quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Bernardo Guimarães (Poemas Humorísticos e Irônicos : Dilúvio de Papel) Parte 2, final

Sonho de um jornalista poeta

VII

Calou-se a musa, e envolvida
Em tênue vapor de rosa,
Qual sombra misteriosa
Nos ares se esvaeceu;
E de aromas divinais
Todo o éter recendeu.

Qual zunido do látego vibrado
Por mãos de algoz cruento,
Nos ouvidos troou-me aquele acento,
E me deixou de horror petrificado.
Já ia arrependido aos pés prostrar-me
Da irritada, frenética deidade,
Cantar-lhe a palinódia, e em triste carme
Pedir-lhe piedade!...
Em vão eu lhe bradava: “Musa, ó musa!
Não me castigues, não; atende, escusa
A minha estranha audácia;
Um momento isso foi de irreflexão,
Em que não teve parte o coração,
E não serei mais réu por contumácia.”

Mal dou um passo, eis no mesmo instante
Encontro por diante
Jornal imenso de formato largo,
Aos meus primeiros passos pondo embargo.
Vou desviá-lo, e em sua retaguarda
Encontro um Suplemento;
Porém, pondo-me em guarda
Para a direita opero um movimento,
E encontro frente a frente o Mercantil.
Para evitá-lo esgueiro-me sutil,
Buscando flanqueá-lo, e vejo ao lado
O Diário do Rio de Janeiro
Que todo desdobrado
Ante mim se apresenta sobranceiro;
Com brusco movimento impaciente
Me volto de repente
E quase que me achei todo embrulhado
No Diário do Rio Oficial.
Então compreendi toda a extensão
E força do meu mal,
E o sentido satânico e fatal
Que encerrava da musa a maldição.
Eis-me pelos jornais de todo o lado
Em assédio formal engaiolado!
Assédio, que depois foi um Vesúvio,
Que arrojou das entranhas um dilúvio.

Porém o sangue-frio inda não perco,
Co’a ponta da bengala
Romper procuro o cerco
Que obstinado em torno se me instala.
Sobre o inimigo intrépido me atiro;
Brandindo uma estocada
Varo o Jornal, e mortalmente o firo;
E de uma cutilada
Denodado rasguei de meio a meio
O Mercantil e o Oficial Correio;
Co’as botas ao Diário faço guerra,
E debaixo dos pés o calco em terra.
Mas ai de mim! em batalhões espessos,
Ao longe como ao perto,
Resistindo a meus rudes arremessos
O inimigo rebenta em campo aberto.
Debalde lhes desfecho denodado
Mil golpes repetidos;
Debalde vou deixando o chão coalhado
De mortos e feridos.
E quanto mais o meu furor se assanha,
Mais a coorte cresce e se arrebanha!

Bem como nuvem densa,
Eu vejo chusma imensa
De folhas de papel, que o espaço coalham,
Que lépidas farfalham,
Que trêmulas chocalham,
Nos ares se tresmalham,
E sobre a fronte passam-me, e repassam,
E em contínuo vórtice esvoaçam.
Aturdido procuro abrir caminho,
Demandando o pacífico aposento,
Onde refúgio encontre a tão mesquinho
E mísero tormento.
E espreitando a custo pelos claros,
Que entre as nuvens da espessa papelada,
Já me luziam raros,
Procuro orientar-me pela estrada,
Que me conduza à casa suspirada.

E através das ondas, que recrescem
A cada instante, e os ares escurecem,
De Mercantis, Correios e Jornais,
De Ecos do Sul, do Norte, de Revistas,
De Diários, de Constitucionais,
De Coalições, de Ligas Progressistas,
De Opiniões, Imprensas, Nacionais,
De Novelistas, Crenças, Monarquistas,
De mil Estrelas, Íris, Liberdades,
De mil Situações, e Atualidades;
Através de Gazetas de mil cores,
De Correios de todos os países,
De Crônicas de todos os valores,
De Opiniões de todos os matizes,
De Ordens, Épocas, Nautas, Liberais,
Do Espectador da América do Sul,
De Estrelas do Norte, e outros que tais,
Que me encobrem de todo o céu azul,
A custo rompo, e chego esbaforido
Ao sossegado albergue, e precavido
A porta logo tranco,
E de um só arranco
Com as escadas íngremes invisto.
Mas! oh! desgraça! oh! caso não previsto!
As folhas entre as pernas se embaralham,
E todo me atrapalham,
E quase de uma queda me escangalham.
Mas salvei-me sem risco, e subo ao quarto
Do meu repouso, e onde me descarto
De tudo que me zanga e me atrapalha.
Cansado já do excesso
De golpe me arremesso
Sobre o colchão de fresca e fofa palha;
Mas apenas encosto na almofada
A fronte afadigada,
Eis começa de novo o atroz vexame;
Como importunas vespas,
De folhas me acomete novo enxame,
Zumbindo pelo ar co’as asas crespas,
Agravando à porfia o meu martírio
A ponto de me pôr quase em delírio.

Já das gavetas
E dos armários
Surgem gazetas,
Surgem diários;

Uns do tablado
Lá vêm subindo,
Ou do telhado
Descem rugindo;

Dentro da rede
Sobre o dossel,
Pela parede
Tudo é papel.

Folhas aos centos
Pare a canastra,
E o pavimento
Delas se alastra.

Té as cadeiras
E os castiçais,
E escarradeiras
Parem jornais.

Saem do centro
Dos meus lençóis,
E até de dentro
Dos ourióis

Já me sentia quase sufocado
Do turbilhão no meio,
E já tendo receio
De ficar ali mesmo sepultado,
Para sair de trance tão amargo
Resolvi-me a de novo pôr-me ao largo,
Salto da cama, rodo pela escada
E procuro safar-me da rascada,
Já não andando,
Porém nadando
Ou mergulhando
Co’esse quinto elemento em guerra crua.
Cheguei enfim à rua
Que de papel achei toda inundada!
E bracejando
Espernegando
Entrei em luta acerba
Contra a enchente fatal, que me assoberba,
Até que a muito custo surjo à tona
Do horrendo turbilhão
Que túrbido se entona
E no mundo se arroja de rondão.
Às vagas meto o ombro,
Até achar dos céus a claridade.
Oh! céus! que cena horrível! oh! que assombro!
Em todo o seu horror e majestade
A mais triste catástrofe contemplo,
De que jamais no mundo houvera exemplo.
Fiquei transido de terror mortal,
Pois vi que era um dilúvio universal.

Das bandas do Oriente
Avistei densas nuvens conglobadas,
Que sobre o americano continente
Arrojavam camadas e camadas
De fofas papeladas.

E lá vinha de Times nuvem densa
Com um sussuro horrendo
No ar as pandas asas estendendo,
Derramando nos mares sombra imensa.
E após vinha em vastíssima coorte
O Pais, a Imprensa, o Globo, o Mundo,
O Este, e o Oeste, o Sul, e o Norte,
Esvoaçando sobre o mar profundo,
Jornais de toda a língua, e toda sorte,
Que no hemisfério nosso vêm dar fundo,
Gazetas alemãs com tipos góticos,
E mil outras com títulos exóticos.

Outras nuvens, também do sul, do norte,
Mas não tão carregadas, se encaminham,
E lentas se avizinham
Com horroroso frêmito de morte.
Da tormenta fatal recresce o horror!
Até do interior
Como um bando de leves borboletas
Lá vêm surgindo lépidas gazetas,
À desastrosa enchente
Fornecer seu pequeno contingente.
Julguei que sem remédio este era o dia
Da ira do Senhor; — pois parecia,
Que se abriam do céu as cataratas
E os abismos da terra, vomitando
Em borbotões, em túrbidas cascatas,
De hedionda praga o inextinguível bando.

Enquanto esbaforido luto, e ofego
Contra as ondas, que sempre recresciam,
Já sobre o farfalhante, imenso pego
As casas abafadas se sumiam.
Em torno a vista estendo,
E vejo então, que esse dilúvio horrendo
Já tendo submergido as baixas terras
Ameaçava os píncaros das serras.
E nem diviso barca de Noé
Que me conduza aos cimos de Arará!
O mal é sem remédio!... já perdida
Toda esperança está!...

Mas não!... eis voga além batel ligeiro,
Os fofos escarcéus assoberbando;
Impávida e com rosto sobranceiro
Uma ninfa gentil o vai guiando,
De angélica beleza;
E vi então... que pasmo! que surpresa!
Que a dona, dêsse nunca visto lago
Sem mais nem menos era
A ninfa linda e fera
Que ainda há pouco em um momento aziago
Aos sons de uma canção
Fulminou-me tremenda maldição.
Era-lhe barco a concha mosqueada
De tartaruga enorme,
Com engenhoso esmero trabalhada
De lavor preciosa e multiforme.
Com remo de marfim, mimoso pulso
Ao leve barco dá fácil impulso.
E enquanto fende as chocalheiras ondas
Desse pego, que em torno se lhe empola,
Vai cantando em estrofes mui redondas
Esta estranha e tremenda barcarola:


VIII

Já tudo se vai sumindo!...
Já desparecem as terras;
Pelos outeiros e serras
Sobem ondas a garnel...
E neste geral desastre
Somente a minha piroga
Ligeira sem risco voga
Sobre as ondas de papel!
Sobre estes estranhos mares,
Voga, voga, meu batel!...

Para a triste humanidade
Não resta mais esperança;
O dilúvio cresce, e avança,
Leva tudo de tropel!...
Já imensa papelada
As terras e os mares coalha;
Já o globo se amortalha
Em camadas de papel.
Mas sobre elas resvalando
Vai vogando o meu batel.

Pobre idade, testemunha
Desta pavorosa cheia
Que dos tempos na cadeia
Vê quebrar-se o extremo anel!...
Oh! século dezenove,
Ó tu, que tanto reluzes,
És o século das luzes,
Ou século de papel?!...
Sobre estas estranhas ondas,
Voga, voga, meu batel!...

Debaixo de teu sudário
Dorme, ó triste humanidade!
Que eu chorarei de piedade
Sobre teu fado cruel!
E ao futuro irei dizendo
Sentada na tua lousa:
— Todo o mundo aqui repousa
Sob um montão de papel! —
Meu batel, eia! ligeiro,
Voga, voga, meu batel!


