sexta-feira, 30 de março de 2012

J. G. de Araújo Jorge (Verão, Compromisso com a Felicidade)


Uma vez um amigo meu estranhou que “chovesse tanto” em minha poesia. A chuva -disse-me ele - é uma constante em vários poemas, e em todos os seus livros. Curioso com a observação passei os olhos por minha obra. Mas se constatei, realmente, que escrevi muitos poemas sugeridos pelos dias de chuva, nem por isso, homem que sou dos trópicos, escapei às influencias poderosas do sol, do verão.

Confesso até meu “estranho remorso” num poema de “Eterno Motivo”:

“Às vezes, quando escrevo feliz uma poesia,
me assalta um estranho remorso, incompreensível,
que não sei de onde vem:
Quem sabe? Pode ser que esse meu canto de alegria
faça mal a alguém...
meu irmão triste, meu irmão doente,
perdoem-me a cantiga frívola e contente,
que me fugiu dos lábios na manhã alvissareira
de verão...
Ela brotou sem querer na minha felicidade!
É que eu trago uma cigarra cantadeira
e imprudente/ dentro do coração!”.

Um dos sonetos meus mais difundidos é justamente aquele “Bom dia Amigo Sol!” que está no mesmo livro. Lembram-se?

Bom dia amigo Sol! A casa é tua!
As bandas da janela abre e escancara!
Deixa que entre a manhã sonora e clara
que anda lá fora alegre pela rua!

Entra! Vem surpreende-la quase nua,
doura-lhe as formas de beleza rara,
na intimidade que a deixei, repara
que a sua carne é branca como a lua!

Bom dia, amigo Sol! É esse o meu ninho...
Que não repares no seu desalinho
nem no ar, cheio de sombras, de cansaços...

Entra! Só tu possuis esse direito
de surpreende-la, quente dos meus braços,
no aconchego feliz do nosso leito...

Ainda no mesmo livro, além do “Desejos na Manhã de Sol”, há uma verdadeira declaração de amor à manhã, vale dizer ao dia, ao sol: “A manhã é a minha namorada.” “Ela entrou no meu quarto trêfega e contente/ e com seus dedos de sol tocou nos vidros e metais/ mexeu em tudo que viu/ e espiou para os lençóis da minha cama desfeita.../ Depois, fugiu.../ Lá se foi pelo caminho com as mãos cheias de pássaros/ levada pela aragem numa doida correria,/ rasgando seu vestido/ de galho em galho.../ e as contas do seu colar espatifando-se no espaço/ eram gotas de orvalho...”/.

Sim, mas terei de confessar que a noite é a minha companheira, e com ela as madrugadas. Sou um nostálgico do silêncio das sombras. A luz grita, o sol atordoa. O verão é um desafio constante. Parece jogar-nos na cara todos os instantes: “Vê se consegues ser claramente feliz como eu!”

Um dia de verão é um compromisso com a felicidade. E ai dos que não podem sintonizar o coração com a harmonia e a luminosidade do mundo ao redor. São esmagados. Por isso escrevi aquele “Manhã para se Ser Feliz” que está em “Espera”.

Esta é uma manhã para se ser feliz
em algum lugar, de algum modo
- é uma manhã para se ser feliz...

Esta é uma manhã para dois, para dois juntos
abraçados e tontos num remoinho,
não como nós, eu aqui, diante do sol, das árvores, de tudo
envergonhado porque estou sozinho...

Esta é uma manhã que me fala de ti
na transparência do ar,
neste azul do céu, imaculado,
na beleza das coisas tocadas de sonho
e imaterialidade...

Uma manhã de festa
para se ser feliz de verdade!
Esta é uma manhã
para te ter ao meu lado...
Quando Deus fez uma manhã como esta
estava com certeza apaixonado!”

E eis a razão das fugas constantes para os dias de chuva, dias que parecem feitos para a solidão; quando mesmo sozinho, não sabe tão funda a tristeza. Ficou-me na alma e no ouvido, além do mais, aquele rumor da chuva nos telhados de zinco da minha infância, no Acre. Daí, entre tantos, aquele poema em forma de oração, do “Cantiga do Só”:

Irmã chuva, com teu manto cor de cinza
teus olhos embaciados
teus gestos mansos,
solidária com as nossas fadigas
que acaricias nosso tédio com teus dedos molhados
e embalas nosso coração sussurrando baixinho doces cantigas...

Irmã chuva, que sempre vens quando ficamos doentes
de sol
ou de alegrias,
exaustos de verão e de calor,
e que, com teus gestos suaves e compressas frias
acalmas nossa fronte ardente
e adormeces nosso amor...

Irmã chuva... Que bom teres chegado assim, tão calma...
Pareces que adivinhas a aflição da minha alma...
Ainda bem, que mansamente
E inesperadamente,
Vieste me ver...

Irmã chuva, que aconchegas o coração da gente,
para a gente adormecer…

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 508)

Lual em João Pessoa/PB

Uma Trova de Ademar

Almoço e janto poesia.
E, neste meu universo,
mastigo um pão todo dia
amanteigado de verso!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Partes, levando a metade
da metade que eu já sou,
deixando inteira a saudade
na metade que restou...
–DIVENEI BOSELI/SP–

Uma Trova Potiguar


Pelas manhãs vou buscando
minha esperança perdida.
Há sempre um sonho vagando
nas alvoradas da vida!
–PROF. GARCIA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


A mulher sempre é mais pura,
mais bonita e mais completa,
quando a ponho na moldura
dos meus olhos de poeta.
–ORLANDO BRITO/MA–

Uma Trova Premiada


2009 - Nova Friburgo/RJ
Tema - SAUDADE - M/H


Partiu, deixando o seu traço
no meu caminho dos sós…
- A saudade é esse espaço
que existe sempre entre nós.
JOSÉ VALDEZ C. MOURA/SP–

Simplesmente Poesia

As Duas Flores
–CASTRO ALVES/BA–


São duas flores unidas
são duas rosas nascidas
talvez do mesmo arrebol,
vivendo, no mesmo galho,
da mesma gota de orvalho,
do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
das duas asas pequenas
de um passarinho do céu..
como um casal de rolinhas,
como a tribo de andorinhas
da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
que em parelha descem tantos
das profundezas do olhar...
como o suspiro e o desgosto,
como as covinhas do rosto,
como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
numa eterna primavera
viver, qual vive esta flor.
juntar as rosas da vida
na rama verde e florida,
na verde rama do amor!

Estrofe do Dia

Se você é pessimista
orgulhoso e prepotente,
aprenda a vergar a alma
se quiser viver contente;
ouça a paz que lhe convida,
toda reforma da vida
começa dentro da gente.
–GERALDO AMANCIO/CE–

Soneto do Dia

Amigo! Um irmão que a gente escolhe...
FRANCISCO NEVES MACEDO


Fazer escolhas, nesta minha vida,
é o dia a dia que se faz dever,
e quando eu erro vem todo um sofrer,
mas, se a escolha é banal, fica esquecida.

Um carro, um disco, um anel, uma bebida,
uma mulher, um livro para ler,
a nossa fé, time para torcer,
uma viagem, um som, uma comida.

Fiz tantas vezes essa escolha errada,
usei o livre-arbítrio para nada!
mas, quem está na chuva, que se molhe...

Há uma escolha que é definitiva,
e eu me baseio nesta afirmativa:
Amigo é aquele irmão que agente escolhe.

José Feldman (Até Mais, meu Irmão) - Dedicado a Chico Macedo

quinta-feira, 29 de março de 2012

Trova Triste - Francisco Neves de Macedo (RN)

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 507)


Uma Trova de Ademar

Tem homem com maus intentos,
que, por maldade ou desdém,
às vezes, gasta quinhentos
para o outro não ganhar cem...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Se a vida é a maior graça,
que do bom Deus recebemos,
ergamos a nossa taça
enquanto vida nós temos.
–ZÉ REINALDO/AL–

Uma Trova Potiguar


Meu olhar ficou defronte,
ao seu olhar, de repente...
E este encontro se fez ponte
entre os corações da gente.
–FRANCISCO MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Faço versos se estou triste,
faço versos de alegria,
a minha alma não resiste
aos apelos da poesia.
–CORA LAYDNER/RS–

Uma Trova Premiada


2004 - Nova Friburgo/RN
Tema - REFÚGIO - 1º Lugar


Baú velho, tampo torto,
Cartas e fotos mofando...
- refúgio de um sonho morto
Que eu vivo ressuscitando!...
–JOSÉ OUVERNEY/SP–

Simplesmente Poesia

Libertação
–DOMITILLA BORGES BELTRAME/SP–


Cortei as amarras,
soltei o meu barco,
tracei nova rota...
Disse adeus ao velho cais,
e, qual errante arrais
navego outros mares...
Quero ancorar em ignoradas margens,
desbravar uma diferente terra,
encontrar novas paisagens,
descobrir o segredo do outro lado da serra...
Correr leve e solta
pelas brancas areias de novo sonho
já não mais tristonho,
e, quem sabe, olhos nos olhos,
mãos nas mãos,
viver um amor inesperado,
entregar os beijos que não dei
escrever os versos que guardei!...

Estrofe do Dia

Minha vida tem sido uma peleja,
quando venço um problema outro aparece,
quando alguém me ajuda outro me esquece,
toda mão que eu encontro me apedreja;
procurei um vigário na igreja
disse: padre eu só vim me confessar,
disse o padre você tem que pagar
uma conta que deve a natureza;
minha vida é um filme de tristeza
que eu deixei de assistir pra não chorar.
–BIU SALVINO/PB–

Soneto do Dia

O Ideal
–LUIZ OTÁVIO/RJ–


Esculpe com primor, em pedra rara,
o teu sonho ideal de puro artista !
Escolhe, com cuidado, de carrara
um mármore que aos séculos resista !

Trabalha com fervor, de forma avara !
Que sejas no teu sonho um grande egoísta !
Sofre e luta com fé, pois ela ampara
a tua alma, o teu corpo em tal conquista !

Mas, quando vires, tonto e deslumbrado,
que teu labor esplêndido e risonho
ficará dentro em breve terminado,

pede a Deus que destrua esse teu sonho,
pois nada é tão vazio e tão medonho
como um velho ideal já conquistado ! ...

