quarta-feira, 30 de maio de 2018

Trova 302 - Matusalém Dias de Moura (Vitória/ES)

Fonte: Facebook do Trovador

Gislaine Canales (Glosas Diversas) 4


MODO DE SER FELIZ

MOTE:
– A gente nem sempre alcança,
o que a esperança prediz,
porém... viver de esperança
é um modo de ser feliz…
João Freire Filho

GLOSA:
– A gente nem sempre alcança,
tudo aquilo que sonhou,
mas a vida é uma criança
que recém desabrochou.

Queremos realizar
o que a esperança prediz,
e na vida colocar
um novo e lindo matiz.

Todos querem segurança,
querem ter os pés no chão,
porém...viver de esperança
faz feliz o coração.

O coração satisfeito,
realizado nos diz:
ter esperança no peito,
é um modo de ser feliz...
________________________

PARA QUE ME RECORDES

MOTE: (Quadra)
Para que tu me recordes
e, à recordação, sorrias,
eu te deixo com meus versos
minhas tristes alegrias...
Maria Elena

GLOSA:
Para que tu me recordes,
para que nunca me olvides,
deixo, em meus versos, acordes
de amor, pra que não revides!

Para que fiques feliz
e, à recordação, sorrias
foi que esses versos eu fiz,
esquecendo as nostalgias!

Meus anseios de universos,
como uma linda canção,
eu te deixo com meus versos
e mais o meu coração!

Para sempre eu viverei
feliz, em minhas poesias,
e com elas lembrarei
minhas tristes alegrias...
________________________

SAUDADES DE NINGUÉM...

MOTE:
Toda tristeza é dorida,
dói mais, no entanto, a de quem
enfrenta a tarde da vida
sem saudades de ninguém...
José Tavares de Lima

GLOSA:
Toda tristeza é dorida,
e a dor, provocando o pranto,
canta, como em despedida,
o mais cruel acalanto!

Toda a dor, nos faz sofrer,
dói mais, no entanto, a de quem
não encontra em seu querer,
o querer de um outro alguém.

É triste ser esquecida...
Pobre da alma que, sozinha,
enfrenta a tarde da vida
e só, na noite se aninha!

Machuca o sentir saudade,
mas a dor vai mais além
se vivermos na verdade
sem saudades de ninguém…
_______________

CADÊNCIA DA ESPERANÇA

MOTE:
Acalanto é som que invade,
voz suave que descansa,
no compasso da saudade,
na cadência da esperança!
Leda Costa Lima

GLOSA:
Acalanto é som que invade,
e que entra na alma da gente,
é ilusão... realidade...
é tão lindo... É diferente...

Belo, como a voz do vento,
voz suave que descansa,
partindo do firmamento
as folhas, então, balança!

Ele vem sem ansiedade,
vem chegando de mansinho
no compasso da saudade,
num bailado de carinho!

E tendo a força do verso
e o ritmo de nova dança
coloca todo o universo
na cadência da esperança!

Fonte:
Gislaine Canales. Glosas. Glosas Virtuais de Trovas VI. 
In Carlos Leite Ribeiro (produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. 
http://www.portalcen.org. abril de 2003.

Guy de Maupassant (O Sinal)

A marquesinha de Rennedon dormia ainda, em seu quarto fechado e perfumoso, no grande leito macio e baixo, nos seus lençóis de cambraia leve, finos como uma renda, caridosos como um beijo; dormia sozinha, tranquila, o feliz e profundo sono das divorciadas.

Acordaram-na vozes que falavam com vivacidade, no pequeno salão azul. Ela reconheceu sua cara amiga, a baronesa de Grangerie, discutindo, para entrar, com a camareira, que defendia a porta de sua senhora. Então a marquesinha ergueu-se, puxou os ferrolhos, torceu a chave, soergueu o reposteiro e mostrou sua cabeça, nada mais do que sua cabeça
loira, escondida sob uma nuvem de cabelos.

— Que tem você para vir tão cedo? — disse ela. — Ainda não são nove horas.

A baronesinha, muito pálida, nervosa, febril, respondeu:

— É preciso que eu fale com você. Aconteceu-me uma coisa horrível.

— Entra, minha querida.

Entrou, beijaram-se, e a marquesinha tornou a deitar-se, enquanto a camareira abria as janelas, dando ar e claridade. Depois, logo que a criada se retirou, Mme. de Rennedon tornou: – "Conta, conta".

Mme. de Grangerie pôs-se a chorar, derramando essas lindas lágrimas claras que tornam mais encantadoras as mulheres, e balbuciava, sem enxugar os olhos, para não avermelhá-los:

— Oh! minha querida, é abominável, abominável o que me aconteceu. Eu não dormi toda a noite, nem um minuto Compreende? Nem um minuto. Olha! apalpe meu coração, veja como ele bate.

