quinta-feira, 30 de junho de 2016

A. A. de Assis (Revista Virtual de Trovas "Trovia" - n. 193 - julho de 2016)






Um barco à margem de um rio,
abandonado, sem remos...
lembrando todo o vazio
de um sonho que não vivemos...
Colombina
 *
Nesta casa, que é só minha,
onde eu mesmo sou a lei,
obedeço a uma rainha,
muito embora eu seja o rei...
Ernâni Rushel
 *
Saudade de tal maneira
esta noite me abraçou,
que eu ontem dormi solteira,
mas hoje... não sei se sou...
Jesy Barbosa
 *
Ora é brando, ora é demais:
assim o amor da mulher:
– Ela o gradua à vontade,
nunca como a gente quer...
Jorge Beltrão
 *
Perfumadas e mimosas,
num majestoso buquê,
envio-lhe eu onze rosas:
completa a dúzia você!...
José Bandeira
Deixa a criança correr
descalça pelos caminhos!
Ela precisa aprender
a pisar sobre os espinhos...
José Maria M. de Araújo
 *
Meu amor foi-se acabando...
mas a saudade chegou:
– chuva boa refrescando
o chão que o sol causticou.
Lilinha Fernandes
 *
Às vezes, o mar bravio
dá-nos lição engenhosa:
afunda um grande navio,
deixa boiar uma rosa.
Luiz Otávio
Quando a palavra não pode
traduzir a dor da gente,
então a lágrima acode
e diz tudo quanto sente...
Luiz Rabelo
Nosso amor só necessita
de alguns metros de coragem,
porque a fronteira limita,
mas não impede a passagem.
Tita Liporage
 *



Diz a cabra, dando leite
ao cabrito, o quanto pode:
– Mame, meu filho, aproveite,
enquanto não vira bode!...
Barreto Coutinho
 *
Se usa traje curto e justo,
por que então, ao se sentar,
ela tenta, a todo custo,
cobrir o que quer mostrar?...
Benny Silva
 *
Quando eu imaginaria,
naqueles tempos de outrora,
que um dia ainda veria
tanta perna como agora?...
Fontoura Costa
 *
Se não caso, sou um tolo,
pois de casar bem preciso...
Mas, no caso, é meu consolo
ser um tolo de juízo!
José Coelho de Babo
 *
Em carros sou exigente.
Conversível? – E’ aceitável...
Desde que traga – é evidente –
no volante um... conversável!.
Magdalena Léa
 *
Santa insônia – assim se chama –
não é tão santa, vos digo:
sempre que vou para a cama,
ela vem deitar comigo!
Miguel Russowsky
 *
Eu, trabalhar desse jeito,
com a força que Deus me deu,
pra sustentar um sujeito
vagabundo que nem eu?...
Orlando Brito
 *
Quando vinhas caminhando,
disse alguém com grande humor:
– Eis um pecado passando,
em busca de um pecador!
Paulo Emílio Pinto



Sonho um mundo sem violência,
onde um dia poderei
ver que a humana convivência
nem precisa mais de lei.
A. A. de Assis – PR
 *
Sem fazer-me de rogada,
só persiste uma verdade:
a trova em mim fez pousada,
trazendo a felicidade.
Andréa Motta – PR
 *
Na velha casa vazia,
onde entrei, com ansiedade,
só o silêncio respondia
ao chamado da saudade...
Angelica Villela Santos – SP
 *
Na escuridão em que sigo,
no meu passo caracol,
aquele que vai comigo
é meu imenso farol.
Antonio Cabral Filho – RJ
 *
Se houver alguém precisando
de que você faça um bem,
não se importe com o “quando”,
nem o “como”, nem “a quem”.
Antonio Colavite Filho – SP
 *
Nenhuma trova bem feita
é feita sem lapidar.
Mas, para tê-la perfeita,
tem muito que meditar.
Ari Santos de Campos – SC
 *
Lavrador, ao fim do dia,
após a lida no chão,
sua enxada rodopia
celebrando a produção!
Arlene Lima – PR
 *
Mãos tristes, temendo ausências,
se despedem com revolta...
– Nosso adeus tem reticências
que acenam gritando: – Volta!
Carolina Ramos – SP
 *
No contorno do teu rosto
– flor em forma de buquê –
vejo que tenho bom gosto
de ser louco por você
Clênio Borges – RS
 *