J. G. de Araújo Jorge ("Vamos Voltar Pra Casa ?")


Uma hora "sagrada" para mim é a hora da volta. A hora de voltar para casa. Acredito que seja uma "hora sagrada" para quase todos os homens.

Ao fim do dia de trabalho, de preocupações, de luta, atirado ao mundo ilimitado de interesses e ambições, aquela expectativa de paz, de aconchego, do seu pequeno mundo entre quatro paredes.

Os ingleses tem uma doce palavra que define esse porto de volta - "home".

É o nosso lar.

Tenho uma pena infinita daqueles que não podem voltar, ou não tem para onde voltar. São como pássaros que tivessem que permanecer em vôo, sem o embalo de um ramo, ou a quentura de um ninho.

Na pressa do retorno, no fim da jornada, quando procuro os meios de condução, vez por outra surpreendo na ruas, nos bancos das praças, os vultos indigentes dos que não voltam, dos que terão de ficar, dos que vêem chegar a noite, indiferentes ao estranho burburinho humano que lembra o dos pardais, nas árvores da cidade.

Então, não consigo evitar que um pensamento amargo turve o meu apressado egoísmo. E uma tristeza inevitável esvoaça por momentos como uma borboleta negra que entrasse por uma janela aberta.

Todos nós, diariamente, ao entardecer, somos como marinheiros de nós mesmos; navios que se avizinham do porto de origem. ansiamos por avistar a paisagem do coração, por encontrar os que nos são caros, os que justificam as partidas de todo dia, o cotidiano exílio do trabalho.

Em muitos trechos de minha poesia tenho fixado as emoções que essa hora me suscita. Sou um homem que acha que, até mesmo nas viagens de puro prazer, a grande alegria é a volta. Quase se poderia dizer que a gente parte antegozando hora de retornar., transformar as uvas colhidas no vinho doce das lembranças, servido entre amigos.

Tal como se diz dos namorados: que brigam pelo prazer de fazer as pazes. Uma viagem é uma "briga de namorados" com a vida. A gente larga o que gosta, para sentir saudades, e voltar mais apaixonado ainda.

Gostaria de citar para vocês os muitos poemas que escrevi, cantando a alegria de voltar. Sim, bem sei que tenho muitos outros poemas falando do desejo de partir, de perder-me em dionisíacos descaminhos. Mas, no fundo mesmo, o que prevalece é o sentido das raízes que prende o homem ao seu chão, que lhe permite, nos momentos de pausa, crescer e encher-se de flores, frutos e pássaros.

Na exígua moldura desta página, eis duas faces de um mesmo canto.

Tiro primeiro, de "Harpa Submersa" um trecho de :

COLÓQUIO PROSAICO

Porque as coisas que me cercam se impregnam de poesia,
porque lhes transmito minha convivência
é que posso amá-las e senti-las com a perspectiva
da minha emoção.
Oh, felizes são aqueles que encontram os objetos amados
nos seus lugares, ao seu redor,
e possuem o Dom de transubstanciar-se em seu próprio mundo
cercado por uma imensa família
mesmo em solidão.

Seres de nosso mundo
os jarros, os quadros, os livros, as cortinas,
a janela, a cama, a mesa,
são velhos companheiros - formas estáticas de pensamentos-
são velhos confidentes, testemunhas silenciosas
de nossos conflitos,
estátuas de mil figuras e personagens
representando-nos em mil instantes diversos...

Cada um, é um momento múltiplo, onde se agrupam tantas idéias
tantas conjeturas e solilóquios,
fazem parte de nossa vida e se encontram nela, vivos
como a cena no personagem.

Depois, de "a Outra Face" este monólogo lírico que intitulei:

Meu Mundo

Toda tarde digo para mim mesmo:
afinal, eis o meu mundo.

O mesmo beijo, o mesmo quarto claro, com seu assoalho brilhando
refletindo o meu passo;
as mesmas paredes brancas me envolvendo com afáveis gestos de paz;
o mesmo rádio silencioso, entre livros empilhados, a mesma estante fechada
que a um gesto meu descobre tesouros como velha mala de pirata.

Afinal, eis o meu mundo.
A mesma insubstituível companhia, a mesma presença até quando longe dos olhos,
a mesma voz perguntando, a mesma voz respondendo,
o mesmo odor suave da janta, do tempero cozinhando,
a mesma impressão de quem chega de ombros nus e veste ajudado
um macio agasalho.

Afinal, eis o meu mundo.
Como o pescador solitário, diante do primeiro ramo:
- afinal, eis a terra!

E por isso é que acho que defini a felicidade naqueles dois versos de um poemeto de "A Sós":

Gostaria de poder de repente te dizer:
- vamos voltar pra casa!

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 506)


Uma Trova de Ademar

Nesta gravura se encerra
uma verdade de fato:
se acaso esse mouse emperra
o gato não pega o rato!...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Tendo a plástica da Estela
pele “daquele lugar”...
vira e mexe a cara dela
tem vontade de sentar...
–CÉSAR AUGUSTO DEFILIPO/MG–

Uma Trova Potiguar


De tanto ver a Maroca,
todo dia na janela,
cheio de ciúme, o Joca,
botou o ferrolho nela...
–FRANCISCO BEZERRA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Toda mulher que é gorducha
tem um recurso só seu:
Ao vestir-se, grita: “Puxa...
como esse troço encolheu!”
–MAGDALENA LEA/RJ–

Uma Trova Premiada


2009 - Nova Friburgo/RJ
Tema - CINQUENTÃO - 5º Lugar


Tentando aparentar trinta,
o cinquentão se “ferrou”.
Comprou um estoque de tinta,
mas… o cabelo acabou.
–WANDIRA FAGUNDES QUEIROZ/PR–

Simplesmente Poesia


M O T E:
Não posso vencer a morte,
mas irei de má vontade.


G L O S A:
Mesmo que eu pareça forte
como um touro premiado,
serei um dia enterrado,
Não posso vencer a morte,
do Rio Grande do Norte
levarei muita saudade...
Promessas de eternidade
me fazem crer noutra luz.
Eu sei que é pra ver Jesus,
mas irei de má vontade.
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

Estrofe do Dia


Na vida de Michael Jackson
Eu sei o que aconteceu:
Não tinha fama, arranjou
Era pobre, enriqueceu
Era preto, ficou branco
Mudou de cor e morreu!
–GERALDO AMÂNCIO/CE–

Soneto do Dia

Só a Morte...
–MEDEIROS E ALBUQUERQUE/PE–


"Se me desdenhas, sinto que faleço,
De nada mais pode servir-me a vida;
De ti e só de ti me vem, querida,
Todo o alento vital de que careço.

Só a morte é possível, se perdida
Eu vir tua afeição. Nenhum apreço
Darei a tudo mais, se o que mereço
É teu desprezo, em paga à minha lida."

Ela não respondeu... Por fim, notando
Que contra a sorte é inútil que se teime
Resolvi não morrer. E tão tranquilos

Foram os meus dias, que eu me rio quando
Penso no que ontem vi: ontem pesei-me
E achei, num mês, que eu engordei três quilos!

quarta-feira, 28 de março de 2012

Marina Colasanti (Que Escritor Seria Eu Se Não Tivesse Lido? )


George Dawson tinha 98 anos quando aprendeu a ler. E tinha 102 quando, em maio deste ano, publicou seu primeiro livro. Dawson é descendente de escravos do Texas, e sem Ter lido nada antes, sem Ter qualquer bagagem literária, escreveu a história da sua vida nos anos 20 e 30. Escreveu, sem que nenhum livro lhe ensinasse a fazê-lo, a história mis complexa que existe, a de uma vida humana.

Li sobre a façanha de Dawson no jornal e me perguntei: o ele teria escrito se tivesse começado a ler na infância? E também me perguntei: tivesse sido leitor contumaz desde menino, teria igualmente se tornado escritor?

É provável que não. A leitura não nos conduz fatalmente à escrita- o que, convenhamos, é ótimo, porque ninguém agüentaria tantos escritores -. A leitura, como uma agência de publicidade, desdobra à nossa frente “depliants” de mundo maravilhosos, e nos conclama, e os estimula, e deserta nossos desejos. As possibilidades de escolhas se multiplicam. Vocações que sem ela dormitariam, para sempre ignoradas, despertam. E partimos, graças às asas da literatura, para as mais diversas profissões. Às vezes, até para a de escritor.

Eu não me tornei escritora porque era leitora. Eu me tornei escritora porque comecei a escrever.

A leitura, que habitou minha vida desde cedo quando consigo lembrar, não medisse, vai Marina ser isso ou aquilo. Mas a pessoa que eu era aos 15 anos, barro cozido e assado por tantas pequena chama literárias, queria ser pintora.

E pintora fui, durante bons anos. Dedicada, apaixonada, feliz com meu fazer, segura da minha escolha. Até que cheguei aos 23. Continuava achando que tinha uma vocação e estava até me dando bem na vida com ela. Mas decidi que precisava ganhar dinheiro. E fui trabalhar em jornal.

Não seria questão de abandonar a vocação. Tratava-se de abrir uma porta, deixado a pintura pendurada atrás dela, à espera.

Entrei na redação levando apenas uma bolsa pendurada no ombro, e óculos guardados na bolsa. Uma ‘foca”, sem bola no nariz. Um jovem principiante que havia feito um curso acelerado de datilografia para não passar vexame de catar milho. Assim me apresentei, e assim me viram. Eu não ouvi, nem meus colegas, mas depois que soube comigo haviam entrado o menino Tom e o índio que o perseguia, os acordes do órgão do Capitão Nemo, o silêncio na cabeça de Ulisses enquanto via as sereias cantarem, os rebanhos de carneiros descendo em transumância na Provença de Giono, o vento nas pás do moinho de Quixote, uma galinha perseguida num Domingo pela mão de Clarice, uma pedra no meio do caminho, uma “madeleine' , um gato de botas.

