amigo do poeta que nunca o desamparou nas horas difíceis. Os seus últimos anos de vida foram passados, ora no sanatório em Coimbra, ora no Algarve, em Loulé.
            A 27 de maio de 1944 recebeu o grau de Oficial da Ordem de Benemerência.
Fontes:
– Robertson Frizero Barros . “Perdão, porque mal sei ler” – apresentando António Aleixo, poeta popular português. In Revista Nau Literária. PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 03 N. 02 – jul/dez 2007
https://pt.wikipedia.org/wiki/António_Aleixo

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