E, tomando a mão de sua amiga, ela pousou-a sobre o próprio seio, sobre esse redondo e firme invólucro do coração das mulheres, que basta, muitas vezes, aos homens e os impede de procurar qualquer coisa por baixo. O seu coração batia forte, com efeito.

Ela continuou:

— Aconteceu-me ontem de tarde... pelas quatro horas... ou quatro e meia. Não sei ao certo. Conhece bem meu apartamento, sabe que meu salão, onde sempre estou, dá para a rua Saint-Lazare, no primeiro andar, e que eu tenho a mania de pôr-me à janela para olhar o movimento. É tão alegre aquele quarteirão da estação, tão movimentado, tão vivo... Em suma, gosto daquilo! Ontem, pois, estava eu sentada na cadeira baixa que fiz instalar no vão da janela, estava aberta, a janela, e eu não pensava em nada: eu respirava o ar azul. Deve se lembrar que dia lindo fez ontem! 

De repente noto que, do outro lado da rua, há também uma mulher à janela, uma mulher de vermelho; eu estava de malva, você sabe, com meu lindo vestido malva. Eu não conhecia aquela mulher, uma nova locatária, instalada há um mês, e, como faz um mês que chove, ainda não a tinha visto. Mas logo percebi que era uma mulher da vida. A princípio fiquei bastante aborrecida e chocada de que ela estivesse à janela, como eu; e depois, pouco a pouco, achei divertido examiná-la. Estava debruçada e espiava os homens, e os homens também a olhavam, todos ou quase todos. Dir-se-ia que eles eram prevenidos por alguma coisa ao aproximarem-se da casa, que eles a farejavam como os cães farejam a caça, pois erguiam de súbito a cabeça e trocavam depressa um olhar com ela, um olhar maçônico. O dela dizia: "Não quer?" O deles respondia: "Não há tempo", ou: "Para outra vez", ou "Não há dinheiro", ou "Suma, miserável!" Eram os olhos dos pais de família que diziam esta última frase.

Não imaginas como era engraçado vê-la no seu manejo, ou antes, no seu ofício. Às vezes ela fechava subitamente a janela e eu via um senhor entrar na sua porta. Ela o pescava, como um pescador fisga um peixe. Então eu me punha a olhar meu relógio. Demoravam de doze a vinte minutos, nunca mais. Na verdade, ela me apaixonava, afinal, aquela aranha. E depois, não era feia a rapariga! 

Eu perguntava comigo: "Como faz ela para fazer-se compreender tão bem, tão depressa, completamente? Acrescentará ao seu olhar um sinal de cabeça ou um movimento de mão?" E tomei o meu binóculo de teatro para inteirar-me do seu processo. Oh! era bem simples: uma olhadela a princípio, depois um sorriso, depois um pequenino gesto de cabeça, que significava: "Não vai subir?" Mas tão leve, tão vago, tão discreto, que era preciso mesmo muita habilidade para o fazer como ela.

E eu me perguntava: "Será que eu poderia fazê-lo assim tão bem, esse pequeno gesto debaixo para cima, ousado e gentil"; pois era muito gentil o seu gesto. E fui ensaiá-lo diante do espelho. Minha cara, eu o fazia melhor do que ela, muito melhor! Estava encantada; e voltei para a janela.

Ela não pegava mais ninguém agora, a pobre rapariga, mais ninguém. Na verdade, estava sem sorte. Como deve ser terrível ganhar o pão daquela maneira, terrível e divertido às vezes, pois enfim há alguns que não são nada maus, entre esses homens que a gente encontra na rua. Agora eles passavam todos pela minha calçada, e mais nenhum pela sua. O sol tinha virado. Vinham vindo uns após outros, jovens, velhos, morenos, loiros, grisalhos, brancos. Via-os muito gentis, mas muito gentis mesmo, minha cara, muito mais que o meu marido e o teu, o teu antigo marido, pois estás divorciada. Agora você pode escolher.

Eu pensava: "Se lhes fizesse sinal, será que eles me compreenderiam, a mim, que sou uma mulher honesta?" E eis que sou tomada de um desejo louco de lhes fazer aquele sinal, mas de um desejo de mulher grávida... um desejo espantoso, você sabe, um desses desejos... a que a gente não pode resistir! Eu às vezes tenho dessas coisas!

Coisa tola isto, não? Creio que temos alma de macaco, nós, as mulheres. Afirmaram-me de resto (foi um médico que me disse) que o cérebro do macaco se assemelhava muito ao nosso. É preciso sempre que imitemos alguém. Imitamos nossos maridos, quando os amamos, nos primeiros meses de casamento, e nossos amantes depois, nossas amigas, nossos confessores, quando estes o merecem. Adquirimos suas maneiras de pensar, suas maneiras de dizer, suas frases, seus gestos, tudo. É estúpido. Enfim, eu quando sou tentada a fazer alguma coisa, nunca deixo de fazê-la.