Comecei a escrever porque puseram uma Olivetti na minha frente, um monte de papel, e me mandaram fazer a matéria. Isso ainda não era escrever, evidentemente. Mas empoleirados no alto das divisórias de vidro lateado daquela redação, Pinocchio, Raskolnikov, Ricardo Coração de Leão, Gregório Samsa, D'Artagnan e Mr Gatsby esfregaram as mãos. Estava na hora de começarem a empurrar.

E assim fez-se, ou abriu-se, em mim outra vocação.

Como para George Dawson, também me pergunto: eu teria sido escritora se não tivesse sido leitora? Mas é uma pergunta que não procede porque equivale a por em questão toda uma vida. Então seria que perguntar: eu teria sido escritora se não tivesse saído da África onde nasci? E se não tivesse saído da Itália, onde me criei, e não tivesse vindo para o Brasil, onde comecei a escrever? É quase como perguntar, sabendo de antemão que não encontrarei resposta: que escritora teria sido eu se não tivesse sido leitora?

A leitura me ensinou, antes de mais nada, a gostar de papale, a amar papel escrito, a perseguir tipologias. Ne ensinou a precisar da presença física dos lvros. Não fosse isso, e a viade escritora seria uma condenação, com oslivros que se multiplicam incessantemente, enchendo a casa, empilhando-se sobre as mesas, as cadeiras, o chão, e os papéis, os papéis que contrariamente ao que se alardeou no início da era da informática não desapareceram mas parecem cada ida mais abundantes.

A leitura me ensinou a viver com a leitura. Me viciou em leitura, me fez procurar a vida nos livros com a mesma intensidade com que a procurava fora deles.

Se eu não tivesse sido leitora precisaria de um talento infinitamente maior, para escrever. Não tendo afiado o ouvido às palavras, que trabalhoso seria apertar sozinha, uma por uma, todas as cravelhas.

Mas as palavras escritas- que não são as mesmas palavras da fala, embora irmãs, porque criadas para andarem juntas naquela exata ordem e não em outra, já eu ó naquela ordem o valor de uma contamina a outra- as palavras escritas, eu dizia, infiltraram-se em mim junto com os outros aprendizados, quando eu ainda não sabia ler. Minha mãe lia para mim. E a música da voz da minha mãe fundia-se com a música das palavras que ela lia.

Talvez justamente isso, o fato da minha ler em vez de contar, tenha marcado a minha escrita. Pois nunca me senti levada a escrever de forma oralizante; pelo contrário, o inusitado que mantendo o texto perfeitamente compreensível e familar confere um frescor de coisa nova e uma intonação poética, sempre foi a minha busca. O texto não é para mim ferramenta para contar uma história. Mais justo seria dizer que a história é pretexto para construir o texto.

Hoje leio como se fizesse trialto. Acordo e perco no mínimo um hora lendo os jornais. Depois vou para o escritório e começo a ler o material de trabalho. Na hora do almoço, se estiver sozinha, encosto um livro no copo cheio d'água, que não bebo para não perder o suporte. E dia afora vou lendo e escrevendo. Ma sou atleta indisciplinada, capaz de perder um tempo enorme com leituras inúteis, deixar cada mínima consulta de pesquisa alongar-se indefinidamente porque não consigo me ater somente ao que procurava, e gastar em leituras menores o tempo que deveria reservar para ler ou reler os clássicos. E, o que é pior, tenho a impressão- prefiro não dizer a certeza- de esqueço a maioria do que leio.

Quando menina, e mesmo depois quando jovem, lia como se descesse as corredeiras num bote. Deixava-me levar, jogada de um lado a outro pela narrativa, transportada, na espera ansiosa da cachoeira que a qualquer momento despencaria comigo assombrando meu coração.

Eu usava lápis, jamais teria ousado riscar um livro, por meu que fosse. E por isso, não pela sacralidade do livro, mas porque não me passava pela cabeça eu me fosse permitido, que me fosse devido interagir diretamente junto ao texto- a palavra interagir sequer se usava-. A idéia de que a minha opinião pudesse Ter lugar, e valor, ao lado daquilo que que havia sido escrito pelo autor não me aflorava.

Quando passei a usar o lápis, tornei-me outra leitora. Ou melhor, quando me tornei outra leitora, passei a usar o lápis. Não desço mais, entregue, nas corredeiras. Sou seu vigilante. Analiso a força das águas, sua direção, a profundidade. Meço a transparência, procuro o que nela se move. Vou sim com ela, e me encanto, e me deixo molhar pelas espumas. Mas a qualquer remanso indevido, a qualquer turvação, minhas orelhas se erguem atenta, meu lápis se apoia na margem. Anoto, controlo. Por um instante não estou sendo levada, botei um pé para fora do bote.

Tornei-me interlocutora do autor. As margens às vezes são estreitas demais para as conversas que tenho com ele. E me acontece fazer uma crítica, ir a diante, ver que a crítica não se justifica, voltar atrás apagar o que eu havia anotado. Como se pedisse desculpas ao autor pela falta de confiança. Não estou mais lendo sozinha como lia. estou lendo por cima do ombro dele.

A leitura atravessou minha juventude em blocos. Como se um trem me varasse a cada vez com seus vagões. Eram comboios de paixão. Um autor entreva na minha vida, eu me enamorava e, depois do outro , ia lendo todos os seus livros.

Foi assim desde menina. Bem pequena ainda, devorei Salgari inteiro e imitando suas histórias brinquei de pirata e de índio americano, Sole Ridente era o meu nome na tribo. Lá pelos onze anos me banqueteei com Verne. Depois fui indo. que furacão na minha alma quando encontrei Dostoievski! Eu ansiava o dia inteiro pelos momentos que iria encontrar com ele. Foram meses e meses de neve, sofrimento e nomes cheios de vogais. Depois os americanos; a sedução daquele trem que parecia interminável, os vagões de Hemingway, dos Passos, Steinbeck trazendo-me um mundo novo, seco de frases curtas, um mundo sem volutas, especialmente revelador para mim, italiana encharcada e barroco. Amei Giono, ocupei com ele toda a prateleira da estante. E pouco antes de esbarrar com a minha própria escrita, esbarrei com Proust. Foi um fecho glorioso para minhas leituras de juventude.

Mas também fui leviana, traindo meus grandes amores com amores passageiros, “ficando” com um livro ou outro, só pelo prazer de uma noite. Sim, cometi pecados de juventude, gostei de M. Dely, e acreditei que “To et Moi” de Paul Geraldy fosse bela poesia. Chorei com Ayn Rand. E li muito Mistério Magazine de Ellery Queen, embora o mesmo tempo economizasse dinheiro da mesada para comprar a revista “ Senhor” e ler os contos de Clarice.

Hoje os trens são mais raros , e não percorro todos os vagões. Se gosto de um autor, leio primeiro um livro, atravesso em diagonal um ou dois livros mais, para certificar-me e para Ter uma idéia de conjunto, dispenso os outros. Não tenho mais paixões. Tenho apreço, admiração. Leio, reconheço a qualidade, me entusiasmo. Mas entusiasmo não é a mesma coisa que paixão, entusiasmo é uma categoria profissional. A escrita roubou-me o arrebatamento da leitura.

Houve um tempo em que cada livro que me chegava era um Cavalo de Tróia, de cuja barriga sairiam, na solidão do meu quarto, invasores bem vindos. Depois aprendi a desventrar a barriga do cavalo ainda na livrara, de pé, percorrendo o índice e vendo o que continha. Já não levo nenhum mistério para o quarto, os habitantes do livro/cavalo são gentis convidados, quando não reféns que manterei comigo só quando me interessarem. Nenhum me invadirá.

E se ler escondido depois da hora de dormir, na clássica cena da lanterna acesa debaixo das cobertas, era duplo prazer, de leitura e transgressão, ler tornou-se com o tempo dupla culpa, pois me sinto culpada se, escrevendo, deixo de ler, tendo tantos livros à minha espera.

Com freqüência me perguntam quais as marcas dessas leituras na minha escrita. E eu própria me surpreendo com a sensação de que não existem, pelo menos não claramente identificáveis. Me parece impossível que se possa dizer olha a patinha de fulano ali, olha o focinho de fulana aqui. Pois eu não usei patas ou focinhos alheios para compor minha linguagem, embora os usasse para despertas a emoção que, mais tarde, viria a servir de base para a construção dessa linguagem.

Nunca quis escrever como alguém, por mais que gostasse da sua escrita. Talvez pensasse inconscientemente que não seria capaz, que aquilo não estava em mim.

Embora tivesse tantos romances e livros de aventura, nunca quis escrever nem uma coisa nem outra; meu desejo de escrita sempre esteve centrado na ourivesaria do texto curto.

E nenhum dos meus queridos realistas despertou em mim o desejo de imitá-los. Poe, que li menos que Verne, deixou em minha juventude uma marca mais funda, introduzindo-me no mundo fantástico. Um mundo que eu já havia freqüentado através os contos de fadas na voz de minha mãe. E que, adulta, reencontraria em Borges, em Cortazar, em Calvino, em Buzzati.

Pode parecer ingratidão, mas não tenho e nunca tive ídolo. À medida que avançava nas leituras e na profissão, porém, percebi que pertencia a uma família. Sou parente daqueles escritores que deram um passo além do real, e ali fundaram sua realidade. Sou irmã dos que reencontraram seu mundo somente no inconsciente, ou no papel impresso.

Fonte:
Simpósio Internacional Transdisciplinar de Leitura/ 2000. Leia Brasil
http://www.leiabrasil.org.br/old/simposio/escritor_lido.htm

Carlos Lúcio Gontijo (O Obscuro Fogaréu das Vaidades)


Não me perguntem aonde ir para encontrar leitores, pois nunca soube. As bibliotecas estão sempre vazias, as livrarias repletas de autores estrangeiros e livros de autoajuda, enquanto a literatura brasileira sobrevive com a simples e costumeira citação de grandes autores, que verdadeiramente também são muito pouco lidos. Não entendo também de busca de recursos para se editarem livros, porque nunca obtive sucesso nessa empreitada, consciente de que a política cultural brasileira só favorece aos que se acham sob os holofotes da mídia, o que determina fluxo volumoso de recursos para as mesmíssimas celebridades e famosos de sempre. Todavia, em torno desse assunto, as discussões se prendem mais ao calor obscurantista do fogaréu das vaidades que à luz da real busca de soluções.