Ainda bem que tenho os meios
de não ficar tão sozinha:
desenho e bordo, abro e-mails,
faço versos na cozinha...
Clevane Pessoa – MG
 *
Disse-lhe adeus e mais nada;
seu desgosto foi profundo;
seu peito foi a morada
das dores todas do mundo.
Conceição de Assis – MG
 *
O homem foi feito perfeito,
à semelhança de Deus;
às vezes, fico sem jeito
de não ser igual aos meus.
Cônego Telles – PR
 *
Quem leva a vida no amor,
dos sonhos nunca se cansa,
que o mundo só perde a cor
quando se perde a esperança.
Dáguima Verônica – MG
 *
No meu mundo de magia,
tudo é possível e, assim,
eu vivo na fantasia
o que a vida nega a mim!
Delcy Canalles – RS
 *
Na casa de quem escreve
há sempre papel no chão:
não perde tempo quem deve
segurar a inspiração!
Diamantino Ferreira – RJ
 *
Corta-se a mata nativa,
fica o campo a céu aberto...
É a força bruta nociva
na construção do deserto.
Djalma da Mota – RN
 *
Nesta vida rotineira,
tua saudade em minha alma
é cantiga de goteira
em noite de chuva calma!
Domitilla Borges Beltrame – SP
 *
Trem-de-ferro, o teu apito
lembra-me um sino plangente:
tanta mágoa no teu grito,
tanta saudade na gente!
Dorothy Jansson  Moretti – SP
 *
Arando a terra, meu pai
ensina-me enquanto canta
que uma semente que cai
é esperança que se planta!
Edweine Loureiro da Silva – Japão
 *
Minhas mãos... venho trazê-las,
até parecem vazias,
mas são repletas de estrelas
que eu colho todos os dias...
Elisabeth Souza Cruz – RJ
 *
O espelho, em alguns instantes,
parece que ri... mas chora,
procurando traços de “antes”
na realidade de “agora”...
Ercy Marques de Faria – SP
 *
Este orgulho que carregas,
insano, dentro do peito,
foge, tão logo te entregas
de corpo e alma em meu leito.
Ester Figueiredo – RJ
 *
Minha idade vem rolando
como as pedras no caminho.
Pedra a pedra vou juntando,
edificando o meu ninho.
Eulinda Barreto – SP

 *

Um aceno na partida

faz parar o coração.

O amor passa pela vida,

o aceno marca a emoção.

Evandro Sarmento – RJ
 *
Os teus braços... uma ponte...
Teus olhos... uma canção...
Os teus lábios... uma fonte...
E eu já tenho a inspiração!
Flávio Stefani – RS
 *



Quando a tarde veste o manto,
torna escura a luz do dia.
Saudade dói outro tanto,
do tanto que já doía.
Francisco Garcia – RN
 *
Pedi perdão ao Senhor
por minhas horas vazias,
pelas horas sem amor,
e Ele as encheu de alegrias!
Gislaine Canales – SC
Acordei (tinhas partido)
e me deixaste na estrada:
um pobre arbusto perdido
sem luz, sem pranto, sem nada...
Janske Schlenker – PR
 *
Na clausura da existência,
das prisões que nos impomos,
um devaneio é a essência
do que pensamos que somos.
J. B. Xavier – SP
 *
Entre alegrias e dores
vou indo, como Deus quer,
vivendo muitos amores
como avó, mãe e mulher!
Jeanette De Cnop – PR
 *
Quero um relógio, querida,
cujo mágico processo
atrase a tua partida
e abrevie o teu regresso.
João Costa – RJ
 *
Dê vida ao seu dia a dia,
dedicando-se ao labor.
Trabalho gera alegria,
quando é feito com amor!
Jorge Fregadolli – PR
 *
Perdi, do ouvido direito,
completamente a audição.
Daí me veio o defeito
de ouvir mais o coração...
José Fabiano – MG
Singrei muitos horizontes
em busca do último porto;
bebendo de muitas fontes,
só em você achei conforto.
José Feldman – PR
 *
A vida de quem não sonha
e vive sem ter um bem
lembra uma rua tristonha,
onde não passa ninguém...
José Messias Braz – MG
A luz da noite ilumina
o olhar da menina aflita,
que fita a luz da vitrina
e fantasia o que fita!
José Ouverney – SP
 *
Chego a perder a esperança,
vendo ao relento, a dormir,
uma sofrida criança
sem lar, sem paz, sem porvir!
José Valdez – SP
Com ternura tu me olhaste
e com ternura te olhei...
Nunca mais tu me deixaste,
nunca mais eu te deixei!
Lucília Decarli – PR
A paz que tanto almejei,
em sonhos que não têm fim,
estava onde não busquei:
– perdida dentro de mim!
Luiz Antônio Cardoso – SP
 *
Se não me dás teu carinho,
se não me queres amar,
sou barco triste e sozinho,
que já não quer navegar.
Luiz Carlos Abritta – MG
 *
Seja gentil, cumprimente,
converse, abrace, sorria!
Gentileza está presente
num viver em sintonia.
Mifori
Vou cumprir a minha sina:
– Não pode ter recaída...
Pois teu sorriso elimina
as mazelas desta vida!
Maria Luiza Walendowsky – SC
 *
 

