segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Olivaldo Júnior (Coisa de amigo)

No bar aonde nunca vou, um amigo me espera. Tem olhos que me entendem como eu sou, mãos que apertam como se deve as minhas. Esse bar é muito longe de onde moro. Não sei sequer onde fica. Fico de olho nas ruas onde passo de ônibus. Não fica lá. Longe, deve estar mais perto do céu que da terra onde estamos.

Conta coisas meio bobas, passadas há muito, quando nem nos conhecíamos. Logo que enche o bar, felizes por estarmos bem, paramos tudo e cantamos alto as canções mais belas daqui, onde canta o sabiá. Se eu fosse um passarinho, voava para perto desse bar, que se esconde numa nuvem qualquer, "às barbas" de Noé.

De vez em quando, se essa vida fica feia, chora baixo, em frente a mim, que o reconforto com palavras de esperança, como um velho missionário, sem saber que sou aquele que professa a própria fé: coisa de amigo. Minha fé, como todo credo, nasce das lágrimas de Deus, das páginas dos homens, das máximas de mim, que sou autor de minha história (mesmo que até a página dois...). Depois, mais firme, com um sorriso em seus olhos, fala de tanta coisa de que se havia esquecido, tanta coisa importante que deixara de lado, com propósito, sendo adulto, de voltar a menino.

Na poeira de meus tênis surrados, de meus olhos cansados, de meus lábios silentes, tem um pouco da poeira do chão, dos móveis e da eterna despensa daquele bar aonde nunca vou. Nele, um amigo, o amigo me espera. Falamos de versos, de Bossa e de Vinicius, sem vontade de sair de lá, de deixar que esse pó nos cubra e nos descubra como seres que se afinam nos acordes da memória, que, falha, fura a fila da existência e bebe um pouco desse álcool, desse etílico da amnésia. Esquecer, muitas vezes, é o único remédio: coisa de amigo. Amigo, anônimo, num bar, meu lar.

Fontes:
O Autor
Imagem = http://paposdebar.blogspot.com.br/

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