Houve um tempo em que concursos literários lançavam novos talentos, mas hoje eles só servem para propiciar alguma pequena edição ao ganhador, o que representa significativa glória num país em que as editores não investem nem apostam em novos autores (digo isso no tocante ao ato de se fazer conhecido, uma vez que existe gente com idade avançada e sem qualquer trabalho editado), obrigando aos que pretendem tirar a sua obra da gaveta, em tempo de democrática ditadura de intensa propagação do grotesco ou, no mínimo, de valor cultural duvidoso, que por sua vez leva adultos, adolescentes e crianças a dançarem na boquinha da garrafa. Infelizmente, entre nós, o esmero tecnológico da imagem digital chegou às ?nossas? televisões antes de as mesmas implantarem qualidade em sua rede de programação.

Se eu fosse tangido pela busca de fama e sucesso não estaria me movendo para editar o meu 14º livro nem disposto a investir quantia, para mim volumosa, em meu site, que agora em junho próximo, neste ano de 2012, completará sete anos. Uma vez que, hoje, o que determina notoriedade são a inventiva e o comportamento esdrúxulo ou completamente anômalo e contrário aos chamados bons costumes, tratados como desnecessários ditames ultrapassados.

A dilapidação promovida ao senso comum que norteia a convivência em sociedade vem exatamente dos órgãos que deveriam atuar em sua defesa. Os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário se consideram (e se põem) acima da nação brasileira, que sabiamente os julga pelo produto final que a ela é apresentado. Vem daí a generalização da reclamação popular, pois quando uma prestação de serviço não é satisfatória o consumidor recorre ao PROCON contra a loja vendedora ou a fábrica produtora, não lhe sendo exigida a indicação de nomes ? ao produtor da mercadoria defeituosa cabe, se assim o desejar, a descoberta do funcionário responsável pela ocorrência!

Ou seja, a má prestação de serviço advinda da ação dos Três Poderes é problema relativo a todos aqueles que o integram. Cabe a cada um deles e mais especificamente aos que se nos apresentam como a parte boa, reclamando da constante acusação generalizada, agirem em prol da devida apuração. Afinal, não se trata de seres inanimados; não são maçãs sadias enfiadas, involuntariamente, em saco de aniagem em meio a frutos putrefatos...

Em ambiente assim perverso, no qual os que deveriam dar o exemplo insistem em não dá-lo, assisto ao cotidiano crescimento da cultura do levar vantagem em tudo, que vai levando a tudo de roldão. Para onde olho eu vejo podridão: é político com dinheiro na cueca, na meia, no porta-malas, no banco do carro; são favorecimentos e desvios de recursos públicos em montante inimaginável, mas que pode ser dimensionado pela paisagem de abissais carências sociais que nos rodeia.

Quem sou eu, pequeno escriba, para perder o fio da meada, abandonar a literatura menor que realizo (mas que é a minha vida) à beira do caminho, depois de tão longa caminhada. Só me resta mesmo impor-me alguns sacrifícios em nome do invisível, do que não se vê: a energia imaterial do halo da alegria de efetivar o exercício de um dom, ainda que as palavras me pareçam jogadas ao léu. E é exatamente sob esse sentimento que lançarei meu novo trabalho literário, o romance ?Quando a vez é do mar? (um livro de 400 páginas), no dia 27 de abril, às 19:30, na Associação Mineira de Imprensa, à Rua da Bahia, 1.450, em Belo Horizonte.

Enfim, sou brasileiro comum. Faço parte desse povo que, apesar dos governantes e dos poderes, consegue sobreviver e driblar as pedras atiradas em seu caminho. Termino então repetindo reflexão de Sigmund Freud, grande explorador da alma humana: “Mas posso me dar por satisfeito. O trabalho é minha fortuna.”

www.carlosluciogontijo.jor.br

Fonte:
Texto enviado pelo autor

J. G. de Araújo Jorge (Universo à Vista)


Estamos nos limites de uma época - momento grave da entrega do bastão, na maratona da História

Fim de etapa, começo de outra. Dialeticamente chegamos a uma nova síntese. O homem se encontra, não apenas em face de um mundo novo, mas de “novos mundos”, tal como a civilização medieval na era dos grandes descobrimentos marítimos. Não foi sem razão, portanto, que chamaram os astronautas da Apolo-8 de “Colombos do espaço”. Do mesmo modo que os Colombos, os Magalhães, dilataram o mundinho mediterrâneo, o fechado “maré nostrum” romano, e deram ao Atlas terrestre suas proporções atuais, os recentes feitos da Astronáutica subverteram as dimensões da nossa acanhada geografia.

-Universo à vista!

O Gênesis tem que ser reescrito. “No princípio Deus criou os céus...” e as terras. Muitas terras gravitando em imensos vazios, mas com certeza habitadas por outros seres, parecidos ou não com os Adões e Evas do perdido Éden.

Subitamente somos passado e futuro. Decolamos de nós mesmos, do que “éramos”, como um foguete rompendo a área gravitacional da Terra, e investindo o desconhecido. Olhamo-nos no espelho, e não nos reconhecemos em corpo e alma. Nossas idéias terão que ser reestruturadas em função deste deslocamento físico, das alterações de nossa visão cultural; da imprevista realidade descortinada; do homem inédito em que nos sentimos. Saímos da casca, como o pinto, e devemos encarar tal fato como uma projeção natural do nosso eu ante as espantosas conquistas da ciência moderna.

Todos nós crescemos, e vivemos, sabendo que a Terra é redonda, que gira em torno de si mesma, e entorno do Sol. Está nos compêndios que compulsamos desde o curso primário, no globo terrestre que a professora tinha em cima da mesa. Mas, no fundo, todos nós esperávamos pela “prova real” dessa velha lição. Como S. Tomé: “Ver para crer”. Já ouvi um garoto perguntar ao pai, como é que o japonês podia andar de cabeça para baixo, do outro lado do mundo? E da ingênua conjetura de um companheiro: por que um avião “parado” no ar, não fazia a volta à Terra em 24 horas, se ela completa seu giro nesse tempo?

As explicações da lei de Newton nos deixavam incrédulos, a pensar neste estranho mundo redondo, a rodar nos céus, com todas as coisas presas no chão, sem que as imensas massas líquidas dos oceanos não se soltassem, e com elas, algas, peixes, baleias, tubarões, a voarem como pássaros!

Os garotos de agora não terão motivos de dúvida. Viram, como eu vi, na televisão, os filmes tirados por Borman, Lovel e Anders, quando a mais de 400 mil quilômetros de nosso planeta, circunavegavam a Lua (Três meses depois de escrita esta crônica, a 20 de julho de 1969, Armstrong, Aldrin e Collina, os três astronautas norte-americanos chegaram a lua, tendo os dois primeiros descido na superfície lunar). E todos compreendemos, então, que o homem deixou de ser um simples habitante terreno. Seu “espaço” ampliou-se. Até agora, víamos tudo, do chão, colados, como as serpentes. De repente, ultrapassamos as próprias aves - somos aves de infinito vôo, - e é como se descobríssemos a Terra - habitantes de outro planeta - livres das milenares raízes que nos agarram ao solo. Einstein se imaginou numa estrela, Arturus, para, livre da lei da gravidade, descobrir a sua “teoria da relatividade”.

Borman e seus companheiros se encontram realmente na situação imaginada pelo gênio de Einstein, e devem ter descoberto uma teoria mais simples: a da humanidade. Paradoxalmente foi preciso que se afastassem da Terra para se “humanizarem”, no sentido de compreenderem ao mesmo tempo a insignificância e a grandeza do homem. O Universo, apenas palavra, poesia - tem agora um sentido tão próximo, palpável, como praia, mulher, edifício, sorvete.

Lovel declarou, vendo a Terra à distância, como uma bola iluminada, que, naquele momento, duvidou que ela pudesse ser habitada.

Assistindo o filme, e a nos repetirmos a cada instante: inacreditável! - também perguntamos: será que há seres naquela “lua grande”? E Lovel concluiu:

“O mundo pareceu-me então, realmente um mundo só”.

Positivamente, como se falar em guerras por palmos (palmos, mesmo) de terra, diante dessa imagem extraordinária? Eu, por mim, não pude conter a irritação, quando, logo após o locutor se referia à disputa entre árabes e judeus, por nesgas de deserto, de areal, na península do Sinai. Tudo me pareceu de proporções liliputianas! Que tacanha a mentalidade de nossos estadistas! Se eu fosse Borman, a primeira coisa que teria proposto ao meu governo ao sair da cápsula, na volta seria:

“Que seja criado um governo Universal!”

Não somos mais que um átomo a girar nos espaços. É estúpido que permaneçamos a usar um sistema métrico mental ultrapassado; que insistamos em nos autodestruir e a nos entre devorar.

Tal apelo, hoje, não saberia mais a utopia. Se Borman o fizesse, teria completado a sua oração, ao ler, no Cosmo, um capítulo do Gênesis. Sim, o Gênesis terá que ser reescrito. Esta é a hora de revisarmos valores, idéias, e até palavras. Fronteiras, pátrias, religiões, formas arcaicas de uma civilização para trás, devem e terão que ser necessariamente reconceituadas. As ONUS, OEAS, UNESCOS, meras siglas sem significado real, não funcionarão enquanto o nosso mundo subdividido continuar sujeito à espoliação dos fracos pelos fortes, às competições desleais entre ricos e nobres, com uma infra-estrutura anterior à era da energia atômica, da astronáutica, dos transplantes, da eletrônica.

Há um mundo novo pela frente. Um mundo que deverá se organizar à base das necessidades fundamentais do homem, físicas e culturais, despojando as sociedades de inúteis e anacrônicos aparatos bélicos. As fardas, para os museus.

As fronteiras não estão mais na terra. As pátrias têm novo sentido. As religiões serão reinventadas, para que permaneçam arrimo e esperança. A Bíblia, velha colcha de retalhos, remendada pelos hebreus, será relegada à sua condição de mitologia lendária do Oriente.