IX

Calou-se, e a um golpe do ebúrneo remo
Impele a concha, que veloz desliza;
Eu nesse trance extremo,
Como quem outra esperança não divisa,
Meu afrontoso fim tão perto vendo,
A musa os braços súplices estendo.

“Perdão! perdão! bradei —; musa divina,
Recebe-me a teu bordo; — é o teu vate,
A quem sempre tu foste o único norte,
Que entre estas fofas ondas se debate
Entre as vascas da morte.”

Mas de minha fervente rogativa
Não fez caso nenhum a ninfa esquiva;
Sem ao menos a mim volver o rosto
As secas ondas corta;
Continuando a remar muito a seu gosto
Comigo nem se importa.
E ei-la que continua a cantarola
De sua endiabrada barcarola:

“Meus altares abjuraste,
Agora sofre o castigo,
Que eu não posso dar abrigo
A quem me foi infiel.
Morre em paz, infeliz bardo,
E sem maldizer teu fado
Fica p’ra sempre embrulhado
Nesse montão de papel!...”
Eia, rompe as secas ondas,
Voga, voga, meu batel!...


X

Fiquei aniquilado!...
Horror! horror! há nada mais cruel,
Do que morrer a gente sufocado
Debaixo de uma nuvem de papel?!
Mas eis que de repente
A mais atroz lembrança
O desespero me sugere à mente,
Que exulta em seus desejos de vingança.
Veio-me à idéia de Sansão o exemplo,
Com seus robustos braços abalando
As colunas do templo,
E sob suas ruínas esmagando
A si e aos inimigos
Para evitar seus pérfidos castigos.
“Pois bem!... já que esperança alguma temos,
O mundo, e eu com ele, acabaremos,
Mas não por esta sorte;
Morrerei; mas também tu morrerás,
Ó ninfa desalmada,
Porém um outro gênero de morte
Comigo sofrerás:
A mim e a ti verás,
E a toda tua infanda papelada
Reduzidos a pó, a cinza, a nada!”

Enquanto isto eu dizia, da algibeira
Uma caixa de fósforos tirava,
Que por felicidade então trazia;
E já chama ligeira
Aqui e além lançava
Com o pequeno archote que acendia;
Eis já o voraz fogo se propaga,
Como em madura, tórrida macega,
E co’as rúbidas línguas lambe e traga
A seca papelada que fumega.
Como Hércules em cima da fogueira
Por suas próprias mãos alevantada,
Eu com serena face prazenteira
Vejo lavrar a chama abençoada.
Espesso fumo em túrbidos novelos
Os ares escurece.
E a rubra labareda, que recresce,
Já me devora as vestes e os cabelos.
Em tão cruel tortura
Horrenda me aparece
Da morte a catadura,
E a coragem de todo me falece.
“Perdão! perdão! ó musa! ai!... a teu bordo...
O fumo me sufoca... eu morro...” acordo!...

XI

Ainda bem, que esse quadro tão medonho
Não foi mais do que um sonho.

Vocabulário de termos e expressões regionais e populares do Centro Oeste (Mato Grosso e Goiás) Q, R, S e T

Q

QUEIJEIRO (depreciativo), — Roceiro, matuto.

QUEIXADA:— Porco-do-mato: é o javali brasileiro. Anda em varas e estala os dentes em grande alarido. Não gosta do cheiro de urina.

QUÊNQUÊM — Formiga carregadeira, de porte menor que a saúva; não é cabeçuda.

QUENTAR — Esquentar; aquecer. Quentando sol; quentar fogo; quentar o de comer.

QUICÉ — Faca vagabunda, gasta, sem ponta.

QUITANDA — Doce seco, rosca, biscoito, bolo de qualquer farinha ou fécula.

QUIZILA — Antipatia.

R


RABINHA (pop.) — Caçarola de ferro estanhado.

RABO-DE-ÉGUA — Garrucha de carregar pela boca.

RABO-DE-TATU — Taca; relho.

RAPARIGA — Prostituta.

REINAR — Pensar. Eu já reinava que isto acontecia.

REJUME (corrup.) — Regime; hábito; costume.

REVIRÃO — Pala do vestido.

RIBA (pop.) — Lugar mais alto; em riba, para riba: em cima, para cima.

RIDICAR — Sovinar.

RINGIR — Ranger.

ROQUEIRA — Pedaço de cano enfiado numa vigota de madeira e com ouvido para escorva. Nas festas usa-se enfileirar centenas delas. Um vem com uma capanga de pólvora e vai pondo um tanto que serve em cada cano; um outro com um embornal de farinha de mandioca, daquela redonda, de grão, enche o restante do cano; um terceiro vem fazendo o rastilho de pólvora. Há uma foice na fogueira, avermelhando: chega-se a foice no rastilho e está feito o inferno.

ROXA — Morena.

RUA — Cidade. Moro na rua. Vou "na" rua.

S

SAPICUÁ — Embornal.

SAPIROCA — Tersol.

SAPITUCA — Fanico; ataque, crise histérica.

SARAPANTAR — Aterrorizar; assustar; amedrontar; espantar.

SARCEIRO — Barulho, reboliço.

SECA — "Sem seca", sem cerimônia. Indivíduo sem seca: afável, acessível.

SESTRO — Costume, vício.

SIRIRI — Mariposa de cupim.

SOCA — Sobra de fósforo aceso: "Dê-me a soca…"

SOPITADO — Abafado, agoniado, oprimido do peito.

SOPITAR — Sentir aflição, opressão interna.

SORTIMENTO — Em caçada, sortimento significa munição.

SUADOR — Pequeno’ acolchoado que fica entre o baixeiro e o arreio do animal.

SUÇUARANA — Onça parda.

SUFRAGANTE (corrupt.) — de flagrante) — "No sufragante" em flagrante.

SUNGAR — Levantar; erguer. Palavra muito empregada. Usa–se mais dizer: "erguer". "Levantar" não é tão usada como no interior paulista.

SURIAR — O mesmo que arear; arrasamento de um poço pela areia conduzida pela enchente: "O poço em que pescávamos suriou…"

T

TACA — Surra, pancada.

TAIPA — Muro ou parede de terra socada entre tábuas.

TAMBORETE — Assento tradicional no sertão, de três ou quatro pernas, com forro de couro cru.

TANAJURA — Saúva fêmea provida de asas.

TEIRÓ — Antipatia.

TENDA — Pequena oficina de ferreiro.

TIMBA — Prenhez; ventre crescido.

TIMBÓ — Cipó cuja infusão, aplicada no pêlo dos animais, extermina os parasites. Batido na água do rio intoxica os peixes, aturdindo-os.

TINHOSO — Diabo, capeta.

TIU — Cão.

TIÚ — Lagarto "teiú".

TOADA — Marcha regular do animal.

TORUMBAMBA — Barulho, briga com pancadaria; confusão.

TOUÁ — Tabatinga, argila clara e liguenta.

TRABALHAR — Palavra de cangaço, que significa matar ou sacrificar alguém.

TRAIA — Total de utensílios para um determinado serviço: traia de pescaria: linhas, anzóis, tarrafa, rede etc. (tralha)

TRAIÇÃO — Combinação secreta entre roceiros para, juntos, prestarem serviço de derrubada, capina etc, a um outro roceiro. Chegam de improviso: é a "traição".

TREM — Coisa; qualquer objeto concreto ou abstrato. Este termo é largamente empregado em Goiás. "Estou com vontade de comer um trem".

Fonte: Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Desenhos de J. Lanzelotti. Ed. Literat. 1962

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Clevane Pessoa (Parábola em Versos: A Flor Dourada e o Pássaro Verde)

Passava um pássaro verdíssimo por um vergel variado ,
quando viu lá em baixo, o glitter de uma flor aberta,
cor de ouro fosco, calma , a aromatizar seu entorno.
Chamou-a. Perguntou-lhe mil perguntas e ela as respondeu.
Ela indagou daqueles voos, a ela desconhecidos e ele falou
de tudo que o preocupava, de seus sonhos, desejos , im/possibilidades.

De longe, dialogavam , ela fremia, a escutar encantada,
a tatalar asas de ternuras, carente e cansado de voar sozinho.
Flor, abriu pétalas e recebeu eflúvios, dialogaram solidões
e ensaiaram alegrias, a esperança derramou todos os tons
de seus verdes mais belos, nas penas dele, nas sépalas e folhas dela.
Por um tempinho, acreditaram ser possível semear felicidade perene,
nem sequer pensaram que tudo não passava de um sentimento fugaz,
de cristal puríssimo, embora, mas que poderia quebrar-se ...

Ouviu o canto da ave que prometia em breve, achegar-se
para melhor sentir-lhe aroma e formas, e desejou-lhe felicidades
na jornada ensaiada e que ele esperava cumprir.

As luas passavam, ciclicamente , pela flor saudosa,
seu tempo se encurtava , mas ela olhava para o alto
crendo que o pássaro verde retornaria para os ósculos sonhados.

Até que um dia, insone, numa noite linda e fresca,
relembrava as promessas trocadas , enganosas sem ser falsas.
Quando ouviu chamá-la a velha coruja guardiã dos corações feridos
que lhe disse:-“ Valeu, enquanto durou , enquanto acredistaste...
Valeu porque tuas palavras foram bálsamo e o curaram...
Agora, sê forte e ouve, acabo de saber por uma viajante mariposa ,
que teu amado platônico , viaja agora com uma bela pássara
- e buscam o melhor espaço ,para fazer seu ninho...”

A doce flor estremeceu , magoada e triste, mas não surpresa:
“Eu já sabia “, murmurou à coruja sábia , que girando a cabeça para melhor
olhá-la, retorquiu:-“Não, florzinha, não sabias, apenas adivinhavas
que o amor precisa de zelo e de presença, que até pode sobreviver
à distância, mas quando já está argamassado num espaço de tempo
ideal para ser forte e perene, quando houve um cotidiano a imprimir
rememórias e saudade de cousas vividas , experenciadas com o néctar
da boa convivência. Acorda, vê outras plantas a teu redor, acorda para o real.”

A flor dourada entendeu a mensagem, mas a dor rasgou-a de angústia
e ela desprendeu-se das sépalas, caiu ao solo, e preparou-se para fertilizar
a terra daquele jardim tão grande, e renascer um dia, sem nenhum pesar...