Disse, pois, com os meus botões: "Vejamos, vou experimentar com alguém, com um só, para ver. Que é que me pode acontecer? Nada? Trocaremos um sorriso, e eis tudo, nunca mais o verei; e se o tornar a ver, ele não me reconhecerá; e, se me reconhecer, eu negarei, está feito!"

Começo, pois, a escolher. Queria um que fosse bonito. De repente avisto um loiro, grande, um lindo rapaz. Eu gosto dos loiros, bem o sabe. Olho-o. Ele me olha. Sorrio, ele sorri; faço o gesto, oh! quase imperceptível; ele responde "sim" com a cabeça e ei-lo que entra, minha querida! Ele entra pela porta principal da casa. Não imagina o que se passou em mim naquele momento! Supus que ia enlouquecer. Oh! que medo! Imagine, ele ia falar aos criados! A Joseph, que é tão devotado a meu marido! Joseph acreditaria certamente que eu conhecia aquele homem há muito tempo.

Que fazer? Diga. Que fazer? E ele ia tocar a campainha, imediatamente, dali a um segundo. Que fazer, diga? Pensei que o melhor era correr a seu encontro, dizer que se enganava, suplicar-lhe que fosse embora. Ele teria piedade de uma mulher, de uma pobre mulher! Precipitei-me, pois, para a porta, e abro-a exatamente no instante em que ele pousava a mão na campainha. Balbuciei, completamente louca: "Vá embora, senhor, vá embora, o senhor está enganado, eu sou uma mulher honesta, uma mulher casada. É um equívoco, um terrível equívoco; eu o tomei por um de meus amigos, com quem o senhor se parece muito. Tenha piedade de mim, senhor".

E ei-lo que se põe a rir, minha querida, e responde: "Pois sim, minha gatinha! Eu já conheço essa sua manobra: Você é casada, são dois luíses em vez de um. Você os terá. Vamos, mostre-me o caminho".

E ele me empurra; ele fecha a porta. E como eu permanecesse aterrorizada, na sua frente, ele me beija, me enlaça pela cintura e me faz entrar no salão, que ficara aberto. E depois, pôs-se a observar tudo, como um comissário de polícia: "Hum! hum! Está bem instaladinha, hein? Muito chique tudo isso. É preciso que esteja desempregada agora, para ir pescar à janela!"

Então eu recomeço a suplicar-lhe: "Oh senhor! vá embora! vá embora! O meu marido vai chegar! Ele vai chegar daqui a um instante, está na sua hora! Juro-lhe que o senhor está enganado!"

E ele me responde tranquilamente: "Ora, teteia, pare com essas manobras. Se o seu marido chega, eu lhe darei cem sows para ir tomar alguma coisa defronte".

Avistando sobre a lareira a fotografia de Raul, ele me perguntou:

— É este seu... seu marido?

— Sim, é ele.

— Parece uma boa bisca, hein? E esta, quem é? Uma das tuas amigas? Era sua fotografia, minha cara, você sabe, aquela em toalete de baile. Eu não sabia mais o que dizia, e balbuciei:

— Sim, é uma das minhas amigas.

— É muito bonita, sabe? Você me apresentará a ela. "E eis que o relógio se põe a bater cinco horas; e Raul regressa todos os dias às cinco e meia! Oh! imagina se ele voltasse antes de o outro partir! Então... então... eu perdi a cabeça... eu pensei... eu pensei... que o melhor era... era... desembaraçar-me daquele homem... o mais depressa possível... Mais cedo estaria livre... você compreende... e então... já que era preciso.. e era preciso, minha cara... sem isso ele não iria embora... eu então... eu então aferrolhei a porta do salão... Aí está!"

A marquesinha de Rennedon pusera-se a rir, mas a rir loucamente, com a cabeça no travesseiro, sacudindo toda a cama. Quando se acalmou um pouco, perguntou:

— E ele era... um belo rapaz?

— Pois como não?

— E ainda se queixa?

— Mas, minha cara... é que ele disse que voltaria amanhã à mesma hora... e eu tenho um medo atroz... Não faz ideia como ele é tenaz... e voluntarioso... Que fazer... diga... que fazer?

A marquesa sentou no leito para refletir; depois declarou bruscamente:

— Mande prendê-lo.

— Como? Que diz? Em que pensa? Mandar prendê-lo? Com que pretexto?

— Oh! é muito simples. Vá procurar o comissário; e lhe dirá que um homem vem te seguindo há três meses; que ele teve a insolência de subir a sua casa, ontem; que te ameaçou com uma nova visita para amanhã, e que você pede proteção à lei. E te darão dois agentes, que o prenderão.

— Mas, minha querida, e se ele contar...