A Igreja não considera mais a Terra o “centro do Universo”, renegou Ptolomeu, admite outros mundos habitados. Concordou afinal com Galileu, e quem sabe? -com Renan. Re-estudar a natureza mística de Cristo não será mais heresia. De quantos Cristos precisaria Deus para redimir incontáveis “humanidades”?

As fronteiras são rabiscos de giz, num quadro-negro, que as gerações apagam com facilidade espantosa. O nacionalismo, já o definia Goethe, como “sarampo dos povos”, doença primária, e passageira. As pátrias, armadas, mais que amadas, caducaram. Absurdo que se justifiquem genocídios brutais, à base de conceitos artificialmente alimentados ao som de bandas de música e de discursos políticos. O homem é um só. O Universo, o seu mundo. E é diante desta visão, desta realidade nova, que deveremos reconstruir-nos para conquistar os caminhos que Deus projetou à nossa frente. À maneira dos velhos marinheiros, do alto dos mastros das caravelas, agora podemos gritar:

- Universo à vista!

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 505)

Praia dos Ingleses - Florianópolis/SC

Uma Trova de Ademar

Meu momento mais sofrido
retirei da minha história,
mas vive ainda escondido
nas gavetas da memória.
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Na beleza da alvorada
quando o sol desperta o dia,
no clarão da madrugada,
minha alma canta em poesia!
–SÔNIA SOBREIRA/RJ–

Uma Trova Potiguar


Vida: caminho que alcança
na esquina a sua metade;
de um lado, vive a esperança,
do outro, dorme a saudade.
–MARA MELINNI GARCIA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Na mão esquerda lembranças
refletem fidelidade:
são as duas alianças
cravejadas de saudade!
–EDMILSON FERREIRA MACEDO/MG–

Uma Trova Premiada


2011 - Nova Friburgo/RJ
Tema - RECADO - M/E


Guardo ainda o teu recado,
mesmo com tristes lembranças...
Pedaço de meu passado
alimentando esperanças...
–IVONE PRADO/MG–

Simplesmente Poesia

Calçadão de Minha Rua...
–CAROLINA RAMOS/SP–


Alvinegra passarela
em mosaicos definida...
sempre que passo por ela,
a repassar me convida.

Calçadão de minha rua,
a imitar ondas do mar...
à luz do sol ou da lua,
aonde irás me levar?!

Meu destino, irrelevante,
me fez boa caminheira
e assim vou seguindo adiante,
até quando Deus o queira!

Calçadão de minha rua,
talvez que em dia já breve,
minha vida, que se estua,
não te pise... nem de leve!

E, então, guardarás silente,
nos mosaicos desgastados,
passos meus... passos de ausente
... marcas de passos passados..

Estrofe do Dia

Ó bom Deus, eu vos peço piedade,
para que minha dor não cresça tanto
conservai no meu peito esta saudade
não deixeis meu senhor que vire pranto;
se eu chegar a sentir dentro de mim
toda minha saudade levar fim
como um cacho de espuma na procela,
persistir em viver seria o cúmulo
dois vencidos iriam para o túmulo
minha saudade comigo e eu com ela.
–DINIZ VITORINO/PB–

Soneto do Dia

Mulher, Verbo Amar...
–FRANCISCO MACEDO/RN–


Mulher, obra-prima do Pai Criador,
Mulher, já nasceu - criação preferida,
mulher, mãe, amante, alicerce da vida,
mulher, sobretudo, um exemplo de amor...

Maria, mulher, foi por Deus, escolhida,
seu ventre tão puro, cedeu ao senhor,
gerou o seu filho do próprio calor,
mulher e rainha... A missão foi cumprida.

Mulher soberana, também sofredora,
rainha do lar, mas, também professora,
matérias diversas, nasceu pra ensinar.

O verbo divino, em seu ventre habitou,
e em todos os tempos, porque consagrou,
de todos os verbos, o seu verbo é amar!...

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 504)


Uma Trova de Ademar

É a natureza sentindo
a dor no pulmão da terra,
e as matas, tristes, ouvindo
o ronco da motosserra!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Numa volúpia de amante,
estuante de emoção,
o colibri cintilante
beijava a flor em botão.
–ADAMO PASQUARELLI/SP–

Uma Trova Potiguar


Depois de muitas andanças,
e tanta ilusão perdida,
vejo lindas esperanças
orvalhando minha vida.
–REINALDO AGUIAR/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Da vida, no grande coro,
eis nosso destino atroz:
seguirmos de choro em choro,
até chorarem por nós!
–TASSO DA SILVEIRA/PR–

Uma Trova Premiada


2011 - Nova Friburgo/RJ
Tema - RECADO - M/E


Nas armadilhas da vida
às vezes, o amor mais lindo,
dá seu recado, e em seguida,
manda um outro, desmentindo.
–ALBA CRISTINA C. NETO/SP–

Simplesmente Poesia

Poemeto.
–ORACY DORNELLES/RN–


Voar
Voar em V
como ponta de flecha

Voar em V
como o vento
mítico

Voar em verso
e voltar
oracícaro.

Estrofe do Dia

Eu peço a Deus, todo dia,
numa prece comovida:
se eu merecer um castigo,
tire-me a própria comida,
mas não me tire a alegria
do convívio da poesia,
que é o sonho melhor da vida!
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

Soneto do Dia

Meus Conflitos
–OLGA MARIA DIAS FERREIRA/RS–


Amargo pranto escorre em minha face,
enorme dor sufoca este meu peito,
saudade imensa, já, não mais desfaz-se,
nem abandona as sombras do meu leito..

A nuvem negra deste desenlace,
mostra-me a cor de nosso lar desfeito,
e luto intenso em minha alma faz-se,
na falta deste amor... quase perfeito..

Ah, meus conflitos já cristalizados,
revelam mágoas, dores e pecados,
numa constância e impertinência louca...

Pelos momentos, já, ultrapassados,
por tantos sonhos por nós dois sonhados,
nesta saudade... beijo a tua boca!

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 503)


Uma Trova de Ademar

No outono, o comportamento
da folha, nos irradia,
pois, mesmo atirada ao vento
não perde a sua magia...
ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Doce trova, companheira:
criatura e criação,
chega de toda maneira
e aporta em meu coração!
–CARMEN PIO/RS–

Uma Trova Potiguar


Onde há fé, nada termina...
Jesus Cristo, o Redentor,
lá do céu, abre a cortina
enchendo o mundo de amor!
–EVA GARCIA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


À primeira claridade,
da manhã fresca e bonita,
a nossa bela cidade
desperta alegre e se agita
–SERAFIM FRANÇA/PR–

Uma Trova Premiada


2010 - Brag. Paulista/SP
Tema - CAMINHADA - Venc.


Nesta ambígua caminhada
há mistério e não me iludo:
-“Não sinto medo de nada,
mas tenho medo de tudo!!!”
–ANTONIO COLAVITE FILHO/SP–

Simplesmente Poesia


M O T E :
Eu fumando o cigarro da saudade
e a fumaça escrevendo o nome dela.
HUGO ARAUJO/PE–

G L O S A :

–GILSON MAIA/RJ–

Parece-me que a sorte, por maldade,
sempre quis perturbar a minha vida.
Minha amada zanzando na avenida
Eu fumando o cigarro da saudade
Mudarei, bem depressa, da cidade,
pra tentar esquecer essa mazela.
Ai que sina madrasta, chorumela!
Ergo os olhos aos céus, mas que ironia,
continuo fumando, noite e dia,
e a fumaça escrevendo o nome dela.

Estrofe do Dia

A maior pena da vida
para todos é uma só;
seja pobre, seja rico
a vida termina em pó;
e apenas a morte, apenas,
é quem aplica tais penas
e aplica sem pena e dó!
–LUIZ DUTRA/RN–

Soneto do Dia

Coisificadas
–HAROLDO LYRA/CE–


Hoje é comum mulher tirar a roupa
pra revelar nas bancas de jornal,
despudoradamente o colossal
segredo da virtude, já tão pouca.

Desnuda-se, aos apelos do mural;
na crapulosa folha a pose louca
que a revista conduz de boca em boca
e faz dessa mulher coisa venal,

que assim exposta nua à sordidez;
dependurada à espreita do freguês,
nem percebe aonde e como vai chegar.

Mas chega ao pai, os sonhos carcomidos,
por ver da filha os garbos preteridos,
e oferecida a quem puder pagar.

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 502)


Uma Trova de Ademar

É na Fé que eu me doutrino;
diferente dos ateus...
Minha vida e meu destino
entrego nas mãos de Deus!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Ao contemplar teu sorriso,
fruto de nossa amizade,
meu peito toca seu guizo,
de pura felicidade!
–NEMÉSIO PRATA/CE–

Uma Trova Potiguar


Após, intensa jornada
e como que, por crendice,
a mocidade exultada,
sede lugar a velhice.
–FABIANO WANDERLEY/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Jamais será diferente
minha atitude contigo,
que a amizade é permanente:
só trai quem não era amigo.
–ELTON CARVALHO/RJ–

Uma Trova Premiada


2010 - Brag. Paulista/SP
Tema - CAMINHADA - Venc.


Sem conter as mãos ousadas,
por meu corpo te aventuras
em noturnas caminhadas
de prazeres e loucuras...
–EDMAR JAPIASSÚ MAIA/RJ–

Simplesmente Poesia

Todo Dia
–JUSSARA GABIN/PR–


Todo dia,
no mesmo compasso,
toco minha vida.
Curo as feridas
e busco um espaço.
Não guardo rancor,
nem mágoa de amor,
tristeza ou cansaço.
Tenho na algibeira
pedrinhas preciosas,
nas mãos, um rosa,
colhida no jardim.
Sou peça importante
neste mundo inconstante
que escolheram pra mim.

Estrofe do Dia

O mundo se encontra bastante avançado,
a ciência alcança progressos em soma,
na grande pesquisa que fez o genoma
todo o corpo humano já foi mapeado;
No mapeamento foi tudo contado:
Oitenta mil genes se pode contar,
A ciência que faz chover e molhar,
faz clone de ovelha, faz cópia completa;
duvido a ciência fazer um poeta
cantando galope na beira do mar...
–GERALDO AMÂNCIO/CE–

Soneto do Dia

Sonetos.
–SÍLVIO VALENTE/BA–


Amo o soneto porque é molde antigo
para dizer as cousas sempre novas;
porque depois de não sei quantas provas,
um pudor virginal guarda consigo.