Tão moreno, tão esguio,
tão gostoso de pegar...
que as águas todas do rio
querem teu corpo banhar...
Maria Thereza Cavalheiro – SP
 *
Já não tenho o que falar,
já não choro, já não rio,
já não tenho o seu olhar...
Colho a saudade e o vazio.
Mário Zamataro – PR
 *
Saibam todos que o trabalho
ao homem bom enobrece;
mas quem não pega no malho,
seu espírito empobrece!
Maurício Friedrich – PR
 *
A vida é feita de escolhas:
os acertos festejamos...
O duro é virar as folhas
nas tantas vezes que erramos...
Milton Souza – RS
*
Contemple os campos dourados
que ao bom lavrador deleita:
ontem, bons grãos semeados;
hoje, o prazer da colheita.
Nilsa Alves de Melo – PR
 *
Sonhando de trova em trova
pela estrada da poesia,
minha vida se renova
no correr de cada dia.
Nilton Manoel – SP
 *
O amor, bem como a neblina,
sempre nos turva a visão:
vem do nada e, como sina,
deixa inquieto o coração.
Olga Agulhon – PR
Carícia mais eloquente
que meu coração aprova
é te dar um beijo ardente
nos versos da minha trova!
Renato Alves – RJ
Somente o amor verdadeiro
é por Deus abençoado;
e por não ser passageiro
é tão sublime e sagrado!
Roberto Acruche – RJ
 *
Ante o terror das queimadas
na floresta, com carinho,
as árvores abraçadas
tentam proteger os ninhos.
Ruth Farah – RJ
 *
Não quero chão e nem teto!
Faço da nuvem, morada!
Quem viveu um grande afeto
não precisa de mais nada!
Selma Patti Spinelli – SP
 *
Tudo pode acontecer
no encontro de duas almas.
Tua afeição dá prazer
e sei que só tu me acalmas.
Talita Batista – RJ
 *
Das bofetadas que a vida
me deu sem muita piedade,
tu foste a mais dolorida
e a que mais deixou saudade.
Thalma Tavares – SP
 *
A vida, má roteirista,
dá-me um papel, não me ensaia
e, se eu tento ser artista,
nega-me o aplauso e me vaia.
Therezinha Brisolla – SP
 *
Meu tempo tornou-se esparso...
Por mais que eu tente retê-lo,
nem com tintura eu disfarço
as cinzas do meu cabelo.
Vanda Alves da Silva – PR
 *
Antes que nada mais sobre,
deixa-me ser, por favor,
ao menos a rima pobre
num dos teus versos de amor!
Vanda Fagundes Queiroz – PR
 *
Tendo um bom livro na mão,
viajo o mundo... crio asa.
Mando embora a solidão...
sem sair da minha casa!
Vânia Ennes – PR
 *
Não prometo, em nossa história,
meu amor por toda a vida,
porque a vida é transitória,
e meu amor, sem medida!...
Wanda Mourthé – MG

* * * * * * * * * * * * * * * 
Visite:



quarta-feira, 29 de junho de 2016

Lançamento da Obra Transversalidades, de Andrey do Amaral


Ações descentralizadas são o foco do coletivo Transversalidades. Trabalhar com cultura em espaços alternativos, levando acesso de literatura, artesanato, audiovisual, é promover cidadania. Neste momento, o coletivo escolheu a Cidade Estrutural para receber atividades de cultura em debates literários. Com o apoio da Secretaria de Cultura do Distrito Federal, essa atividade literária promove o empoderamento e a troca de saberes fora dos centros urbanos com a participação de escritores. 

Transversalidades trabalha a cultura em locais de vulnerabilidade social com a participação ativa do morador local, sendo ele parte do processo de construção das discussões literárias.  A escritora Clotilde Chaparro, que prontamente aceitou o convite, estará também presente no debate sobre mulher e formas de violência - tema de sua obra. A mesa será mediada pelo agente literário Andrey do Amaral. 

Evento público e gratuito, dia 09/07, às 10h, na Associação São Francisco de Assis, Estrutural-DF. Contato e informações: transversalidades.cultura@gmail.com / (61) 9.8457-7131

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Carlos Leite Ribeiro (Aquele Setembro Em Que te Conheci)

Pintura de Renoir
O Setembro estava a findar e com ele as últimas chuvas. Naquele dia até trovejava e o ar estava quente.