Fonte:
A Autora

Aparecido Raimundo de Souza (O “Pingado”)

TODO SANTO DIA EU SAIA DO serviço às 06h30min em ponto e dava uma paradinha na padaria para comprar pão. E sempre escutava a garçonete que rodava no salão, por entre as mesas, gritar, espavorida, para os rapazes que ficavam atendendo aos seus pedidos por detrás de um balcão imenso:

-... “Solta um pingado... Mesa cinco...”.

Não passava um minuto e ela voltava à carga:

-... “Um pingado para a mesa oito. Outro para a doze...”.

Aquilo me intrigava. O que deveria ser o tal do “pingado?”.

Como meu tempo era demasiadamente curto, os minutos contados, passava a mão no embrulho, pagava meio que correndo e voava para o ponto. Se perdesse o ônibus das 06h40min, só dali uma hora encostaria outro. Para quem passou a noite toda acordada, e, pior, de pé, andando para lá e para cá, dentro de um galpão imenso, cuidando de um bando de rapazes sobre sua responsabilidade, quando dava o final do expediente, só via pela frente o caminho da roça. Bater cartão, tirar a farda do trabalho, correr para o ponto e embarcar no 06h40min.

Quanto mais rápido no sossego do lar, mais tempo para relaxar. Antes, vinha o ritual de um banho refrescante e bem demorado para espantar a inhaca, e, em seguida, o desjejum com café feito na hora, misturado ao leite, acompanhado de pão, queijo, biscoitos de polvilho e, um variado de guloseimas extras que minha esposa gostava de preparar. Barriguinha cheia e satisfeita, a cama quentinha e solícita, abria os lençóis em braços chamativos e convidada a me aninhar no macio do colchão e esquecer, por completo, do mundo que corria, lá fora, além da cortina que enevoava, sobremaneira, o aposento, tornando-o aconchegante ao meu enfastio da noite passada em claro.

Lurdinha, minha esposa, reclamava, e, com certa razão, uma atençãozinha especial. Queria uns carinhos, um trato, um abraço. Um beijo, algo acolá do café que enfiava goela abaixo, com um acometimento fora do normal. Confesso, nesse ponto da atenção a ela, deixava a ver navios. Chegava esfalfado, estourado, enervado, aporrinhado, com dor de cabeça. Não via a hora de cair no escurinho e apagar, sair do ar. Tinha plena consciência de que se não chegasse junto, de vez em quando, se não cumprisse com as obrigações maritais, o casamento, cedo ou tarde, iria pras cucuias. Mas, por Deus, o serviço, o cansaço, a estafa, a condução com gente saindo pelo ladrão... Raramente aparecia um lugar vago e a disposição, para ajudar a digerir a hora e meia de todo o trajeto. Isso virara rotina. Minha vida se transformara num padrão estressante de comportamento, onde, o ano inteiro, repetia igual procedimento, sem fugir daquele modelo, arquétipo, como se fosse uma norma de estilo de vida escolhido a dedo, por vontade própria. Nada mudava nada acontecia de novo. Quadro imutável de uma vida em constante processo de decadência. 06h30min, pois, cravado, correr para bater o cartão, disparar para o vestiário, trocar de roupas num abrir e fechar de olhos, padaria, e a lotação às 06h40min. Na confeitaria, a garçonete, e a sua aparência imutável, o mesmo semblante, o corpo esguio metido num uniforme batido e surrado e o chavão desmilinguido: “-... Solta um pingado pra dez. Outro pra dezoito, um especial para o senhor sentado no banquinho do balcão...”.

A minha curiosidade crescia, junto com a afobação e com o atropelo de chegar logo e dormir. Sonhava com o tal do “pingado”... Jesus, Maria, José, o que seria o desconhecido “pingado”, tão disputado, tão desejado, tão amado por todos que frequentavam aquele estabelecimento? Pingado, pingado, pingado e o tempo se descorando, se desfalecendo entre o protocolo da padaria e o culto como uma idolatria ao busão das 06h40min...

-... “Amor, vamos namorar? Você não comparece tem mais de mês!...”.

-... “Lurdinha, deixa pra amanhã...”.

O amanhã chegava e eu não comparecia. Não me manifestava. Não dava no couro. Lurdinha, então, em ato extremo, subindo pelas paredes, me agarrava, me catava, como se diz, grosso modo, “à força, no laço, no tapa, no é agora ou nunca”.

-... “De hoje você não me escapa, seu safadinho malandro. Devo lembrar a você, meu marido e esposo, que estou chamando urubu de meu louro...”.

E Lurdinha se enrodilhava me beijava, me acarinhava louca, tesa, cheia de amor para dar, envolvida numa empolgação desvairada e fora de si.  De costas, de lado, de frente, de banda, como fogo morro acima, água ribanceira abaixo, ela partia pro ataque. O cansaço nesses instantes, não dava trégua, seguia junto. De braços dados, marcando presença, entranhado, duro na queda, sem dar espaço... E, de contrapeso, as recordações do cartão de ponto, a padaria, o coletivo às 06h40min atrelado ao maldito pingado. Oxalá! O que seria, afinal, esse pingado? 
                                     ***
Belo dia... Bela manhã me deu na telha, assim, de supetão, e resolvi quebrar a virgindade desse tabu que me corroía as entranhas. Às favas o coletivo das 06h40min. Não suportava mais o pingado me pingando na mente como uma torneira mal fechada. Como a chuva no telhado gotejando como um látego martirizante no meu consciente submisso. Não tinha mais saco, mais cabeça, mais paciência para sentir esse desconforto gotejando, destilando, marejando, vertendo, me corroendo o corpo, a mente, o espírito, os pensamentos, minha vida, enfim...

... “Hoje desvendo o mistério. Que se dane o resto, que se afumente o 06:40min. Embarco no próximo...”.

Resoluto, senhor de mim, cheguei pra a moça, pedi os pães... Enquanto ela ensacava, gritei para a garçonete de todas as manhãs iguais.

-... “- Me veja um pingado, por favor!...”.

-... “- Vai sentar?”.

-... “Num dos assentos do balcão”.

Aos bravios a jovem mandou a ordem:

-... “Um pingado no balcão”.

Em seguida, indagou solícita:

- “Algo para comer, senhor?”.

-... “Não, obrigado, minha fofa. Só o pingado”.

Ao me acomodar, finalmente, no balcão, me deparei com o tal do pingado. Nada além de um café com leite, servido numa xícara de porte médio, igual a que eu tomava todas as santas manhãs, no conforto da mesa, ladeado de Lurdinha, minha adorada e querida esposa.

Fonte:
O Autor

Ciranda da Primavera (Seleção por Simone Borba Pinheiro) Parte 4

GRAZI HENRIQUES VENTURA
 Não espere o amanhã!


 Canta,
 Canta, e esquece a mágoa.
 E traz alegria a este seu penar.

 Chora,
 Chora que deságua,
 Toda esta tristeza deste seu olhar.

 Viva,
 Que a vida é bela
 Saia da janela
 Venha passear.

 Vai,
 Encontra um amigo,
 Sê feliz consigo,
 Só vai aliviar.

 Vem,
 Que hoje é primavera,
 Vem e não espera.
 Pois o outono,
 Logo, logo vai chegar.

HERMES JOSÉ NOVAKOSKI
Primavera


 Harmonia de cores magníficas
 Enfeitando o jardim
 Semeando paz e amor
 Que há dentro de mim.

 A primavera convida
 À vida celebrar
 Montrando que é possível
 Sempre recomeçar

 Que as flores e o perfume
 Da Primavera possam estar
 Todos os dias de nossas vidas
 Para seu sentido renovar

HUMBERTO - POETA
Primavera!


 É chegada a primavera,
 das manhãs de céu azul!
 Quanta claridade impera
 no Brasil, de norte a sul!

 Surge o sol sobre o horizonte
 e em revérberos reluz,
 banhando de ouro o monte,
 vestindo a manhã de luz!

 Como é lindo ver na roça
 os loiros e amplos trigais!
 Toda a vida se alvoroça
 na cantiga dos pardais!

 As abelhas saem em bando
 pelas manhãs brasileiras,
 o loiro mel retirando
 das flores das laranjeiras!

 O verde cobre as colinas
 e a mata se enche de cores;
 vemos frutos nas campinas,
 e os prados cheios de flores!

 E ao sol, senhor dos espaços,
 que estupendas sinfonias
 cantam sabiás e sanhaços,
 bem-te-vis e cotovias!

 Riachos correm, vadios,
 por sob o arco das pontes;
 gargalham cascatas, rios,
 e cantam todas as fontes!

 É a estação dos sons, dos ecos,
 das mais estranhas fanfarras:
 põem-se a grasnar os marrecos,
 e a zumbir põem-se as cigarras!

 Entre as flores não há mídia,
 pois todas têm belos dotes;
 é tão graciosa uma orquídea,
 quanto é formoso o miosótis!

 Primavera é riso e flores,
 é festa em tudo que existe
 transformando em riso as dores
 da alma de quem é triste!

 Nenhuma outra supera
 o esplendor desta estação;
 vai-se o inverno, e a primavera
 veste os campos de algodão!

 Juntinhas, no mesmo atalho,
 por entre o mato e as urtigas,
 vão contentes ao trabalho
 os batalhões das formigas!

 À noite o jasmim recende
 seus exóticos perfumes...
 e a mata em festa se acende
 no piscar dos vaga-lumes!

 Molhado em gotas de orvalho,
 o pomar tem outras cores:
 há cem botões num só galho,
 e em cada ramo há cem flores!

 Flores, que em certo momento,
 o céu julgou nunca tê-las,
 mas Deus fez do firmamento
 um jardim cheio de estrelas!

 Oh, Deus, de amor tão profundo,
 eis nossa prece sincera:
 que as nações façam do mundo
 uma eterna primavera!

IZA MOTA
Primavera


 São como as flores
 diferentes formas e cores
 cheia de magia e odores
 as expressões dos amores

 Uns suaves, delicados
 uns ásperos e espinhados
 uns na forma bem definidos
 outros volúveis, são coloridos

 Depois do período de inverno
 chega de mansinho sutil e terno
 trazendo à magia do sentimento
 toda beleza e encantamento

 É a primavera das emoções
 que traz pra nossa vida paixões
 nos tirando às vezes à razão
 excitando e acelerando o coração.