— Não lhe darão crédito, tolinha, desde que tenha impingido bem sua história ao comissário. E em você acreditarão, pois é uma irrepreensível dama da alta sociedade.

— Oh! eu nunca ousarei!

— É preciso ousar, minha cara, senão está perdida.

— Considera que... que ele vá me insultar... quando o prenderem.

— Pois bem, terá testemunhas e o condenará.

— Condenar a quê?

— A uma indenização. Neste caso, é preciso não ter piedade!

— Ah! a propósito de indenizações... há uma coisa que aborrece muito... mas muito mesmo... Ele me deu... dois luíses... sobre a lareira. 

– Dois luíses? 

– Sim. 

– Nada mais? 

– Não. 

– É pouco. A mim, isso teria me humilhado. 

– E daí? Pois o que é que se deve fazer desse dinheiro que me deixou?

A marquesinha hesitou alguns segundos, depois respondeu com toda a seriedade:

— Minha querida... É preciso... é preciso fazer... um presentinho a seu marido... Nada mais justo

Fonte:
Guy de Maupassant. Bola de sebo e outros contos. 
São Paulo/SP: Editora Globo, 1987

Guy de Maupassant (Pedro e João)

Em “Pedro e João” Guy de Maupassant explora a relação tensa entre dois irmãos, sobretudo depois de um deles (João) receber de herança 20.000 Francos, provenientes da morte de um amigo dos pais. Maupassant desenvolve esta problemática de uma forma muito equilibrada, nomeadamente no ritmo de revelações e agravamento da relação, como na própria estrutura do romance, onde o tempo e espaço são desenvolvidos de maneira muito calma, pese embora o destino que paira sobre cada um.

Guy de Maupassant, discípulo oficial de Gustave Flaubert, oscila entre o Naturalismo e o Realismo, quer criticando socialmente a Paris oitocentista, como aproximando-se de análises psicológicas das personagens. A forma de o fazer é muito diversa da desenvolvida por Dostoiévski, uma vez que este era mais denso e violento nas suas construções, claro está que o facto de um ser francês e outro russo explica as diferenças entre os dois. No entanto, Maupassant opta por um caminho mais limpo, por cargas psicológicas menos exaustivas, colocando o indivíduo na sociedade e assim criticando os vícios de todos através de uma só personagem.

Neste romance de 1888, o autor coloca dois irmãos em confronto, como dois blocos distintos que rivalizam por um lugar de destaque entre a burguesia pavoneante. Pedro (médico) perde quase sempre para João (advogado), quer nas preferências dos pais, como de uma viúva que paira em busca de um futuro marido. Por isso Pedro comunga das cervejas e dos antros sebosos dos marginais que circulam pelo cais; recebe com encanto o licor de cereja que Marowsko, emigrante polaco, lhe oferece. Com todos se identifica, à excepção daqueles que lhe são próximos: despreza o irmão pela popularidade; odeia o pai pela sua capacidade inata de ser estúpido; passará a sentir-se enojado com a presença da mãe por…  É necessário ler o livro para saber esta razão!

É um romance de vícios, de paixões desmedidas e dicotômicas, um romance de terra e de mar. Um romance essencial da literatura francesa do século XIX.

Para além do romance, Guy de Maupassant oferece ao leitor um ensaio curioso sobre a obra, sobre a profissão de crítico literário e suas falhas nos critérios, na forma acéfala como aqueles analisam as obras. Ao mesmo tempo, Maupassant traça de uma forma muito simples a sua poética e isso podemos encontrar nas páginas que se seguem, ou seja, neste romance e em outras obras do autor.

Fonte:

terça-feira, 29 de maio de 2018

José Feldman (Álbum de Trovas) 15


Cora Coralina (O Lampião da Rua do Fogo)

Ali, naquele velho canto onde a Rua de Joaquim Rodrigues faz um recanteio, morava Seu Maia, casado com Dona Placidina, numa casa de beirais, janelas virgens da profanação das tintas, porta da rua e porta do meio. Portão do quintal, abrindo no velho cais do Rio Vermelho. Isso, há muito tempo, antes da rua passar a 13 de Maio e da casa ser fantasiada de platibanda.

Seu Maia era muito conhecido em Goiás e era porteiro da Intendência. Boa pessoa. Serviçal, amigo de todo mundo e companheirão de boas farras. Gostava de uma pinguinha em doses dobradas, dessas antigas que pegavam fogo. Então, se misturava vinho, conhaque e aniseta; só voltava para casa carregado pelos companheiros, que o entregavam aos cuidados da mulher.

Esta, acostumada, embora com a sina ruim, como dizia, não poupava a descalçadeira quando recebia o marido naquele fogo, arrastando a língua, de pernas moles, isto quando não virava valente, quebrando pratos e panelas e disposto a lhe chegar a peia.