O soneto é mais puro do que as trovas.
sim, Bem-Amada, eu nele apenas digo
tudo que é nobre em mim, tudo que aprovas
e é meu prêmio na vida, e é meu castigo.

É fino e breve, e tem segredos de arte;
uma pureza, enfim, tão cintilante
que, quando um dia desejei cantar-te,

os teus encantos rútilos, diversos,
pus em soneto; e desde aquele instante,
só sei rimar-te com quatorze versos.

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 501)


Uma Trova de Ademar

O carisma verdadeiro
não se compra, ele é um dom!
Bem melhor que ter dinheiro
é ter carisma... E ser bom!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


No teatro, hoje em ruínas,
tantos sonhos eu plantei,
que as lembranças peregrinas
nem percebem que parei...
–LUIZ ANTONIO CARDOSO/SP–

Uma Trova Potiguar


Este conceito traduz
um céu de muito esplendor:
– “amor é facho de luz”
– “perdão é bênção de amor!”
JOAMIR MEDEIROS/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Pôs-se fim na pagodeira,
resta a cinza, em despedida,
que o vento da Quarta feira
vai levando na avenida!
PEDRO WILSON ROCHA/CE–

Uma Trova Premiada


2010 - Brag. Paulista/SP
Tema - CAMINHADA - Venc.


Nas caminhadas que fiz
pela vida atribulada,
aprendi que ser feliz
é viver de quase nada!...
–ALMIRA GUARACY REBÊLO/MG

Simplesmente Poesia

Em Preto e Branco
–CARMEN CARDIN/RJ–


Eu aposto nas emoções praticadas
Da ternura: ela atravessa fronteiras!
Amo o sabor das coisas delicadas,
Amo o valor das coisas verdadeiras.

Em cada muito, do pouco que faço
Em cada tudo, do nada que sinto,
A surpresa de viver trai o meu traço:
Dizendo a verdade, eu minto.

No rubor da minha face me afugento
(Ás vezes têm-se o nada e este é tanto!)
O carmim dos meus lábios é sedento
A maquiagem dos meus olhos é o pranto

Não faço planos, desconheço o que é promessa:
Nada tenho, nada sou, nada sei...
Nada peço, tudo quero, tenho pressa:
O artifício do Amor é a minha lei!

Estrofe do Dia

Me sinto prisioneiro
nas rédeas do teu destino,
me tornei um peregrino
por esse amor bandoleiro;
a ausência do teu cheiro
maltrata o meu coração,
por não sentir mais paixão
fiz voto de castidade;
no cabresto da saudade
amarrei minha ilusão.
–HÉLIO CRISANTO/RN–

Soneto do Dia

Ninguém...
–JOÃO UDINE/CE–


Ninguém entende a alma de um poeta!
É um enigma sondá-la e entendê-la.
O mundo vil, em desencanto, a veta,
Só porque o bardo diz ouvir estrela...

Ninguém entende a alma de um poeta!
Ninguém entende o seu poetar divino.
Ninguém entende a sua luz e meta
A transcender no verso cristalino...

O vate canta o que o céu clareia:
O mar, o sol, a lua, a branca areia,
E o perfume oloroso de uma flor...

Ah, o poeta canta e mui delira
Ao tocar, com amor, as cordas da lira,
Do seu pequeno e desmedido amor!

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 500)


Uma Trova de Ademar

A mais triste solidão
que os seres humanos tem
é abrir o seu coração,
olhar... E não ver ninguém!
ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Sofre o revés mais que justo
quem da ambição não se esquece
ao tentar a todo custo
conquistas que não merece.
–CEZAR AUGUSTO DEFILIPPO/MG–

Uma Trova Potiguar


A noite cai machucada
por tantas cenas de horror,
que os olhos da madrugada
abrem vermelhos de dor!
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Não paras quase ao meu lado...!
e em cada tua partida,
eu sinto que sou roubado
num pouco da minha vida..
–LUIZ OTÁVIO/RJ–

Uma Trova Premiada


1985 - Nova Friburgo/RJ
Tema - BRINQUEDO - 1º. Lugar


Infância é um brinquedo usado
que um dia a vida resolve
tomar um pouco emprestado
e nunca mais nos devolve!
–ARLINDO TADEU HAGEN/MG–

Simplesmente Poesia

Motivo.
–CECÍLIA MEIRELES/RJ–


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
Sou poeta.

Irmão das coisas fugidias
Não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

Estrofe do Dia

Seu doutor com licença e com respeito,
sou um pobre coitado e sem ciência,
tenha um pingo se quer de consciência
e reconheça também o meu direito.
Mesmo estando sofrendo neste leito
eu imploro ao senhor, não me agrida!
Mostre a luz, o caminho e a saída,
não cometa este ato tão medonho
nem maltrate um poeta e nem seu sonho,
que um poeta sem sonho, não tem vida.
–JÚNIOR ADELINO/PB–

Soneto do Dia

Ouvir Estrelas
–OLAVO BILAC/RJ–


"Ora direis ouvir estrelas! Certo
perdeste o senso"! E eu vos direi, no entanto,
que, para ouvi-las, muita vez desperto
e abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
a via láctea, como um pálio aberto,
cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora! "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las:
pois só quem ama pode ter ouvido
capaz de ouvir e de entender estrelas".

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 499)


Uma Trova de Ademar

Sem grana até pra o café,
doeu, eu sei, mas foi fato...
Eu mandei cortar um pé
pra economizar sapato...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Ao chegar no beleléu,
mostra, o bebum, seu espanto:
- Não tem boteco no céu?
E as pingas que eu dei pro santo ?!?
SÉRGIO FERREIRA DA SILVA/SP

Uma Trova Potiguar


Minha sogra além de feia,
é lúcifer em formato!
Que a aranha tecendo a teia
desvia do seu retrato.
–DJALMA MOTA/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Pra botar fogo na gente
é assim que a mulata faz:
em cima estufa pra frente,
em baixo estufa pra trás!
–JOUBERT DE ARAÚJO SILVA/RJ–

Uma Trova Premiada


2011-Belo Horizonte/MG
Tema: FOGO - M/E


Bem malandro é o Ademar,
de “fogo”, quase caindo,
entra de costa em seu lar
pra fingir que está saindo.
–OLYMPIO COUTINHO/MG–

Estrofe do Dia


Fiz de tudo nesta vida
só pra te fazer feliz;
dei-lhe tudo o quanto quis
dinheiro, casa e comida,
dei carinho e dei guarida
te deixei toda alinhada
e você de pá virada
dizendo que me detesta;
na boca de quem não presta
quem é bom não vale nada!
–HÉLIO CRISANTO/RN–

Soneto do Dia

Argumento de Defesa
–BASTOS TIGRE/PE–


Disse alguém, por maldade ou por intriga,
que eu de Vossa Excelência mal dissera:
que tinha amantes, que era "fácil", que era
da virtude doméstica, inimiga.

Maldito seja o cérebro que gera
infâmias tais que em cólera maldigo!
Se eu disse tal, que tenha por castigo
o beijo de uma sogra ou de uma fera!

Senhora! pondo a mão sobre a consciência,
minha palavra, impávida, protesta
contra essa intriga da maledicência!

Indague a amigos meus; qualquer atesta
que eu acho e sempre achei Vossa Excelência
feia demais para não ser honesta...

sexta-feira, 2 de março de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 498)

Uma Trova de Ademar

Já cansado, de voz rouca,
ao encontrá-la novamente
minha emoção não foi pouca,
Apenas... Foi diferente!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Nosso sonho deu em nada,
mas nosso amor ergue a voz,
em busca de outra alvorada
que vive dentro de nós!
–RODOLPHO ABUDD/RJ–

Uma Trova Potiguar

Sorrindo, escondo uma dor
que ela deixou em meu peito;
e o peito guarda um amor
que teima em não ser desfeito.
–TARCÍSIO FERNANDES/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Saudade – lembrança triste
de tudo que já não sou...
Passado que tanto insiste
em fingir que não passou!
–EDGAR BARCELOS/RJ–

Uma Trova Premiada


2010 - Brag. Paulista/SP
Tema: CAMINHADA - Venc.


O reencontro... a caminhada...
a lua seguindo os dois...
a chama reavivada,
e o resto... eu conto depois...
–DARLY O. BARROS/SP–

Simplesmente Poesia

Falta de Ar
–J. G. DE ARAÚJO JORGE/AC–


Há dias que posso passar sem sol, sem luz,
sem pão,
sem tudo enfim...

( Tenho até a impressão de que não preciso de nada...
... nem mesmo de mim...)

Mas há dias, amor... ( e parece mentira)
- nem eu sei explicar o porquê
de tão grande aflição -

em que não posso passar sem Você
um segundo que seja!
- de repente preciso encontrá-la, é preciso que a veja -

- Você é o ar com que respira
meu coração !

Estrofe do Dia

Fui feito sob medida
para amar e ser feliz,
mas o destino não quis
que eu fosse feliz na vida;
com minha alma enternecida
e um coração sofredor
digo com todo amargor;
ninguém amou do meu tanto...
Eu nasci para ser santo,
mas me fazem pecador!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Soneto do Dia

Via Crucis
–MARIA NASCIMENTO CARVALHO/RJ–


Foste embora e eu, sedenta de carinhos,
tentando alimentar minha ilusão,
fingia encontrar rosas nos espinhos
com que marcaste a minha solidão...

Depois, tentei seguir outros caminhos,
mas, sem achar a tua direção,
na “VIA CRUCIS” longas dos sozinhos
deixei pedaços de alma e coração...

E, nessa andança inútil, sem destino,
provei a dor cruel do desatino
e todo o dissabor dos desenganos...

Não te encontrei. Por isso, em poucos meses,
meu coração parou milhões de vezes,
minha alma envelheceu mais de cem anos...