JOSÉ ERNESTO FERRARESSO
Chegou para Mudar


 Olho pela janela, sinto a natureza mudar,
 Deparo com uma paisagem diferente,
 Diferente no ar.
 Estranha no tempo.
 vejo o florir dos jardins,
 Que antes estavam secos e rasteiros,
 Plantinhas crescem mostrando vida,
 Uma vida de amor, uma vida de poesia,
 Onde os poetas procuram suas inspirações,
 Onde pessoas começam a imaginar,
 A pensar, divagar.
 Entre essa beleza colorida,
 Onde as cores se misturam,
 se transformam,
 Onde as maravilhas nos demonstram:
 Uma Beleza, Um amor,
 Um lugar para amar.
 E Ela que chega,
 A nossa Primavera ,
 De mansinho e devagar,`
 Para nos deslumbrar.
Serra Negra

Fonte:
Seleção por Simone Borba Pinheiro. in http://www.familiaborbapinheiro.com

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 3, continuação – O passarinho-ninho

Gostei muito da sua última carta sobre a reforma das cidades e das gentes. Adoro você, Rã, porque você não concorda.

- Ali, não concordo mesmo! - exclamou a Rãzinha. - Vivo não concordando. Em nós, gente, por exemplo, quanta coisa errada! Por que dois olhos na frente e nenhum na nuca? Eu, se fosse reformar as criaturas, punha um olho na testa e outro na nuca. Desse modo eu dobrava a segurança das criaturas.

- Pois eu aumentava o número de olhos - disse Emília.

- Por que dois só? Assim como temos dez dedos podíamos ter dez olhos. Eu punha quatro na cabeça, a norte, sul, leste e oeste. Eu punha dois nos dedões dos pés, para evitar as topadas. Outro dia Pedrinho deu uma topada num tijolo que quase arrancou a unha. Com um olho em cada dedão não há perigo de topadas - nem de espinhos e estrepes. E eu também dava olhos a cada dedo minguinho. O minguinho é uma verdadeiro vagabundo nas mãos. Não faz nada. Fica o tempo todo assistindo ao trabalho dos outros. Ora, se o "mingo" tivesse um olhinho na ponta, podia prestar bons serviços. Às vezes a gente quer enxergar numa cova de dente ou ver se há cera no ouvido e não pode. Com o olho do "mingo", nada mais fácil.

- E esse olho do minguinho - ajuntou a Rã - podia ser como os microscópios, capaz de enxergar coisinhas invisíveis aos olhos comuns. Mas haveria um inconveniente, Emília. As mãos lidam com tudo, trabalham muito, e esses olhos do minguinho haviam de viver se enchendo de cisco ou se arranhando - e
que dor!

- Nada mais fácil do que evitar isso - lembrou Emília.

- Basta que usem dedaizinhos. Ficam cobertos quando não tiverem o que fazer. Mas por enquanto não podemos reformar gente, porque não há gente aqui. Todos os humanos do sítio foram para a Europa.

- E Rabicó?

- Esse é desumano e quadrupedíssimo. Já pensei muito na reforma de Rabicó. Podemos transformá-lo em bípede e ...

- E acabar com aquela mania de comer tudo quanto encontra - continuou a Rã.

- Eu faria assim: no focinho punha uma espécie de ratoeira, sempre armada; quando ele avançasse num doce ou em qualquer coisa séria, como aquela coroa do casamento de Narizinho, a ratoeira desarmava e segurava-lhe o focinho. E também dava-lhe pernas de tartaruga, para que não pudesse fugir quando Pedrinho o perseguisse com o bodoque.

Emília olhou para a Rã com ar desconfiado. Aquelas idéias pareceram-lhe absurdas. A ratoeira impediria Rabicó de comer não só cocadas e coroinhas como tudo mais, e ele morreria de fome.

- "Bissurdo", Rã! - disse ela. - A sua ratoeira acabava matando Rabicó e Dona Benta ficava danada.

- Você não me entendeu, Emília. A ratoeira só funcionaria quando ele quisesse comer coroinhãs. Para abóbora, milho, mandioca e o resto, não.

- Mas como a ratoeira podia saber quando era coroinha?

- Pelo cheiro. Eu punha um bom nariz na ratoeira.

Emília olhou para a Rã com o rabo dos olhos. Aquela menina estava com jeito de ser maluca ...

Apesar disso encarregou-a de reformar Rabicó. A Rã mudou de assunto.

- Na carta que você me escreveu,    Emília, encontrei a palavra "bissolutamente" em vez de "absolutamente" e agora você disse "bissurdo" em vez de "absurdo." Está reformando as palavras também?

- Ainda não, mas já pensei nisso. Por enquanto me limito a cortar uma ou outra letra com a qual me implico. O "a" de certas palavras me obriga a abrir muito a boca - e meu queixo pode cair, como o da filha de Nhã Veva. Experimente dizer absurdo sem abrir a boca.

A Rã experimentou e não conseguiu, mas "bissurdo" ela disse quase de boca fechada.

- Pois aí está! - tornou Emília. - Tudo errado, até o "a" de certas palavras. O mundo é uma grande trapalhada. Para que, por exemplo, caudinha em Rabicó? Na vaca Mocha a cauda tem razão de ser - serve para espantar as moscas. É um espanador. Mas em Rabicó? Para que serve aquele caracolzinho pelado?

- Para enfeite do fim - lembrou a Rã.

- Que fim?

- O fim de Rabicó. Todos os fins têm caudinhas. É o remate. Mamãe diz que é feio comer e deixar o prato limpo, ou beber um cálice de licor sem deixar um bocadinho no fundo. São caudinhas. São os enfeites da boa educação.

Emília estava cada vez mais desconfiada da Rãzinha. Parecia a Alice do País das Maravilhas. Só vinha com disparates. E disse:

- Enfeites são inutilidades. Não quero saber de enfeites nas minhas reformas. Tudo há de ter uma razão científica. Aquela idéia da carta sobre a reforma do Quindim me pareceu maluca. Acho que você quer brincar com a Natureza, menina. Eu quero corrigir a Natureza, quero melhorá-la, entende? Não se trata de nenhuma brincadeira. Negócio sério. Aí está a diferença entre nós. Na última carta você falou em substituir o couro do Quindim por um veludo. Isso é asneira.

- Mas que necessidade tem Quindim dum couro duríssimo, aqui no Pica-pau Amarelo, onde não há espinhos africanos?

- Concordo. Poderá ter um couro mais fino, assim como a camurça; mas de veludo. Rã, é demais. Às vezes penso que você está sabotando a minha idéia de reforma da Natureza ...
–––––––––––
continua…

Folclore dos Estados Unidos (Rugarou, o Homem Lobo)

Imagem de Rebecca Ryals Russell
No episódio 4 da quarta temporada de Sobrenatural, Sam e Dean são chamados por um caçador de nome Travis para ajudá-lo a matar um rugarou. Ele conta aos irmãos que há alguns anos ele matou um rugarou, pensando que tinha terminado com a “maldição”, mas infelizmente ele descobriu que a esposa dele tinha tido um bebê e agora essa criança era um homem adulto que em breve se transformaria, pois a maldição do rugarou seria transmitida aos seus descendentes.

Logo o filho do rugarou sofreria uma metamorfose, ficaria com uma fome insaciável e logo provaria carne humana, a partir daí nunca mais deixaria de ser um canibal. Bem, ao contrário do descrito nas lendas, o rugarou do Sobrenatural mais parece um zumbi, com sua pele putrefata parecendo soltar-se do corpo.

Mas nas diversas versões da lenda original,  um rugaru ou rugarou (Roux-Ga-Roux, Rugaroo, or Rugaru) seria uma espécie de lobisomem. O mito começou a ser disseminado nas comunidades americanas de origem francesa e por isso se confunde com a lenda do lupgarou, o homem lobo. Essas estórias vem tanto dos imigrantes canadenses como de franceses que imigraram para a Louisiana.

Loup é a palavra francesa para logo e garou, do franco arcaico garulf, cognato da palavra inglesa werewolf). O loupgarou é um homem que se transforma em animal. É mais comumente descrito como um ser humano com cabeça de lobo, lembrando muito a lenda do lobisomem.

No folclore da Louisiana ele representa uma variante da pronúncia original do francês loup-garou. As estórias de rugaru seriam comum na Louisiana francesa. Ambas as palavras são usados como se tivessem o mesmo significado no sudeste da  Louisiana.  Alguns o chama de rougarou, outros de  loup garou.

Nas lendas dos cajun (1) é uma criatura que vaga pelos pântanos de Acadiana e Greater New Orleans, e nos campos e florestas da região.

Acredita-se que seja uma dessas estórias que se diga pra inspirar medo e obediência, para crianças ou para que católicos não deixem de ir à igreja. É dito que os católicos que desobedecerem a quaresma serão perseguidos e mortos pelo rugaru. Na lenda do loupgarou, aqueles que deixarem de observar a quaresma por sete anos seguidos, serão transformados em lobisomem.

Uma lenda comum, diz que o rugaru está sob feitiço por 101 dias, depois disso a maldição é transferida para outra pessoa, se o rugaru sugar o sangue dela. Isso lembra o mito do vampiro, em que a maldição é transmitida para outro pelo ato de sugar o sangue, com a diferença de que o vampiro não consegue se livrar de sua condição.

Outras estórias mostram o rugaru desde como um cavaleiro sem cabeça até o ser derivado da bruxaria.  Em algumas versões, somente uma bruxa pode criar um rugaru – tornando-se ela mesma um lobo ou por amaldiçoar pessoa com a licantropia.

A criatura rugaru é tema de muitas lendas dos nativos norte-americanos. Algumas versões variam do pé grande (sasquatch) ao wendigo.

Alguns estudam a ligação da palavra rugaru, de origem francesa, dentro do folclore dos índios norte-americanos. A palavra não é de origem Ojibwa , mas notadamente de origem francesa. Talvez tenha sido assimilada pelos Ojibwa de Turtle Mountain e os Chippewa da Dakota do Norte, devido ao contato deles com missionários e mercadores de origem francesa, para poderem nomear uma criatura humanóide e peluda.

Enquanto que o wendigo é uma critura temida, o rugaru é  visto como sagrado ligado à  Mãe Terra, assim como o pé-grande.
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Nota:
(1) Os cajun são um grupo étnico,  descendentes de canadense da Acadia ou Nova Escócia, províncías do Canadá, com traços de cultura predominantemente francesa, inclusive o idioma.


Fonte:
http://casadecha.wordpress.com

Guilherme de Azevedo (Alma Nova) VIII

foi mantida a grafia original.
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A UM CERTO HOMEM

Agora és todo nosso: a rude voz da história
Já pode hoje falar
E dar-te um balancete às nódoas e à glória
Rei-Sol de boulevard.