Como os relâmpagos sempre me causaram pavor, entrei no primeiro lugar que me parecia oferecer mais segurança que, por acaso, era o restaurante "Fênix", que eu costumava almoçar, na linda cidade de Leiria, frequentado geralmente por clientes conhecidos. 

Os trovões continuavam cada vez mais fortes e os relâmpagos espalhavam raios dourados em todas as direções projetando uma luz intensa por toda a cidade. Era realmente uma tempestade assustadora. 

Tinha na altura 25 anos e estava sentada naquele restaurante que, quase sempre, àquela hora estava cheio. Aguardava que me servissem o almoço, quando um belo moço assomou à porta. Hesitou, mas por fim resolveu entrar. 

Como as outras mesas estavam ocupadas, dirigiu-se à minha e, delicadamente perguntou-me: - "Dá-me licença que me sente?". 

Ele não era uma daquelas figuras que os gregos descrevem, mas era simpático, embora tivesse nos seus belos olhos castanhos-escuros, uma tristeza profunda. Eu não costumava compartilhar com estranhos os meus "solenes" momentos de refeições, detestava quando alguém tentava invadir a minha privacidade, mas percebendo que não havia outro lugar desocupado, secamente, respondi-lhe então: 

- "Sim, pode-se sentar". 

Ele agradeceu e calmamente sentou-se. Comecei a sentir algo diferente em mim, mas logo afastei qualquer ideia da minha mente. Ele também não se mostrava muito à vontade, embora intimamente me estivesse a admirar (intuição feminina...). Eu fingia que não o estava observando, mas, volta e meia, descobria um ou outro detalhe interessante no meu imposto companheiro de mesa que àquela altura, já saboreava um vinho tinto como se fosse a bebida mais saborosa do mundo. Olhando de vez em quando de relance, percebi que era charmoso, muito bem cuidado, além dos olhos castanhos e amendoados tinha traços de pessoa fina, enfim não deixava de ser um homem muito interessante. 

Por fim começou por perguntar se a comida era boa naquele restaurante; depois se o meu marido não se importava se a esposa estivesse à mesa com outro homem, etc., etc. Respondi-lhe que estava completamente livre. O homem pareceu ter ficado mais calmo e menos tímido. De início, eu não me senti à vontade com o rumo que a conversa estava tomando, e fiquei nervosa ao perceber que algumas pessoas conhecidas estavam nos lançando olhares atravessados, imaginando não sei o quê... 

Como em cidade pequena quase todas as pessoas se conhecem, e no mínimo estavam admirados com a minha "prosa" forçada com um cavalheiro desconhecido. Contudo, depois de algumas frases trocadas fiquei mais descontraída e até fiz algumas indagações de somenos importância 

Entretanto, começamos a almoçar e ele aproveitou para me ir dizendo que era aluno de Engenharia de Máquinas, mas por vários motivos não podia terminar o curso, sendo o principal o fato de uma moça que amava e já há anos a namorava, o ter traído. 

Até parecia que se estava a confessar-se! Comecei a pensar: "Este quer cantar-me a "canção do bandido", mas comigo, vem de carrinho e para lá vai de carroça!". Sorri. O que deve ter desencorajado o meu belo interlocutor, que, delicadamente se despediu. 

Levantou-se e foi-se embora, depois de ouvir pacientemente, num gesto de amizade, eu dizer que lamentava profundamente o que havia acontecido com ele, que aquela situação poderia acontecer com qualquer pessoa e que a minha história não era muito diferente: comigo havia acontecido coisa pior porque eu tinha sido "trocada" pela minha melhor "amiga" , o que tornava a traição muito mais dolorida... 

Mas, embora eu não quisesse admitir fiquei muito decepcionada com aquela despedida apressada, que mais me parecia uma fuga. Fiquei ainda alguns minutos a pensar naquilo que tinha acontecido naquele almoço. Mas a vida tinha de continuar e eu tinha de entrar há horas no escritório. Tinha muitos processos para bater ao teclado. 

Realmente, precisava voltar ao trabalho e aceitar a minha realidade. Em cidade pequena há uma escassez muito grande de cavalheiros disponíveis e, querendo ou não, eu tinha que continuar levando a minha vidinha pacata e sem grandes perspectivas. 