Ademar Macedo (Mensagens Poética n. 497)

Antigo Mosteiro em Mossoró/RN

Uma Trova de Ademar

O amigo que nos quer bem
é aquele que, sem temor,
oculta uma dor que tem
e vem sanar nossa dor...
–ADEMAR MACEDO/RN–

Uma Trova Nacional


Ouço no vento o lamento
dos solitários tristonhos
que viram, da vida, o vento
amarrotar os seus sonhos!
–MARISA RODRIGUES FONTALVA/SP–

Uma Trova Potiguar


Meu cartão de identidade
está dentro de meu ser;
e, em meus olhos, a verdade
todo mundo pode ver.
–TARCÍSIO FERNANDES/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Quando na igreja, te fita,
tão meiga e linda rezando,
o próprio santo se agita
com medo de estar pecando.
–RENATO MARTONE JUNIOR/SP–

Uma Trova Premiada


2010 - Ribeirão Preto/SP
Tema: VIAGEM - 5º Lugar


Se a vida é apenas passagem
quero que me façam jus;
na minha última viagem
deixem que eu veja Jesus!
–ADEMAR MACEDO/RN–

Simplesmente Poesia

Despedida.
–THALMA TAVARES/SP–


No aceno discreto e mudo
que entre lágrimas fizeste,
teus olhos disseram tudo
do amor que nunca disseste...
Por esse amor eu desnudo
meu coração rude e agreste,
que se transforma em veludo
ante o teu olhar celeste.
Mas assim que tu partiste
a vida se fez mais triste
e o mundo um tédio medonho.
Sempre que lembro o teu pranto,
minha alma se encolhe a um canto
e chora a morte de um sonho.

Estrofe do Dia

A pior das piores sacanagens
que se pode a um poeta praticar
é roubar-lhe o direito de narrar
em seus versos, poemas e mensagens,
a beleza bucólica das paisagens
sobre a relva orvalhada e colorida,
sem ter isso o poeta não tem vida,
fica triste abalado e bem tristonho;
quer matar um poeta, mate um sonho,
que um poeta sem sonho se liquida.
–JUNIOR ADELINO/PB–

Soneto do Dia

A Solidão
–GABRIEL BICALHO/MG–


Trago comigo, neste corpo lasso,
as marcas do que fui, meu desatino.
Se tive uma mulher em cada braço,
não tive o grande amor do meu destino.

A solidão me sobe, passo a passo,
quando subo as ladeiras do Divino
e pesa mais que fardo este cansaço,
como dobres de morte em cada sino.

Ai!, quem me dera, nesta noite fria,
qual vate ilustre que também vadia,
revê-la agora como outrora a vi!

Tamborilava os dedos na agonia
de quem morre um pouquinho todo dia,
compondo os versos que não lhe escrevi!

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A. A. de Assis(Revista Virtual Trovia n. 147 - março 2012)


Inesquecíveis

De compromissos te esquivas
mas é fácil de notar,
que o prazer do qual me privas
vive escrito em teu olhar...
Analice Feitoza de Lima

Riquezas tenhas tão grandes,
e tal bondade também,
que ao redor donde tu andes
não fique pobre ninguém.
Augusto Gil

Hoje eu sei que foi loucura...
Mas ao louco que fui eu
devo o pouco de ternura
que o bom senso não me deu.
Cesídio Ambroggi

Ah se eu pudesse saber
qual a mulher que ele quer!
Que não iria eu fazer
para ser essa mulher?
Magdalena Léa

O poeta, em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
tem sempre um sopro de vida
que o leva além do horizonte...
Milton Nunes Loureiro

Saudade!... Foto em pedaços,
que eu colei, com mão tremida,
tentando compor os traços
de quem rasgou minha vida!...
Waldir Neves

A grande páscoa será aquela que marcará a passagem de um mundo
sem alma para um mundo onde haja espaço para o amor e a poesia.


Brincantes

Maria, o que foi que eu fiz
para ficares queimada?...
– Ainda pergunta, infeliz?
Há tempo não fazes nada...
Istela Marina – PR

Casamento de verdade
pouca gente ainda procura:
querem ter a propriedade
sem pagar pela escritura!
Jotão Silva – RJ

Depois de um beijo molhado,
sentiu algo diferente...
Perguntou ao namorado:
– Onde foi parar meu dente?
Mª Lúcia Godoy Pereira – MG

Afoita, entra de cabeça,
e ao se dar conta declara:
– Por incrível que pareça,
o que eu quebrei... foi a cara!!!
Mª Madalena Ferreira – RJ

Quando a feia se “embeleza”,
mas o resultado é trágico,
diz o espelho – que se preza:
– Ela pensa que sou mágico!...
Renato Alves – RJ

Da abelha o casal tem tudo:
primeiro o mel da paixão;
segunda fase – abelhudo;
terceira fase: – ferrão!...
Roza de Oliveira – PR

Líricas e filosóficas

Entre o pássaro e o poeta
há perfeita identidade:
seu canto só se completa
se há completa liberdade.
A. A. de Assis – PR

Saudade é tarde chorando
um tempo em que foi aurora,
ao ver a noite levando
o brilho do sol embora.
Adélia Vitória Ferreira – SP

Versos já fiz – não sei quantos –
relembrando a mocidade...
Hoje servem de acalantos
para ninar a saudade.
Ademar Macedo – RN

Costumo dizer que a trova
é diminuta poesia,
mas que sempre põe à prova
a nossa sabedoria.
Agostinho Rodrigues – RJ

Ah, se eu pudesse algum dia
ter asas para voar...
Quem sabe talvez iria
em tua boca pousar!
Almir Pinto de Azevedo – RJ

Quero sim, você diz não!
Assim é tudo impossível...
Não quero viver em vão,
nessa dúvida terrível.
Benedita Azevedo – RJ

O mar da vida parece
que às vezes quer me afogar,
mas Deus, que nunca me esquece,
atira a boia no mar!
Carolina Ramos – SP

Eu confesso hoje, sem medo,
que este amor em mim guardado
não é só o meu segredo,
é também o meu pecado!
Clenir Neves Ribeiro – RJ

Sou rainha afortunada,
você meu rei, meu senhor.
Doce ilusão implantada
no reino do nosso amor!
Conceição Abritta – MG

Uma página arrancada,
jogada ao léu, esquecida:
assim sou eu – quase nada –
no livro da sua vida!
Conceição de Assis – MG

Não sou ave nem sou peixe,
nunca aprendi a nadar,
mas peço a Deus que me deixe
num dia desses voar!
Diamantino Ferreira – RJ

Inútil, desagradável,
tornar alguém diferente,
para que seja ajustável
aos interesses da gente.
Djalma da Mota – RN

O nosso amor escondido,
sem promessa de aliança,
tem o sabor proibido
do fruto da vizinhança!...
Domitilla B. Beltrame – SP

“O que é o amor?”, me perguntas,
e, em coro, os anjos entoam:
“São duas pessoas juntas
que se amam e se perdoam!”
Eduardo A.O. Toledo – MG

Sol e mar... calor, beleza...
vêm mostrar à humanidade
que o homem e a natureza
têm a mesma identidade.
Eliana Jimenez – SC

O nosso beijo envolvente,
na rotina que amanhece,
é o apelo mais urgente
para que a noite se apresse!
Elisabeth S. Cruz – RJ

Ao tempo que está passando,
peço: – Vá mais devagar!
E ele segue me esnobando,
fingindo não me escutar.
Francisco Macedo – RN

A velhice que me encurva
desacelera meus passos,
torna a minha visão turva...
Apoio? Só nos teus braços.
Francisco Pessoa – CE

A saudade da saudade
varreu de mim a alegria,
levando a felicidade
que eu pensava que existia!
Gislaine Canales – SC

Quando uma lágrima cresce
e cai dos olhos de um pai,
pesa tanto que parece
ser a própria dor que cai.
Héron Patrício – SP

Olho o céu. A lua, um lume,
se desloca magistral...
Nunca vi um vaga-lume
tão soberbo e pontual.
Humberto Del Maestro – ES

Não dou conselhos na luta
que cada um realiza,
pois o tolo não escuta
e o sábio jamais precisa.
J. B. Xavier – SP

A presença do Senhor
se faz sentir plenamente
desde a beleza da flor
à humildade da semente.
Jeanette De Cnop – PR

Amor, dádiva divina,
semente humilde e perfeita;
a luz que nos ilumina
pela caminhada estreita!
João B. de Oliveira – SP

Dê vida ao seu dia a dia,
dedicando-se as labor.
Trabalho gera alegria,
quando é feito com amor!
Jorge Fregadolli – PR

Amor há no coração
que é feito brasa apagando.
Se vai virando carvão,
surge a saudade soprando...
José Fabiano – MG

Vivo em busca de carinho,
em castelos de ilusão...
Tanto tempo estou sozinho,
quem me aquece é a solidão.
José Feldman – PR

O mar, nas lutas que travo
ao dar combate à procela,
parece um cavalo bravo
e a jangada, a minha sela!
José Messias Braz – MG

De uma forma muito astuta,
a mentira nunca falha:
Hoje atinge a quem a escuta,
amanhã, a quem a espalha...
José Ouverney – SP

Meu corpo colado ao teu...
dois seres: um sentimento!
Sonho que sobreviveu
apenas em pensamento...
Luiz Antonio Cardoso – SP

Não pergunte a um trovador quantas trovas ele
já escreveu. Pergunte-lhe quantas trovas já leu.