Que dias de esplendor! Porém como começa
A noite e a podridão!
Foi Deus que te mandou também para a Lambessa
Da eterna punição!

Enfarda a tua glória e leva-a que é vergonha
Que vejam amanhã,
Que até lhe depenou as águias de Bolonha
O abutre de Sedan!

E visto que em redor nenhuma estrela brilha
E a noite é longa e má,
No caminho do opróbrio acende a cigarrilha
E, César, ouve lá:

Que altiva e bela a França! Aquela Gália ardente
Que de Valmy levou,
Descalça, quase nua; a Marselhesa em frente;
Nossa alma até Moscow!

Seus filhos têm a foice: envergam rudes clâmides
Depois, caminham sós;
E enquanto ceifam reis acordam nas Pirâmides
A alma dos Faraós!

E vão cheios de fé, bandeira solta ao vento,
Na gleba das nações,
Convictos semeando o novo pensamento
No sulco dos canhões!

Mas tu chegas um dia: afogas-lhe a grandeza
E quando a tens aos pés,
Celebras a vitória aos hinos de Teresa,
A musa dos cafés!

Banquetes dás ao crime; e os teus heróis de esquina
Ainda a afrontam mais,
Tornando a Marselhesa em torpe Messalina
Dum circo de chacais!

E sobre alguns montões de mortos ainda quentes,
Enfim campeias, tu,
Que deste à sagração das cousas dissolventes
um Petrónio Sardou!


Porém, quando ao comer ainda um beijo à Fama,
Um dia avanças mais,
Teu carro triunfal trambolha-te na lama
E então como tu sais!

Revolves-te no horror das vis, infectas ondas
De lodo e podridão,
E vais de manto roto e vestes hediondas
Buscar a escuridão!

Em vez de reclinar a fronte ao sol ardente
Da luta que sorri,
Do fumo dos canhões fugiste, e de repente...
Matou-te um bisturi!...

Que entrada a tua, então, na fúnebre morada,
Pisando, incerto, o pó,
À luz duma lanterna, ao vir da encruzilhada,
Sinistro, sujo e só!

Das cinzas levantou-se um brado entre os jazigos
Dos bons e dos leais,
Apenas descobriste a marca dos castigos
Nas faces triviais!

E quando te assustava o olhar altivo de Hoche
E o gesto de Danton,
Sorria-te na sombra o amor da Rigolboche
Meu César-Benoiton!

Bernardo Guimarães (Poemas Humorísticos e Irônicos : Dilúvio de Papel) Parte 1

Sonho de um jornalista poeta

I

Que sonho horrível! — gélidos suores
Da fronte inda me escorrem;
Eu tremo todo! — cérebros calafrios
Os membros me percorrem.

Eu vi sumir-se a natureza inteira
Em pélago profundo;
Eu vi, eu vi... acreditai, vindouros,
Eu vi o fim do mundo!...

E que fim miserando!... que catástrofe
Tremenda e singular,
Como nunca os geólogos da terra
Ousaram nem sonhar.

Não foram, não, do céu as cataratas,
Nem as fontes do abismo,
Que alagando este mundo produziram
Tão feio cataclismo.

Nem foi longo cometa amplo-crinito,
Perdido nos espaços,
Que sanhudo investiu nosso planeta,
E o fez em mil pedaços.

E nem tão pouco, em roxas labaredas,
Ardeu como Gomorra,
Ficando reduzido a lago imundo
De flutuante borra.

Nada disso: — porém cousa mais triste
Senão mais temerosa,
Foi da visão, que a mente atormentou-me,
A cena pavorosa.

II

Já o sol se envolvia em seus lençóis
De fofas nuvens, resplendentes d’ouro,
Como o cabelo de um menino louro,
Que se enrosca em dourados caracóis.
Dos róseos arrebóis
A luz suave resvalava apenas
Nos topes dos outeiros
E dos bosques nas cúpulas amenas.
E eu, que os dias sempre passo inteiros,
Rodeado de folhas de papel,
Que de todos os cantos aos milheiros
Noite e dia me assaltam de tropel,
Qual o gafanhotal bando maldito
Com que Deus flagelou o velho Egito:
Eu que vivo de um pálido aposento
Na lôbrega espelunca,
Não vendo quase nunca
Senão por uma fresta o firmamento,
E as campinas, e os montes e a verdura,
Flóreos bosques, encanto da natura;
Das vestes sacudindo
A importuna poeira, que me encarde,
Longe das turbas, num recesso lindo
Fui respirar os bálsamos da tarde.

Ao pé de uma colina,
Ao sussurro da fonte, que golfeja
Sonora e cristalina,
Fui-me sentar, enquanto o sol dardeja
Frouxos raios por sobre os arvoredos,
E da serra nos últimos fraguedos,
Meu pensamento longe se embrenhava
Em páramos fantásticos,
E do mundo e dos homens me olvidava,
Sem ter medo de seus risos sarcásticos.

Mas, ó surpresa!... ao tronco recostada
De um velho cajueiro vi sentada,
De mim não mui distante,
Uma virgem de aspecto vislumbrante;
Sobre os nevados ombros lhe tombava
A basta chuva do cabelo louro,
E a mão, como a descuido, repousava
Por sobre uma harpa de ouro
Engrinaldada de virente louro.
Cuidei que era uma estátua ali deixada
Que em noite de tremendo temporal
Pela fúria dos ventos abalada
Tombou do pedestal.
Mas o engano durou só um momento;
Eu a vi desdobrar o ebúrneo braço,
E percorrendo as cordas do instrumento
De melífluas canções encher o espaço.
E ouvi, cheio de espanto,
Que era a musa, que a mim se endereçava
Com mavioso canto,
E com severo acento, que inda abala
Té agora o meu peito, assim cantava,
— Que a musa canta sempre, e nunca fala.

III
Canto da musa, recitativo

Que vejo? junto a meu lado
Um desertor do Parnaso,
Que da lira, que doei-lhe
Faz hoje tão pouco caso,
Que a deixa pendurada numa brenha,
Como se fora rude pau de lenha?!
Pobre infeliz; em vão lhe acendi n’alma,
De santa inspiração o facho ardente;
Em vão da glória lhe acenei co’a palma,
A nada se moveu esse indolente,
E de tudo sorriu-se indiferente.

Ingrato! ao ver-te, sinto tal desgosto,
Que fico possuída de ruim sestro,
Me sobe o sangue ao rosto;
E em estado, que até me falta o estro,
Em vão estafo os bofes,
Sem poder regular minhas estrofes.

Por que deixaste, desditoso bardo,
As aras, em que outrora
De tua alma queimaste o puro incenso?
Como podes levar da vida o fardo
Nesse torpor, que agora
Te afrouxa a mente, e te anuvia o senso,
E as flores desprezar de tua aurora,
Ricas promessas de um porvir imenso?
Nossos vergéis floridos
Trocas por esse lúgubre recinto,
Onde os dias te vão desenxabidos
Em lânguido marasmo;
Onde se esvai quase de todo extinto,
O fogo do sagrado entusiasmo;
Onde estás a criar cabelos brancos
Na lide ingloriosa
De alinhavar a trancos e a barrancos
Insulsa e fria prosa!

Ária

Pobre bardo sem ventura,
Que renegas tua estrela;
— Oh! que estrela tão brilhante!
Nem tu merecias vê-la!

Pobre bardo, que da glória
Os louros calcas aos pés,
Deslembrado do que foste,
Serás sempre, o que tu és?

Já não ouves esta voz,
Que te chama com amor?
Destas cordas não escutas
O magnético rumor?

Nenhum mistério decifras
No rugir deste arvoredo?
Esta fonte, que murmura
Não te conta algum segredo?
Não entendes mais as vozes
Destes bosques, que te falam.
No rumorejo das folhas.
E nos perfumes que exalam?

Nesta brisa que te envio
Não sentes a inspiração
Roçar-te pelos cabelos,
E acordar-te o coração?

Não vês lá nos horizontes
Uma estrela refulgir?
É a glória, que rutila
Pelos campos do porvir!

É ela, que te sorri
Com luz vívida e serena;
E com sua nobre auréola
Lá do horizonte te acena.

IV

Estes acentos modulava a musa
Com voz tão maviosa,
Qual borbotando geme de Aretusa
A fonte suspirosa,
Da Grécia os belos tempos recordando,
Que já no esquecimento vão tombando.
Encantada de ouvi-la, a mesma brisa
O vôo suspendeu;
E o travesso regato de seu curso
Quase que se esqueceu.
Os bosques aos seus cantos aplaudiram
Com brando rumorejo;
E o gênio das canções, na asa das auras,
Mandou-lhe um casto beijo.
Enquanto a mim, senti correr-me os membros
Estranho calafrio;
Mas procurei chamar em meu socorro
Todo o meu sangue-frio.

Qual ministro de estado interpelado,
Não quis ficar confuso;
E da parlamentar nobre linguagem
Busquei fazer bom uso.
Como homem que entende dos estilos,
Impávido me ergui,
Passei a mão na fronte, e sobranceiro
Assim lhe respondi:

V

Musa da Grécia, amável companheira
De Hesíodo, de Homero e de Virgílio,
E que de Ovídio as mágoas consolaste
Em seu mísero exílio;

Tu, que inspiraste a Píndaro os arrojos
De altiloqüentes, imortais canções,
E nos jogos olímpicos lhe deste
Brilhantes ovações;

Tu, que a Tibulo os hinos ensinaste
De inefável volúpia repassados,
E do patusco Horácio bafejaste
Os dias regalados;

Que com Anacreonte conviveste
Em galhofeiro, amável desalinho,
Entre mirtos e rosas celebrando
Amor, poesia e vinho;

Que tens a voz mais doce que a da fonte
Que entre cascalhos trépida borbulha,
Mais meiga que a da pomba que amorosa
Junto do par arrulha;

E também, se te apraz, tens da tormenta
A voz troante, o brado das torrentes,
O zunir dos tufões, do raio o estouro,
O silvo das serpentes;

Tu bem sabes, que desde minha infância
Rendi-te sempre o culto de minh’alma;
Ouvi-te as vozes e aspirei constante
A tua nobre palma.