Dona Placidina era muito prática, nessas e noutras coisas... Ajeitava logo um café amargo, misturado com frutinhas de jurubeba torrada, que o marido engolia careteando e o empurrava para a rede, onde roncava até pela manhã ou se agitava e falava a noite inteira.

— Coitada de Dona Placidina, comentavam as amigas. Seu Maia é um santo homem sem esse diabo da pinga.

E ensinavam remédios, simpatias, responsos, rezas fortes. Simpatia que dera certo em outros casos, era nada para ele. Remédios? Inofensivos como a água do pote. Os próprios santos se faziam desentendidos dos responsos, velas acesas e jaculatórias recitadas.

Dona Placidina, cansada daquele marido incorrigível, acabou botando o coração ao largo, embora achasse, no íntimo, que melhor seria uma boa hora de morte para ela... ou antes, para o marido, esta parte no subconsciente.

Naquele dia, como a dose da boa fosse mais pesada, Seu Maia, que já vinha se ressentindo do fígado com passamentos e vista escura, se achou pior.

Os amigos o trouxeram para casa mais cedo. Tiveram mesmo de o levar para a cama e o meter entre as cobertas. De nada valeu a chazada caseira.

No dia seguinte, chamaram Seu Foggia que diagnosticou empanchamento e doença do coração. Receitou um purgativo e uma poção. Seu Maia piorou. Dona Placidina se desdobrou em cuidados especiais. Esqueceu o defeito do marido, as desavenças, os pratos quebrados e passou a sentir, antecipadamente, os percalços da viuvez.

Os amigos não arredaram. Faz-se a conferência médica das vizinhas prestativas. Escalda-pés, benzimentos, sinapismo, nada deu jeito. Nem valeu promessa de muito boa cera ao senhor São Sebastião. Seu Maia morreu.

Os companheiros tomaram conta do morto. Levaram o corpo.Vestiram-lhe o fato preto de sarjão, que tinha sido do casamento. Calçaram meias, ajuntaram-lhe as mãos no peito. Pearam as pernas e passaram um lenção branco, bem apertado, no queixo. Chamaram um canapé, largo de palhinha, para o meio da sala, deitaram o cadáver, cobriram com um lençol. Cuidou-se do pucarinho de água benta, com seu ramo de alecrim. Acenderam-se as quatro velas e, nos pés do morto, botou-se um caco de telha com brasa e grãos de incenso. Era assim que se arrumava defunto em Goiás, antigamente.

Os amigos foram chegando, tomando posição e começou o velório. Dona Placidina, entregue aos cuidados das amigas, mal escapava de uma vertigem, caía noutra. Afinal, à força de chás de arruda, de casca de tomba e de Água Florida de Murray, voltou a si e, como era decidida e de espírito prático, botou de parte o abatimento e passou a cuidar do pessoal que fazia sentinela.

Café com biscoito pelas 10 horas. Mais tarde, mexido de lombo de porco e ovos fritos com farofa, comido na cozinha, e requentão quando a noite esfriou mais e os galos passaram amiudar.

Entre a diligência caseira e suspiros puxados, a viúva, de vez em quando, levantava a ponta do lençol que cobria o marido e enxugava umas lágrimas hipotéticas. “Bom marido”, lastimava e, lá consigo, “não fosse a pinga, era a falta que tinha...”

No dia seguinte, veio o caixão com tampa solta, como de costume. Agasalharam ali o defunto. Chegaram mais amigos e mais comadres. Dona Placidina louvava as virtudes conjugais do finado, em crises nervosas de choro seco — sem lágrimas, o choro mais difícil que existe.

A cada visita que chegava, com seu carinhoso abraço e formalíssimos “meus pêsames”; havia uma exaltação no choro ressecado da viúva.

Pelas duas horas, começou a fazer vento de chuva e um trovão surdo se ouviu ao lado da Santa Bárbara. Como o caixão teria mesmo de ser carregado na força dos braços, os amigos resolveram apressar o saimento, antes que o tempo enfarruscado se decidisse em água. Vento da Santa Bárbara é chuva certa no São Miguel. E enterro debaixo de chuva era a coisa mais estragada que podia acontecer em Goiás.

Dona Placidina se debruçou em cima do morto. Não queria deixar sair Seu Maia, coitado... As amigas com chazadas de alecrim. Os amigos tomaram conta das alçadas e ganharam a rua. Entraram na outra, que era Direita, naquele tempo. Passaram a ponte da Lapa, subiram e entraram no Rosário para encomendação do corpo.

Os sinos das igrejas, todas, dobrando a lamentação de finados. Pela intenção do morto, cada amigo mandava dar um sinal nas igrejas, quanto quisesse. Ainda que os sinos tocam como a gente quer, alegres ou soturnos.