Segue o tempo, indiferente,
pela idade, em despedida...
Passa, mas deixa presente
o doce encanto da vida!
Mara Melini Garcia – RN

Sonhar quando a gente dorme
é comum e é natural.
A diferença é enorme
é quando o sonho é real.
Maria Lúcia Fernandes – RJ

Muito pouco foi preciso
para em Deus acreditar.
No encanto do teu sorriso
eu vejo o céu se espelhar.
Mª Luíza Walendowsky – SC

Às vezes, tudo exigimos
que Deus faça a todo custo,
sem pensar que o que pedimos,
tornaria Deus injusto.
Maria Nascimento – RJ

Reticências: uma frase
que alguém pensa mas não diz...
justamente aquele "quase"
que nos faria feliz.
Mª Thereza Cavalheiro – SP

Tenho por certo, em verdade,
bem vivo, embora pungente,
que a mais pungente saudade
é aquela de alguém presente!
Maurício Friedrich – PR

Cortina lembra passado
e nela não vou mexer.
Tenho até muito cuidado:
eu a lavo sem torcer.
Messody Benoliel – RJ

Toda mentira promete
o que não pode lhe dar;
só à verdade compete
fazer justiça e mostrar.
Mifori – SP

Por estar na solidão, / tu de mim não tenhas dó. / Com trovas
no coração, / eu nunca me sinto só. – Luiz Otávio


Neste mundo em que a atitude
poderá causar um mal,
a prudência é uma virtude
de expressão universal.
Nei Garcez – PR

Sonhos são bolas infladas
pelos ares da ilusão,
que os espinhos das estradas
vão fincando pelo chão...
Nilton Manoel – SP

No rosto, um leve sorriso
disfarça a dor da saudade...
– Há vezes em que é preciso
fingir a felicidade.
Olga Agulhon – PR

Da despensa de Deus Pai,
sou mordomo e sou fiel;
só quem pensa que Ele trai
vira as costas para o céu.
Olivaldo Júnior – SP

A tristeza em minha casa
está num quarto vazio.
De dia a saudade abrasa,
à noite mata de frio.
Roberto Acruche – RJ

Contemplo o céu para vê-las
com um respeito profundo,
pois na raiz das estrelas
eu vejo o dono do mundo.
Rodolpho Abudd – RJ

Piedade infeliz tem sido...
Com santa piedade orava
pelo seu amor bandido,
que, sem piedade, matava.
Rose Mari Assumpção – PR

No refúgio desmanchamos,
quando ficamos a sós,
esses nós que carregamos
no fundo de todos nós!
Selma Patti Spinelli – SP

Um abraço grande a todos os divulgadores de trovas.
Sem eles os nossos trabalhos não seriam conhecidos.


Nada mais nos aproxima...
e, nessa ausência de afeto,
nós somos trova sem rima
e sem sentido completo!
Sérgio Ferreira da Silva – SP

Sim, eu sou paranaense,
com orgulho e "pé vermeio";
e aprendi que a vida vence
quem pra aqui com garra veio.
Sinclair Casemiro – PR

Eu penso em mãos carinhosas,
espero um beijo faceiro;
quero sussurros e rosas
e um romance por inteiro.
Therezinha Tavares – RJ

Na vida vivo tentando
tornar meu mundo risonho,
pois a tristeza vem quando
existe ausência de um sonho.
Vanda Alves – PR

Em tédio avassalador
daqueles que não têm cura,
num minuto o Trovador
transforma tudo em ventura!
Vânia Ennes – PR

Meu diário! Em tuas folhas
morrem desejos sem fim...
Pago o preço das escolhas
que outros fizeram por mim.
Wanda Mourthé – MG

Não sei como Deus sabia,
mas deu-me, quando nasci,
a família que eu queria
e os amigos que escolhi.
Wandira F. Queiroz – PR

Sabiá de peito roxo,
passarinho cantador...
Seus gorjeios sem muxoxo
são melodias de amor!
Vidal Idony Stockler – PR
Visite →
http://poesiaemtrovas.blogspot.com/
http//www.falandodetrova.com.br/

J. G. de Araujo Jorge (Uma Estrela Para Você)


É hora da gente pensar como no poema: “Um dia...”

Um dia... E para nós há sempre um dia
que tudo modifica de repente,
dando outro rumo, inesperadamente,
ao caminho que a gente percorria...

E então, a hora inesperada de alegria
se transforma em tristeza, rudemente,
ou a dor se desfaz, e a alma sente
imprevisto prazer que não sentia.

Ouço falar assim desde menino
e me deixo ficar, sempre esperando,
por esse estranho dia do destino...

E às vezes, esta espera me intimida,
porque não sei o que trará, nem quando
chegará esse dia à minha vida...


Não me lembro. Mas talvez tenha escrito este soneto num fim, ou num começo de ano, quando inexplicavelmente nos deixamos ficar com a alma em suspenso, como se alguma coisa tivesse, ou estivesse para acontecer. Fim de ano é época propícia às velhas superstições. Todos nós, mesmo os mais céticos, os mais materialistas, percebemos que nosso pretensioso racionalismo se turva, que resíduos místicos vêm à tona agitados sabe-se lá por que misteriosos elementos.

Afinal, a Terra completou mais uma volta em torno do Sol, tal qual fazia nos tempos dos faraós egípcios, e dos “patesis” sumérios. O que não impediu que muitos povos, através da história, comemorem o ano solar de formas diversas, como os gregos, os russos, os mulçumanos, os judeus. Mas todos nós, povos cristãos, o festejamos da mesma maneira e na mesma ocasião, desde a reforma gregoriana.

E então, a 31 de dezembro, à meia-noite, atordoados pelo rumor da alegria nos salões e nas ruas, por entre contos fetichistas e marchinhas carnavalescas, ressurgem em nós crenças e temores que julgávamos desaparecidos. Já não discutimos a força dos signos, nem as previsões dos horóscopos.

De súbito, acreditamos no Destino e na Felicidade, que ganham a força de entidades, de uma efêmera religião que nasce e morre ao espocar das garrafas de champanha, ou enquanto se derretem as velas de cera dos rituais pagãos a Iemanjá, à beira do mar.

Há um transe coletivo, em que todos se engolfam, nas festas de passagem de ano.

Vagamente se acredita que alguma coisa está terminando, e que algo de novo se inicia, e com esse algo de novo, novas oportunidades, novas possibilidades diante da vida. Você já experimentou se analisar naquelas horas, naqueles momentos, em que se comemora o Ano Novo?

Subitamente o Destino está presente, como um deus. É o Deus-Destino ao qual festejamos, diante de quem comparecemos, como as almas dos mortos egípcios, no tribunal de Osíris. E se não nos confessamos, e se não estamos em penitência pelos nossos erros e pecados, esperamos que ele nos absolva de tudo, e que nos dê aquela felicidade que ainda não conseguimos conquistar.

Exaltei-o nas quadrinhas:

Deus poderoso, maneja
nosso mundo pequenino...
Quem, por mais forte que seja,
tem mais força que o Destino?

Que somos nós? Indefesos
pobres bonecos, sem pés...
O Destino nos tem presos
aos seus estranhos cordéis...


E isto porque, todos nós, a cada nova manhã

Saímos, pelos caminhos
quais D. Quixotes, bisonhos,
lutando contra os moinhos
de vento, dos nossos sonhos!


A verdade é que, ao fim de cada ano, a cada ano novo, não podemos fugir às sugestões que a oportunidade suscita. Há um fato astronômico ? trezentos e sessenta e cinco dias, cinco horas, quarenta e nove minutos e doze segundos ? o tempo necessário para o nosso velho planeta completar a sua volta em torno do Sol, mas criamos com isso todo um mundo complexo de implicações emotivas e imaginosas, e então, sentimos, como se realmente nós também começássemos uma “volta” nova em nossas vidas. Mas, em torno de quê?

O fato é que realimentamos o coração de desejos. Que poderoso manancial de sonhos e esperanças há nesta simples expressão: Ano Novo! E todos nós nos desejamos, ardentemente, com estranha convicção: um feliz Ano Novo! Levantamos no tempo (o que é o tempo?) uma barreira quase material: o que passou, passou! Sim, há um ano novo, e poderá haver também uma vida nova. Estamos, na realidade, desejando: Feliz Vida Nova para Você!

E nessa hora de festa, é como se todos se sentissem obrigados a ser felizes. Como se temessem a tristeza como uma doença, ou como se receassem aparecer diante dos seus deuses com as máscaras de suas dores e de seus desenganos. As claridades que estão no céu não são apenas as de um novo dia, mas as de uma felicidade entressonhada, nunca tarde demais para chegar.

Estranho. Nessas ocasiões me acovardo. As festas coletivas me intimidam. Receio não ter forças nem condições para sintonizar com as grandes felicidades.

Naquele exato momento, entre o ano que finda e o que nasce, quando uma onda de alegria contagia a todos, quase que indistintamente, fico à margem, numa invisível praia solitária, como um náufrago. À toa, sem saber que fazer da vida. Uma das horas mais pungentes para mim, inexplicavelmente, é sempre aquela em que os ponteiros se casam na meia-noite do dia 31 de dezembro de cada ano. Enquanto sobem foguetes, espocam garrafas de champanha, tinem taças, ouvem-se cantos, bocas se beijam, abraços se estreitam, não consigo evitar meu invencível e súbito estado de levitação interior, entre atordoado a atônito.

Tal como no carnaval, ou no Natal, o último dia do ano me apanha sempre desprevenido. O encontro com essa felicidade barulhenta, exibicionista, que estoura como um petardo, me paralisa. Caio em mim, e sinto-me de repente, fundo, distante de todos, incapaz de segui-los, de entrar em seus “ranchos” e “blocos”. Como já escrevi, certa vez: Me sinto cada vez mais no “bloco do eu sozinho”. Desculpem-me esta cinza com que escrevo. Alguma coisa ainda se queima, e o vento trouxe. Resta o consolo de que alguma coisa ainda há para queimar, para arder. Podia ser pior.

Francamente, sou um homem incapaz de “entrar no Ano Novo”. Não sei que gostaria de fazer, quem gostaria de encontrar. Talvez porque não consiga mesmo distinguir essa “última noite” do ano de todas as outras noites. Não gosto das datas vermelhas dos calendários. Gosto dos feriados que a vida, avaramente, cada vez mais avaramente, decreta para mim. Meu Ano Novo começa qualquer dia e qualquer hora.

Me lembro, por exemplo, de que esse último dia do ano, enquanto a festa atordoante se diluía na noite, e pulsava em todos os segundo, eu me sentia um homem banal, perdido, sem contatos com a Terra. Receio muito que esteja me tornando, cada vez mais, um homem difícil, nesses tempos difíceis.

Mas, de coração, desejo felicidades para todos vocês.

Afinal o Ano Novo é um estado de espírito. Que o tenham, festejando como um Natal - algo novo que nasce, que brilha como uma estrela.

Sim, desejo a todos vocês uma estrela brilhante, neste Ano Novo que se inicia!

Fonte:
JG de Araujo Jorge. "No Mundo da Poesia " Edição do Autor -1969