Mas, ah!.. devo eu dizer-te?... o desalento
N’alma apagou-me a inspiração celeste,
E fez cair das mãos esmorecidas
A lira que me deste!...
Peregrina gentil, de que te serve
Andar vagando aqui nestes retiros,
Na solidão dos bosques exalando
Melódicos suspiros?...

Não vês que o tempo assim perdes embalde,
Que tuas imortais nobres canções
Entre os rugidos, abafadas morrem,
Dos rápidos vagões?

Neste país de ouro e pedrarias
O arvoredo de Dáfnis não medra;
E só vale o café, a cana, o fumo
E o carvão de pedra.

Volta aos teus montes; vai volver teus dias
Lá nos teus bosques, ao rumor perene,
De que povoa as sombras encantadas
A límpida Hipocrene.

Mas se desejas hoje alcançar palmas,
Deixa o deserto; exibe-te na cena;
Ao teatro!... lá tens os teus triunfos;
Lá tens a tua arena.

Tu és formosa, e cantas como um anjo!
Que furor não farias, que de enchentes,
Quanto ouro, que jóias não terias,
E que reais presentes!...

Serias excelente prima-dona
Em cavatinas, solos e duetos:
E ajustarias de cantar em cena
Somente os meus libretos.

Se soubesses dançar, oh! que fortuna!
Com essas bem moldadas, lindas pernas,
Teríamos enchentes caudalosas
Entre ovações eternas.

Em vez de ser poeta, quem me dera,
Que me tivesse feito o meu destino
Pelotiqueiro, acrobata, ou funâmbulo,
Harpista ou dançarino.

Pelos paços reais eu entraria
De distinções e honras carregado,
E pelo mundo inteiro o meu retrato
Veria propagado.

E sobre minha fronte pousariam
C’roas aos centos, não de estéril louro,
Como essas que possuis, mas de maciças,
Brilhantes folhas de ouro.

Esse ofício, que ensinas, já não presta;
Vai tocar tua lira em outras partes;
Que aqui nestas paragens só têm voga
Comércio, indústria e artes.

Não tem aras a musa; — a lira e o louro
Já andam por aí de pó cobertos,
Quais vãos troféus de um túmulo esquecido
Em meio dos desertos.

Ó minha casta, e desditosa musa,
Da civilização não estás ao nível;
Com pesar eu to digo, — nada vales,
Tu hoje és impossível.

VI

De santa indignação da musa ao rosto
Rubor celeste assoma;
De novo a lira, que repousa ao lado,
Entre seus braços toma.

E essa lira, inda agora tão suave,
Desfere voz rouquenha,
Desprendendo canções arrrpiadas
De vibração ferrenha.

Eu julguei que escutava entre coriscos
Troar a voz do raio;
Em pávido desmaio
Tremem os arvoredos;

De medrosos mais rápidos correram
Os trépidos regatos, e os rochedos
Parece que de horror estremeceram.

“Maldição, maldição ao poeta,
Que renega das musas o culto,
E que cospe o veneno do insulto
Sobre os louros da glória sagrados!

Ao poeta, que em frio desânimo
Já descrê dos poderes da lira,
E que à voz que o alenta e inspira,
Se conserva de ouvidos cerrados!

Maldição ao poeta, que cede
À torrente do século corrupto,
E nas aras imundas de Pluto
Sem pudor os joelhos inclina!

Que com cínico riso escarnece
Dos celestes acentos da musa,
E com tosco desdém se recusa
A beber da Castália divina.

E agora, ó descrido poeta,
Que o alaúde sagrado quebraste,
E da fronte os lauréis arrancaste
Qual insígnia de ignóbil baldão,

Já que a minha vingança provocas,
Neste instante tremendo verás
Os terríveis estragos que faz
A que vibro, fatal maldição!”
–––––––––––––––
continua…

Vocabulário de termos e expressões regionais e populares do Centro Oeste (Mato Grosso e Goiás) L, M, N, O e P

L
 
LÁ-EM-BAIXO — Centro civilizado.

LAMEIRÃO — Grande lamaçal.

LAMEIRO — Lamaçal.

LÉGUA — Seis quilômetros.

LENCAR — Negar fogo (tiro) .

LEVA — Cambão ou vigota de madeira, para transportar peso.

LINHA-LARGA — Uma puída grande, que vai até o leito do rio.

M
 
MACACOA — Doença crônica, que não obriga a guardar o leito. "Macacoas da velhice…"

MACAIA — Fumo de péssima qualidade.

MACUTENA — Leproso; morfético. A macutena: a lepra. O macuíena: o leproso.

MALHADOR — Amassado no pasto ou no mato, por animais. As antas e as capivaras também fazem malhador no barro das margens dos rios.

MAMPARRA — Perda de tempo; morosidade; moleza de ação.

MAMPARREAR — Perder tempo; agir morosamente.

MANDAÇAIA — Abelha mansa, cujo mel é muito saboroso.

MANDOROVÁ — Lagarta de fogo, larva.

MANÉ-POR-HORA — Sempre a mesma música.

MANINHO — Sáfaro, ruim, emaranhado: "terreno maninho …"

MANTENA — Grande.

MARIQUINHA — Trempe de paus em que se dependuram as panelas, em viagem, para o serviço culinário; mariquita.

MARROÁ — Touro, reprodutor de gado creolo.

MARTELO — Copo grosso para dose de bebidas, principalmente a cachaça.

MATAIME — Trempe de paus e folhas, para desviar a correnteza de um rio.

MATAR-O-BICHO — Tomar um aperitivo.

MATRINCHÃ — Peixe de carne muito apreciada, nas vertentes do rio Araguaia.

MATUNGO — Cavalo velho, sendeiro.

MEIAPATIA (corrup.) — homeopatia.

MEIA-PRAÇA — Garimpeiro a serviço de um patrão, com direito à metade do que apurar.

MELÊTE — Tamanduá-mirim.

MEMÓRIA — Anel, aliança.

MEZINHA — Remédio caseiro.

MILITANDO — Operando, trabalhando.

MINADOR — Manancial; fonte; olho d’água.

MOFINO — Raquítico; fraco; adoentado.

MOJAR, MOJANDO — Estar prenhe (o animal): "a vaca está mojando".

MURICI — Pequeno arbusto de frutos amarelos, cheirosos e bons para temperar pinga.

MURIÇOCA — Mosquito zumbidor, noturno, sanguessuga; pernilongo.

MUTIRÃO — Reunião sertaneja para um serviço, principalmente para limpa de roça ou colheita ao qual segue uma festa. Este serviço não é remunerado.

MUTRECO (ê) — Tipo-á-toa, estúpido, desprezível.

MUXIBA — Avarento, econômico em excesso.

N

NAMBI — Animal de orelha caída.

O

OBRIGAÇÃO — Família. Como vai a obrigação? (como vai a família?)

P

PAÇOCA — Farnel de carne seca e farinha, socados em pilão.

PACUERA — Fígado.

PAMPEIRO — Alvoroço, briga com algazarra; forte altercação.

PANEMA — Macaca; azar.

PAPO AMARELO — Carabina. Há também uma espécie de jacaré com este nome.

PASSARINHADOR — Diz-se do animal que, em viagem, se assusta de repente, com ou sem motivo, pondo em perigo de queda o cavaleiro inexperiente.

PASSARINHAR — Mesquinhar; espantar; assustar. Animal que passarinha não é bom para se viajar.

PASSARINHEIRO — O mesmo que passarinhador.

PAULA SOUSA — Caroço de chumbo grande para carregar arma de fogo.

PÉ-DE-BODE — Sanfona de oito baixos.

PÉ-DE-BOI — Pessoa muito trabalhadora.

PEDRÊS — Animal chumba-dinho de branco e preto.

PELAMONIA (corrupt.) — Pneumonia.

PÊLO-DE-RATO — Animal de pouco pêlo e côr acinzentada.

PEQUI — Planta da família das cariocaráceas que dá fruto amarelo e extremamente cheiroso, contendo, além polpa carnuda. A pequi vem quase sempre geminado em forma de rins, cujo envólucro é redondo, de côr verde e do tamanho de uma laranja. O licor do pequi, de Mato Grosso, é exportado.

PERRENGAR — Viver adoentado, enfraquecido; fazer algo com preguiça.

PERRENGUE — Adoentado, convalescente, enfraquecido.

PICÁPAU — Espingarda de carregar pela boca; fulminante; chumbeira; o mesmo que laza-rina do norte, porém, mais curta.

PICUÁ — Recipiente feito da ponta do chifre onde os garimpeiros guardam diamante.

PINCHAR — Jogar fora; atirar, arremessar para longe.

PINDA — Linha com anzol dependurado de um galho, dentro do rio.

PINGUELO — Gatilho.

PINOTEOU — Deu pinote: ficou de pé (animal); saltar; empinar.

PINTADA — Onça canguçu, a maior da América Latina.

PIPOCA — Biscoito mineiro, de grande crescimento, feito de polvilho.

PIRAMBEIRA — Descida a pique para um precipício.

PITUCA — Coque de cabeleira da mulher.

PIXUÁ — Fumo bom em camadas de folhas prensadas e não enroladas e torcidas como no fumo de rolo ou de corda.

PIXUÁ — Rolête de folhas de fumo maduro, não seco nem curtido, para cigarros de palha.

POJADURA — Saída fácil e abundante do leite.

POJAR — Mamar satisfeito: "os leitões estão pojando, contentes …"

PRECÀNCHO (corrupt.) — percalços.

PRIMEIRA ÁGUA — Terreno de primeira água é terreno de legítima cultura.

Fonte:
Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. . Ed. Literat. 1962

domingo, 29 de setembro de 2013

Trova 264 - Roberto Pinheiro Acruche (São Francisco de Itabapoama/RJ)

Imagem obtida no facebook

Clevane Pessoa de Araújo Lopes (Passagem)

A Gonçalves Dias

Poeta -saudoso, agônico, voltas à terra natal
Frágil, trêmulo, febricitante,
Mas com relembranças fortes
A plenificar-te a alma de energia
Embora estejam enfraquecidas as esperanças...
Queres chegar a São Luiz do Maranhão,
Chegar e andar pelas ruas estreitas,
Pelas calçadas de pedras,
Da ilha de praias singulares
Cujo areal extenso
É lambido pelo mar cor de rio,
Cuja extensão vai dar nas terras de Portugal...
Queres rever pessoas, ouvir os sons
Dos sinos das igrejas, da siringe dos sabiás festivos
Que não esqueceste em teu exílio.
A mulher amada acode-te em teu delírio,
a rememória faz-se musa e te inspira versos
que não mais escreverás...
Um piedoso anjo de cristal,que parece orvalho,
Cheirando a rosas e à maresia,
Faz com que olvides as razões de teu martírio
Pela separação cruel e indevida
Da mulher amada...
Que culpa tens por teu sangue a correr nas veias
Brasileiras, é mestiço,a gerar tantos preconceito .

