quinta-feira, 10 de maio de 2018

Arnaldo Forte ((Livro D'Ouro da Poesia Portuguesa vol. 2) II

ENVOLTA NO "MANTON" DAS ROSAS VERMELHAS...

Hás de ser minha, eu quero, é quanto basta!
Um dia, quando for, não o procuro.
E é o desejo ardente que me arrasta,
Aquel' que há de fazer vibrar-te, eu juro!

Um dia, quando for... hei de deixar
Nos seios que tu tens, beijos aos molhos!
Nodoas de lírios roxos a sangrar...
E olheiras cor da noite nos teus olhos!

Não tenhas ilusões! Nunca a tua Raça
Me vencerá a mim por mais que faça!
Quero-te. Eu sinto a ânsia de beijar!

Queimada pelo fogo dos meus beijos
Heide sentir-te louca de desejos...
Um dia, quando for... sem eu te amar!

NA PRAIA-MAR DO SONHO

Decerto tu já viste ao sol-poente,
O mar beijar a areia de mansinho.
Parado, a olha-la docemente,
Num grande sonho, louco, de carinho.

Depois é densa a treva. O mar é louco.
E briga com a areia, encapelado.
Embravecido cansa, e pouco a pouco,
Soluça a grande dor dum revoltado!

Assim, houve luar e noite escura,
Naquela doce noite de amargura,
Mistério indefinido que profundo!

Assim, é a tu'alma p'ra minh'alma,
--Ó minha maré-viva e maré-calma,
Do grande mar, da Dor em que me afundo!

A MÁSCARA LOIRA

Ó minha viciosa, estérica e perversa,
De linhas sensuais; teu corpo eterizado,
Tem frases de requinte, em lubrica conversa!
Tem lume de cigarro, loiro e opiado!

Teus olhos a boiar, são taças d'absinto.
E a tua silhuete loira e desgrenhada,
Tem risos de cristais partidos, que eu bem sinto,
Em noites de volúpia, á luz da madrugada!

Á noite, as tuas mãos, são gumes de punhal,
Depois de terem morto - alguém sem fazer mal...
Tua voz é o Fado... eu ouço-o quando passa!

No Mundo és o Drama, a Farsa, és a Comedia!
Ás vezes também és - palhaço - na Tragédia!
És a figura loira e linda da Desgraça!

ABANDONO

Decerto tu sentiste o abandono,
Que vai acompanhando o sol-poente,
Nas tardes tristes, lividas, do outono,
E quando chora o coração da gente!

Tardes pedindo ao sol a Extrema-Unção,
Numa ancia doentia de mais luz!
Decerto tu sentiste a sensação,
De ajoelhar-se em frente d'uma cruz!

Tu entraste á tarde na Igreja,
Á hora de rezar's - bendita seja,
A cor tão doentia do Outono!-

Tudo sentiste... e os olhos rasos d'água!
Que pena não sentir's a minha mágoa!
A vaga incompreensão d'este abandono!

13 LÍRIOS

Atei-os com os fios d'oiro daquela taça de
crystal «bohème» que partiste...

Encheste a minha vida d'amargura.
Encheste a minha vida de martírios.
Enchi a tua vida de ternura,
E vou encher o teu coval de lírios.

São 13 os lírios roxos que levei.
- Meus versos de saudade são p'ra ti.
Amor, num dia 13 te encontrei!
Num dia 13, Amor, eu te perdi.

Meu doce Amor perdido... hei de te ver,
Na luz que tem o céu amanhecer,
Na cor do sol-poente em que reparo!

E o nome que tiveste, ó loira e linda,
Que certa rosa branca fala ainda...
Será p'la vida fora o meu amparo!

Fonte:
Arnaldo Forte. 13 Sonetos. Lisboa: Edição do Autor, 1921

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