Durante muitos dias ainda alimentei a secreta esperança que ele aparecesse, mas em vão. Já há muito que tinha chegado à conclusão que ele tinha uns belos olhos castanhos-escuros. Mas ele nunca mais apareceu e a minha vida foi sempre o que tinha sido até aí: emprego ? casa ? emprego ? casa. De vez em quando ia ao cinema, mas numa localidade pequena é sempre difícil arranjar divertimentos. Por vezes mergulhava-me na Internet. Mas aquele homem... Aquele homem não saía da minha cabeça... Era tão forte a presença dele no meu pensamento que parecia que eu já o conhecia há muitos anos... Era uma espécie de "namorado virtual"... " O namorado que era... Sem nunca ter sido "... 

O tempo foi passando. Eu já estava perdendo a esperança que tinha de reencontrá-lo e cada dia a mais ficava mais decepcionada comigo mesma por perder tanto tempo esperando por um milagre que, talvez nunca acontecesse. 

No outro ano, como é óbvio, o Setembro voltou. Naquele dia estava um dia esplendoroso, com muito sol e uma temperatura agradável. Estava sentada na mesma mesa, do mesmo restaurante, em que pela primeira e última vez o tinha encontrado. Pensava nele... Pensava em como seria maravilhoso se ele estivesse ali, mesmo que fosse só para mostrar os seus olhos castanhos com aquela tristeza quase indecifrável. E, de vez em quando, me perguntava como uma mulher podia trair um homem como aquele, elegante, de traços finos, cavalheiro e que, mesmo não sendo um "bonitão" , tinha uns olhos castanhos muito lindos e expressivos, apesar da tristeza que tentava ofuscar todo o seu brilho. 

E é o Destino! Tu por vezes fazes coisas maravilhosas. 

De repente, como num toque de magia, ouvi uma voz que me parecia familiar. Olhei de relance, e quase sem acreditar no que via, dialoguei imaginariamente com o meu "Destino" e o meu coração pulsou mais forte quando tive certeza de que era ele mesmo. 

Ele tinha aparecido! Entrou no restaurante e assim que me viu, dirigiu-se logo para a mesa onde eu estava sentada. Aproximou-se de mim e, como se quisesse contar um segredo, foi logo me dizendo: 

Não acredito que, um ano depois, você esteja sentada no mesmo lugar, no mesmo restaurante, e parecendo a mesma "garotinha" assustada, que eu conheci aqui, sem este sorriso lindo estampado no rosto, como agora tem. E, encostando-se a mim quase ousadamente, me perguntou tentando parecer engraçadinho.

- Por acaso tínhamos marcado alguma comemoração um ano depois do nosso primeiro encontro? 

E parecendo velhos amigos, ficamos rindo como duas crianças que apreciavam as mesmas brincadeiras. Desta vez nem pediu licença, sentou-se logo. E logo senti um enorme desejo que ele me contasse todas as "histórias de bandido que conhecesse". Que ele me conhecesse melhor. Mas ele limitou-se a contar que, por questões financeiras, tinha imigrado para o Rio de Janeiro para refazer a vida, mas que nunca me tinha esquecido. 

Eu nem podia dizer que não acreditava, porque parece que ele estava em todas as coisas bonitas que eu via, e embora eu ainda não soubesse nem o seu nome, eu não o havia esquecido em momento nenhum e, para falar a verdade estava ali quase chorando de tanta felicidade.

No final do almoço, perguntou-me se queria jantar com ele e, depois, ir ao cinema. O meu "aceito" surgiu antes de eu ter pensado. Mas não queria perde-lo novamente. 

Foi nesse dia, um ano depois, que tivemos oportunidade de revelar nossos verdadeiros nomes: Miguel e Ivone. Hoje estou aqui emocionada, sentada no mesmo lugar, do mesmo restaurante, a pensar naqueles belos olhos castanhos, que um dia me apareceram e que modificaram completamente a minha vida. 

Alguns anos passaram, mas para nós parece que o tempo não passou, porque seremos sempre eternos namorados. 

Miguel trabalha numa cidade vizinha onde moram seus pais, mas não deixa de voltar para casa todos os dias porque somos amigos inseparáveis e assim, não podemos ficar separados muito tempo porque sentimos muita falta um do outro. 

Agradecemos sempre a Deus por aquele dia de temporal em que nos conhecemos. Sou casada com ele; temos dois filhos amorosos e, para o fim do ano espero ter o terceiro. A nossa vida em comum cada dia se torna mais bonita. Temos gostos e gênios bem-parecidos e naquilo em que não combinamos, respeitamos mutuamente as nossas diferenças. Nossos filhos são Leonardo, o Leo Vitória e o terceiro e último, será João Miguel.

Ai aquele Setembro que nos conhecemos?

Fonte:
Colaboração do autor