Os sineiros sempre tiveram esmero especial para anjinho ou defunto. Essas duas palavras, em Goiás, delimitavam as circunstâncias da idade, sem mais explicações. Anjinho era criança mesma ou moça virgem e, defunto, gente pecadora.

Ia o cortejo subindo e os homens se revezando nas alças, que o morto estava pesado. Com a doença curta, nem tivera tempo de emagrecer. Iam depressa, que a chuva já tinha posto uma carapuça branca no cocuruto do Canta Galo.

Na frente, um popular, afeito àquele préstimo, carregava a tampa que só ia ser colocada na beira da cova. Outros levavam os dois tamboretes, tradicionais, para o descanso do ataúde, quando se trocavam os que iam carregando. Os músicos, de fardão escuro, tocavam um funeral muito triste. Sendo de notar que não havia enterro em Goiás sem acompanhamento de música, somente os muito pobrezinhos. Na rabeira, a molecada da rua. Queriam ver o caixão descer no buraco, se divertiam com aquilo.

Na esquina da Rua do Fogo com a Rua da Abadia, existiu, durante muito tempo, um poste de lampião antigo, saliente, fora de linha, puxando mesmo para o meio da rua. Era um tropeço. Coisa embaraçosa. Não foram poucos os esbarrões, cabeçadas, encontrões verificados ali.

Enterros que subiam, já de longe, começavam a torcer à direita para se desviar do lampião, que não tinha outra consequência senão atrapalhar. Naquele dia, com a aflição da chuva que vinha perto e com o peso do caixão que era demais, ninguém se lembrou do poste. Foi quando o compadre Mendanha, que ia na alça dianteira pela esquerda, pisou de mau jeito num calhau roliço, falseou o pé, fraquejou a perna e... bumba! Lá se foi o caixão bater com toda força no lampião.

Com a violência do baque, o defunto abriu os olhos, desarrumou as mãos e fez força de levantar o corpo.

A essa hora, o pessoal do enterro tinha se desabalado, em doida carreira pela rua abaixo e largado o morto se soltando da laçada das pernas. O dia inda estava claro, não era hora de assombração. Alguns, mais esclarecidos, resolveram voltar e ver de perto o acontecido.

Encontraram Seu Maia de pé, muito amarelo, escorado no poste, com tremuras pelo corpo e olhando, com desânimo o caixão vazio. Reconheceram, então, que o mesmo estava vivo e que era preciso voltar com ele para casa. Guardaram o caixão inútil na igreja da Abadia e desceram a rua, amparando o ex-morto.

Todas as janelas, agora, com gente assombrada ante aquele caso novo na cidade. A meninada na frente, gritava:

— Evém o defunto...

De dentro das casas, os moradores corriam para as portas e só se ouvia:

— Vem ver, Maricota... vem ver, Joaninha. Óia o defunto que evém voltando...

Amparado pelos amigos, metido naquele sarjão preto, desusado, calçado só de meias, lenço na cara e muito devagarinho vinha Seu Maia de volta.

Um portador foi na frente avisar Dona Placidina, daquela ressurreição e consequente retorno, ao que ela só teve expressão sintomática:

— Seja pelo amor de Deus.

Seu Maia chegou afinal, entrou, recebendo um abraço de boas-vindas mais ou menos calorosas da mulher. Bebeu um cordial. Meteu-se na cama e de novo foram chamar Seu Foggia. Este veio. Examinou, apalpou, auscultou, pediu para ver a língua. Concluiu, com sabedoria, que tinha sido um ataque de catalepsia, muito parecido com a morte, mas que não era morte, não.

A providência tinha sido o lampião do meio da rua, senão teria sido mesmo enterrado vivo.

A cidade comentou o caso por muito tempo. Seu Maia foi entrevistado por todos os sensacionalistas da terra — gente insuportável daquele tempo. Muita língua desocupada levantou a suspeita de que vários fulanos e sicranos daquele tempo tivessem sido enterrados vivos e toda a gente ficou se pelando de catalepsia. Os letrados foram até o Chernoviz e Langard. Conferiram-se diploma no assunto e discorriam de doutor e com muita prosódia, sobre catalepsia ou morte aparente.

Enquanto os comentaristas faziam roda, o doente recuperava a saúde. Dona Placidina, muito prática como sempre, aproveitou o acontecimento para uma pequena homilia doméstica, complicada e cheia de boa dialética feminina, de que “aquilo fora aviso do céu e castigo de Deus...”

E já pelo choque emocional — vá lá que naquele tempo não havia destas coisas não — já pelo medo de novo ataque e de ser mesmo enterrado vivo, o certo é que o homem moderou a bebida.

Dona Placidina, no entanto, já havia, no seu foro íntimo, aceitado a ideia da viuvez e aquela volta inesperada do marido vivo não melhorou de muito os pontos de vista da ex-viúva.