Súbito, a vida se esvai, a breve vida

As águas em movimento, frias ao teu corpo ardente
Sereias de prata conduzem-te ao Absoluto,
O desconhecido –assustador, por ignoto,
Até que se chegue aos portais dessa outra dimensão.
Teu anjo Estelas, que tantas vezes desceu à Terra
para consolar-te e enxugar-te as lágrimas,
ampara-te, e tomando-te pela mão,
leva-te ao gênese de tua essência,,
pelo túnel pleno de magnífica luminescência...
As asas angelicais, energia em movimento,
Criam mil arco-íris deslumbrantes, o que te encanta na passagem...

Percebes que enfim, estás livre
De qualquer sofrimento e provação
Não tens cor-de pele que te torne um rechaçado,
Carne alguma, cuja carnação de mulato
Marque tua destinação!
Nada que te faça um auto-exilado...
Súbito, ouves risos e canções.
Outros poetas estão à tua espera, Gonçalves Dias.
Ajudam-te, dizem-te teus próprios versos e os deles,
Convincentes de que todos os bardos são iguais de alma
Abraçam-te, cordifraternalmente.
Nem em todas as tuas fantasias,
Te imaginaste assim, igual entre iguais,
diferente entre diferentes,
quais o são todas as criaturas de um mesmo Criador...
Percebes que nesse mundo , não há preconceitos
E que aqui, experimentarás um espaço de estar para ser...
Leve, em pianíssimo, , sentindo uma felicidade inusitada
À tua vida antes atribulada, tributada
de preços que não podias pagar,
deixas-te conduzir ,em agonia agora.
Seria o fim, mas é um recomeço
Afinal, poetas não devem morrer
-não se sua Poesia permanecer
Após sua délivrance ao contrário.
Para sempre, teus versos serão lembrados,
Enquanto houver sabiás, enquanto a serpente dormitar
Enroscada no contorno da Ilha .
Teus poemas são o retrato de teu talento,
De teu perfil, de tua história...
O mar foi o derradeiro abrigo de teu corpo.
A alma...continua em expansão!

Fonte:
A autora

Aparecido Raimundo de Souza (Meu Anjo)

Eu tenho um anjo.

Um ente espiritual que me guarda os passos, que me guia dia e noite onde quer que vá ou esteja. Esse anjo é minha luz sempre acesa, a estrela maior no infinito, o sol mavioso que aquece o meu frio e a água pura e cristalina que mata a minha sede.

Eu tenho um anjo.

Não um desses comuns que se compram nessas lojinhas de R$ 1.99, espalhadas pela cidade, mas um anjo de verdade, com asinhas nas costas, vestida de azul (embora brigue com ela pedindo que use o branco), os cabelos à Jennifer Garner (aquela da série “Aliás”).  Esse meu anjo anda numa carruagem de cristal com dois bonitos cavalos brancos — tão alvos como as nuvens de um céu de brigadeiro. É ela, meu anjo encantado, que todas as manhãs me acorda e toma café ao meu lado. É ela que me faz ajoelhar antes de sair para o trabalho e pedir com a mão direita posta sobre a Bíblia, proteção ao Pai numa oração silenciosa endereçada ao Altíssimo.

Eu tenho um anjo.

Da falange de Jesus, da legião que presta serviços constantes a Deus. Um anjo que lembra Viviane Araújo por causa da sua meiguice, da sua ternura e do seu sorriso constante. Um anjo inteligente como a Carol Trentini que entende de moda e chega a arriscar alguns palpites nas roupas que devo usar. Eu tenho um anjo, tenho sim, um anjo autônomo, perfeito, incansável, senhora de si, cabeça feita. Vive a proteger minha vida, quer seja na rua, no trânsito, no carro, dentro da condução. Um anjo que caminha lado a lado, que marcha ombro a ombro, que segue comigo, de mãos dadas, um anjo que me desvia da estrada ruim evitando que siga em frente e caia num precipício sem volta.

Pois é: eu tenho um anjo.

Um anjo, eu tenho, acreditem. Um anjo de luz intensa. É ela que enfrenta, em meu lugar, as balas perdidas, que se põe à frente dos malfeitores e dos assaltantes que tentam cruzar meu caminho. É ela que, igualmente, me orienta, protege, vigia, aconselha, ensina, governa e dirige os meus passos. É também esse meu anjo bom, essa criatura com poderes divinos, que me ampara nas viagens longas e não me perde de vista um minuto sequer — mesmo quanto baixinho, lhe implore, que me espere, do lado de fora, no corredor. Meu anjo é bonito. Seu rosto não me parece com ninguém conhecido, embora diga a ela, de vez em quando, ter uma leve aparência com a Sabrina Petraglia.

Quando isso acontece, ela se limita a sorrir e ralhar com ares maternais, observando que deixe de lado as bobagens, que amadureça e encare com mais seriedade o viço que me cerca. Foi com esse anjo que aprendi a comer a fondue de carne em garfos compridos, mergulhados na panela de óleo quente. Com ela conheci o verdadeiro sentido da paz, pois o meu anjo é todo feito de Paz!

O meu anjo tem os traços de Jesus, age como Ele, e, como tal, caminha comigo em direção à felicidade que procuro a cada nova manhã, para mudar de uma vez para sempre os destinos da minha vida.

Eu tenho um anjo!

Fontes:
SOUZA, Aparecido Raimundo de. Havia uma ponte lá na fronteira. São Paulo: Ed. Sucesso, 2012.
Imagem = Gisele Santos da Silva

Rita Rocha (À Chegada da Primavera)

Do ano, uma encantadora fração
no cenário nova vestimenta
a Primavera vem falar aos corações
e aos nossos sonhos... acalenta.

É o esvoaçar das aves, é a floração...
se estendendo em opulência.
É no milagre da renovação
alegrando a terra e nossa vivência.

É encantamento em profusão
no esbanjar d`um róseo colorido
num pôr-do-sol temos a sensação
de que o Pai está ali... refletido.

Primavera não é apenas mais uma estação
é o sentir da vida, é encanto, é magia,
é a natureza em perfeita comunhão
que ao ser humano só traz alegria.

Santo Antônio de Pádua, 24/09/2013

Fonte:
A autora

Folclore dos Estados Unidos (Origem da Terra dos Haida)

O corvo saiu da Terra e escalou o céu, causando grande confusão entre o Povo Celestial. Por isso, eles acabaram jogando ele nas águas.

Antes dos dias de nossos avós não havia nada, além de água. Era tudo água, com exceção de um único recife. Lá viviam seres sobrenaturais.  Mas eles ficavam todos amontoados. O corvo voou tentando arrumar um lugar onde pudesse ficar de pé,  mas ele não podia imaginar aonde.

Então ele olhou para o céu. Era sólido. Era tão lindo e o corvo estava fascinado por ele. Ele disse: “vou até lá!”, então ele correu o bico pelo céu e o escalou.

Ele viu que a Cidade dos Céus era um lugar bem grande. O chefe vivia lá e na casa do chefe havia um bebê.  Quando a noite chegou,  o corvo pegou o bebê pelo calcanhar e balançou os ossos para fora. Então ele vestiu a pele e fingiu que era o bebê.  Porém, mais tarde ele saiu da pele do bebê e virou corvo novamente.  Ele voou de casa em casa e fez muita bagunça. Enfim uma mulher o viu e avisou para todos.

Então o chefe reuniu sua gente e eles cantaram uma canção para o corvo. Era uma canção mágica, e no meio da canção o corvo deixou de se segurar, e caiu do Cidade dos Céus até que atingiu as grandes águas;

Então o berço ficou a deriva nas águas por um bom tempo. O corvo chorou, então ele mandou a si mesmo que dormisse, mas quando o corvo dormiu, alguma coisa disse: “Seu poderoso pai manda você entrar”. O corvo se recobrou rápido. Ele olhou em direção ao som, mas não viu nada, não havia coisa alguma ali. Logo a voz repetiu as palavras.

Corvo olhou através do buraco em seu lençol de pele de marta. Então, através das águas veio um mergulhão dizendo, “Seu poderoso pai diz para você entrar!”.

O corvo desceu pelo totem até chegar a uma casa submersa, onde encontrou o Homem Gaivota, seu pai. Figura: Totem de uma casa Haida.

O corvo se levantou. Seu berço estava indo ao encontro de uma grande alga marinha. Ele caminhou sobre ela, e olhem! Na verdade era um totem de duas cabeças feito de pedra. Quando o corvo desceu, descobriu que ele podia respirar tão facilmente quando no ar acima.

Abaixo do totem havia uma  casa. Alguém disse, “venha, entre meu filho, eu ouvi falar que você quer emprestar algo de mim”. O corvo entrou. No fundo da casa estava sentado um velho Homem Gaivota (1). O ancião mandou ele até uma caixa que estava pendurada em um canto. O corvo a abriu e tirou de dentro dois grandes pedaços de alguma coisa. Uma era preta e a outra estava coberta com pontas brilhantes.

O Homem Gaivota pegou os dois pedaços e mostrou para o corvo. Ele disse. “coloque este pedra pontuda na água primeiro, e depois coloque a preta. Então tire um pedaço de cada e cuspa fora e os pedaços vão se reunir;” assim ele falou.

Quando o corvo saiu, ele colocou o pedaço preto na água primeiro. Quando ele bicou um pedaço da pedra com pontos brilhantes e jogou na água, as pontas se juntaram novamente. Ele não fez como tinha sido orientado. Então ele voltou para a pedra preta, bicou e cuspiu fora de novo. Os pedaços ficaram presos. Então eles começaram a se transformar em terra. Ele colocou isso na água, e isso se esticou até se tornar a terra dos Haida (2). Do outro pedaço ele fez o continente.
---------------------
Notas:
(1)
Para os haida, os animais são seres muito poderosos, que podem se transformar a seu bel-prazer, provavelmente o homem gaivota deveria ser uma gaivota que no momento estava assumindo a forma humana.