Alguns meses depois, Seu Maia adoecia gravemente. Vieram os amigos da primeira viagem. Apareceram as clássicas e inefáveis comadres. Deram-se os remédios. Da botica e extra botica. Foi bem purgado e lhe aplicaram ventosas e sinapismos. Nada serviu. Seu Maia morreu.

Seu Foggia então declarou que, por via das dúvidas, só levassem o morto quando começasse a feder. Fez-se de novo o velório com todas as regrinhas de costume. Café com biscoito pelas dez horas. Viradinho de feijão e linguiça comidos, com voracidade e discrição na cozinha, e quentão forte de canela e gengibre, quando a noite esfriou e os galos amiudaram.

Contaram-se casos. Louvaram as virtudes do finado, num breve necrológio. Passaram a anedotas discretas. Falou-se da carestia da vida, dos erros do governo e se fez a filosofia da morte.

A viúva chorou, mais ou menos conformada com aquela segunda via. O compadre Mendanha tomou conta de trocar as velas que iam se consumindo, de regrar o pucarinho de água benta com seu raminho de alecrim.

No dia seguinte, quando perceberam que não mais haveria engano, os amigos ajuntaram as alças e levantaram o caixão.

Dona Placidina, muito experiente, despediu-se do morto em soluços alternados. Teimou com as amigas: dessa vez havia de acompanhar, ao menos até a porta.

O compadre Mendanha, muito metódico e apegado aos velhos hábitos de sempre pegar caixão pela alça da frente e da esquerda, tomou posição. Outros pegaram pelos lados, adiante saiu a tampa, carregada por um popular e os tamboretes indispensáveis, renteando o caixão aberto.

Espalhado pelas ruas, o acompanhamento, só de homens. Agrupada com seus instrumentos enlaçados de crepes, a banda do funeral. Arrumado o cortejo, Dona Placidina botou o corpo fora da porta e chamou alto:

— Compadre Mendanha... Escuta, compadre, cuidado com o lampião da Rua do Fogo, viu... Não vá acontecer como da outra vez…

Fonte:
Cora Coralina. Estórias da casa velha da ponte. 
São Paulo: Global Editora, 2000.

Camilo Pessanha (Livro D’Ouro da Poesia Portuguesa vol. 6)


Ao longe os barcos de flores

Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva grácil, na escuridão tranquila,
- Perdida voz que de entre as mais se exila,
- Festões de som dissimulando a hora.

Na orgia, ao longe, que em clarões cintila
E os lábios, branca, do carmim desflora...
Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva, grácil, na escuridão tranquila.

E a orquestra? E os beijos? Tudo a noite, fora,
Cauta, detém. Só modulada trila
A flauta flébil... Quem há de remi-la?
Quem sabe a dor que sem razão deplora?

Só, incessante, um som de flauta chora…

Estátua

Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, - frio escalpelo,
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo.

Segredo dessa alma e meu degredo
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.

E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre o mármore correto
Desse entreaberto lábio gelado...

Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.

Interrogação

Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.

Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do Cântico dos Cânticos.

Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno...
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de Inverno.

Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.

Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.

Viola Chinesa

Ao longo da viola morosa
Vai adormecendo a parlenda,
Sem que, amadornado, eu atenda
A lengalenga fastidiosa.

Sem que o meu coração se prenda,
Enquanto, nasal, minuciosa,
Ao longo da viola morosa,
Vai adormecendo a parlenda.

Mas que cicatriz melindrosa
Há nele, que essa viola ofenda
E faz que as asitas distenda
Numa agitação dolorosa?

Ao longo da viola, morosa…

Crepuscular

Há no ambiente um murmúrio de queixume,
De desejos de amor, d'ais comprimidos...
Uma ternura esparsa de balidos,
Sente-se esmorecer como um perfume.

As madressilvas murcham nos silvados
E o aroma que exalam pelo espaço,
Tem delírios de gozo e de cansaço,
Nervosos, femininos, delicados.

Sentem-se espasmos, agonias d'ave,
Inapreensíveis, mínimas, serenas...
- Tenho entre as mãos as tuas mãos pequenas,
O meu olhar no teu olhar suave.

As tuas mãos tão brancas d'anemia...
Os teus olhos tão meigos de tristeza...
- É este enlanguescer da natureza,
Este vago sofrer do fim do dia.

Floriram por engano as rosas bravas

Floriram por engano as rosas bravas
No Inverno: veio o vento desfolhá-las...
Em que cismas, meu bem? Porque me calas
As vozes com que há pouco me enganavas?

Castelos doidos! Tão cedo caístes!...
Onde vamos, alheio o pensamento,
De mãos dadas? Teus olhos, que num momento
Perscrutaram nos meus, como vão tristes!

E sobre nós cai nupcial a neve,
Surda, em triunfo, pétalas, de leve
Juncando o chão, na acrópole de gelos...