(2)
A tribo haida é um tribo norte-americana, cujos territórios se estendem desde os Estados Unidos até o Canadá. A nação é dividida em clã das Águias e clã dos Corvos. Eles são hábeis em construir canoas e outras tribos sempre tiveram medo de guerrear com eles no mar.

Fonte:
JUDSON, Katherine B. Myths and Legends of British America. 1917.
Texto em portugues obtido em http://casadecha.wordpress.com

Ciranda da Primavera (Seleção por Simone Borba Pinheiro) Parte 3

DETH HAAK
Ao tempo …


 Chegando Lírica a Primavera
 Bordando de Flores os sonhos
 Tramando corrimões pra chegar
 Ao mar que remexe risonho…

 Cortejando a janela um lindo
 Quadro suponho…
 Nas velas que sopram a brisa
 O olor das Açucenas vindo.

 É mágico! O tempo de sonhar
 Estrelas ornamentadas
 Brilhando pro farol ofuscar
 No valsar das samambaias…

 A musica a se despedir do verão
 Que amarelou suas folhas,
 Que hoje destilam o verdejar
 No serenar da maresia o tom…

 Das Petúnias Cravíneas, a canção
 Que ao horizonte embala e matiza
 Dando vida as cores na emoção,
 Que esparge o Vento…

 As sementes que espocam ao ver
 O vergel enamorado a engalanar
 A Primavera que chega do mar
 Em guirlandas de conhas no SER;

 A arte pincela o terno entardecer
 Que abraça a noite saudando o dia
 Que explodirá em Flores ao amanhecer
 Orvalhado as pétalas da Poesia…
---------------------------------
EFIGÊNIA COUTINHO
Festa das Flores


 Que alegria naquelas flores
 que perfume de juventude!
 Viva!...Viva!...Venha dançar
 nesta Festa das Flores...

 As Flores vêem anunciar a
 a ressurreição da natureza.
 E cantam a canção colorida
 e sorriem aos raios do astro sol.

 Cantam um dia, uma hora, e
 depois inclinam a cabeça,
 deixando que outras Flores
 se abrem á Luz da vida...

 Pra que nunca seja quebrada
 a grinalda das cores e dos
 Perfumes...Que Alegria nesta
 dança das Flores na vida!
--------------------------
ERMÍNIA (BEL-BA)
Primavera


 É quando a vida se abre como uma flor
 E em seus braços meu corpo inerte
 Deitado sobre a relva macia
 Numa manhã de setembro
 Vive sem pudor
 O amor....
------------------------
FAFFI (SÍLVIA GIOVATTO)
Amadurecer Florindo


 A maturidade no amor
 não é uma equação matemática,
 agindo racionalmente, ela chega... e
 fica no seu cantinho...
 Nem é preciso ser valente e forte,
 mas é bom tomar cuidado com o bichinho do ciúme,
 esquecer as desigualdades conjugais...
 e meter na cabeça que o amor não é só um sentimento,
 é uma escolha de vida a dois...
 Nunca confundir maturidade com comodidade,
 precisamos estar sempre investindo no amor..
 mudar hábitos, trocar carinhos,
 nunca deixar que o amor vire rotina...
 Só assim ele amadurece florindo,
 e fica durável por tempo indeterminado.
----------------
FAFFI (SÍLVIA GIOVATTO)
Primavera


 A estação do amor está chegando
 a primavera está no ar...
 No ar que passa
 No ar que respiro
 No ar que te vejo passar
 As árvores se enfeitam,
 as folhas ganham um verde de esperança,
 mais forte, mais brilhante, mais vibrante...
 A calmaria está no ar!
 é a primavera chegando,
 estação da paz, estação do amor,
 as flores vão começar a desabrochar a colorir a vida...
 O sol vai chegar mais cedo
 esquentando a terra, desabrochando a Rosa...
 é o amor chegando...
--------------------
FERNANDO REIS COSTA
O Poeta e a Primavera


 Começa a Primavera... E que alegria!
 Abrem-se os corações, brotam as flores,
 E os poetas, nas canções da poesia,
 Mais inspirados estão com seus amores!...

 Cantam mais alto, em verso, os seus louvores!
 E aos seus amores, em grande apologia,
 Doam versos em forma de flores
 De toda a Primavera deste dia!

 Renasce a Primavera! E, na poesia,
 Os cânticos d'amor e de saudade!
 E quanta dor e pranto, e nostalgia...

 O poeta transforma em alegria
 Nos versos d'amor e d'amizade
 Da sua Primavera: - a Poesia!...
------------------------------
GISLAINE CANALES
 
Primavera
 Glosando P. de Petrus

 MOTE:
 A primavera vem vindo!...
 Há festas, risos e amores...
 é deus que chega sorrindo
 pelo sorriso das flores...

GLOSA:
 A primavera vem vindo,
 perfumada e colorida,
 e o inverno vai fugindo
 em sua louca corrida!

 Nessa gostosa estação,
 há festas, risos e amores,
 que servem de inspiração
 aos poetas trovadores!

 Tudo é mais que muito lindo
 na inigualável beleza...
 É Deus que chega sorrindo
 nas flores da natureza!

 A Primavera nos traz
 numa imensidão de cores,
 a felicidade e a paz
 pelo sorriso das flores...
--------------------
GLADYS OVADILLA
Primavera


 La primavera sonriente
 Detrás de los árboles verdes,
 Mirando maravillada,
 La juventud para verte,
 Se acuesta con su hermosura,
 Llena de tules y flores,
 Danza como una diosa
 En el rincón de las rosas,
 El viento se envaneció
 Callo sus fuertes soplidos,
 Encontró la primavera
 Estaba sola en el camino,
 La miro muy suavemente,
 Ella no quiso confianza, y el
 Regreso por donde vino,
 Todos ocuparon sus lugares,
 El agua corrió por el rió,
 Los peces encandilaron el día,
 Se movía mi canoa de madera
 Sintiendo el perfume en el aire,
 Llego, llego, la primavera

Fonte:
Seleção por Simone Borba Pinheiro. in http://www.familiaborbapinheiro.com

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 3 – O passarinho-ninho

A resposta foi um "Aqui!" vindo do pomar. Correndo no rumo da voz, a menina encontrou Emília tão entretida com um passarinho que nem sequer a olhou. Estava afundando as costas dum tico-tico. Todos os passarinhos têm costas "convexas", isto é, arredondadas para cima. Emília estava fazendo um passarinho de costas "côncavas", isto é, com um afundamento redondo nas costas. A Rã ficou a olhar para aquilo sem entender coisa nenhuma, até que Emília explicou.

- Estou fazendo o passarinho-ninho. A boba da Natureza arruma as coisas às tontas, sem raciocinar.

Os passarinhos, por exemplo. Ela os ensina a fazer ninhos nas árvores. Haverá maior perigo? Os ovos e os filhotes ficam sujeitos à chuva, às cobras, às formigas, às ventanias. O ano passado deu por aqui um pé–de-vento que derrubou o ninho deste tico-tico, ali da minha pitangueira - e lá se foram três ovos tão bonitinhos, todos sardentinhos. E mais uma vez me convenci da "tortura" das coisas. Comecei a reforma da Natureza por este passarinho.

A Rã não entendeu que reforma era aquela e perguntou:

- Para que esse afundamento aí nas costas do tico-tico?

- Pois é o ninho - respondeu Emília. - Faço o ninho dele aqui nas costas e pronto. Para onde ele for, lá vão também os ovos ou os filhotes - e não há perigo de cobra, nem de ventania, nem de chuva.

- De chuva há - disse a Rãzinha. - Nos ninhos em árvores a fêmea está sempre em cima dos ovos.

Mas aí...

Emília fez um muxoxo de superioridade.

- Já previ todas as hipóteses - disse ela. - Faço a caudinha dele bem móvel, de modo que possa virar para trás e cobrir os ovos quando for preciso, como se fosse um telhadinho.

A Rã deu-se por satisfeita e com a maior atenção acompanhou o preparo do primeiro passarinho ninho do mundo.

- Pronto! - exclamou Emília por fim. - Passam só os ovos. Corra ali e me traga o tico-tico fêmea que está na gaiola.

A Rã foi e trouxe o passarinho. Emília pegou-o com muito jeito e espremeu-o de modo que saíssem três ovinhos sardentos, os quais depositou com muito cuidado no ninho de penas feito nas costas do tico-tico macho - e soltou os dois, pelo ar.

Emília estava radiante.

- Lá se foram! - exclamou. - Acabaram-se as inquietações, os medos de cobra, formiga ou vento. E também se acabou o desaforo de todo o trabalho de botar e chocar os ovos caber só à fêmea. Os homens sempre abusaram das mulheres. Dona Benta diz que nos tempos antigos, e mesmo hoje entre os selvagens, os marmanjos ficam no macio, pitando nas redes, ou só se ocupam dos divertimentos da caça e da guerra, enquanto as pobres mulheres fazem toda a trabalheira, e passam a vida lavando e cozinhando e varrendo e aturando os filhos. E se não andam muito direitinhas, levam pau no lombo. Os machos sempre abusaram das fêmeas, mas agora as coisas vão mudar. Este tico tico, por exemplo, tem que tomar conta dos ovos. A fêmea fica com o trabalho de botá-los, mas o macho tem que tomar conta deles.

- Mas assim os ovos não chocam - objetou a Rãzinha.

- Para que choquem é preciso que as fêmeas fiquem uma porção de dias sentadas sobre eles. As galinhas levam 21 dias no choco.

- Já "previ a hipótese" - disse Emília - e reformei esse ponto. No meu sistema de passarinho ninho quem choca não é a fêmea e sim o sol, como acontece com os ovos dos jacarés, tartarugas, lagartixas e cobras.

- E quando não houver sol? Às vezes passam-se dias sem o sol aparecer.

- Nesse caso os ovos que tenham paciência e esperem que o sol apareça. Para que pressa?

A Rã não teve mais nada a dizer. Estava certo. Só então é que Emília se lembrou de cumprimentá-la e saber como iam todos lá da casa. Também lhe examinou as mãos para ver se as unhas estavam de luto.

E fê-la voltar-se de perfil e de costas, e dar três pulos. Era a primeira vez que as duas se encontravam pessoalmente.

- Estou gostando do seu físico - disse Emília no fim do exame. - Tive medo de que não correspondesse à idéia que fiz. Muitas vezes a gente imagina uma pessoa e sai o contrário.
–––––––––––-
continua…