Em redor do teu vulto é como um véu!
Quem as esparze - quanta flor! - do céu,
Sobre nós dois, sobre os nossos cabelos?

Caminho

I

Tenho sonhos cruéis; n'alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...

Saudades desta dor que em vão procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum véu escuro!...

Porque a dor, esta falta d'harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o céu d'agora,

Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque é só madrugada quando chora.

II

Encontraste-me um dia no caminho
Em procura de quê, nem eu o sei.
- Bom dia, companheiro - te saudei,
Que a jornada é maior indo sozinho.

É longe, é muito longe, há muito espinho!
Paraste a repousar, eu descansei...
Na venda em que poisaste, onde poisei,
Bebemos cada um do mesmo vinho.

É no monte escabroso, solitário.
Corta os pés como a rocha dum calvário,
E queima como a areia!... Foi no entanto

Que choramos a dor de cada um...
E o vinho em que choraste era comum:
Tivemos que beber do mesmo pranto.

III

Fez-nos bem, muito bem, esta demora:
Enrijou a coragem fatigada...
Eis os nossos bordões da caminhada,
Vai já rompendo o sol: vamos embora.

Este vinho, mais virgem do que a aurora,
Tão virgem não o temos na jornada...
Enchamos as cabaças: pela estrada,
Daqui inda este néctar avigora!...

Cada um por seu lado!... Eu vou sozinho,
Eu quero arrostar só todo o caminho,
Eu posso resistir à grande calma!...

Deixai-me chorar mais e beber mais,
perseguir doidamente os meus ideais,
E ter fé e sonhar - encher a alma.

Camilo Pessanha (1867 – 1926)

Camilo de Almeida Pessanha nasceu em Coimbra/Portugal em 1867, e faleceu em Macau/China, em 1926.

Filho ilegítimo de Francisco António de Almeida Pessanha, um estudante de direito da aristocracia, e Maria Espírito Santo Duarte Nunes Pereira, sua empregada. O casal teria mais quatro filhos.

Cursou direito em Coimbra. Procurador Régio em Mirandela (1892), advogado em Óbidos, em 1894, transfere-se para Macau, onde, durante três anos, foi professor de Filosofia Elementar no Liceu de Macau, deixando de lecionar por ter sido nomeado, em 1900, conservador do registro predial em Macau e depois juiz de comarca. Entre 1894 e 1915 voltou a Portugal algumas vezes, para tratamento de saúde, tendo, numa delas, sido apresentado a Fernando Pessoa que era, como Mário de Sá-Carneiro, apreciador da sua poesia.

Publicou poemas em várias revistas e jornais, mas seu único livro Clepsidra (1920), foi publicado sem a sua participação (pois se encontrava em Macau) por Ana de Castro Osório, a partir de autógrafos e recortes de jornais. Graças a essa iniciativa, os versos de Pessanha se salvaram do esquecimento. Posteriormente, o filho de Ana, João de Castro Osório, ampliou a Clepsidra original, acrescentando-lhe poemas que foram encontrados. Essas edições foram publicadas em 1945, 1954 e 1969.

Na area da imprensa, encontra-se colaboração da sua autoria nas revistas Ave Azul (1899-1900), Atlantida (1915-1920) e Contemporânea [1915]-1926.

Apesar da pequena dimensão da sua obra, é considerado um dos poetas mais importantes da língua portuguesa. 

Camilo Pessanha morreu no dia 1 de Março de 1926 em Macau, devido ao uso excessivo de ópio.

Em 1949 a Câmara Municipal de Lisboa homenageou o poeta dando o seu nome a uma rua junto à Avenida da Igreja, em Alvalade.

Características estéticas

Além das características simbolistas que sua obra assume, já bem conhecidas, Camilo Pessanha antecipa alguns princípios de tendências modernistas.

Camilo Pessanha buscou em Charles Baudelaire, proto-simbolista francês, o termo “Clepsidra”, que elegeu como título do seu único livro de poemas, praticando uma poética da sugestão como proposta por Mallarmé, evitando nomear um objeto direta e imediatamente.

Por outro lado, segundo o pesquisador da Universidade do Porto Luís Adriano Carlos, o seu chamado "metaforismo" entraria no mesmo rol estético do imagismo, do interseccionismo e do surrealismo, buscando as relações analógicas entre significante e significado por intermédio da clivagem dinâmica dos dois planos. Junto de sua fragmentação sintática, que segundo a pesquisadora da Universidade do Minho Maria do Carmo Pinheiro Mendes substitui um mundo ordenado segundo leis universalmente reconhecidas por um mundo fundado sobre a ambiguidade, a transitoriedade e a fragmentação. Podemos encontrar na obra de Camilo Pessanha, de acordo com os dois autores citados, duas características que costumam ser mais relacionadas à poesia moderna que ao Simbolismo mais convencional.

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